Lembra daquela casa de repouso que eu havia mencionado? É, na verdade aquilo estava mais pra um motel mesmo. Você devia ver! Ou… talvez não, eu não sei. Os brinquedos que eu encontrei nas gavetas de cada um daqueles quartos… Oh, meu Deus! Ainda estou em choque. Será possível que antes de toda essa merda haviam pessoas capazes de introduzir aquelas peças tão… tão… ah, deixa pra lá. Eu não posso perder o foco.

        Estou com as mãos apoiadas sobre o guarda-corpo da extensa varanda que compõe o segundo andar desse lugar tão exótico. Não há muitos quartos quanto eu imaginei da primeira vez, mas isso não vai ser um grande problema. O meu corpo ainda dói, não tanto quanto as minhas mãos especificamente, mas ainda assim é uma dor considerável. Hoje, matei a minha primeira aberração e quase fui morto em seguida… duas vezes! Quem diria! Uma situação como essa não deve ser facilmente encontrada pelo mundo afora. É curioso. O mundo se deixou levar por esse vírus assim como a nossa pequena cidade? Eu gostaria de ter esperanças.

        — Ei! — Catarina se aproximou ao subir as escadas ao ar livre, segurando dois copos brancos. Acho que ela havia dado algum jeito de quebrar uma daquelas máquinas de café da recepção. Aquilo deveria estar quente por causa da fumaça que escapava de sua beirada mal tapada pelo plástico. Como ela esquentou isso? — Você deveria beber um pouco disso!

        Sua voz estava meiga, mesmo com o extremo frio daquela noite calma e nem um pouco ventosa. Eu refletia bastante à medida em que seu corpo se aproximava. Era impressionante. Às vezes aquela garota mudava o seu comportamento drasticamente em questão de pouco tempo, como se nada tivesse acontecido. Eu me pergunto se aquilo era saudável, quer dizer, havíamos brigado pela manhã, saqueados logo em seguida, quase perdemos nossas vidas pela tarde e agora ela está me servindo um copo de café com um grande sorriso no rosto? Isso… não pode ser tão saudável para uma menina de apenas quatorze anos. Eu não digo isso pelo fato de ser apenas um ano mais velho que ela, e isso não importaria em nada, mas digo porque realmente me preocupo. Será que todo aquele tempo em Madrid foi o suficiente para mudá-la tanto assim?

        — Toma! — Ela me entregou um dos copos antes de se virar para a paisagem oferecida pela varanda. Logo, ajeitei a posição do meu corpo para que pudesse tomar aquela bebida quente ao seu lado. Aquela me pareceu a melhor hora para que finalmente pudéssemos nos resolver.

        Conseguíamos enxergar, mesmo sem qualquer luz que sustentasse os fios de energia da cidade, uma grande parte das construções que compunham o seu centro, iluminada pela luz fraca do luar daquela noite.

        — Onde arranjou aquela arma? — Falei sem pensar. A minha curiosidade não se desagarrava tão fácil e a minha ansiedade se afogou na bebida quente. Que droga, por que ainda me envergonho dessa maneira? É… só uma pergunta para a minha irmã! Eu não preciso temê-la sempre. Ah…

        — É sério que essa foi a sua primeira pergunta depois de tudo o que houve? — Ela riu, debochando enquanto bebia, chegando a me dar um leve empurrãozinho no ombro antes de me continuar com a sua fala. — Estava com ela desde Madrid. Eu não queria colocar nenhuma pressão sobre você. Eu só… a guardei para uma situação de extrema emergência. O que importa é que… no fim… tudo deu certo, não é? Pelo menos até agora. O senhor Dawn e o outro cara, o Joffrey, eles não parecem serem tão babacas quanto eu achava.

        — Ah, já sabe até o nome deles agora? — Sorri.

        Pois é. A minha irmã abaixou a arma naquele instante, arriscando as nossas vidas e as colocando nas mãos daquele musculoso, o dito Joffrey aparentemente, que repetiu o gesto e nos ofereceu uma trégua junto com o seu amigo barbudo e mal encarado. Me desculpe, mas eu não vou conseguir parar de xingá-lo em minha mente enquanto ele não provar não ser um grande filho da puta do caralho. Qual foi? Ele queria que eu tirasse a porra das minhas calças! Ah, que ódio! Eu preciso me acalmar. Preciso terminar de tomar esse café quentinho.

        — Eles não são maus, Tom. Eles só estavam se protegendo. Assim como eles eram desconhecidos para nós naquele momento, também éramos desconhecidos para eles. Você precisa se acalmar um pouco.

        — Ele ia me fazer ficar pelado, Catarina! — Nem me esforcei em conter a minha raiva.

        Ela suspirou, terminando de beber todo o café do seu copo. Logo depois, ela o arremessou contra uma lata de lixo há alguns metros abaixo, me respondendo a seguir:

        — Você havia acabado de sair de um combate corpo a corpo contra três daquelas criaturas. Antes de mais nada, ele precisava ter a certeza de que você não havia sido mordido ou arranhado em qualquer parte do corpo. As pessoas não saem por aí confiando umas nas outras como antigamente, Tom. Você já pensou em se colocar no lugar do senhor Dawn naquela situação?

        Ela retirou os bruços do guarda-corpo, alinhando retamente a própria coluna.

        — Bom, ainda assim eu não pediria para que um garoto de quinze anos abaixasse as próprias calças se eu fosse a porra de um velho ranzinza e cabeça quente. — Finalizei o copo de café e também arremessei naquela mesma lixeira, acertando em cheio diferente da tentativa de minha irmã.

        — Tudo bem, Tom. — Ela se virou, passando a caminhar de volta às escadas. — Que se foda você e a sua ignorância.

        Uau… Pensamentos invadem a minha cabeça enquanto a vejo indo embora mais uma vez. Espera… Não é possível que eu tenha estragado as coisas mais uma vez. É, eu estraguei, não é? Quer dizer, eu tenho a droga do meu ponto de vista! Eu tenho o direito de pensar da minha maneira! Estaria eu, ainda assim, sendo apenas mais um ignorante? Ah… Eu não sei se vou conseguir aguentar isso por muito tempo.

        Optei por observar aquela paisagem mal iluminada por um pouco mais de quarenta minutos, refletindo em algumas cenas do meu passado e das decisões que haviam me dado a chance de chegar até ali, bem ali mesmo naquela varanda, antes de voltar para o interior do motel. Eu precisava escolher. Tomar alguma postura.

        O tempo se passou e eu me encontrava em uma parte do corredor sombrio do primeiro andar do motel. Meu relógio apitou por cinco vezes consecutivas. Eram onze horas e meia da noite. Eu havia configurado um tipo de alarme silencioso para indicar o quão tarde já estava caso ainda estivesse acordado fazendo qualquer tipo de besteira. Pois é. Eu ainda estava acordado e prestes a topar com aqueles dois estranhos que me apontaram as suas armas há apenas algumas horas atrás.

        Depois de atravessar um brilho sutil que vinha da cozinha do motel, cruzei com algumas mesas e cadeiras esparramadas pelo cômodo sujo e empoeirado. Eu podia ver a alegria de Catarina ao se debater com os dois estranhos. Eles degustavam algum tipo de carne ao molho em seus pratos, sentados em uma mesa forrada com um pano limpo e duas velas em forte brasa. Havia uma janela aberta ao lado, que permitia a visualização de todos os cantos do estacionamento daquele estabelecimento. Havia uma panela em uma das mesas ao lado.

        — Ei! Olha só quem chegou! — Disse o tal senhor Dawn, se levantando para me receber com um sorriso amargo. Era claro que ele tentava se reconciliar pelas suas atitudes. Eu deveria reconhecer aquilo? Talvez seja a minha hora de desconfiar agora. — Eu sabia que você não resistiria ao belo cheiro do meu cozido!

        O senhor Dawn puxou a cadeira que havia reservado para mim naquela mesa, esperando que eu aproximasse e me sentasse para que finalmente nos reuníssemos. Eu não tive problemas em “seguir o script”, afinal, deveria me enturmar de qualquer forma por causa da minha irmã. Eu não poderia deixar que eles a convencessem uma hora de que eu não passava de uma carga viva. É egoísta pensar assim? Eu não sei se me importo.

        Ao me sentar, Joffrey me entregou talheres limpos enquanto o senhor Dawn já me servia com um prato de pedaços de carne. Eu não vou mentir: na primeira garfada, pude me contagiar com a alegria de Catarina.

        — Isso é… divino! — Foram as minhas palavras depois de experimentar aquilo. — Onde encontraram isso?

        — O que? Foi o nosso grande “chef Dawn” quem preparou isso! — Catarina esbanjou uma felicidade sem tamanho ao realizar tal comentário, enquanto cortava um dos pedaços de carne do seu prato.

        Joffrey riu, ainda que estivesse com a boca cheia, mastigando e me observando atentamente.

        Depois de algumas conversas jogadas fora e alguns minutos passados, o senhor Dawn se desculpou pelas atitudes de algumas horas mais cedo. Aquilo me pareceu sincero. Muito sincero para falar a verdade. Quanto ao Joffrey, ele não parecia tão condizente com a seriedade que o velho carregava consigo. Era como se a sua presença fosse algo brutal e desprovida de qualquer intelecto. Eu não tenho certeza! São apenas achismos! Eu só estou relatando as minhas primeiras impressões, não é nada demais!

        — Ah… eu mal consigo me lembrar da minha vida antes de tudo isso… é como se toda essa merda já tivesse me consumido por inteiro, sabe? — Comentava o senhor Dawn. Confesso que não havia prestado atenção na conversa daqueles três enquanto refletia em meus próprios pensamentos. Mas aquela fala realmente chamou a minha atenção. — Ainda penso se o ato de sobreviver realmente vale todo esse desgaste e esforço…

        — Aposto que você deveria ser feliz antes de tudo isso! — Comentou Catarina. — Porra, quem não amaria desfrutar da vida enquanto tivesse um dos melhores cozinheiros do mundo ao lado?

        O senhor Dawn passou a rir e beber do vinho da garrafa que escondia entre as pernas à medida que dizia:

        — Você tem razão, garota. Eu não poderia me considerar como um dos melhores cozinheiros do mundo… mas eu realmente sabia me virar. Tenho certeza de que a minha mulher e a minha filha nunca se arrependeram de cada dia único que elas viveram. Sabe, depois de tudo isso, é como se a vida realmente tivesse perdido seu sentido. Elas haviam se tornado a minha razão de viver e… de repente… tudo aquilo se acabou. Ainda consigo me lembrar do cheiro exato de cada uma delas. Sabe, não é muito difícil, já que a garotinha sempre roubava um pouco do seu shampoo para tomar banho. Elas eram… literalmente o meu mundo… — Agora, ele enxugava algumas lágrimas. — É… Eu não sei… Droga… de onde tenho tirado tanto esforço para sobreviver sem aquelas duas gracinhas. Talvez tudo isso tenha sido por elas… até agora… Me desculpem pelo desabafo…

        — Tá… tudo bem… — Catarina tentou o confortar, colocando a mão sobre seu ombro.

        Eu não me lembrava da última vez que havia visto um desabafo tão real sobre esse mundo pós-apocalíptico de merda. Eu não me lembrava da última vez que havia visto outra pessoa chorar além da minha irmã. A carne já não estava mais tão saborosa depois daquela história deprimente. É impressionante o quanto a minha mente se deixa abalar por esse tipo de coisa. Eu deveria me deixar simpatizar pela história desse homem?

        — Sinto muito, senhor Dawn… — Falou Joffrey, de repente. Ele já havia acabado de se alimentar há algum tempo. Era muito estranho o fato de estarmos lidando um com o outro de maneira tão próxima como se aquilo se tratasse de um jantar em família ou algo do tipo. Pelo menos essa era a minha sensação.

        — Todos nós perdemos pessoas importantes, senhor Dawn. Nós sabemos e reconhecemos a sua dor, tenha certeza disso! — Falava Catarina. — Mesmo que nenhuma outra pessoa seja capaz de entender o seu tipo de dor exatamente, saiba que ainda existem muitos outros pilares ao qual você pode se apoiar. Sabe, ainda deve existir algum lugar por aí… algum lugar onde possamos recomeçar.

        — Tá falando do “Porto”? — Relanceou Joffrey.

        — Han? — Minha irmã largou os talheres, curiosa dessa vez. Ela não consegue se concentrar em qualquer outra coisa quando se interessa muito por algum assunto. Entenda, sempre foi assim.

        — O Porto Seguro de Valência. — Complementou o senhor Dawn, agora com um sorriso esperançoso em sua face. — “Um lugar para sobreviventes”. Localizado na extrema baía de Valência, uma região propícia pra cada ser humano disposto a cooperar para a alta-sustentação do local. Alimentos, abrigo, água. Parece a terra prometida. Eles têm até a porra de barcos para aqueles que estiverem dispostos a se arriscarem pelo mar afora na tentativa de buscarem uma terra não afetada pelo vírus ou qualquer tipo de ajuda.

        — Já ouvimos falar desse tal Porto… — Encarei Catarina, que voltou seus olhares a mim. — Dan e Olívia haviam comentado sobre isso, você não lembra?

        — Dan e Olívia? — Questionou Joffrey. Mas eu simplesmente o ignorei.

        Logo, Catarina retrucou o velho:

        — Você sabe de muita coisa do local para soar apenas como um boato. Fala como se já estivesse lá.

        — E eu estive. — A fala do senhor Dawn foi inesperada, surpreendendo até mesmo a minha irmã. — Nossa, aqueles foram os melhores meses de nossas vidas, não foram, Joffrey?

        — O que? Você e o Joffrey estiveram no Porto? — Perguntei inativamente.

        — Essa não é a questão mais importante… — Catarina me interrompeu. — Por que caralhos saíram de lá?

        Com direito a mais um gole da garrafa de vinho, o senhor Dawn prosseguiu:

        — Como eu disse, garota. É um lugar onde cada ser humano é bem-vindo caso esteja disposto a cooperar com qualquer tarefa que seja de uma causa nobre… para que o seu funcionamento se mantenha a todo vapor.

        — Eu vou repetir: por que caralhos vocês saíram de lá?

        O senhor Dawn bufou.

        Não era como se ele estivesse com medo de responder à pergunta ou se quisesse ocultar algo. Era estranho. Talvez estivéssemos sendo enganados de uma maneira tão brilhante que mal desconfiávamos àquela altura da conversa. Era bem possível, não? Mesmo assim, eu estava ansioso pela sua resposta.

        — Fomos encarregados de realizar uma missão no exterior do Porto há cerca de dois meses atrás. A missão era muito simples na verdade: recuperar um gerador de energia que havia sido largado pelos responsáveis do Porto em uma cidade próxima ao Norte de Madrid. A viagem não duraria nem dois dias e logo estaríamos de volta, com nossa lealdade comprovada e praticamente adeptos ao local. Mas, o pior aconteceu.

        Notei que Joffrey criava uma expressão de receio à medida que o senhor Dawn relatava a sua versão:

        — Depois que localizamos o gerador de energia e o recuperarmos, fomos cercados por uma horda daquelas criaturas que vagam pelos extremos de Madrid. Dirigíamos uma enorme van vermelha e estávamos no total de seis pessoas. Porém, em um momento de muito nervosismo, o nosso motorista perdeu totalmente o seu controle e nos enfiou em um grave acidente, explodindo o gerador depois de alguns segundos.

        — Desde então, vocês têm sobrevivido até aqui? — Catarina estava boquiaberta.

        — Sim.

        — As outras quatro pessoas morreram no tal acidente? — Não hesitei em questioná-lo.

        — Não exatamente. O motorista e outra pessoa morreram instantaneamente quando chegamos até a avenida principal de Madrid, ocupada por carros já enferrujados e que apenas atrapalhavam o seu fluxo. Outra havia se acidentado gravemente e, devido aos seus ferimentos, decidiu se sacrificar para ganhar um pouco de tempo para a nossa fuga. Já a quarta… bom… essa foi o que nos transformou por completo. Depois de um confronto contra aquelas aberrações em uma certa noite, decidimos descansar em uma loja de conveniência há cerca de um mês atrás. Bom, eu não sei se sou apenas um sortudo ou se o meu “instinto” de sobrevivência é tão afiado quanto uma faca…, mas eu me lembro até agora de acordar exatamente no mesmo instante em que aquele cara estava prestes a me atacar. Ele havia se transformado em uma aberração e nem havia nos dito ou demonstrado qualquer sintoma que levantasse alguma suspeita. É por isso que depois do que aconteceu mais cedo, eu pedi para que tirasse as suas peças de roupas.

        — Você precisava mesmo ter pedido para que eu tirasse as minhas calças?

        Ele riu outra vez e não me respondeu, tomando o restante daquele vinho.

        Passamos duas horas conversando sobre os mais diversos assuntos depois daquilo.

        Talvez Catarina tivesse razão. Eles não eram tão maus como imaginei. Mas, mesmo assim, eu não deveria deixar de continuar com a minha desconfiança, mesmo que mínima. Eu também não me lembrava de a ver tão feliz e tomada por risadas espontâneas como naquela noite em especial. Era um momento mágico dentre todos os episódios daquela merda de pesadelo. Algo único.

        Joffrey já havia se despedido há meia hora atrás e se levantado para subir as escadas. Ele só pegou alguma das chaves dos quartos do andar de cima e caminhou lentamente até que sumisse do nosso ponto de vista.

        Lembro daquela conversa terminar da maneira mais trágica e constrangedora possível. Ah, meu Deus, como eu poderia me esquecer daquele momento tão vergonhoso?

        — E quanto a você, Tom? — Perguntava o senhor Dawn depois da sua terceira garrafa de vinho. — Aposto que você fazia o maior sucesso com as garotas na sua escola! Você deveria arrebentar, garoto!

        Em primeiro lugar, eu não sabia o que responder para o velhote… já que… já que…

        — O Tom é gay, senhor Dawn. — Respondeu minha irmã, friamente. Pois é. Eu fiquei tão envergonhado naquele momento que mal sabia para onde olhar. A sensação de raiva pela revelação da minha irmã não foi o suficiente para que eu surtasse completamente. Eu só… me mantive intacto… como uma pedra.

        — Ah… — Mesmo bêbado, o senhor Dawn aparentou ter algum mínimo senso quanto à conversa e também aos meus sentimentos. — Eu acho que… sabe… já está muito tarde…

        — É claro… — Catarina agiu naturalmente.

        O senhor Dawn se levantou, bambeando-se entre as cadeiras e pondo-se a caminhar até o corredor escuro.

        — O senhor precisa de ajuda? — Ofereceu ela.

        — Não! É claro que não! — É claro que um velho ranzinza recusaria qualquer tipo de ajuda. Eles se acham independentes demais para passarem por esse tipo de situação. Tá! Talvez… eu tenha o xingado por causa da sua pergunta. Que droga… Por que estou pensando dessa maneira? Ele nunca poderia desconfiar da droga da minha sexualidade… Catarina, por que você tem que estragar tudo… sempre!?

        — Ah… garotos… — Dizia o senhor Dawn, antes de abandonar a cozinha do motel. — Pensem com carinho na nossa proposta, por favor. O Porto… talvez seja a última esperança que tenha nos restado nesse lugar.

        — Claro, senhor Dawn. — Catarina ainda agia naturalmente!

        O velho sorriu antes de nos desejar uma ótima noite e abandonar o local.

        As velas da mesa quase se apagavam devido à pouca cera que lhes restavam.

        — O que você acha, Tom? — POR QUE ELA AINDA CONTINUA AGINDO NATURALMENTE!?

        Bati na mesa levemente, passando a língua sobre o meu lábio inferior e a encarando:

        — Por que você disse aquilo, Catarina?

        — Hum!? — Agora ela está se fazendo de desentendida. — Eu não entendo, Tom. Você não havia dito que eu deveria lidar com esse seu lado da maneira mais natural possível há alguns meses atrás?

        — Eu… eu disse! Mas não é pra você sair por aí falando sobre os meus assuntos íntimos!

        — Isso não vai fazer nenhuma diferença, Tom. Nós temos questões mais importantes para discutir.

        Que raiva dessa garota! Eu não posso esganá-la! Não posso esganá-la! Preciso continuar a repetir! Eu não posso esganá-la! Não posso esganá-la! Ah! Eu não posso…

        — Tom!? — Ela colocou a mão sobre a minha mão direita, me confortando de alguma maneira. — Tá, me desculpe. Eu exagerei. Eu só acho que… me empolguei a ponto de considerar o senhor Dawn como um novo amigo ou sei lá o que… Eu não me sinto tão acolhida assim desde… você sabe… Dan e Olívia…

        — Ah… Está tudo bem! — É claro, como eu poderia esquecer? As pessoas sempre tem o seu lado. Eu não gosto nem um pouco do ser humano que tenho me tornado desde a saída de Madrid. Estou me esquecendo do “básico” das maneiras para se lidar com qualquer outro ser humano? As pessoas tem sentimentos, droga!

        Catarina aproveitou do fato de nossas cadeiras estarem praticamente coladas e girou o seu corpo para que me abraçasse fortemente, cruzando os braços sobre as minhas costas. Com a sua bochecha grudada em meu pescoço, ela se manteve naquela mesma posição por dois minutos completos. Me senti confortável para passar a acariciar uma parte de seus cabelos. Eu só queria a confortar de alguma maneira.

        — Tom, você acha que o Porto é uma boa ideia? — Sua pergunta coincidiu com o apagar de uma das velas.

        Com a iluminação comprometida e a um passo de escolher o nosso destino, resolvi refletir por cerca de dez segundos antes de respondê-la. Eu conseguia sentir as suas unhas afiadas sobre as minhas costas. Minha blusa estava rasgada devido aos acontecimentos de mais cedo, não se lembra? Eu juro que amanhã vou arranjar um novo modelo… talvez algo social combine com essas calças jeans…

        Depois de retirar uma das mãos de seus cabelos, passei a acariciar as suas costas suavemente, a respondendo com um tom sutil e convincente:

        — Acho que é a nossa melhor opção no momento.

        Consegui sentir o aliviar da sua respiração forte contra o meu peito após a minha resposta, seguido de um sorriso com os lábios encostados no meu corpo. Às vezes me esquecia o quanto aquela garota se sentia segura mesmo perto de um covarde como eu. Era inexplicável. O seu amor era intrigante e inexplicável.     Logo, a chama da segunda vela se apagou.

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