Acordei cedo no domingo, algo completamente inusitado para mim. Meus olhos ainda estavam pesados de sono, e a ideia de sair da cama me irritava. Tentei voltar a dormir, mas o sono não veio. Olhei pela janela, e vi que o dia estava chuvoso. A chuva batia suavemente contra o vidro, criando um som hipnótico, mas não o suficiente para me fazer adormecer novamente.

    Suspirei, aceitando meu destino, e me levantei. Cambaleando até o banheiro, escovei os dentes, o gosto de menta ajudava afastar a sonolência restante. A casa estava quieta, minha mãe e minha irmã, Hana, ainda dormiam. Nada surpreendente, afinal era domingo.

    Fui para a cozinha e preparei meu café, o cheiro forte e reconfortante preenchendo o ar. Coloquei algumas fatias de pão na torradeira e, enquanto esperava, voltei a olhar pela janela. A chuva continuava a cair, com as gotas se acumulando em pequenas poças no jardim. Peguei meu café e as torradas e me sentei para comer. O silêncio da casa, combinado com o som da chuva, era quase meditativo.

    Depois do café, voltei para o meu quarto. Pensei em jogar um pouco, afinal, um dia chuvoso era perfeito para isso. Peguei meu celular e liguei para Seiji, mas ele não atendeu. Provavelmente ainda estava roncando alto em sua cama. Tentei ligar para Rintarou.

    — Alô? — atendeu Rin com a voz levemente rouca.

    — E aí, Rin! Vamos jogar? — perguntei, animado.

    — Talvez mais tarde. Estou lendo um livro interessante agora — respondeu ele.

    — Um livro? — repeti, surpreso. Rin sempre teve um interesse por livros, algo que nunca compartilhei. Minha curiosidade foi despertada. — Que livro é esse?

    — É “O Nome do Vento” de Patrick Rothfuss. Você provavelmente não conhece — disse Rin, um pouco surpreso.

    — Hum… parece interessante. Podemos jogar mais tarde então. — Eu realmente queria saber mais sobre o livro. — Vou dar uma olhada nesse livro.

    — Claro, Shin. A gente se fala mais tarde.

    Desliguei o celular e sentei em frente ao computador. Pesquisei sobre “O Nome do Vento” e li algumas resenhas. A história parecia intrigante, cheia de magia e aventura, assim como os jogos que eu jogava. Mas não consegui encontrar uma versão online para ler. Fiquei um pouco incomodado. Então, me lembrei da biblioteca da escola, mas era fim de semana e estava fechada. A biblioteca pública seria a melhor opção.

    Verifiquei o horário de funcionamento na internet e, para minha alegria, estava aberta. Decidi sair de casa. Quando descia as escadas, minha mãe já estava de pé.

    — Bom dia, mãe. — Eu cumprimentei-a, tentando não parecer muito apressado.

    — Bom dia, Shin. Onde você vai com essa chuva? — perguntou ela, surpresa.

    — Vou na biblioteca procurar um livro — respondi, pegando meu guarda-chuva.

    — Na biblioteca? — Ela arqueou uma sobrancelha, claramente surpresa, mas não fez mais perguntas. — Bem, boa sorte então.

    — Obrigado, mãe — despedi-me e saí de casa.

    O som da chuva contra o guarda-chuva era relaxante, quase melódico. Enquanto caminhava, refleti sobre como nunca tinha dado uma chance aos livros. Sempre preferi meus jogos, onde a ação era imediata e visual. Mas talvez fosse hora de tentar algo novo.

    Cheguei à biblioteca e entrei, sentindo o cheiro de papel velho e madeira polida. As prateleiras eram altas, abarrotadas de livros de todos os tamanhos e cores, suas lombadas contando histórias só pela capa. O chão de madeira rangia suavemente sob meus pés, criando uma trilha sonora sutil para o ambiente de estudo.

    Havia algumas pessoas espalhadas pelas mesas, algumas com olhares concentrados, outras fazendo anotações rápidas em cadernos surrados. O som ocasional de páginas sendo viradas misturava-se com o barulho suave da chuva lá fora, criando uma sinfonia tranquila. Senti uma calma tomar conta de mim, um contraste com o que eu sentia quando eu jogava meus jogos online.

    Comecei a procurar pelo livro que Rin mencionou. Passei por diversas seções, lendo os títulos nas lombadas até finalmente encontrar “O Nome do Vento”. Peguei o livro da prateleira e analisei a capa, hesitante. Apesar de eu não gostar muito de ler livros, eu queria saber o que Rintarou tanto lia. Decidi dar uma chance e ler.

    Encontrei uma mesa vazia e puxei a cadeira. Sentei-me, ajustei a iluminação e abri o livro. À medida que lia a primeira página, as palavras começaram a formar imagens vívidas na minha mente, e logo estava imerso na história. As horas passaram voando enquanto eu lia, completamente concentrado. A história era incrível, cheia de detalhes e emoções.

    Quando finalmente olhei para o relógio, percebi que havia passado a manhã inteira na biblioteca. Levantei-me, devolvi a cadeira ao lugar e fui até o balcão para pegar o livro emprestado. A bibliotecária, uma senhora simpática com óculos de armação fina, sorriu para mim enquanto fazia os registros.

    — Primeira vez que te vejo por aqui, jovem. Espero que goste do livro — disse ela, enquanto entregava o livro de volta para mim.

    — Obrigado. Tenho certeza de que vou gostar — respondi, sorrindo de volta.

    Com o livro em mãos, saí da biblioteca e comecei a caminhada de volta para casa. A chuva tinha diminuído, agora caindo em um ritmo suave. O som das gotas contra o guarda-chuva era quase hipnótico, e eu me peguei pensando na história de Kvothe, o protagonista do livro. Enquanto caminhava pelas ruas molhadas, as luzes refletindo nas poças, eu sentia uma sensação de tranquilidade. A cada passo, minha mente voltava às cenas do livro, imaginando os detalhes dos personagens e os lugares descritos.

    A caminhada foi rápida, mas o tempo pareceu esticar, como se estivesse em um mundo entre a realidade e a fantasia. Ao chegar em casa, encontrei minha mãe e Hana sentadas vendo TV.

    — Já voltou? — perguntou minha mãe.

    — Sim. Trouxe um livro para ler — respondi, mostrando o livro.

    — Estou impressionada, Shin. Espero que goste.

    Fui para o meu quarto e me acomodei na minha poltrona favorita, com uma luz suave iluminando o livro. A história me prendeu de tal forma que li o livro inteiro em um dia. Cada página me transportava para um mundo novo. Eu podia ver Kvothe claramente, suas expressões esculpidas pela tensão das batalhas, o calor das fogueiras aquecendo seu rosto, e o sussurro do vento nas folhas ao redor.

    Minha imaginação recriava cada cenário detalhado descrito por Rothfuss. As horas passaram voando enquanto me perdia na narrativa, cada capítulo era uma nova aventura que eu devorava avidamente. Senti as emoções dos personagens como se fossem minhas, e quando finalmente cheguei à última página, experimentei um vazio misturado com satisfação. O tempo havia passado sem que eu percebesse.

    Quando terminei, senti um leve vazio. Eu queria mais, queria ler mais histórias como aquela. Olhei pela janela e vi que já era tarde.

    Fechei o livro e sentei-me em frente ao meu computador, decidi jogar um pouco para relaxar. Meus amigos estavam online, então jogamos juntos por algumas horas. Mas mesmo enquanto jogava, minha mente voltava às aventuras de Kvothe. Depois do jantar, fui para a cama, com o livro ainda fresco na minha mente.

    Na segunda-feira, acordei e segui minha rotina normal. O trânsito matinal das pessoas indo para o trabalho e para a escola era um cenário comum, mas agora parecia um pouco diferente para mim. As ruas estavam cheias de estudantes, todos apressados, mas meus passos eram mais leves.

    Chegando na escola, vi Seiji e Rin se aproximando. O pátio estava cheio de grupos conversando animadamente sobre seus fins de semana,.

    Encontramos um canto tranquilo e começamos a conversar sobre o dia no fliperama e os jogos que jogamos no domingo. A sala de aula estava cheia de energia, todos compartilhando suas aventuras do fim de semana enquanto aguardavam o início das aulas.

    Antes da aula começar, estávamos conversando em grupo quando me lembrei de algo.

    — Ah, Rintarou, falando nisso… — comecei, chamando sua atenção. — Gostei bastante do livro que você recomendou. Li tudo e achei a história incrível.

    Seiji olhou para mim, surpreso.

    — Você leu um livro, Shin? — perguntou ele, incrédulo.

    Rin parecia ainda mais surpreso.

    — Você leu tudo em um dia? — perguntou ele, desconfiado.

    — Sim. Foi tão bom que não consegui parar — respondi, sorrindo.

    Rintarou começou a me fazer perguntas sobre o livro, testando se eu realmente tinha lido.

    — Qual o nome do protagonista? — perguntou ele.

    — Kvothe — respondi prontamente.

    — E onde ele passou a infância? — Rin continuou.

    — Na trupe dos Edena Ruh — respondi, sem hesitar.

    Ele ainda parecia desconfiado.

    — E qual era o nome do mestre arcanista que ele conheceu na Universidade?

    — Elodin — respondi, sem gaguejar.

    A surpresa no rosto dele era evidente. Ele sorriu, finalmente convencido.

    — Impressionante, Shin — disse sorrindo — Tenho algumas outras recomendações, se você estiver interessado.

    — Estou, com certeza! — Fiquei animado com a ideia de ler mais.

    — Talvez você devesse considerar entrar no clube de literatura da escola — sugeriu Rin, com um sorriso. — Temos um grupo de pessoas que adoram livros tanto quanto eu. E a melhor parte é que temos acesso a uma vasta coleção de livros que você pode explorar.

    — Hmm, nunca pensei em entrar em um clube — respondi, pensativo. — Mas parece uma boa oportunidade para encontrar mais livros interessantes.

    Rin assentiu.

    — E além disso, é um ótimo lugar para discutir sobre as histórias e personagens que você vai encontrar. Eu acho que você vai gostar.

    Senti uma nova animação crescendo dentro de mim. Talvez fosse hora de tentar algo novo. Eu era o único sem clube, enquanto Seiji estava no clube de futebol e Rin no de literatura. Talvez fosse uma boa oportunidade para encontrar mais livros interessantes. E, afinal, eu sempre queria ir para casa o mais rápido possível para poder jogar, mas talvez agora fosse uma boa hora de mudar isso.

    O dia na escola passou rapidamente, e antes de ir embora, decidi passar na biblioteca novamente. Peguei dois livros emprestados e voltei para casa.

    Deitado na cama, refleti sobre como um simples livro poderia mudar tanto minha perspectiva. Nunca pensei que encontraria tanto prazer em algo tão quieto, tão introspectivo. Era uma porta para um novo mundo, um que eu mal podia esperar para explorar ainda mais. Eu realmente estava grato a Rintarou por me mostrar esse caminho.

    O sono veio rapidamente, preenchido por sonhos de novas histórias e aventuras.

    Nota