Capítulo 190: Retome!
Dante desceu a mão. O ar pareceu se rasgar com o peso da força bruta. O impacto viria como um trovão, um golpe capaz de quebrar ossos e apagar vidas. Mas, no instante antes de seus dedos tocarem a pele de Clara, algo se enroscou em seu pulso. Fino como seda, mas forte como aço.
Um fio azulado, cintilante sob a luz pálida, serpenteou ao redor de sua mão e o puxou para o lado. Seu golpe desviou do alvo e encontrou outro — o peito do primeiro guarda, que sequer teve tempo de gritar. O corpo foi lançado pelo ar como uma boneca de trapo, colidindo contra o Arco de Vidro com um estalo surdo. O vidro tremeu, mas foi a carne que cedeu primeiro. O impacto estraçalhou ossos, e o homem caiu como um pedaço de carne morta, a cabeça tombando para o lado, os olhos sem vida. Sangue escorria de seu nariz, formando um fio grosso e escuro.
Dante seguiu a linha do fio azul até seu ponto de origem. Lá estava ele. Heian Cerberus. Os olhos de Maethe se arregalaram por um breve instante antes de sua expressão se tornar gélida. O homem de fios brilhantes manteve-se parado por um momento, avaliando a cena com um olhar analítico. Então, sem hesitação, desfez os fios e saltou. Seu corpo desapareceu na escuridão do céu, como se nunca tivesse estado ali.
Maethe apertou os dentes.
— Acabe com ela — ordenou, apontando para Clara. — Você também.
O soldado vacilou. Seu rosto se contraiu de incerteza, e sua mão suada deslizou até o cabo da espada. Mas o medo fez seus dedos errarem o encaixe, e a lâmina permaneceu embainhada. Ele tentou de novo, desesperado, mas seus dedos escorregaram. — Agora, seu inútil! — Maethe gritou.
Mas então, o som seco de algo se partindo no ar ecoou pelo salão. O homem gritou. Fogo. Uma labareda repentina irrompeu em suas costas, engolindo o tecido e a pele em chamas famintas. Ele caiu de joelhos, se debatendo, rolando como um animal encurralado, mas o fogo era impiedoso. O cheiro de carne queimada preencheu o ar. Os gritos duraram alguns segundos. Depois, apenas o crepitar das chamas.
Clara caiu. Seus joelhos cederam, o corpo esgotado demais para continuar lutando contra a gravidade. Sua respiração vinha curta, e seu peito subia e descia de forma errática.
Maethe respirou fundo. Ela ainda tinha a vantagem. Ainda tinha as mãos livres. Ainda tinha Dante sob controle. Ainda podia acabar com Clara Silver.
Os soldados haviam se mostrado inúteis, mas isso não importava. A vitória estava ao alcance de seus dedos. Sua mão mergulhou no vestido. E encontrou o cabo de uma adaga. A lâmina era fina, letal. A mesma que a havia acompanhado até o topo de GreamHachi. A mesma que faria com que permanecesse ali. Sem hesitação, ela avançou.
A lâmina cortou o ar em um arco prateado, buscando o pescoço de Clara. Mas então, uma luz branca brilhou atrás dela. Algo atravessou a escuridão—rápido, afiado, mortal. A lâmina que vinha em direção ao pescoço de Clara foi interrompida por outra, surgindo das sombras como um fantasma.
Maethe arregalou os olhos. Ela viu a lâmina vindo e desviou no último instante, jogando-se para o lado. O fio de metal cortou o ar, faltando milímetros para abrir sua garganta. E então, ele emergiu.
Das sombras projetadas pela própria mulher, um homem se ergueu. Leonardo Vulkaris. Seus olhos eram os mesmos de sempre: frios, calculistas. Um espadachim aposentado, vestido com a praticidade de um guerreiro que nunca deixou de lutar. Seu semblante era o mesmo que havia usado quando arrancou Vinigo Phios dos portões de GreamHachi.
— Parece que você está com pressa demais.
A lâmina cortou o ar de novo. Maethe se moveu, mas desta vez, a lâmina de Leonardo quase encontrou seu ombro. Centímetros. Apenas centímetros. E então, ela parou. Trancada no ar, como se tivesse sido agarrada por dedos invisíveis.
Maethe sorriu.
Leonardo manteve a espada firme entre os dedos, mas sentiu o impacto quando Maethe empurrou a lâmina para trás, obrigando-o a recuar. Seu olhar, afiado como o fio de sua arma, não desviou dela.
— Esqueceu quem eu sou, Leonardo? Acha que minha habilidade se resume a Controle Mental? — A voz de Maethe era como seda rasgada, macia na superfície, mas cortante nas entrelinhas.
Então, com um movimento rápido, ela ordenou:
— Senhor, mate Clara Silver. Agora.
Leonardo girou a cabeça por um instante. Apenas um. O suficiente para Maethe atacar. A adaga deslizou entre seus dedos, um lampejo prateado contra a luz fria da noite. Ela não precisava de força, apenas precisão. Um único golpe bem-sucedido, e teria o prazer de espalhar sua vitória por toda Kappz.
Mas mesmo um espaço curto podia ser a diferença entre a vida e a morte.
O disparo cortou o ar como um trovão. O projétil encontrou a lâmina da adaga, ricocheteando-a para longe antes que pudesse encontrar seu alvo. O estalo metálico ecoou entre os prédios e deu a Leonardo o tempo de que precisava. Sem hesitar, ele correu na direção de Dante.
Maethe, atônita por um breve segundo, procurou o atirador. Seus olhos varreram os telhados, as janelas escuras das casas, qualquer sombra que pudesse esconder aquele maldito rato.
Outro disparo.
Dessa vez, ela não precisou procurar. A resposta veio de cima.
No topo do Arco de Vidro, sentado sobre um dos cubos translúcidos, uma figura escura puxava a trava da Carabina ISE, preparando-se para o próximo tiro. O metal refletiu o brilho pálido da lua por um instante, um vislumbre prateado no meio da escuridão.
Maethe franziu o cenho, os dentes cerrados.
— Por que vocês… continuam aparecendo como ratos?
Leonardo não esperou por mais nada. Aproveitou o momento e puxou Clara para longe de Dante. Mas a mulher resistiu. Seu corpo estava fraco, os joelhos cedendo, mas sua determinação parecia feita de ferro.
— Precisamos sair daqui — insistiu Leonardo, a voz grave, tensa. — Você não está em condições de andar ou correr sozinha.
— Me leve até ele.
Leonardo a olhou, perplexo.
— Ele quem? — O gosto amargo da incredulidade tomou sua boca. — Está brincando? Dante não está aqui. Não do jeito que você conhece. Maethe usou a raiva dele para assumir o controle. Ele está perdido em algum lugar dentro da própria mente. Se chegarmos perto… nós é que vamos morrer.
Clara, no entanto, não desviou o olhar. Não piscou. Seu rosto estava pálido, o sangue escorrendo de um corte na têmpora, mas seus olhos… seus olhos eram de alguém que já havia tomado uma decisão.
— Me leve até ele — repetiu, com a calma de quem aceita seu próprio destino.
Leonardo viu algo ali que o fez hesitar. Algo além do medo, além do desespero.
Leonardo inspirou fundo, sentindo o peso da espada em sua mão calejada. O frio da lâmina contra seus dedos era uma lembrança do que estava por vir. Seu olhar se fixou em Dante, ou no que restava dele. Os olhos brancos como mármore, o corpo rígido, cada músculo tomado pela força cruel da habilidade de Maethe.
— Espero que saiba o que está fazendo, Clara. — Sua voz saiu como um rosnado baixo, mas não havia tempo para arrependimentos. Ele girou a lâmina no punho, mudando a postura, dessa vez não para defender, mas para atacar.
Ele não queria enfrentar Dante. Sabia que não poderia vencê-lo sozinho. Nenhum deles poderia.
— Heian, Marcus, me deem cobertura. — Ele respirou fundo. — Nós vamos caminhar até o inferno agora!
O silêncio que se seguiu foi quebrado por uma risada.
Maethe deslizou pelos arredores como uma sombra serpenteante, os passos leves, os olhos brilhando com algo que oscilava entre a euforia e a loucura. Caminhava por trás de Dante, os dedos roçando suavemente sua nuca, como se estivesse admirando uma obra de arte recém-criada.
— Isso é um espetáculo. — Sua voz soou divertida, quase sonhadora. — Vamos nos matar, todos juntos.
Leonardo ignorou. Sua atenção estava em Dante, no leve tremor nos dedos do homem, no modo como seus ombros subiam e desciam, como se ainda houvesse algo lutando dentro dele.
— Se ele for forte o bastante… — murmurou para si mesmo. — Esse era o seu plano, não é?
Dante ainda estava lá dentro, ainda existia chance. Ainda existia disputa.
— Eu prometi a Fabiana que nunca mais faria isso. — Leonardo trocou a espada de mão, os músculos do braço tensionando com o movimento. Seu olhar escureceu, a lembrança do passado relampejando em sua mente. Promessas eram como folhas ao vento. Em tempos de guerra, poucas resistiam.
Ele ergueu a lâmina em uma postura diferente, cruzando um dos braços diante do peito, os ombros erguidos para a lateral. Um velho movimento, ensinado por um mestre já esquecido pelo tempo. A postura de um homem que lutava não para vencer, mas para sobreviver.
— Ele ainda é mais forte do que Vinigo ou Remex. — Sua voz soou firme, sem hesitação. O ar exalado formou uma pequena nuvem branca diante de seus lábios. — Então, que seja.
Dante continuava imóvel, mas havia algo sutil em sua respiração. Um leve tremor nos dedos, um espasmo imperceptível nos músculos do pescoço. Como se uma fera acorrentada se debatesse dentro dele, arranhando as grades da jaula.
Maethe sorriu.
— Está pronto para morrer, velho guerreiro?
— Pode vir, bastarda de Yoirichi.
A cara dela afundou em uma raiva sombria.
— Mate ele, agora!
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