Capítulo 54 — Rosto familiar
O olhar de Eriel se voltou para cima, e foi quando ela notou a presença de dez figuras encapuzadas. Cada uma delas exalava uma aura única, diferente de tudo o que ela já havia presenciado.
Apesar do cansaço extremo após a batalha, Eriel sentiu um arrepio percorrendo sua espinha. Cada um desses indivíduos parecia possuir poder suficiente para rivalizar com os sucessores, e pelo menos dois ou três deles demonstravam uma força que claramente ultrapassava esse patamar, elevando-os a um nível excepcional.
Ades, que havia se aproximado do grupo, caminhou em direção aos encapuzados. Com um gesto casual, ele entregou o corpo desacordado de Malak a um de seus companheiros.
“Me desculpe por isso, Azrael–”, começou Ades, mas foi interrompido imediatamente.
“Vamos parar por aqui…”, declarou Azrael, sua voz irritada.
O homem, que minutos antes parecia um aliado confiável, agora direcionava um olhar carregado de desconfiança e ódio. Eriel observou cada movimento, sentindo que algo estava prestes a acontecer.
“Você está com a aliança, certo?”, questionou Azrael, estreitando os olhos.
“Sim”, respondeu Ades prontamente, sem hesitação.
Azrael suspirou, sua expressão se tornou ainda mais sombria.
“Não apenas isso, mas sou o atual líder da aliança”, completou Ades com um tom provocador.
Eriel arregalou os olhos, conectando as peças. O antigo amigo de Azrael, classificado como aliado pelo líder anterior da Aliança, era ninguém menos que Ades?
“Você parece confiante, deus da guerra”, interveio Samael, cruzando os braços. “Sabe que podemos acabar com essa brincadeira em um piscar de olhos, certo?”
“Não seja impaciente”, respondeu Ades, esboçando um sorriso frio. “Você não pode me atacar, membro da segunda geração. Azrael está exausto, seus cavaleiros e o terceiro príncipe estão ainda piores. Não existem chances de vitória para vocês.”
Samael estreitou os olhos, sua voz fria ao retrucar: “Tem certeza? Existem membros da geração primeira ao seu lado. Posso sentir de longe. O que me impede de atacar seus aliados?”
Ades deu de ombros antes de voltar a sorrir.
“Certamente. Você é perceptiva, Samael, mas isso não é tão simples assim.”
Ades então fez um gesto sutil para a figura ao seu lado. O encapuzado estalou os dedos, e como se uma névoa se dissipasse, uma legião de soldados surgiu, materializando-se a partir da escuridão. Era evidente que sempre estiveram ali, ocultos pela magia do aliado de Ades.
“Sou o deus da guerra. Pensou mesmo que eu não estaria preparado para uma batalha?”
Enquanto a tensão aumentava, Eriel observava cada detalhe, sentindo o peso da situação crescer. Foi então que Samael demonstrou preocupação, seu olhar se voltou para Belial, que parecia incrédulo.
“Não é possível…”, murmurou Belial, a voz falhando. “Essa magia… Como?”
“Mãe?”, a voz de Alice soou rouca, compartilhada de choque. Eriel ficou confusa. Mãe? A pessoa responsável por ocultar os soldados era a mãe dos demônios?
“Lilith, diga ‘oi’ para seu marido e filhos. Vamos, não seja tímida”, provocou Ades, com um sorriso sarcástico.
Ao ouvir suas palavras, o encapuzado ao lado de Ades retirou o capuz, revelando sua aparência. Eriel prendeu a respiração.
Os olhos de Lilith eram de um vermelho escarlate, como sangue vivo, e seus cabelos castanhos escuros caíam em ondas que eram esculpidas à perfeição. Sua beleza era etérea, rivalizando com a de Samael, mas havia algo profundamente sedutor em sua postura. Seus olhos maliciosos brilhavam com uma intensidade que fazia qualquer um se sentir vulnerável.
O coração de Eriel disparou. Era como se Lilith exalasse uma presença irresistível, impossível de ignorar. Sua voz soou, cada palavra reverberando como uma melodia hipnotizante:
“Olá, queridos. Sentiram saudades?”
Era impossível não ficar preso à sua presença. Eriel sentiu um calor estranho em seu peito, como se algo a puxasse para aquela mulher. A beleza de Lilith não era apenas física; era uma armadilha cuidadosamente tecida para capturar e subjugar.
“Ades, o que está comemorando?”, a voz de Azrael soou como um trovão. Sua fúria era palpável, irradiando-se dela como uma tempestade prestes a explodir. Todos recuaram instintivamente, incapazes de enfrentar o atual rei demônio.
Ades demonstrou um sorriso egocêntrico que parecia transbordar de arrogância, enquanto mantinha os olhos fixos em Azrael.
“Simples, meu amigo. Estou coletando alguns espécimes que podem me ajudar na guerra que quero travar.”
“Você considera minha mãe um espécime?”
O sorriso de Ades permaneceu intacto, mas sua expressão assumiu um tom mais provocador. Ele manteve o foco em Azrael, ignorando os outros ao redor.
“Você era ainda mais valioso–”
“Então me troque por ela. Eu me juntarei ao seu lado, mas deixe-a.”
Ades riu, mas havia algo cruel em seu tom.
“Não é assim que funciona, Azrael. Existem indivíduos que não podem ser controlados. Você é um deles. Se você se juntar a mim por chantagem, isso só levaria à traição. Me diga, sinceramente. Você me seguiria no momento em que aceitasse a oferta? Ou melhor, você continua ao meu lado mesmo depois do que fiz?”
Azrael permanece em silêncio. Ele não tinha respostas. A visão de sua mãe sendo controlada era algo que ele simplesmente não podia aceitar.
“Eu vou te matar”, declarou ele, sua voz contendo uma determinação implacável.
No instante em que as palavras de Azrael ecoaram, o ambiente mudou. Movimentos involuntários tomaram conta de Eriel. Suas mãos seguiram em direção ao pescoço de Azrael, enquanto Naara e Zenith o cercaram. Nain preparou um ataque, e Alice ativou sua magia, pronta para lançar-la contra o irmão. Até mesmo Samael parecia prestes a agir a qualquer momento.
“Azrael, me desculpe, não consigo controlar meus movimentos!”, Eriel estava desesperada, lutando contra a força que a dominava.
“Está tudo bem”, a voz fria de Belial cortou o caos. “Lilith tem uma magia de sedução capaz de afetar até mesmo Lúcifer. Você não está fazendo nada de errado.”
A explicação de Belial apenas aumentou a gravidade da situação. Lilith não havia tolerado a ameaça de Azrael, e seu poder estava agitado sobre os aliados dele.
“Apenas duas pessoas na história resistiram aos efeitos da sedução de Lilith”, disse Samael, lutando para manter o controle de si mesma. “Belial e Azrael.”
Azrael estava livre da influência de sua mãe, mas todos ao seu redor estavam prontos para atacá-lo.
“Se você usar o poder dela para ferir Azrael, nem mesmo eu poderei salvá-la”, lembrou Samael em tom de advertências.
Ades moveu a mão e, em um instante, a restrição dos movimentos de todos cessou.
“Estou aqui hoje apenas para declarar guerra. Nada mais. Azrael, esteja preparado. Em nosso próximo encontro, seremos inimigos”, declarou Ades.
“Pode apostar que sim”, respondeu Azrael, seu olhar frio e penetrante.
Ades deu um passo à frente, como se quisesse enfatizar algo.
“Isso me lembra… Não tente fazer nada estúpido. Eu tenho a sua maior fraqueza.”
Azrael permaneceu imóvel, mas seu olhar revelou incerteza.
“Eu não tenho muitas, na verdade”, ele retrucou, em um tom desafiador.
Ades levantou novamente a mão direita e segurou o pescoço de uma de suas aliadas.
“Ajoelhe-se agora, ou ela morre”, tentou Ades.
Quando o capuz foi retirado, Eriel sentiu seu mundo vacilar. Diante dela estava uma figura que transcendia sua raça, uma mulher cuja presença irradiava autoridade e poder.
Julia, antiga líder da Facção Humana, mantinha uma postura firme, mesmo com o aperto de Ades em seu pescoço. Seus longos cabelos castanho-avermelhados brilhavam, e seus olhos azuis profundos tocavam a alma de quem os encarasse. Mas seu olhar, frio e apático, estava fixo em Eriel.
Azrael não hesitou. Ele se ajoelhou diante de todos, ignorando os olhares surpresos de seus aliados. Não havia medo ou relutância em seu rosto, apenas uma determinação feroz e absoluta.
“Eriel, mantenha o controle!”, a voz desesperada de Zoe ecoou em sua mente.
A aura de Eriel começou a subir a níveis perigosos. Seu sangue fervia, e seus poderes estavam prestes a sair do controle. Ela sentiu uma fúria crescente, consumiu sua sanidade, mas algo a impediu de sucumbir completamente.
Azrael avançou rapidamente, mas, em vez de atacar Ades, seu movimento foi direcionado a Eriel. Seu golpe foi certo. Eriel poderia facilmente desviar, mas com os últimos vestígios de sanidade, ela permitiu que ele acertasse.
Enquanto sua consciência desaparecia, Eriel murmurou, quase sem voz:
“Obrigado, Azrael.”
Ao cair, toda a raiva e o caos dentro dela se dissiparam, substituídos por um silêncio estranho. Antes que tudo escurecesse, memórias antigas vieram à tona, inundando seus pensamentos como uma tempestade de lembranças.
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