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    — Faça algo, idiota.

    Selina deu um pequeno empurrão no ombro de Isak, ainda caído no chão. Ela amarrou o arco na cintura, pegando um pano no cinto logo em seguida. Caminhando até Drogmose, tentou dar um jeito de amarrar o ombro do agente, mas sozinha era difícil. 

    — Me ajudem!

    A conjuradora, caída frente ao agente ensanguentado, esticou o pano que Selina segurava, dando uma volta até o tórax oposto ao do braço arrancado. Aplicando a pressão certa, elas tentaram estancar o sangramento. Depois de lidarem com o braço amputado, tentaram fazer curativos no estômago.

    — Ei… — chamou Theo. — Você tá bem?

    Mesmo sonolenta, Aidna se manteve acordada. Theo podia jurar que ela estava perdendo calorias pela falta de energia. A druida se deitou nos braços dele, aproveitando que o rapaz estava demonstrando afeto.

    — Honestamente? Não. Sacrifiquei quase setenta e cinco por cento da minha energia pra isso. Culpa de vocês, moribundos fracos.

    — Foi mal aí. — Se desculpou balançando a cabeça, trazendo um sorriso sarcástico para seu rosto.

    — Você não, gato. Você é poderoso, só é ignorante demais.

    — Ei, olhem! — Um agente exclamou, vasculhando os corpos sem vida dos tubarões.

    Ele cravou o pé na boca aberta de um tubarão, entre os dentes de diamante, tentou puxar para fora da mandíbula. Depois de muito esforço, conduzindo a mana por seus braços, fortalecendo os músculos e aprimorando a força física, o agente conseguiu quebrar uma lasca do diamante.

    Saltou para cima e comemorou, estendendo o braço alto para todos verem.

    — É diamante puro! Daqueles que valem muitão, hahaha! 

    Um agente suspirou. Um sorriso largo se alastrou por sua face.

    — Pelo menos algo de bom nesse caos — murmurou feliz.

    — Primatas idiotas. Sempre guiados pelo dinheiro.

    Theo franziu o cenho, questionando as atitudes de Aidna apenas com o olhar.

    — Você está sendo um pouco racista desde que usou o feitiço…

    — Perdão. É tipo insônia, não consigo pensar. Apenas tô falando da boca pra fora. Me dá uma noite de sono, vai — pediu Aidna, se aconchegando no colo de Theo. — Acho que doze horas é o suficiente para eu me recuperar.

    A druida suspirou profundamente, enchendo os pulmões de ar e expelindo. Limpando a garganta, retomou a falar:

    — Sabe, eu odeio demônios.

    — Demônios? Do que cê tá falando? — Ele só não gargalhou pois queria manter entre os dois.

    — É, eles existem. Lutei contra um há alguns séculos, não lembro mais. É muito tempo. Ele almejava o trono de um rei, porém, as sombras deste rei jamais permitiram. O império caótico ganhou esse nome graças ao demônio. Ele era tedioso, no entanto, sua aura era peculiar…

    Aidna se levantou, um pouco mais desperta. Ela se sentou na frente de Theo, olhando nos olhos cor âmbar do rapaz. Pareciam belos, puros como o sol, ou melhor, como a lua. Mesmo que distantes, se prestasse muita atenção, era notório todos os sentimentos deles. O arrependimento matando, a ansiedade atacando, o medo dominando…

    Estava se sentindo um verdadeiro peso. Bom, não tinha como contrariar esse sentimento. Ele era inútil naquela missão. Assim como dito antes, se os tubarões são equivalentes ao nível sessenta, Theo é apenas um nível vinte. Somente por um ponto de pressão foi o motivo de matar um dos animais. Se não fosse por isso, no primeiro ataque… Seria pior que o destino de Jin.

    — Diferente dos humanos, que tem uma aura vermelha e fraca, às vezes com personalidade. A aura dos demônios é… podre. Suja, corrompida. Algo negro e vazio.

    Theo se lembrou da presença antiga de Liam. O imperador Kaiser, de Egon, costumava dizer que Liam era perfeito justamente por ter uma aura totalmente podre. Por isso, não pensaria em justificativas para matar.

    — A sua aura é uma bela pintura. Ah, sim. A melhor das pinturas, tingida por um véu de ouro, tomando a forma que deseja. Isso foi o que me atraiu, a princípio. Entretanto, bebê, quando o desespero bateu na sua porta, essa pintura desapareceu. Deu lugar a uma mancha podre e perturbadora.

    — Onde você tá querendo chegar? — Afastou o rosto, um pouco desconfortado.

    — Se você abrir a porta certa… — Aidna ergueu uma sobrancelha para cima, enquanto sorriu para Theo. — Vai dar lugar a um demônio. O único demônio bonito. Agora vou dormir. Preciso das minhas doze horas.

    — E quanto é essas doze horas para os humanos?

    — Sei lá. Algumas décadas talvez… Me protege até lá?

    — Virei teu guarda? Na primeira oportunidade eu te largo.

    Aidna gargalhou baixo, já que não tinha mais forças para rir alto.

    — Eu também faria o mesmo…

    Jack se aproximou das águas do mar, tais que, agora estavam cobertas por um véu verde luminescente. Pôde ver que mesmo que servisse como barreira, era somente isso que o feitiço tinha a oferecer. Os tubarões ainda estavam vivos, nadando debaixo do véu e esperando a melhor oportunidade para atacar novamente.

    — Acho que vai manter um pouco — sussurrou Jack, massageando o ombro esquerdo.

    — Jovem mestre… — Bastien se aproximou, guardando a espada na bainha. — Temos que ir até o círculo principal. Acreditamos que será mais seguro.

    Theo balançou a cabeça, concordando com cuidado, ainda estava desconfiado pelo rastro de energia azul.

    Jack repousou a mão no ombro de Theo, aplicando uma certa pressão. Trocaram olhares, o rapaz ainda estava tenso e infeliz, o coração batia forte. Não conseguia se manter distante dos pensamentos ruins, ele se perdeu nas pupilas gélidas e vibrantes do agente. Mal conseguia manter as lágrimas de frustração. 

    Engoliu em seco como última alternativa.

    — Eu carrego ela — sugeriu Jack. — Tira um tempo para si.

    Theo, lentamente, levantou Aidna e a entregou para Jack deitando-na em seus braços, o agente começou a caminhar até o círculo central. Os outros dois agentes o acompanharam. Avançando à frente de Bastien e Jack, o rapaz tentou se distanciar demonstrando sua frustração em seus punhos cerrados. 

    — Deve estar traumatizado… Bom, eu também não esperava esse rumo. — Jack diminuiu o tom de voz para que Theo não o escutasse.

    — Não é isso.

    Os olhos de Bastien estavam caídos, como um olhar de peixe morto.

    — Ele está frustrado, conheço o sentimento. Enfrentar bestas superiores a si, mesmo que já tenha presenciado algo pior, é um inferno. Mesmo tubarões como estes são demônios para os perturbados.

    — Acha que ele já viu pior?

    — Com toda certeza. Não vê em seus olhos? Ele pode falar com todos, mas se isola na primeira oportunidade. Os olhos que brilham como uma joia de âmbar, produzem esse brilho para esconder o vazio. Ele é uma pessoa forte em uma mente fraca.

    — Ou uma mente forte em uma pessoa fraca…

    Bastien fechou os olhos e suspirou, agoniado com algo.

    — Cara, que porra. Nós deveríamos entrar, dominar, matar e sair. Agora? Não sabemos sequer em que parte do mundo estamos. Odeio missões que saem do trilho.

    — Todos odiamos, amigo. 

    — Temos que sair daqui — disse Selina, se aproximando. — A presença do Titã Moris desapareceu há algum tempo, mas, eu consegui rastrear a última posição.

    Jack revirou para trás procurando por Selina. Ela estava coberta pelo manto da noite — uma das benção de Alunne.

    — De onde veio esse manto negro? — perguntou Bastien. Posteriormente, o manto da noite foi se dissipando no ar, deixando apenas rastros pretos.

    — Benção de Alunne. Consegui sentir a presença dele muito longe daqui, provavelmente até a cidade de Zephyr está mais próxima. Porém, aquela saída para o mar ao norte não faz sentido…

    — Por quê? — O agente que catava os diamantes dos tubarões se juntou à reunião. Já que estava por perto, não se conteve.

    — Estávamos no centro do continente. Como caralhos tem um mar ao norte? É mais fácil ter mar para todas as direções do que ao norte. Ainda teria todo o território de Hardian e Zethian pela frente — retrucou Selina.

    — Então nós…

    Jack foi interrompido por um gesto peculiar de Selina. A seguidora de Alunne desviou rapidamente os olhos para o círculo central, onde Theo estava parado olhando para o mar de boca levemente aberta e olhos estreitados, Serach franziu o cenho em dúvida.

    — Theo?

    Ele observava atentamente uma abertura no feitiço de Aidna. 

    Um buraco, elevando a mana da druida para cima enquanto continuava prendendo os animais abaixo do nível do mar. Theo imaginava como uma lâmina rasgando constantemente o véu de energia posto no mar. Estava perdido na análise sobre aquilo, ficou nesse estado por muito tempo. Quando se deu por conta, todos os agentes já estavam atrás dele.

    Serach se aproximou, acompanhando a tensão do jovem de perto.

    — O que há de errado? — perguntou Serach.

    — Não consegue ver? — Theo se manteve fixo ao buraco no véu.

    — O quê? Tem algo além da camada de energia da druida?

    — Tem um buraco no véu de energia…

    Selina distanciou a cabeça do mar. Pegando no braço de Theo, o puxou para trás.

    — Temos que sair daqui. Agora…

    Com uma presença que vazou pela abertura todos paralisaram, inclusive Selina. 

    Eles não sabiam como reagir, seus corpos não tinham noção de espaço, não conseguiam se mover. Só tinham a vontade extremamente absoluta de ficarem parados sem mover um músculo sequer.

    Os olhos tensos, distantes, fracos e quase sem brilho de Selina e Theo acompanharam as águas do mar sendo jogadas para cima. Algo tinha se lançado para cima rapidamente pelo lugar em que Theo enxergava a falha no véu.

    “Era dele que eu estava sentindo todo aquele medo.” afirmou Theo, espantado com um mero homem.

    Com roupas largas e cor bege azulado, flutuava cinco metros acima de Theo. Seus trajes eram tão largos que aparentava ter mais de dez roupas por debaixo. O homem usava um chapéu pontudo, como os das bruxas, tendo a mesma cor de suas roupas. Seu rosto, porém, estava livre de verrugas ou de barbas longas, mas seus cabelos ressecados e sem cor não viam uma tesoura há… não dá para se dar uma estimativa de tempo.

    Seu nariz era reto e empinado, quase como a postura de um nobre. 

    Isso irritou Theo no fundo da alma. 

    O olhar de cima, tentando se achar superior enquanto escondia os olhos por trás de um óculos retangular e de um sorriso malicioso.

    ‘Ajoelhem-se.’

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