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    Theo mergulhou no universo. Seu plano espiritual estava completamente destruído: não havia mais aquele imenso mar, nem aquele belo céu iluminado por um sol intenso. 

    No início, não havia nada. O universo de Theo estava absolutamente carente de qualquer estrela, galáxia, luz… Apenas o espaço reinava, acompanhado por seu relativo tempo.

    Com um pensamento, as estrelas surgiram. 

    Ele tentou se mover no vazio, mas nada aconteceu, obviamente. Repentinamente, Theo foi puxado contra um ponto no vasto espaço.

    As luzes das estrelas passavam por seus olhos como rastros de luz, tão imensamente veloz que seus olhos, embora num mundo espiritual, sequer conseguia processar. Sua mente superaqueceu com tanta informação sendo distribuída, ainda assim ele interpretou corretamente o que estava havendo.

    Por decidir aceitar Liam, sua mente passou por um processo de autodestruição. O corpo e alma estavam finalmente se alinhando e, claro, a consciência estava se adaptando para o nascimento de um novo ser. O plano espiritual de Theo começou a ser destruído e, graças ao conhecimento do próprio rapaz, seu universo mental foi sendo recriado.

    Inesperadamente, um chão fixo se criou. Ao invés de ser jogado, pois estava se movendo em alta velocidade, Theo ficou imóvel no chão, o que levou a crer que ele não estava se movendo, mas sim o espaço.

    Theo vislumbrou o mais belo dos céus. Estrelas tingiram o horizonte, pintando o céu noturno por linhas de luz que não paravam de se mover. Gradualmente, um campo de trigo nasceu do chão, indo de seus pés até sumir no horizonte.

    Pela imensa velocidade que os astros se moviam no céu, o sol e a lua começaram a se encontrar. A lua lentamente a sobrepôs o brilho do sol, sendo contornada pelo mais belo brilho vermelho.

    O rapaz ignorou o céu e olhou para o campo de trigo à sua volta. O aroma era familiar, além do que ele gostaria que fosse. Uma brisa confortável, tal que sentia nos dias mais felizes da sua infância. Ele jurava que podia ouvir os pássaros nimentis — nativos de Nethuns — cantarolar pelo céu, o calor do verão abraçar seu corpo enquanto se misturava com a sensação perfeita da primavera.

    Ele havia voltado para o vilarejo de Midian.

    — Esse não! — Theo exclamou, com apenas cinco anos.

    O rapaz pôde ver como ele era há dez anos. Realmente, o Theo de apenas quatro anos já era bastante grandinho se comparado com os demais de sua idade. 

    Theo e Camille batiam boca num pequeno saguão.

    — Theo! — Camille reprimiu. — Deixe aí!

    “Mãe…” o atual Theo pensou.

    Ele se sentiu estranho. Sua mãe era bastante alta para uma mulher, quase tão alta quanto uma desviante do mesmo gênero. Porém, Theo estava mais alto que ela naquele momento. Não fazia sequer dois meses desde a última vez que ele viu Camille, mas a diferença de altura o levou a pensar que se passaram anos.

    Foi algo bobo, mas o fez pensar algo que ele sempre estranhou: como o tempo funciona?

    Há alguns dias ele estava em Wispells, hoje está numa missão com dois Titãs. Theo percebeu também que seus últimos dez anos se passaram, haviam dias que ele desejava passar, mas não conseguia ao menos lembrar desses tais motivos.

    Theo chegou a conclusão que sua vida foi desperdiçada por ele próprio.

    Ele voltou a olhar sua memória. Naquela manhã o seu antigo eu estava discutindo com Camille por um livro, tal qual contava a história do Santo Jorge e o dragão da lua de sangue.

    Ao lado da mãe de Agnes, Camille decidiu abrir uma pequena biblioteca em Midian para ensinar as crianças plebeias a ler, escrever e obter informações. Em todos os reinos, apenas os nobres têm a oportunidade de aprender tais necessidades. Se os camponeses quiserem, que ouçam de fontes nada confiáveis.

    Camille não queria isso. Ela preza por um mundo onde todos podem ter acesso a tudo que a humanidade tem, desde informações até necessidades. Por ser a duquesa do ducado mais importante do império, ela decidiu aplicar isso nas regiões da capital Loureto.

    Para isso, ela começou a doar seus próprios livros, assim como os de Theo, Thays e Edward — irmão mais novo de Ethan. Porém, Theo não gostou nem um pouco de ter seu livro favorito tirado de si. Ele faltou pouco chorar no dia, mas Camille optou por deixar o livro com seu filho após o avô de Agnes, Michel Hansen, apaziguar um pouco a pequena discussão.

    Theo não queria avançar naquele dia, por ele ficaria o tempo inteiro naquela biblioteca. No entanto, o destino estava o puxando para sua memória mais dolorosa.

    De repente, Dullahan surgiu em sua frente. Podia ser uma memória, mas o trauma que ele carregava consigo tremeu até sua última molécula. Posteriormente, o chão tremeu com explosões. 

    Theo olhou para trás, colocando seus olhos por cima das árvores do bosque, apenas procurando pelas nuvens de fumaça que cobriam o céu.

    Quando menos esperava, ele se viu no maior pesadelo mundial: o Cataclismo Negro estava novamente diante dele. Em particular, no pior momento para o rapaz.

    Ao seu lado estava o Theo de cinco anos, paralisado olhando adiante. Ele tentou negar, mas não foi capaz disso. Os gemidos de dor acompanhados pelo ranger da placa de metal caindo, constantemente, contra Michel não o deixaram quieto.

    O jovem se rendeu: olhando hesitantemente para Michel, fechou seus punhos e acumulou oxigênio em seus pulmões. Ele vivenciou Michel ser esmagado vivo novamente, o que foi bastante irônico, tendo em vista que, ainda tentando esconder seus sentimentos, Theo sofreu mais do que versão infantil.

    Talvez por viver mais de dez anos com isso no peito, reviver aquele cenário trouxe uma dor pior. Ele suspirou, fungou, fraquejou… Seus olhos não conseguiam mais conter as lágrimas, sua mente era um inferno.

    Theo levou as mãos até os olhos, buscando enxugar suas lágrimas. Ele fungou desesperadamente e sofreu calado, escondendo seus sentimentos até de si próprio.

    — Um rapaz que nem você, chorando por tão pouco? — comentou Liam, obviamente era uma ironia do ex-general.

    O cenário cataclísmico fora substituído pelo campo de trigo infinito, onde, no céu, ainda se formava um eclipse.

    Theo continuava com as mãos no rosto.

    — Liam… Eu irei sentir essa dor? 

    Ele estava ponderando seriamente aquela “assimilação”.

    — Sim. A dor emocional fez você chegar até aqui, e com certeza será responsável por te guiar ao futuro.

    — Se nós nos tornarmos esse Lumen, o tal homem perfeito, seremos realmente perfeitos? 

    — Perfeição não existe, né? Você quem criou isso. 

    — Eu serei forte?

    — Você já é. — Liam afirmou.

    — Absolutamente forte?

    — Será. — O ex-general sorriu confiantemente. — Na real, serei sincero com você. A única coisa que essa convergência promete é uma purificação da sua mente. Que convenhamos, você precisa. Após isso, só você poderá reconstruir o seu ser.

    O sol e a lua continuaram se alinhando.

    Theo estendeu o braço para seu alter-ego, tal qual entendeu perfeitamente a mensagem. No entanto, ele queria ouvir do próprio garoto.

    — Vamos concluir isso de vez — declarou Theo. — Cansei de procurar caminhos longos e seguros; ou de desperdiçar a minha vida com eles. Recomeçarei minha vida hoje, viverei intensamente cada segundo presente sem me importar com o passado. Pois, afinal, algum dia partilharei do mesmo destino que você.

    Liam sorriu abafado.

    — “A morte é uma data marcada”, tenho certeza que a sua não será hoje. Tenha plena consciência da sua vida e de seus caminhos, moleque.

    O ex-general apertou a mão de sua contra parte. O eclipse solar no céu se completou; a lua tomou a frente do sol em uma assimilação cósmica de dois astros para iluminar um terceiro.

    Os dois sorriram reciprocamente, onde, instantaneamente, uma luz tomou fortemente o horizonte, iluminando cada centímetro do plano espiritual de Theo.

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