Capítulo Extra 48 - Izanamou, a Calamidade Primoridal
Herman estava sentado dentro de um helicóptero militar, o olhar distante e focado em seus próprios pensamentos. Estava totalmente alheio ao que acontecia ao seu redor, seu único foco era aquele pequeno artefato em suas mãos.
A aeronave era parte de um pequeno esquadrão aéreo composto por seis helicópteros de hélice dupla, todos carregados com os mais exóticos artefatos mágicos roubados do cofre celestial. Estavam estacionados na borda de uma das metades da ilha, uma área onde a neblina negra de Judas Imortal ainda não havia chegado. As hélices giravam lentamente, enquanto as últimas cargas eram apressadamente colocadas a bordo.
— Tem certeza de que Judas pegou ele? — perguntou Yoou, encostado na lateral do helicóptero, olhando para Lótus, sentada ao lado de Herman.
— Eu vi com meus próprios olhos — respondeu Lótus, com um tom frio e irritado. — Aqueles tentáculos malditos o agarraram. Se não estiver morto agora, é só questão de tempo. Nunca deveríamos ter enviado Sedenta para procurá-lo…
— O Escriba disse que ele estava com um grupo de heróis. — A voz de Pacificador cortou a conversa, enquanto ele permanecia na entrada do helicóptero, em sua forma humana. Ele mordia tranquilamente um sanduíche de mortadela. — E o Escriba nunca erra.
O rugido ecoou ao longe, baixo, todavia, o suficiente para que o grupo o escutasse.
— ‘Olho do Tigre’… — afirmou Yoou, ao voltar o olhar para a névoa.
— Isso é obra daquele garoto? — Pacificador terminou o sanduíche e limpou o rosto com a manga de seu uniforme, sua expressão refletindo tanto curiosidade quanto ceticismo. — Nunca ouvi algo assim antes.
— Ele conseguiu concluir um ritual de fusão? — retrucou Lótus, em tom ácido, um leve sorriso de desprezo curvando seus lábios. — Seja como for, precisamos sair daqui o mais rápido possível.
— Não sem a Sedenta. — Yoou interrompeu, firme. — Precisamos esperá-la.
Herman permanecia em silêncio, com a pequena ampulheta nas mãos. Ele a girava cuidadosamente, seus olhos fixos no artefato enquanto tentava decifrar como aquilo funcionava. A peça era intrigante em sua simplicidade, algo incomum para um artefato mítico, possuía vidro liso, sem adornos, exceto por uma marca em relevo no topo, como se uma peça estivesse faltando.
— Lótus, quero que seja sincera. — Herman quebrou o silêncio pela primeira vez, porém sem tirar os olhos da ampulheta enquanto falava. — Você acha que o garoto tem alguma chance contra Judas?
Lótus soltou uma gargalhada amarga, cruzando os braços enquanto relembrava a cena de Vítor sendo capturado.
— Sincera? — perguntou, a risada ainda engasgada em sua garganta. — Aquele garoto não conseguiria lidar nem com o ‘Olho do Tigre’, quem dirá com Judas. E mesmo que, por um milagre, ele sobreviva a Judas, ainda existem os escravos do trabalho. Uma horda deles acabaria com ele em segundos.
— Então, se não foi ele quem fez um ritual de fusão com a calamidade, isso significa que outro alguém conseguiu. E, nesse caso, teremos problemas muito maiores do que Judas — concluiu Herman, ao desviar o olho pela primeira vez do artefato e encarar Lótus, para confirmar a resposta dela.
— A única coisa que importa agora é irmos embora, entendeu? — rebateu Lótus, em um tom ríspido. — Esqueçam a Sedenta. Ela encontrará outra maneira de voltar. Nós é que precisamos encontrar a nossa.
Maria, também conhecida como Dragonslayer, se manifestou, apoiada na lateral de um dos helicópteros.
— Concordo com ela, minha mãe pode chegar a qualquer momento e estragar tudo.
Suas palavras foram seguidas por um sinal de concordância do restante do grupo. Todos sabiam da gravidade das coisas caso uma deusa chegasse na cidade celestial em meio a todo aquele caos.
Uma leve brisa começou a circular ao redor do grupo, e páginas soltas eram levadas pelo vento. Então, o redemoinho tomou uma forma distinta, os papéis parecendo se fundir em algo maior, mais sólido. Quando o movimento cessou, minha figura humana se manifestou.
— Podem ir embora. Estão liberados — falei para eles, enquanto abria um livro número com XLII na capa. — A missão foi concluída com êxito.
— Como assim, velhote? Concluída? — Yoou levantou a voz, desconfiado.
— Concluída — reafirmei, ao encará-lo de volta, Yoou se encolheu e desviou o olhar. — Agora, por favor, a ampulheta, Erobern precisa dela.
— Antes de entregá-la, eu tenho perguntas. — Herman balançou o artefato na minha frente.
— E eu tenho as respostas, mas este não é o momento para elas — respondi, ao me aproximar para pegar o objeto. — Entregue a ampulheta, e podemos conversar isso mais tarde, sim?
Herman levantou a mão, como se fosse entregar o artefato, mas hesitou no último instante. Antes que pudesse tomar qualquer decisão, um segundo rugido ecoou pelo ar. Esse som não era apenas maior que o primeiro; era diferente, gutural e profundo, claramente vindo de uma calamidade. Era uma terceira criatura.
— Quem é dessa vez? — Yoou perguntou, seus olhos arregalados enquanto varria os arredores com o olhar.
Eu não tive tempo para explicações. A gravidade da situação se tornou clara em um instante.
— Vão embora… Agora! — gritei, minha voz carregada de um medo que nem tentei disfarçar.
A ordem, por mais abrupta, foi suficiente para fazê-los agir. Nenhum deles se atreveu a questionar. Suas expressões estavam congeladas em puro choque enquanto corriam para as aeronaves e se preparavam para partir.
— O que pode ser pior que Judas? — murmurou Pacificador enquanto lutava para ajustar o cinto de segurança, suas palavras dirigidas mais ao ar do que a qualquer um.
Antes que alguém pudesse responder, uma visão surreal emergiu da névoa: centenas de libélulas gigantescas. Elas surgiram em um enxame frenético, voando em direção ao esquadrão. O som de suas asas era ensurdecedor, como o zumbido de máquinas colossais.
Para o alívio momentâneo de todos, elas não atacaram. Passaram por nós como uma corrente de vento, sem demonstrar nenhum interesse. Era evidente que nós não éramos seu alvo. Elas fugiam. E o que quer que as estivesse perseguindo… era algo muito maior.
Da neblina, então, ele surgiu. Tinha pelo menos dois metros de altura, um corpo humanoide com seis braços, cada um com duas mãos, e quatro grandes asas de mariposa. Não possuía olhos, nem nariz, a parte frontal do seu rosto, era composto por uma espécie de capacete negro, sua boca borbulhava de um líquido branco, que pingava no chão e fazia ele derreter. Tinha a textura de um grande inseto, sem pele, e composto apenas por um esqueleto esterno como uma carapaça.
— Você não vai passar por mim… — declarei, posicionando-me diante dela. Ao meu redor, os meus papéis começaram a se unir, e eu os moldei em uma armadura que cobria meu corpo.
Um leve sorriso surgiu em seus lábios, um gesto que exalava satisfação, como se tivesse finalmente encontrado o que procurava. Ela girou suas mãos, e em cada uma delas, uma espada de ossos tomou forma.
— Izanamou… — murmurou a criatura, sua voz rouca e profunda, reverberando no ar como um trovão abafado. — Izanamou! IZANAMOU! — gritou, sua voz crescendo em intensidade enquanto erguia os braços e as espadas para o alto.
Apenas confirmou algo que eu já sabia no momento que eu a vi. Izanamou, a lendária criatura de Erobern, outrora o guarda-costas pessoal do grande Imperador da Glória Eterna. Também conhecida como “A Vingança do Imperador”, “A Colecionadora de Cabeças”, ou simplesmente “Izanamou, a Calamidade Primordial”.
Eu mesmo havia testemunhado sua queda diante da aliança dos vinte reis na Batalha de Bluntinsel, quase seis milênios atrás. Agora, ela estava de volta, embora diminuída. Em sua glória original, Izanamou era colossal, quase doze metros de altura. Embora sua forma parecia menor, compacta, isso não significava que ela não era perigosa.
Antes que pudesse criar alguma teoria de sua volta, ela avançou contra mim. Seus braços giravam as espadas em um movimento rápido e mortal, cada golpe com força suficiente para despedaçar aço. Segurei o primeiro ataque com a palma da mão, em um esforço colossal que eu havia desacostumado a usar. Não tive reação para desviar do segundo golpe. Um soco no estômago me forçou de joelho ao chão.
— Por que luta contra mim? O que você quer? — questionei, cuspindo sangue pela primeira vez em séculos, apesar de imortal, eu ainda podia ser ferido.
— Izanamou… — repetiu ela, apontando para o helicóptero de Herman, que já ganhava distância no horizonte.
— Nem brincando! — exclamei, limpando o sangue do rosto enquanto me levantava, a determinação voltando ao meu corpo. — Posso estar enferrujado, mas não esqueci nenhuma das cinco técnicas lendárias de Erobern. Pode vir…
Assumi uma postura de combate, a energia ao meu redor começando a se condensar. Mas, para minha surpresa, a criatura apenas sorriu novamente. Em vez de avançar, ela me ignorou por completo, e encarou o grupo de helicópteros.
Ela ergueu os braços com um gesto imponente, e o helicóptero simplesmente parou no ar, como se preso por uma força invisível. Izanamou começou a caminhar em direção à aeronave, seus passos lentos. No entanto, antes que pudesse alcançá-la, uma figura despencou do helicóptero em sua direção.
Herman desceu em um movimento rápido e preciso, as lâminas de suas adagas duplas reluzindo. Em um único golpe ágil, ele cortou um dos braços de Izanamou, que caiu no chão com um som surdo.
— Vamos te mandar de volta para onde você nunca deveria ter saído, verme! — Herman posou no chão, sem nenhum arranhão. Ele encarava Izanamou com uma determinação única dele.
Para surpresa de Herman, a criatura sorriu, não se intimidou, nem demonstrou raiva por sofrer tal golpe humilhante.
— Izanamou… — murmurou novamente, e apontou para o novo desafiante, em aceitação a provocação.
O ferimento em seu braço parecia insignificante. Em questão de segundos, um novo braço surgiu, sólido e funcional, uma demonstração impressionante de suas capacidades regenerativas.
— Dezesseis Caminhos para o Paraíso, Caminho Número Nove: Eletricidade! — minha voz ecoou atrás de Izanamou. Levantei a mão em direção ao céu, e um relâmpago colossal rasgou as nuvens, e caiu com uma força descomunal diretamente sobre a criatura.
A luz cegante e o estrondo ensurdecedor dominaram o ambiente. Herman, instintivamente, saltou para trás, protegendo os olhos com o antebraço para evitar ser ofuscado pelo clarão intenso do raio. O ar ao redor crepitava com energia, enquanto o impacto sacudia o chão como um trovão vivo manifestado.
Quando a fumaça finalmente se dissipou, meus olhos fixaram-se na enorme cratera aberta no chão. No centro dela, para meu desgosto, estava Izanamou. Intacta. Nem um único arranhão marcava sua carapaça reluzente.
— Izanamou… — Ela soltou uma gargalhada rouca, em um tom de zombaria. Era evidente que meu ataque havia sido completamente ineficaz.
Eu sorri de volta para ela. O peso de uma batalha real, o desafio genuíno, algo que há séculos não experimentava, agora ardia dentro de mim como uma chama reacendida. Apesar da ameaça que ela representava, eu sentia uma satisfação enorme ao enfrentar um oponente digno do meu verdadeiro poder.
Izanamou | |||
Afiliação | Nenhuma | Raça | Humano-Calamidade Ascendido |
Alcunha | Calamidade Primordial | Técnica Especial | ‘Pela espada na minha mão’ |
Pela espada na minha mão | |||
Capacidade Ofensiva | A | Capacidade Defensiva | A |
Alcance | Irrelevante | Resistência | S |
Versatilidade | C | Velocidade | C |
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