Capítulo 119 - Em direção ao desconhecido
“Avançar em direção ao desconhecido é a essência da exploração. É nessa jornada que desvendamos os mistérios do mundo e é através dessa busca incessante que transcendemos as fronteiras do conhecido.”
— Discursos do Grande Explorador Zandar, Vol. básico.
Harley contemplava a vastidão escura e aparentemente sem fim que se estendia diante dele, enquanto a carroça deslizava pela superfície negra. Era uma paisagem que evocava memórias do Mundo Sombrio.
Ele tinha acabado de sair de um mundo monocromático, mas ali estava novamente, diante de um cenário que parecia sussurrar-lhe que, mesmo mudando de ambiente, não podia escapar totalmente das sombras que o acompanhavam.
O abismo diante dele parecia um lembrete de que não se podia fugir nem evitar o inevitável. Estava claro que o destino o vigiava atentamente, aguardando a qualquer momento por sua queda ou retorno.
Enquanto refletia sobre a paisagem desoladora, Harley se perguntava sobre o destino de Ivana e seu pai, e sobre o que acontecia no mundo sombrio após sua partida. Tentou em vão recuperar a conexão que antes tinha com Ivana e os outros, mas parecia que essa ligação havia se dissipado, perdida em algum lugar entre os mundos.
Considerou a possibilidade de que essa conexão fosse algo exclusivo do mundo sombrio, uma parte de sua vida que ficara para trás. Decidiu deixar essas preocupações de lado por enquanto, prometendo-se abordá-las quando tivesse a oportunidade de retornar ou de encontrar alguém do mundo sombrio novamente.
Absorto na vastidão do horizonte sombrio que se estendia abaixo de seus pés, Harley mergulhou em reflexões sobre aqueles que havia deixado para trás. Mesmo tentando, não conseguia mais sentir a mesma conexão que antes o ligava a Ivana.
Em contrapartida, porém, tinha voltado a sentir novamente a conexão com sua adaga negra, uma sensação reconfortante que o acompanhava há tempos.
E agora com mais tranquilidade, também notou que sua adaga branca tinha, de certa forma, recuperado seu braço perdido, alterando sua forma para substituir o membro ausente.
No entanto, essa revelação também confirmava suas suspeitas anteriores: a energia anterior que causava paralisia tinha sido substituída pela energia sombria.
Enquanto a carroça continuava avançava pela vastidão do deserto negro, Harley começou a ponderar sobre a necessidade de descobrir onde realmente estava e quais perigos poderiam habitar esse novo mundo desconhecido.
Após a surpresa do abismo escuro sob seus pés, ele agora observava mais atentamente o céu amarelo escurecido, cuja luminosidade era obscurecida pelo impacto do solo.
Os três sóis na atmosfera do novo mundo emitiam raios intensos, tingindo o ambiente com uma tonalidade amarelada, que se destacava vividamente contra a escuridão emanada do solo.
Os três sóis o levavam a questionar se permanecia no mesmo mundo, enquanto sua mente se voltava para baixo, indagando se ele emergira das profundezas, e se o mundo sombrio jazia abaixo, no abismo.
Seria essa escuridão sob seus pés o mundo sombrio que conhecia ou o mundo anterior pelo qual ele transitava? A incerteza o assaltava diante da vastidão do deserto negro.
De repente, Harley foi surpreendido pela aparição de vários objetos móveis que passavam rapidamente por eles. Esses objetos, diferentes da carroça em que estava, pareciam apenas ser invólucros, deslocados por várias formas de energia.
Era possível constatar isso pela densidade e pelas cores distintas visíveis das energias que tracionavam os objetos.
Diferentemente da carroça, esses objetos flutuavam e se deslocavam a uma velocidade infinitamente superior. Durante a aproximação, tanto os objetos quanto a carroça onde o jovem estava se iluminavam, gerando uma espécie de sinalização contra choque.
Harley observava surpreso o aparecimento repentino de objetos móveis que rompiam a quietude do deserto negro. Eram de diferentes formas e tamanhos, alguns revelando suas tripulações, embora fossem construções mais simples, desprovidas dos detalhes e do cuidado da carroça em que estavam.
Era claro que esses objetos serviam apenas para transporte e provavelmente seriam utilizados por pouco tempo. A variedade de formas e cores indicava uma diversidade de clãs diferentes existentes ou transitando por aquele lugar, avaliava Harley.
O jovem olhou para Doravan, curioso, e perguntou:
— Por que não vi mais nenhuma carroça como essa?
— Porque elas são raras. Esse é um projeto custoso e complicado de produzir, manter e usar. Todos os povos sempre preferirão a praticidade e a tangibilidade da magia, em vez de fantasias tecnológicas.
Embora compreendesse o ponto de Doravan, Harley ficou pensativo sobre a possibilidade da existência de uma técnica capaz de simular a magia.
Em seu mundo natal, ele sabia que o que podia ser realizado ou modificado com magia dificilmente poderia ser replicado por outros meios, e os resultados geralmente ficavam aquém das expectativas.
Muitos objetos tecnológicos em seu clã eram relíquias de tempos antigos, heranças que eventualmente seriam abandonadas ou substituídas por técnicas mais eficientes baseadas em magia.
Mesmo antes de possuir a adaga negra e estar aprisionado em seu mundo natal, Harley sabia que, para muitos anciões de seu clã, a tecnologia era apenas uma ilusão passageira destinada a desaparecer eventualmente.
“Como a combinação de simples peças mecânicas pode criar os mesmos efeitos que a magia concebe?” — pensou.
Ele compreendia que a única utilidade real da tecnologia era moldar itens que pudessem ampliar ou facilitar a manipulação da magia.
No entanto, se a energia mágica fosse removida de qualquer item tecnológico, ele se tornaria tão ineficiente quanto aquela carroça: lento e muito abaixo do potencial que poderia ser alcançado com magia.
Doravan, aproveitando a iniciativa de Harley, pergunta:
— Se não for muito invasivo, meu jovem, o que pretende agora?
O jovem contemplava a pergunta do velho homem com todas as suas nuances, percebendo nela uma maneira disfarçada de questionar suas intenções. Com isso em mente, ele respondeu, procurando também sondar mais sobre sua permanência neste novo mundo e as possíveis consequências:
— Já que acabei aqui, não custa dar uma olhada por aí.
Antes que Harley pudesse vislumbrar algum indício de perigo ou colher alguma revelação ou nova informação na resposta de Doravan, um objeto pontiagudo circulou em volta da carroça e parou ao lado. O objeto se dividiu ao meio e dele emergiu um homem alto, magro, com pelos desenhados no rosto.
A descrição mental que ele poderia dar da barba e do bigode do homem era única, com cortes milimetricamente delineados em curvas, em contraste com os cortes retos que ele estava acostumado a ver até então. O homem, com uma espécie de espelho luminoso e quadrado em mãos, olhou para o velho e disse:
— Se não é o mais teimoso dos inventores. Doravan, você sabe que este seu invento em minhas mãos não pode estar errado.
O velho retirou uma pequena bolsa e a arremessou em direção ao homem. Após examinar o conteúdo, este, antes de reduzir a luminosidade do objeto em suas mãos e partir, comentou:
— Interessante. Este intruso em nosso mundo deve valer alguma coisa.
Rindo, o homem voltou ao seu objeto e partiu sem dizer mais nada. Doravan olhou para Harley e sugeriu:
— Que tal me acompanhar um pouco? Pode ser uma boa opção até você descobrir mais sobre este mundo.
O jovem concordou, sentindo-se, de certa forma, com uma dívida dupla com aquele homem e, ao mesmo tempo, curioso para descobrir quais eram seus reais interesses.
Aurora ficou radiante com a decisão de Harley e acabou impulsivamente abraçando-o, deixando-o constrangido, pois nunca antes o jovem havia ficado tão próximo de uma mulher dessa maneira.
Apesar de não sentir nenhuma atração pela jovem, seu coração se aqueceu com a demonstração genuína de alegria dela. Vendo o embaraço do jovem, Doravan comentou:
— Aurora vive muito sozinha. Ela não está acostumada com companhias.
Harley compreendeu imediatamente que o velho estava se desculpando e explicando a proximidade excessiva da jovem, que vinha de sua falta de experiência.
Depois de um longo tempo, chegaram a uma espécie de pequena vila, construída com a mesma madeira branca usada na carroça e cercada por um muro retangular que resguardava várias pequenas casas no interior. Apesar da simplicidade aparente, Harley podia sentir que nada ali tinha sido construído ao acaso.
O todo transmitia a impressão de algo extremamente pensado e interligado. Era como se cada detalhe estivesse em harmonia com o outro, formando um conjunto coeso e integrado. Por alguma razão, ele tinha a sensação de que tudo naquela vila seguia um padrão invisível, como se estivesse alinhado a uma estrutura maior e mais complexa.
As casas eram dispostas em padrões únicos, transmitindo uma sensação de grandiosidade e ordem. Os telhados de madeira ligeiramente mais escura contrastavam com as paredes de tonalidade levemente mais clara, criando um visual harmonioso e convidativo. As ruas estreitas, pavimentadas com pedras irregulares, serpenteavam entre as construções, proporcionando a sensação de que cada caminho conduzia a algum lugar importante.
Ao se aproximar mais, a impressão inicial de harmonia da vila foi rapidamente substituída pela percepção de negligência. A ausência de manutenção e cuidado com vários detalhes indicava que o local havia sido abandonado há muito tempo e ninguém residia ali há anos.
Antes que pudesse assimilar completamente o que via, Aurora o interrompeu com um sorriso radiante:
— Bem-vindo ao departamento avançado de ciência — anunciou ela, seus olhos brilhando com excitação.
Harley ficou momentaneamente surpreso com a revelação, questionando-se como aquele local poderia ser uma escola de magia ou ciência. Ele esperava encontrar um ambiente mais estruturado, semelhante aos locais de desenvolvimento de conhecimento em seu mundo natal, com espaços específicos para a produção e armazenamento do saber.
A simplicidade e o abandono do que via diante de si não condizia com suas expectativas, o que se refletiu em sua expressão de surpresa. No entanto, optou por seguir adiante na carroça, escolhendo não questionar seus anfitriões.
Ao chegarem ao centro da vila, seus olhares se encontraram com um novo olhar inusitado, e um silêncio tenso se estabeleceu. Um homem permanecia imóvel, definitivamente aguardando especificamente por eles. Harley reconheceu imediatamente o mesmo homem que Doravan havia subornado anteriormente.
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