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    Aquafira

    Na imponente fortaleza dos dragões, cujas muralhas pareciam esculpidas pela própria vontade do destino para manter os prisioneiros cativos, encontrei-me imersa em um abismo de desespero. Mesmo dotada de poderes mágicos, encarei uma barreira intransponível: as muralhas maciças, adornadas com antigos selos, permaneciam inabaláveis diante de meus esforços mais ardentes.

    Cada centímetro daquele recinto exalava uma aura de impenetrabilidade, como se as próprias fundações estivessem impregnadas de uma magia ancestral, resistente até mesmo aos meus mais formidáveis poderes. Minhas habilidades, por mais vastas que fossem, mostravam-se impotentes diante da solidez das muralhas.

    Além das grades de minha cela, envolvidas por uma penumbra perene, reinava um silêncio que ecoava a resignação dos prisioneiros. A conexão com o mundo exterior tornara-se uma miragem distante, enquanto as ameaçadoras muralhas devoravam qualquer esperança de comunicação com o mundo lá fora. Era como se estivéssemos afundados em um abismo sem fim, onde a luz do sol jamais penetraria novamente.

    Os guardas, em suas armaduras imponentes e olhares impiedosos, patrulhavam os corredores como sentinelas sombrias, prontos para aniquilar qualquer tentativa de fuga com uma eficiência gélida e implacável.

    Assim, entre sombras que dançavam ao redor das grades e a sensação sufocante de estar aprisionada, percebi que cada segundo naquela fortaleza era uma eternidade, um testemunho sombrio de minha própria impotência diante dos dragões.

    Qual pecado hediondo eu cometera para merecer tal destino? Os habitantes daquela fortaleza eram, em sua maioria, os mais cruéis e impiedosos, indivíduos que não mereciam lugar na sociedade. Contudo, o que uma jovem poderia ter feito para ser condenada àquele tormento?

    Meu crime fora punir um nobre abusador de poder, sem saber que ele era o senhor daquela fortaleza. Ao confrontá-lo, fui tratada como uma criminosa, quando, na verdade, só buscava proteger os mais fracos. Tudo o que fiz fora tentar salvar alguém, mas me vi transformada em uma foragida.

    “Bem, a vida nesta fortaleza não é tão terrível…”, murmurei, só para minha própria audição. No entanto, a voz solitária ecoou no ambiente sombrio e frio. Com o passar do tempo, acostumei-me àquela existência, perdendo gradualmente a sanidade enquanto as lembranças do sol no rosto e da liberdade se desvaneciam.

    Foi então que ouvi movimentos do lado de fora de minha cela.

    “Vamos, eu disse que estava só brincando. Como minha mãe pode ser tão cruel?”, reclamava a voz de um garoto, evidenciando sua irritação. “Tenho apenas alguns dias restantes, podem me levar de volta agora?”, prosseguia ele, em tom de súplica.

    A porta de minha cela se abriu, revelando dois guardas que jogaram o jovem aos meus pés. Em silêncio, eles o deixaram ali antes de se retirarem. O garoto se ergueu, dirigindo-me um olhar curioso.

    “Desculpe, quem é você?”, perguntou ele, sua voz calma denotando uma certa inocência em meio à escuridão que nos cercava.

    “Aquafira”, respondi, notando um sorriso se formar em seus lábios.

    “Aquafira, é?”, ele repetiu, passando uma mão pelos cabelos negros. Em seguida, apresentou-se com um sorriso alegre. “Sou Legion. Um prazer conhecê-la.”

    “Você não deveria estar tão tranquilo…”, comentei, observando que seu sorriso não se desvanecia, o que me irritava ligeiramente.

    Legion começou a explorar o ambiente como se procurasse algo específico. Deitou-se no chão e soltou um suspiro pesado.

    “Maldição… Só tenho uma semana para conquistar Aion, e acabo nesta prisão sombria”, lamentou, como se estivesse brincando. “Tudo por ter prometido me comportar”, acrescentou, antes de me lançar um olhar curioso. “Como você acabou aqui? Posso estar enganado, mas você não parece uma criminosa cruel.”

    Embora ele falasse assim, também eu notava algo peculiar em Legion. Suas roupas, apesar de desgastadas, tinham ares nobres, e sua atitude e maneirismos denotavam uma falta de preocupação com a situação em que nos encontrávamos.

    “Bem, o senhor da fortaleza estava castigando uma criança que sujou suas roupas sem querer. Eu intervi e acabei aqui”, expliquei, vendo surpresa em seus olhos, como se não esperasse por minhas palavras.

    “E como você enfrentou os guardas?”, indagou ele.

    “Aqueles frágeis? Despachei todos e segui em direção ao maldito nobre… Eram simples”, respondi, relembrando o evento. “Mas não contava com a pedra que anula meus poderes”, acrescentei, em um suspiro desanimado

    Ele me encarou com surpresa, ponderando sobre minhas palavras. “Você realmente derrotou os guardas daquele sujeito?”, questionou ele, mostrando-se cético em relação à minha afirmação. Seu olhar denotava uma mistura de incredulidade e desconfiança.

    Não era minha intenção exibir superioridade ou alardear minha força. A verdade era que os guardas eram simplesmente fracos demais para representarem qualquer desafio real.

    “Sim, foi fácil”, respondi sucintamente. Antes que eu pudesse reagir, ele avançou em minha direção, um golpe rápido que me fez recuar por instinto. “O quê?!”, exclamei enquanto sentia a corrente de ar produzida pelo seu punho roçar meu rosto.

    Consegui desviar a tempo, mas percebi que qualquer esperança de contra-ataque era inútil quando seu golpe atravessou a parede com uma facilidade surpreendente, regenerando-a no momento em que ele retirou a mão. Poderia ter sido fatal.

    “Oh? Impressionante”, ele disse, sem qualquer traço de arrogância em sua voz, verdadeiramente impressionado. “Ataquei com minha velocidade máxima.”

    “Você está tentando me matar?”, questionei, minha irritação evidente em cada palavra.

    “É uma pena, mas já tenho uma noiva”, respondeu Legion, ignorando minha indignação. “Já decidi. Você será minha subordinada direta.”

    Ele se aproximou, pousando a mão em meus ombros enquanto exibia um sorriso amigável.

    “Venha comigo. Vou te transformar em uma mulher ainda mais forte. O que me diz?”, sua pergunta me arrancou um sorriso, embora ele parecesse não compreender completamente a gravidade da situação.

    “Ir com você? Para onde? Se ainda não percebeu, não há como sair desta fortaleza.”

    Além das muralhas impenetráveis, a fortaleza estava localizada em uma região remota, cercada por uma paisagem de neve interminável. Tentar escapar com os selos de restrição significaria a morte certa em questão de dias.

    “Certamente não há”, ele murmurou desanimado. “Maldição, mãe. Eu estava só brincando”, acrescentou sarcasticamente. “Aion deve estar preocupada… Ela pode parecer fria, mas é uma pessoa legal.”

    Foi então que algo pareceu clicar em sua mente.

    “Bem, se eu disser que temos um jeito de sair daqui, você vai me seguir?”, ele propôs, e minha resposta foi um firme “sim”. Não havia motivos para recusar, e eu disse isso sem hesitação. “Se conseguirmos sair daqui, vou seguir você pelo resto da minha vida.”

    Ter uma companhia para conversar era algo agradável; afinal, poderia me distrair do tédio que consumia meus dias na fortaleza.

    “Então, tenho duas condições. Primeiro, você deve ser leal e nunca me trair”, afirmou Legion, suas palavras carregando um peso oculto, uma verdade subjacente que eu mal conseguia discernir. “E segundo…”, ele fez uma pausa, seu olhar severo enquanto seu tom se tornava mais austero. “Como você é uma mulher, vai me ajudar a conquistar Aion… Tenho apenas uma semana.”

    Fiquei momentaneamente sem palavras diante de sua exigência, mas decidi concordar. “Uma pergunta. Se você conseguir usar seu poder, seria possível escapar com facilidade?”, indaguei.

    “Não quero criar expectativas, mas com certeza, sou mais forte que você…”, ele respondeu, revelando uma confiança tranquila em sua própria força.

    Não era novidade para mim ser a mais forte onde quer que fosse. Lutar, sobreviver, arriscar-se – essas eram as definições de minha vida. Mesmo os oponentes mais poderosos que enfrentara não chegavam aos meus calcanhares.

    “Contudo, no momento em que meu poder retornar e minha sanidade for restabelecida… Digamos que minha personalidade não é muito agradável…”, acrescentei, relutante em admitir, mas a verdade era que o tempo que passei presa ali me enfraquecera mentalmente. A solidão havia corroído minha mente, e a amizade com o primeiro a aparecer era um alívio bem-vindo.

    “Ah, não se preocupe. Não me importo se você for uma pessoa incompreensível. Na verdade, até prefiro assim. Quero os mais fortes ao meu lado, e só isso. Sua lealdade já é um presente”, respondeu Legion, suas palavras soando sinceras.

    “Você terá minha lealdade”, declarei sem hesitação.

    “Bom… Então vamos sair daqui”, ele disse, aproximando-se da porta de aço.

    Seu primeiro soco fez a porta tremer, mas não foi o bastante para derrubá-la. O segundo golpe foi ainda mais poderoso, e o terceiro teve o dobro da força do segundo. Em apenas sete golpes, a porta cedeu, o som do impacto ecoando pelo ambiente.

    “Vamos”, ele disse com seriedade. Ao sairmos da cela, senti a mana retornando sutilmente ao meu corpo, ainda não o suficiente para usar plenamente meus poderes, mas o bastante para fortalecer meu corpo.

    Enquanto fugíamos, vários guardas surgiram, e tivemos que lutar para abrir caminho em direção à saída. O labirinto de corredores era confuso, mas Legion parecia conhecer o lugar como a palma de sua mão.

    Não demorou muito até chegarmos à sala principal, onde uma variedade de guardas estava preparada para nos deter.

    “Apenas isso?”, comentei sarcasticamente.

    “Realmente decepcionante”, concordou Legion.

    Senti meu sangue ferver, meu espírito de luta reacendendo. Quanto tempo fazia desde que me vi em uma situação desafiadora? Como uma louca, estava disposta a morrer, pois a batalha se tornara uma diversão para mim.

    Olhei para Legion com admiração, percebendo que ele não recuaria. Se ele pretendia se tornar meu mestre, teria que ser louco o bastante para desfrutar de cada luta ao meu lado.

    “Aqua, quando sairmos daqui, quero lutar com você, tudo bem?”, sua voz não vacilava, como se estivesse ansioso pela batalha que ainda não havia começado.

    “Tudo bem. Também estou curiosa sobre suas habilidades”, concordei.

    Até então, havíamos confiado apenas em nossa força bruta e magia rudimentar, o que tornava as lutas desafiadoras. No entanto, superamos todos os obstáculos até então com maestria. Se conseguíssemos sair, teria que testar pessoalmente o quão forte esse homem era.

    Foi então que a imensa porta atrás dos guardas se abriu, revelando a presença de uma mulher. Os guardas abriram passagem para ela, permitindo que ela se aproximasse sem impedimentos.

    “Você sabe? Quando ouvi que sua mãe o enviou até aqui por um motivo tão trivial, pensei em deixá-lo aqui para aprender uma lição”, disse ela, seus longos cabelos brancos refletindo a luz do sol enquanto seus trajes nobres indicavam sua posição elevada.

    Legion a observava com um sorriso, parecendo encantado com sua beleza.

    “Então você se apaixonou pelos meus atos nobres?”, Legion retrucou sarcasticamente.

    “Não posso dizer que me apaixonei, mas estou genuinamente tocada por suas ações”, ela respondeu, aproximando-se e se ajoelhando diante dele, surpreendendo até mesmo os guardas com sua reverência. “Contudo, você ainda tem uma semana, Vossa Majestade Imperial.”

    Todos ficaram estupefatos ao ouvir a nobre não apenas se ajoelhar, mas também chamá-lo por seu título, o que levou todos a instintivamente se ajoelharem diante da presença do jovem de cabelos negros.

    “Aion, esta é Aqua. Ela estará conosco. Pensei em torná-la minha subordinada.”

    “Agindo como um idiota novamente?”, ela respondeu com um suspiro. “Você ao menos perguntou o que ela achava, dessa vez?”

    Suas palavras me arrancaram uma risada. Embora eu não entendesse completamente a situação, era evidente que me envolvera em uma aventura empolgante.


    Naara

    Enquanto relaxava na banheira de água quente, aconchegada pelo calor reconfortante, meus olhos foram atraídos pelo sorriso radiante de Aquafira. Seus lábios curvados para cima emitiam uma aura de serenidade, enquanto ela entoava uma melodia suave e desconhecida, preenchendo o espaço com uma sensação de tranquilidade.

    “Esse seu sorriso é intrigante”, comentei em tom sarcástico, captando a atenção de Aquafira, que me encarou com uma expressão de surpresa.

    “Estou sorrindo? Bem… estava apenas relembrando o dia em que conheci meu senhor”, respondeu ela, suas palavras despertando uma onda de nostalgia em mim. Recordações do dia em que fui liberta das minhas algemas por meu amado mestre inundaram minha mente.

    E agora, ali estava eu, incapaz de permanecer ao seu lado. Os dias se arrastavam dolorosamente, revivendo cada momento do passado, e me sentia tão impotente quanto no dia em que ele foi aprisionado pelos deuses.

    “Naara”, a voz de uma garota invadiu o ambiente, interrompendo meus pensamentos. Seus olhos se fixaram em mim, enquanto ela hesitava em revelar sua presença.

    “Oh? Chloe… Gostaria de se juntar a nós no banho?”, convidei, tentando soar amigável.

    “Conosco?”, Chloe murmurou, claramente confusa.

    “Sim, Aquafira está aqui… embora você não possa vê-la de qualquer forma.”

    No entanto, Chloe balançou a cabeça em negação. “Naara, Sua Majestade Imperial está aqui para vê-la”, informou timidamente.

    “Como assim? Lembro-me de ter recusado o seu pedido.”

    “Ela veio sem guardas, parecendo uma visita não oficial.”

    Então, Eriel fugiu do palácio… algo que Azrael faria…

    “Não há o que fazer”, murmurei enquanto me levantava. “Vamos, vou conversar com Eriel.”

    “Eh? Você vai assim?”

    “Não vejo problemas. Só existem mulheres em minha casa, e não é como se elas não tivessem visto meu corpo”, brinquei.

    Mas era a verdade. Não havia empregados do sexo masculino, e apenas mulheres me serviam. Portanto, não havia motivo para me envergonhar de mostrar meu corpo.

    “Até mesmo quando Azrael me visitava na mesma situação, eu o recebia como estava”, acrescentei, relembrando seu rosto inexpressivo ao me ver.

    “Você não pode!”, exclamou Chloe, enquanto Aquafira sorria.

    “Por favor, vista uma roupa”, pediu Chloe novamente.

    Após me preparar adequadamente, dirigi-me ao quarto preparado por Chloe. Embora não estivesse particularmente ansiosa para encontrar Eriel, decidi ao menos dar-lhe uma chance e ouvir o que ela tinha a dizer.

    Quando finalmente entrei no quarto, senti a presença de Eriel perto da janela. Ela observava o mundo exterior com uma expressão estranha, como se algo a estivesse perturbando.

    “Algum problema?”, perguntei, notando a mudança em sua expressão enquanto ela se dirigia ao seu assento.

    “Estou apenas com uma sensação estranha”, respondeu ela, suspirando desanimada.

    Quando todo o reino virou de cabeça para baixo com a chegada de outras raças, fui nomeada uma das rainhas pelo conselho e pelos nobres. Embora tenha recebido recomendações diretas da Imperatriz, Alice e de Belial, neguei fortemente o título, pois significaria mais trabalho e poucas lutas.

    Pensei que tudo correria bem, e de fato correu. Em meu lugar, surgiu uma nova rainha dos vampiros, que agora governa sua raça e os outros povos acolhidos no império.

    O trabalho aumentou, mas as batalhas pareciam não chegar. Não consigo explicar o quão entediada estou com a vida monótona que levo. Mesmo que pensasse em iniciar uma luta, tinha meus próprios deveres. Muitas vezes me pego pensando por que recusei acompanhar Azrael, pois ao seu lado seria o melhor lugar para alguém como eu.

    Foi quando Chloe entrou na sala. Ela usava um magnífico vestido florido enquanto servia o chá, sentando-se ao meu lado em seguida. Observei-a encantada com seu rápido crescimento. A criança sempre estava sorrindo, mesmo nos momentos difíceis. Durante o tempo em que convivi com ela, experimentei um pouco de felicidade. Mesmo que as batalhas não acontecessem, eu poderia simplesmente viver em paz ao lado daquela criança.

    Enquanto estava envolvida em meus pensamentos, fui surpreendida por finos braços que me envolveram em um doce abraço, cortesia de Chloe, que me observava com um sorriso enquanto ouvia as palavras de Eriel.

    “Posso dizer que vocês se tornaram uma bela família”, expressou Eriel, suas palavras destituídas de sarcasmo, emanando uma genuína felicidade pela nossa relação.

    “Vamos direto ao assunto. Imagino que tenha deixado a segurança do castelo e os guardas por um motivo importante”, questionei, preparada para suas revelações, mas sua resposta me surpreendeu.

    “Na verdade, queria apenas observar como vocês estavam. Não recebi notícias suas nas últimas semanas, e você se mantém distante, nem mesmo comparecendo às reuniões.”

    “Majestade Imperial, peço que seja paciente com minha mãe adotiva. Sei que ela pode parecer uma mulher incrível e forte, mas ela realmente é frágil”, interveio Chloe, seus olhos brilhando com admiração ao me observar.

    Não pude deixar de sorrir ao ser chamada de frágil, embora soubesse que havia verdade em suas palavras. Com o desaparecimento de Azrael, me senti perdida em um mundo que nunca foi meu.

    “Se fosse no passado, certamente preferiria ser aprisionada e aguardar o resgate por ele…”, murmurei, desanimada. “Mas, não tenho mais essa intenção, já que existem pessoas para proteger.”

    Mesmo com meu amado mestre distante, tinha certeza de que ele pensava em sua família e amigos todos os dias.

    “Não é como se eu fosse aprisioná-la”, assegurou Eriel, enquanto apreciava seu chá. “Você é importante para o Império e todas as pessoas que vivem sob seu domínio.”

    Diferente do passado, agora existiam pessoas para supervisionar os movimentos dos nobres, e novos guardas de diferentes raças cuidavam de todas as regiões. Meu trabalho como cavaleira ou até mesmo como nobre se tornara monótono, quase não havia problemas que necessitassem de minha ajuda.

    “Posso perguntar o motivo de sua visita, então?”

    Ao constatar que Eriel não estava a pedido dos Anciões, deduzi que sua visita era particular. Quando recusei seu pedido, sua urgência em buscar algo a levou até minha casa.

    Eriel permaneceu em silêncio por um momento, antes de finalmente revelar suas intenções.

    “Noir…”, sua voz baixa trouxe à tona lembranças da jovem garota que reside em sua espada. “Como você era a mais próxima de Azrael, imaginei que pudesse obter algumas respostas.”

    Embora eu não fosse a pessoa mais próxima do meu mestre, compreendi o que ela queria dizer, e já tinha uma resposta para sua pergunta ainda não feita.

    “Se você acha que Noir vai se abrir comigo e revelar sua forma, está enganada. Se não for Azrael, ela nunca se abrirá”, afirmei com convicção. “No entanto, acredito que exista uma pessoa que poderia facilmente fazê-la se revelar.”

    Quando estava com Azrael no início de nossa jornada, Noir sempre mencionava essa pessoa com uma expressão de pesar nos olhos, como se recordasse momentos felizes do passado.

    “Quem seria essa pessoa?”, perguntou Eriel, curiosa.

    “A antiga noiva de Azrael e sua versão passada”, sugeri. “Não podemos ressuscitá-la, mas podemos conversar com ela.”

    “Você pode estar certa… Talvez eu devesse fazer uma visita à minha antiga versão”, ponderou Eriel, refletindo sobre a possibilidade.

    “Obrigada, Naara. Não havia considerado conversar com ela…”

    Fomos interrompidas pelo som de alguém batendo à porta. Com nossa permissão, Charlotte apareceu, claramente fora de fôlego.

    “Peço desculpas por interromper”, disse ela, tentando recuperar o fôlego.

    Eriel aguardou pacientemente até que Charlotte se recuperasse o suficiente para falar. Sabendo que Charlotte enfrentara uma longa viagem até minha casa, imaginei quanto de magia ela usara.

    Após se recompor, as palavras de Charlotte trouxeram um brilho de esperança aos olhos de Eriel.

    “Samael retornou ao castelo.”

    “Isso é uma ótima notícia, vou encontrá-la imediatamente”, anunciou Eriel, mas logo seu entusiasmo foi substituído por preocupação ao ouvir o resto da história.

    “Na verdade, Samael retornou, mas estava gravemente ferida”, explicou Charlotte. “Parece que Samael estava no reino de Belzebu. O reino foi atacado pela aliança e Samael teve uma luta contra Azrael.”

    Charlotte detalhou como Samael lutou contra Azrael, que estava tentando conquistar um artefato no reino de Belzebu. A batalha foi intensa, e Samael saiu derrotada, forçando Belzebu a fugir e buscar refúgio no mundo demoníaco com seu povo.

    “Azrael venceu Samael? Como isso é possível?”, perguntei, perplexa. Mesmo que Samael estivesse muito mais fraca do que em seu auge, ela ainda era um Caído, e Azrael não deveria ser capaz de derrotar um Caído no estado em que estava naquele momento. Algo definitivamente aconteceu.

    “E como está Samael?”, indagou Eriel, buscando por respostas.

    “Ela está em estado grave. Foi levada aos melhores médicos, mas não houve melhora em seu estado”, Charlotte relatou, pesarosa. “Por isso vim procurá-la. Belzebu deseja um encontro formal com a imperatriz. Poderia ouvi-la?”

    Parecia que o castelo estava em caos com a chegada repentina de Belzebu e seu povo, e Eriel era a única que poderia resolver tudo.

    “Charlotte… Poderia voltar para o palácio primeiro? Estarei indo logo depois”, decidiu Eriel, como se tivesse notado algo.

    Foi então que percebi uma presença sutil que logo desapareceu. Era fraca e quase indetectável, mas suficiente para que Eriel notasse. Sabendo o que ela estava planejando, decidi agir também.

    “Peço sua permissão para resolver parte do problema, enquanto você confronta o outro”, propus, notando a surpresa de Eriel.

    “Então você notou…”, ela comentou, um sorriso desanimado brincando em seus lábios. “Não, na verdade, seria estranho se não tivesse notado.”

    “Não tenho a intenção de confrontar… Bom, você me entendeu. Resolva seus problemas e vá à sala do trono o mais rápido possível”, declarei, me preparando para sair com Charlotte e Chloe.

    “Obrigado… Eu lhe dou a autoridade para agir em meu lugar enquanto eu resolvo esse ‘problema’…”, consentiu Eriel.

    Com sua permissão, deixamos a mansão enquanto Eriel esperava um tempo antes de seguir o mesmo caminho. Nosso destino era o mesmo, mas Eriel tinha que se dirigir a um quarto específico.

    Eu poderia muito bem segui-la, pois queria confrontar aquele indivíduo, mas ainda não era o momento.

    ***

    Eriel 

    Após deixar a casa de Naara, me dirigi ao castelo, ocultando minha aura para evitar a detecção dos cavaleiros. Não demorou muito para chegar ao meu destino: um quarto escuro.

    Ao adentrar, deparei-me com uma enorme cama onde repousava o corpo desacordado de Mana, irmã de Azrael. O quarto, embora escuro, parecia normal, sem a presença de mais ninguém além de nós. Duas cadeiras vazias estavam posicionadas lado a lado, as mesmas que Azrael costumava usar ao conversar com Mana ali.

    Escolhi a segunda cadeira, um pouco afastada da cama, e me sentei. Com um leve suspiro, recostei minha cabeça na primeira cadeira e pude sentir uma presença invisível ao meu lado. Seus olhos vermelhos me observavam sem expressão, enquanto seus cabelos brancos tocavam meu rosto.

    “Eu poderia te matar facilmente…”, ele disse, sua voz fria.

    “Sim, eu sei”, respondi, recusando-me a mover minha cabeça de seu ombro. Ele não tentou me afastar, como se não se importasse. Ao observar Mana, mais um suspiro escapou de mim.

    Notei os ferimentos em seu corpo, as marcas da luta que teve com sua mestra eram evidentes e o cheiro de sangue pairava no ar. Parecia que ele havia sofrido um ferimento severo.

    “Você deveria entender como me sinto… Você jurou seu amor e disse que governaríamos juntos, mas aqui estou eu, sozinha, após meu amado tentar me matar”, desabafei, tentando demonstrar irritação. “Não apenas isso, mas descubro que meu amado tem dois filhos que eu não conhecia…”

    “Eu tinha dois filhos…”, disse Azrael, sua voz carregada de tristeza.

    “Você tem… O garoto continua vivo e sendo tratado no castelo. Parece estar em algum tipo de coma.”

    Apesar das minhas palavras, o olhar sombrio de Azrael permanecia focado em Mana.

    “Eu te traí, tentei te matar e empurrei todo o trabalho para você… Achei que nosso encontro seria no campo de batalha, onde você tentaria me matar.”

    “Sim, eu poderia dizer que estou muito irritada, mas não é a verdade. Certamente você tentou me matar”, disse, colocando a mão em seu queixo e forçando-o a olhar em meu rosto. “Mas não consigo sentir ódio… Quando tudo isso acabar, vamos apenas sorrir do que aconteceu enquanto aproveitamos o tempo juntos… Mas não me faça esperar muito, afinal, sou apenas humana.”

    Levantei-me, preparando-me para sair. Havia muitas coisas que gostaria de dizer, mas senti que não era o momento certo. Azrael acabara de lutar com sua mestra e, neste momento, ele deve estar emocionalmente abalado, o que o levou a buscar conforto com Mana, mesmo correndo riscos.

    “Certifique-se de explicar bem para sua família seus motivos. Alice está realmente decepcionada”, disse, saindo do quarto sem olhar para trás. “Você tem mais dez minutos. Mais do que isso, e todos vão notar sua presença.”

    “Tudo bem, é mais que o suficiente”, respondeu em tom firme.

    Saí do quarto sem olhar para trás, pois sabia que se o fizesse, não conseguiria deixá-lo partir. Se ouvisse sua voz mais uma vez, ou visse seu rosto, não conseguiria entender meus próprios pensamentos, mas sabia que não haveria volta.

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