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    O quarto do hotel estava quase um silêncio, se não fosse pelos roncos de Quincas Borba, deitado no sofá, apagado. As outras três pessoas, cada uma sentada em uma cadeira diferente, mantinham-se quietas e em seus cantos. 

    Baret já estava com a mão aparentemente curada. Axel também já tinha consertado o nariz com um Kit MED, e mantinha-se usando os óculos escuros quebrados. Arya tinha uma expressão para baixo e em mãos a slinger de Émile. 

    Já estavam assim há mais ou menos vinte minutos desde que saíram do labirinto e cerca de uma hora e meia desde que Baret e Axel derrotaram Destroyer e a algemaram. A invasora mantinha-se apagada na cama. 

    Ninguém ousou falar uma palavra até então. Até que Axel decidiu quebrar o silêncio. 

    — E então, quando vamos avisar pro Atlantis a merda que aconteceu?

    Baret não respondeu. 

    — Responde. 

    — Não vamos — Baret respondeu — se falarmos, estamos fodidos. Mesmo que recuperemos ela… Eles vão nos encher de processo, vai ser nosso fim. 

    — E qual o seu plano? Fugir da cidade e desaparecer? — Axel questionou irônico. — É nossa responsabilidade, e nós quebramos ela. Agora pagamos a consequência. 

    — Não. Não vamos fugir. — Baret ergueu a cabeça, e olhou para os outros dois. — A gente vai recuperar a Émile. 

    — Isso se já não tiverem matado ela — O homem falou. 

    — Você ouviu algum disparo depois que nos separamos?

    — Não.

    — Arya?

    — Também não…

    — Então não mataram. Eles devem ter a sequestrado. Mas se ainda não pediram resgate, é por que provavelmente estão esperando a poeira baixar, devem achar que já falamos pro Atlantis. 

    — Tsc, isso é verdade. — Axel cruzou os braços. — Mas não fazemos a mínima ideia de onde ela poderia estar. 

    — Então vamos ter. 

    Baret se levantou da cadeira. Pegou o revólver e foi até a parte das camas onde a “hóspede” estava. Encostou ela na parede, e usando a coronha do revólver, bateu em seu pé com toda força que tinha. 

    — AI! — Acordou no mesmo momento. — Quem caralhos fez… Hã? — E então, seu deu conta que estava almejada nas mãos e nos pés, num local desconhecido, cercada de pessoas que conhecia. — Merda…

    — Acordou rápido — Baret comentou, pondo a coronha bem em cima do outro pé de Destroyer — espero que você saiba a confusão que tu se meteu. 

    Antes de falar algo, olhou um pouco mais ao redor. Pensou. Fechou os olhos e largou toda a força que tinha no corpo, caindo em cima do próprio joelho. 

    — Ela… Desmaiou…? — Axel questionou — quer que eu pegue uma água fria?

    Baret não respondeu. Deu um suspiro, colocou a mão no cabelo de Destroyer e puxou com força, fazendo levantar. 

    — AI! — A garota gritou de dor de novo, e na hora percebeu a burrada que fez. — Err… Bom dia…!

    — Viu só? Fingiu desmaio — a líder revelou como uma verdadeira detetive — escuta aqui, garota. Não to com paciência para jogar joguinhos e nem tenho tempo para perder. Então você vai responder minhas perguntas de forma clara e rápida, entendeu?!

    — Não!

    — Como que é?

    — Não entendi! Eu… eu sou burra! Neuro divergente! Eu não entendo as pessoas!

    Um silêncio predominou pela sala, um silêncio de mais pura vergonha alheia.  Baret soltou seu cabelo e deu alguns passos para trás. 

    Andou um pouco pelo quarto, com o revólver ainda em mão. Estava pensando, ponderando opções que tinha. Axel tentou dar a sorte ele mesmo.

    — Escuta aí garota, pro seu próprio bem, sugiro responder às perguntas. 

    — NEURO DIVERGENTE!

    Axel franziu as sobrancelhas, se afastou e foi até Baret. Puxou ela até um canto isolado e disse com certa vergonha. 

    — Vamos… Sei lá, tentar acordar o Quincas? Sabe, mandar ele usar aquela educação dele. Vai ver ele convence ela. 

    — A gente tentou acordar ele por uns dez minutos. Não sei o que usaram nele, mas o negócio é forte… — Baret cruzou os braços. — Vai ter que ser do jeito brutal. 

    — Eu não sou lá muito fã de tortura. 

    — E ela não me parece muito aberta a falar de outra forma. 

    Baret não esperou ele responder. Voltou até Destroyer que continuava agindo que nem idiota na frente de Arya, que estava apenas quieta. 

    — NEURO…!

    Baret interrompeu o grito. Colocou a mão na frente da boca de Destroyer e olhou ela com seus olhos mais mortais. 

    — Escuta aqui sua filha da puta, se você gritar, MAIS UMA VEZ SEQUER, eu vou pegar a slinger do Axel e cortar a sua língua e mandar tu escrever os detalhes que eu preciso com o restinho de língua que tiver, entendeu?!

    Dessa vez, Destroyer tremeu. Confirmou com a cabeça, e lentamente, Baret tirou a mão em cima de sua boca. E como mandado… Ela não abriu a boca, ficou quietinha. 

    — Ótimo. Agora, vou direto ao ponto: eu não ligo se você é de uma gangue, facção, da Wild Hunt ou não. Não ligo pros motivos, não ligo como conseguiu. Só quero saber duas coisas: se a Émile está viva, e onde ela está. 

    — A gente… era pra pegar ela viva. 

    — E levar ela pra onde?

    — Se não tivesse testemunhas, direto pro esconderijo da Wild Hunt, mas se tivesse… A gente iria esperar a poeira baixar em algum dos outros esconderijos…

    — Não respondeu a minha pergunta. Quais esconderijos?

    — NEURO DIVER…

    Baret colocou a mão em cima da boca de Destroyer de novo. 

    — Axel, me diz, teus portais… tu consegue ir para algum lugar com ratos?

    — Errr… Acho que sim? Eu sei a localização de um lixão. Dá para ir lá.

    — Me apanha um BEM GORDO! E Arya, me faz um favor e pega uma chaleira e um isqueiro.

    Destroyer tremeu, pois entendeu na hora que tipo de método de tortura Baret estava falando, sentiu algo apertar onde o sol não bate. Mesmo com a boca tampada, tentava falar coisas como “espera” “deixa eu falar”, e após alguns segundo de desespero, Baret tirou a mão. 

    — Diga. 

    — E-eu não sei todas as localizações! O-o Elliot é que cuidava… Aí merda…

    — Elliot, é? Ótimo, continue. 

    — Não! Não posso trair ele! É meu amigo, sabe? Não pode trair os amigos!

    — Escuta aqui. — Baret ficou olho a olho com Destroyer, que já estava começando a lacrimejar. — Eu não ligo para seus amigos, e eu duvido que eles liguem para você. Já devem achar que ta morta mesmo. Agora, EU e MEU grupo assinamos um contrato dizendo que iriamos proteger a Émile, e se eu não cumprir esse contrato, meu sonho já era. Além disso… ela é a minha amiga. Então você tem duas escolhas: ou me conta, ou diga adeus as suas pregas e oi para o rato. 

    Destroyer cochichou “desculpa” e então, com a voz trêmula, indicou cada ponto que sabia no mapa virtual. Eram num total dezessete pontos diferentes espalhados pela cidade. Mesmo com Baret, Axel, Arya e Quincas, levaria ao menos cerca de quatro horas para conferir todos aqueles pontos. 

    E talvez eles não tivessem quatro horas. 

    — O que fazemos? — questionou Axel, com o trio se reunindo na sala de estar do andar, longe dos ouvidos de Destroyer — é demais para nós. Sério, falar com o Atlantis me parece a escolha mais segura. 

    — Já disse, se falarmos, a gente vai se foder de todos os jeitos. — Baret cruzou os braços, pensando. — Mas se o problema são os números… Tenho uma ideia. 

    — Qual? — Questionou. 

    — Simone. 

    — Hã?! — Axel ficou surpreso, enquanto Arya ficou confusa. — Ela? Por que diabos ela nos ajudaria?

    — Émile ainda não deu o dinheiro para nós pagarmos ela. E se não resgatarmos ela, nunca vamos ter esse dinheiro. Então… Talvez ela não goste, mas ela tem motivo para querer nos ajudar. 

    Axel descansou as duas mãos em cima das bainhas das espadas. Não gostava da ideia, mas conseguia ver alguma lógica por trás. 

    — E se der merda?

    — Então eu penso outro jeito. Não quero perder neurônio pensando num plano B, quero garantir que esse plano funcione. 

    Axel tentou pensar em um contra argumento, mas não conseguiu. Consentiu com o silêncio. 

    — E eu? — Arya intrometeu-se — fico aqui?

    Baret não respondeu de primeira. Foi até os quartos, onde Destroyer estava com um pano amarrado na boca. Mexeu nas coisas de Quincas até achar a outra pistola dele. Voltou ao grupo. 

    — Quando você me disse o que aconteceu com a Émile… Você se desculpou por não fazer nada. E eu confesso… Eu até fiquei puta, mas sabia que eu não podia te culpar, a responsabilidade era nossa. — E então, entregou a pistola para Arya. Continuou falando: — Dessa vez, eu peço que faça algo. Se qualquer pessoa vier tentar libertar a garota, atire para matar. Se a garota fazer qualquer coisa, atire para matar. 

    — Hey! Tu não pode exigir algo assim dela…! — Axel tentou se por contra, mas ficou surpreso quando Arya segurou a pistola com força, e retribuiu com um olhar determinado. 

    — Eu entendo. Eu tenho algum treinamento, sei me virar com isso. Eu não vou ficar parada dessa vez. 

    — Beleza. Valeu. Inclusive, se o Quincas acordar… Me liga. Qualquer coisa o Axel faz um portal para cá. 

    Arya confirmou com a cabeça e Baret e Axel saíram juntos visando ir até o restaurante de Simone. Quando estavam no elevador, Axel ficou encarando Baret por trás. Quando ela notou, falou um mero:

    — To com a cara suja pra tá me encarando desse jeito?

    — Não. Não… É que… Hã… E a mão?

    — Minha mão? — Repetiu a fala. Olhou para ela por um segundo, fechando e abrindo e respondeu: — os ossos regeneram, e a pele em si tá de boa. Mas ainda tem alguns pedaços de chumbo dentro dela. Vejo isso depois. 

    — Chumbo? Cara, isso vai te dar um envenenamento. 

    — Só se demorarmos demais. 

    — Ainda assim….

    — Relaxa.

    Silêncio novamente. Baret voltou a encarar a porta do elevador, esperando aquela lesma em forma de caixote descer. Axel decidiu desembuchar. 

    — Tudo isso foi estranho. Sabe, as ameaças de tortura. — Falou ajustando o óculos quebrado. — Não parecia que seria capaz dessas coisas. 

    — E o que tu sabe de mim? — Questionou, mas quebrou o gelo em seguida. — Mas eu entendo o que tu ta falando. Eu não falaria algo disso numa situação normal, só que estamos longe de uma situação normal. 

    — Disso eu sei… Só fiquei surpreso, só isso. 

    Ela não respondeu. Baret estava com cara séria, centrada. Axel não tinha certeza o que se passava dentro da cabeça dela. O que estava realmente pensando? Era uma curiosidade simples, de leve, mas era importante saber, já que iriam trabalhar em equipe pelos próximos tempos. 

    A cara séria de Baret foi destruída quando deu o primeiro passo para fora elevador, dando de cara com um homem grande, de cabelos brancos e azuis que usava óculos: Atlantis. Atrás dele, havia Agni, com sua expressão neutra e tímida. O sorriso amarelo e forçado dominou sua face. 

    — Ah, vocês já estão aqui. Viram Émile? Mandei mensagem para ela, porém ela não respondeu. 

    Ambos se olharam por um segundo, Baret respondeu rindo de medo. 

    — Ela… tá dormindo! É, haha, ela ta dormindo!

    — Já? O sol ainda está no céu.

    — É que ela ta exausta do labirinto, sabe? Nossa, parecia que tava morta! Só deve acordar amanhã de manhã de TÃO cansada que está!

    — Entendo… — Colocou a mão no queixo, pensando. E a cada segundo de Silêncio fazia Baret e Axel sentirem o coração sair do peito. — Bom, ok, então. O que eu queria falar não tem grande importância. Falo com ela amanhã. Vamos, Agni. 

    — Sim, senhor — ela disse, sem muita emoção em sua voz. 

    — Claro! E-eu passo o recado!

    Atlantis e Menta se despediram, entraram no elevador e desapareceram com o fechar da porta. Baret e Axel ficaram ali, parados recuperando o fôlego. Saíram do hotel e andaram o mais rápido possível até o restaurante de Simone. Ainda não estava 100% aberto, os atendentes estavam posicionando as mesas no lado de fora, limpando vidros. 

    Axel parecia meio relutante de entrar, mas Baret não se importou. “Ou você entra ou você entra”. Quando se aproximaram, os atendentes fizeram cara feia, correram até dentro do restaurante. Minutos depois, um dos funcionários veio e falou um simples “Entrem e vão para a área de funcionários”. 

    Seguiram a ordem. 

    Entraram, e foram até o que parecia uma espécie de camarim. Era uma sala pequena, com um espelho grande, armário cheio de roupas. O que chamava atenção era um homem jovem, ruivo que nem Simone, braço robótico que nem de Simone. 

    Fumando um cigarro, jogou para fora o ar nos pulmões e perguntou. 

    — Vieram pagar a dívida?

    — Errr… Com a Simone? Mais ou menos. — Baret cruzou os braços. — Mas é só com ela. Então se puder chamar ela, seria bom. 

    — Aham — o homem confirmou — beleza, então, podem falar. 

    — Cara, tu é burro? Ela acabou de falar que é só com a Simone. Chama ela logo que o assunto é urgente. 

    O homem deu um suspiro. Colocou o cigarro no cinzeiro e foi em direção a um armário e o abriu. A porta bloqueava qualquer visão de Baret e Axel sobre o que estava acontecendo. Um minuto depois, saiu… Simone, com o seu braço robótico, cabelo longo e ruivo, e curiosamente, as mesmas roupas que do homem, com o mesmo peito reto e musculoso. 

    — Vão querer que eu coloque maquiagem também? — Disse com sua voz feminina. 

    A dupla ficou quieta por alguns segundos, processando, pensando. Até que um click surgiu na mente deles, e falaram exatamente ao mesmo tempo:

    — Ahhhhh

    — Vocês são muito lentos — “Simone” disse com sua mais masculina, tirando a peruca e sentando-se novamente. Pegou o cigarro e deu uma tragada. — Agora, falem logo. O que cês querem?

    — Como que a gente te chama agora? — Baret falou, meio envergonhada. 

    — Nil. 

    — Beleza, Nil. Então… A gente precisa da sua ajuda. 

    — Ata. Quando pagarem a dívida eu empresto dinheiro, sem problema. Cobro até uns juros bom, uns 40%. 

    — Não, não é isso. É… A nossa empregadora, a Émile Dayone, sabe aquela garota de cabelo branco e azul que tava comigo naquele dia? Ela… Ela foi sequestrada. 

    Nil ergueu a sobrancelha, expulsou a fumaça dos pulmões. Girou a mão e segurou o cigarro de uma maneira feminina, sem tragar, e questionou com um tom muito cuidadoso:

    — E eu com isso?

    — É que… — Baret tentou argumentar, mas Axel interrompeu sem paciência alguma. 

    — É que se a gente não recuperar ela, esquece todo o dinheiro que a gente vai te pagar. Pois os Dayone vão ferrar a gente primeiro. 

    — Axel! Mas… É, é basicamente isso. Se tu quer aquele dinheiro, vai precisar ajudar a resgatar ela. 

    — Tsc… O que vocês querem que eu faça? Controle a força policial de Romaniva? Vai ser muito caro. 

    — Não… Tipo… Sem polícia. — Baret balançou as mãos em negação. — Só precisamos que mande umas pessoas averiguarem alguns pontos para achar os sequestradores… Na real, melhor eu te explicar tudo. 

    Conversaram sobre os detalhes. Nil, de começo desinteressado, foi pouco a pouco mostrando mais atenção a fala, fazendo olhares e bocas de alguém que estava formulando planos em sua cabeça. Depois da explicação de Baret, ele parecia estar mais do que dentro. 

    — Wild Hunt, é? — Questionou. — Eles são difíceis, mas não infalíveis. 

    — Você conhece eles?

    — Mais ou menos. Digamos que já tentaram… — Com o dedo, fez um risco no próprio pescoço — Em mim, mas não deu certo. Era uns peixes pequeno, acabei deixando eles irem após me pagarem. Desde então consegui umas informações… Bom, me passa as localizações. Vou chamar o meu pessoal. 

    — Pera… Tive uma ideia para adiantar as coisas. 

    Começaram a conversar mais sobre um plano. Sabiam muito bem que aquele dia seria longo.

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