Capítulo 75: Provocação
Em alguns mundos, as pessoas são abençoadas com um lugar incrível, porém uma habilidade limitada para aproveitá-lo. Em outros, com uma vida dura e ríspida, mas com potencial enorme para superar tais adversidades e conquistar o mundo a sua volta. Os seres vivos de Erebus, no entanto, foram presentados com ambos, um mundo incrível e um potencial ainda maior para desbravá-lo. Poderíamos fazer com que este fosse o paraíso, e por algum motivo… escolhemos não o fazer. Limitamos a nós mesmos para ser apenas um pouco melhor do que o próximo… eu… nunca vou entender.
Fitoparasitismo ~ Nitocris
— Mexa bastante os pés, Li! — gritou Prado. — Não o deixe encurtar a distância, o melhor a se fazer usando uma lança é manter o inimigo na distância da ponta.
— Sim senhor!
— Se ele chegar próximo demais, lembre-se de erguer a mão de trás e utilizar da porção da lança entre as suas duas mãos!
— Sim senhor!
— Movimentos rápidos e mortais, você está indo bem!
Após pouco mais de um mês treinando diariamente, Li já estava pouco a pouco desenvolvendo uma consciência de batalha e criatividade, aprendendo a misturar os estilos que estava aprendendo e sendo um pouco mais ousado no duelo. Sua perícia com a espada não estava a melhor possível, mas não era a intenção de seu instrutor que se tornasse um mestre e sim que tivesse uma grande variedade de experiências para usar isso no desenvolvimento próprio.
“Ele finalmente parou de absorver informação crua e começou a tentar de fato entendê-la… se ele continuar nesse ritmo poderia se tornar um Mestre das Armas em uma década… talvez eu só esteja entusiasmado…” Pensou Prado.
Subitamente, Fynn, que estava treinando com o Li, agachou-se, avançando. Levantando a parte de trás da lança, o homem tentou bloquear a investida rasteira com a ponta da arma, mas o seu oponente foi mais rápido, rotacionando seu próprio corpo e desviando um pouco pra direita, sendo acertado de raspão, mas conectando o sabre que utilizava próximo ao pescoço de Li.
— É minha derrota… — disse Jihan rendendo-se.
— Então, é minha vitória novamente! — comemorou Fynn.
— Ei, falando dessa forma, parece que eu estou numa sequência de derrotas, estamos praticamente empatados — retrucou. — De qualquer forma, não sabia que você utilizava sabres como arma.
— Normalmente não uso, é mais uma coisa secundaria, sempre preferi adagas, combinam mais comigo.
— Então estou empatando com suas armas secundarias…?
CLAP CLAP
— Sem perder o ânimo, o Fynn está longe de ser um iniciante quando se trata de armas como essas — disse Prado. — Não se deixe enganar por esse rosto sorridente.
— Eu sei, eu sei…
— Ei, Li! — Uma voz feminina gritou da entrada do ginásio onde os três estavam.
— Glória? Por que você está aqui?
— Esquece isso, a Lisa veio fazer uma visita, vem logo!
— Lisa? — Ouvindo a mensagem, o homem olhou para o instrutor, pedindo permissão para sair mais cedo.
— Pode ir, se ficar aqui não vai conseguir se concentrar de qualquer forma — disse Prado, gesticulando um sinal de positivo com a mão.
— Sim senhor, obrigado senhor! — agradeceu, se curvando levemente.
Os três integrantes juntos voltaram o mais rápido possível para a casa.
BAM
A porta da casa onde toda a equipe liberada por Matheus ficava abriu com força. Fynn ofegante entrou pela porta primeiro, sendo o mais rápido a chegar; Li veio logo atrás. Todos os integrantes, com exceção de Selene estavam reunidos na sala.
— Lisa!
Antes mesmo que pudesse respirar, a menina atirou-se em seus braços sem falar nada e enterrou sua cabeça em seu peito, abraçando-lhe com toda sua pequena força. Jihan ficou surpreso com a vontade dela, mas apenas fez carinho em seu cabelo.
— Senhorita Lisa, isso não é comportamento de uma sacerdotisa — um homem que estava sentado ao sofá a frente de Matheus, a reprimiu. — Por favor, se contenha.
“Quem é esse cara? Ele é tão… estranho?” Pensou Li.
— Não acho que tenha problemas em uma criança abraçar alguém que sente falta — retrucou Fynn.
— Claro que você não veria problemas, considerando quem é — contra-argumentou o homem.
— O que isso deveria significar? — perguntou grosseiramente.
— Vai saber… Assassino de Amarílis — provocou.
BAM
— Você… o que pensa que está fazendo? — Matheus, que estava sentado tranquilamente até então, bateu na mesa com seu punho. — Está na nossa casa, fala de modos, mas aparentemente você não tem nenhum.
— Eu disse alguma menti…
— Olhe como fala, templário, você não está na sua igreja.
O líder da equipe disse seriamente, os outros integrantes acharam normal a sua postura, mas para Li que não estava acostumado com aquela atitude vindo de alguém normalmente tão tranquilo, foi uma surpresa.
— Aqui em Arcádia nos protegemos os nossos, não esqueça disso novamente.
O silêncio junto a tensão solidificou o ar por alguns segundos.
— Como esperado, uma vez caçador de demônios, sempre um — o homem loiro quebrou o gelo. — Acho que me excedi em minhas palavras, perdoe minha infração.
— Fynn?
— Está tudo bem.
— Sendo assim, por que não tomamos um café?
— Agradeço a proposta, mas acho que é melhor nos irmos andando — respondeu o templário, levantando-se.
Ele estava vestindo armadura pesada completa dourada e branca, seu equipamento deixava a cintura aberta, piorando a defesa, mas facilitando a movimentação; em suas costas, carregava um escudo do tipo suíço.
Ouvindo as palavras de Donatello, Lisa desesperou-se e olhou para Li, seus olhos brilhantes e redondos imploravam para que ela ficasse mais um pouco. Além disso, ele já havia percebido algo de errado, a menina parecia mais magra desde a última vez que se viram, a bolsa de seus olhos estava um pouco inchada, detalhes que somente ele perceberia.
— Você pode ir andando — disse Jihan. — Ela vai ficar mais um pouco e eu a acompanharei mais tarde.
— Receio que não será possível — negou o homem. — A senhorita Lisa é uma mulher muito ocupada e infelizmente tem muito a fazer.
— Dona — a menina finalmente falou. — Me deixe ficar só mais alguns minutinhos, o Li acabou de chegar.
— Tem certeza? Não acho que o Patriarca Gregorios vá ficar muito feliz com isso…
Ouvir tal nome fez a sacerdotisa tremer, visivelmente aflita, uma aflição que Jihan conhecia muito bem e jamais poderia esquecer.
— Tenho certeza que o Patriarca vai entender o atraso — Li insistiu.
— Acho que você não entendeu, garoto — O Templário agia como se fosse mais velho que o outro, mesmo que parecesse ter a mesma idade. — Isso não é um pedido.
— E isso não é uma é uma discussão!
— Você realmente…
Donatello subitamente desapareceu da visão dos integrantes da equipe.
— Acha que tem o poder para me parar?
E reapareceu a um passo de distância de Jihan. Puxando a menina e tapando sua boca, o Templário rapidamente seguiu com um soco no peito de Li, empurrando-o alguns metros. Todos os outros membros se armaram quase que de forma instantânea.
— Li! — gritou a sacerdotisa.
— Sabe, tenho certeza de que se eu não fizer muita bagunça, o supervisor que está olhando para cá não irá se envolver, afinal, todas as facções têm uma ligação obrigatória com a igreja e não vão desgastá-la tão facilmente.
TSK
Matheus, que era o mais consciente disso, estalou os lábios. Ele sabia que um dos lordes sempre supervisionava o quartel principal de Arcadia para mantê-lo protegido de qualquer ameaça que aparecesse, não é preciso dizer que tal lorde sabia de tudo que estava acontecendo ali.
— O líder de vocês sabe do que estou falando, por favor não percam seu tempo tentando lutar contra mim — avisou o homem. — Apesar de que Templários se fortalecem na presença do mal, posso dizer que não cheguei a esse posto por sorte, vocês têm um torneio importante se aproximando, certo? Não querem ficar incapacitados logo agora…
— Só vamos descobrir se tentarmos…
— Li, pare — disse Matheus.
— Você também — Donatello sussurrou no ouvido de Lisa. — Não quer ver seus amigos se machucando, certo?
— Líder!?
— É uma ordem! Isso serve a todos vocês — seus olhos encararam os outros integrantes, que também estavam aflitos. — Não se movam!
— Muito bem, Matheus! Sabia que poderia contar com você — disse o Templário, colocando a mão em seu ombro.
— Tire sua mão suja de mim — respondeu o líder batendo em seu braço.
— De qualquer forma… estou de saída, vamos senhorita Lisa.
A sacerdotisa, sem o que fazer, somente obedeceu.
— Está tudo bem, senhor Li… foi bom ver todos — disse, forçando um sorriso. — Não quero causar problemas para vocês…
— Lisa…
Sem outra alternativa, ambos deixaram tranquilamente a casa e o quartel de Arcádia.
— Matheus, o que significa isso!? — Glória foi a primeira a abrir a boca. — Você viu o que estava acontecendo, como pode simplesmente deixar ele a levar!
— Foi demais, líder, até mesmo para você — Fynn concordou e Hans acenou em aprovação.
— Você tem um plano, não tem? — Discrepante do resto, Li estava mais calmo do que deveria — O homem que eu sigo jamais ficaria parado em uma situação como essa.
— Sim… eu tenho.
— Então conte-o logo.
— É uma alternativa que surgiu quando vocês foram convidados para participar do segundo nível do torneio, o prêmio para quem o vencer é mais do que reconhecimento e dinheiro… o vencedor também ganha um pedido feito diretamente ao Deus de sua facção.
— Um pedido?
— Sim… a resposta é mais difícil do que parece, Li. Se quer ajudar aquela menina, não podemos recorrer a lutar contra uma instituição inteira… Kali pode ajudar, tudo que precisa fazer é ganhar o torneio… não vai ser fácil.
— Nós vamos conseguir — afirmou Jihan. — Se ganhar o torneio é necessário para libertar ela, é o que eu farei.
“Espero que esteja ouvindo, Nasháh.” Pensou consigo mesmo.