Capítulo 193: Acordado
Clara se colocou diante de Dante, o coração martelando contra as costelas. Com cuidado, segurou seu rosto, os dedos trêmulos percorrendo sua pele fria, tentando erguer sua cabeça. Mas seus olhos… os olhos dele estavam tomados por uma névoa branca que oscilava, indo e vindo como uma maré fantasmagórica. Nunca tinha visto nada parecido. O pânico se enroscou ao redor de sua garganta, mas usaria sua habilidade?
Não.
Tirar dele tudo o que construiu ao longo dos anos só para garantir uma chance de saírem vivos? Isso não estava certo.
— Eu disse… — A voz de Maethe reverberou com um poder que fez a terra vibrar. — Nada do que fizerem mudará minha vitória. Eu sou a verdadeira herdeira de tudo o que meus olhos alcançam. E farei com que sintam o desespero.
Então, ela começou a subir.
Os escombros, antes espalhados pela destruição, foram sugados para o ar, girando ao seu redor em um redemoinho violento. Não apenas pedras soltas—os telhados foram arrancados das casas, e os gritos dos moradores ecoaram pelo caos.
As paredes foram puxadas, o concreto inteiro da praça se ergueu como se fosse feito de papel, retorcendo-se em um turbilhão implacável. No alto, os fragmentos se comprimiam em esferas colossais, formando armas de destruição pura. Clara nunca havia testemunhado algo dessa magnitude.
— Clara. — A voz de Leonardo irrompeu através do estrondo ao redor. Ele olhou por sobre o ombro, sem um traço de calma no rosto. — Faça o que for preciso para tirá-lo desse transe. Heian, Marcus e eu vamos atrasá-la o máximo que conseguirmos. Mas traga esse velho de volta.
Ela engoliu seco.
— Como? Eu… eu não sei o que fazer! Ele não me responde!
Leonardo não respondeu, mas também não precisava. O olhar que lançou a ela dizia tudo. A urgência, o medo, a confiança depositada nela.
Eles estavam desesperados.
E, quando voltou a encarar Maethe, Leonardo soltou um longo suspiro.
— Pela minha esposa e minha filha. — Deu um passo à frente, sua voz se firmando como aço. Com um movimento rápido, tirou a capa grossa que cobria seus ombros e a deixou cair. — Pela minha história e por aqueles que confiaram em mim, até que o Destino me tire a vida.
Maethe continuava a rir, um som cruel e reverberante, enquanto sua força se expandia. O poder dela não era apenas um dom—era um colosso devorando GreamHachi, transformando a cidade inteira em sua arma.
Clara segurou Dante com mais força, as lágrimas ardendo nos olhos. Suas mãos tremiam ao apertar seu queixo. A barba por fazer roçou em sua pele, fazendo-a sorrir brevemente, um momento de ternura em meio ao horror.
— Sei que está aí. Sei que pode me ouvir. — Sua voz saiu mais rouca do que pretendia. Ela puxou seu rosto para mais perto, colando suas testas. — Me perdoa por ter gritado com você. Eu nunca quis magoá-lo. Me perdoa se, em algum momento, eu te fiz sentir sozinho.
Seus dedos deslizaram para a nuca dele, segurando-o como se pudesse ancorá-lo à realidade.
— Você gosta de implicar comigo, e eu… eu ainda não sei lidar com isso.
O vento ficou mais forte. A energia de Maethe fazia o ar vibrar, sugava tudo para seu centro. Mas Clara se recusou a soltar Dante.
— Antes de você aparecer, eu pedi um milagre. Pedi a Deus que enviasse alguém que mudasse a vida dessas pessoas.
A brisa fria cortava seu rosto.
— E então você caiu do céu. Como uma estrela cadente.
Seus olhos se fecharam, as lágrimas escorrendo por suas bochechas.
— Eu soube, naquele instante… eu soube que você era o meu milagre.
O ar rugia como uma fera faminta, cada rajada carregada com o estrondo das explosões e os gritos de Heian e Leonardo, que tentavam conter o caos. As ordens deles se perdiam no tumulto, abafadas pela gargalhada cruel de Maethe, um som que se misturava ao desmoronar de pedras e ao assovio cortante do vento.
Clara Silver ignorou tudo ao seu redor. Fechou os olhos, puxou o ar para dentro dos pulmões e prendeu a respiração por um instante. Seu coração oscilava entre batidas frenéticas e pausas tensas. Suas mãos tremiam. Se hesitasse, se errasse… Se sua habilidade saísse do controle, poderia matar Dante ali mesmo.
A chance de trazê-lo de volta era mínima.
A Energia Cósmica serpenteou sobre sua pele, cintilando como um fio dourado prestes a se romper. No momento em que tocou verdadeiramente Dante, sentiu um puxão violento, como se sua alma estivesse sendo sugada para dentro dele.
E então, tudo mudou.
Quando Clara abriu os olhos, estava de pé em um lugar completamente diferente. O som do caos desaparecera. Não havia destruição, não havia vento cortante — apenas um ambiente tranquilo e vozes ao fundo.
Dante estava sentado à frente, conversando com algumas pessoas. Rostos desconhecidos, mas seus trajes os denunciavam. Na verdade, Clara não sabia diretamente, mas algo indicava para ela, o lugar de onde ele veio.
A Capital.
O choque percorreu o corpo de Clara como um trovão silencioso. Sua voz saiu fraca, arrastada, mas foi o suficiente para chamar atenção.
Os desconhecidos pararam e a encararam. E então… riram.
— Então essa é a mulher que está forçando Dante a ficar.
A frieza naquelas palavras fez algo se contorcer dentro dela, mas Dante parecia alheio a tudo. Ele estava imerso em sua conversa com uma jovem de cabelos negros e roupas elegantes.
Ela sorriu para ele. Brincalhona. Íntima.
Dante não hesitou. Moveu-se para frente e a abraçou com força, como alguém que reencontra um pedaço de si mesmo.
Clara sentiu o peito apertar.
À frente deles, uma mulher ruiva, vestindo uma farda esbranquiçada, observava a cena com um olhar tranquilo.
— Ele está pronto para voltar.
Clara piscou, confusa.
— O quê…?
Antes que pudesse reagir, sentiu um toque em seus ombros. Dois estranhos estavam ao seu lado—um homem que carregava o mesmo rosto de Dante e uma mulher sorridente.
— Ela daria uma bela esposa para nosso filho.
As palavras atingiram Clara como um soco invisível. Seu corpo travou, sem saber como reagir. Mas Dante a viu.
Ele recuou do abraço e, ao notar sua presença, arregalou os olhos. Por um instante, ficou sem palavras. Então, soltou uma risada leve e coçou a bochecha, sem jeito.
— Deve estar bem irritada comigo por eu ter aparecido dessa maneira, Clara.
Ela não respondeu. Em vez disso, avançou sem hesitação, jogando-se para frente e o abraçando com toda a força que tinha. Os braços dele a puxaram, respondendo o abraço com imensa força.
— Eu escutei tudo o que você disse.
A voz de Dante soou baixa, serena, como um sussurro que ecoava diretamente dentro da mente de Clara.
— Mas você está errada sobre uma coisa. Eu não sou o milagre de ninguém. Nunca fui. Mas, no instante em que te vi, soube que minha vida nunca mais seria a mesma.
Clara fechou os olhos e afundou o rosto no peito dele, buscando esconder o turbilhão de medo e desespero que a consumia. Do lado de fora, a realidade os aguardava com brutalidade. O silêncio daquele momento se desfez em um rompante. O rugido do mundo voltou como um trovão. Explosões cortaram o ar, a voz de Heian ressoava em meio ao caos, as chamas dançavam ao redor das esferas de concreto suspensas no céu.
Mas ali, naquele instante congelado no tempo, uma mão áspera e calejada deslizou pelos fios de Clara.
Gentil. Quente.
Ela sentiu o toque de Dante antes mesmo de ouvir sua voz novamente.
— Minha mente está aqui.
O alívio veio como uma onda que a preencheu por inteiro.
— Obrigado por ter me esperado. Obrigado por acreditar em mim.
Clara ergueu o rosto devagar. O olhar dele já não era mais vazio, já não era mais refém do abismo que o consumia. Ele estava ali. Totalmente ali. O sangue ainda manchava sua boca, mas isso não apagava o pequeno sorriso que se formava.
Uma expressão sincera.
Uma prova de que ele havia voltado.
— Mas, sabe… eu adorei quando me chamou de milagre.
Dante piscou, brincalhão, e Clara soltou um riso trêmulo.
— Agora, temos algo importante para terminar — ele continuou, erguendo os olhos para a destruição ao redor. — Então, que tal mostrarmos para aquela mulherzinha quem nós somos, Clara Silver?
Ela não hesitou.
Seu coração batia forte, sua alma queimava em resposta.
— Sim — respondeu, firme, com toda a força que tinha. — Eu aceito.
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