Capítulo 1185: Recuperando
— A realidade é um conceito estranho, Gravis — respondeu Orthar. — O fato de você estar me perguntando isso significa que ainda não compreende completamente suas nuances.
— Ok? Então explique — disse Gravis com interesse.
— A realidade se manifesta e muda à medida que se expande — explicou Orthar. — No momento, tenho as memórias de Mortis entrando em minha percepção, mas essas memórias não são tão antigas quanto parecem ser.
Gravis apenas ergueu uma sobrancelha.
— A realidade objetiva é a realidade objetiva, e o tempo não é um fator para a realidade objetiva. Existe apenas uma realidade objetiva, e essa realidade objetiva só existe em um único ponto no tempo — explicou Orthar.
— Estamos na realidade objetiva agora. Todo o Cosmos está.
— Quando eu disse que não tinha certeza se Mortis sobreviveria, a Samsara dele ainda não havia acontecido lá. Coisas que ainda não aconteceram não podem acontecer prematuramente.
— O quê? Então você não sentiu Mortis em sua percepção naquela época? — perguntou Gravis.
Orthar assentiu.
— Correto. Antes de Mortis entrar na Samsara, eu não o havia sentido em minha percepção. É por isso que disse que não sabia se ele sobreviveria. Afinal, eu ainda não sabia que ele iria sobreviver.
Gravis coçou a nuca enquanto tentava entender o que Orthar estava dizendo.
— Mas agora você tem a Samsara de Mortis em suas memórias, certo?
— Sim, agora tenho essas memórias.
— Mas essas memórias são novas? — perguntou Gravis.
— Correto. Essas memórias só foram adicionadas quando Mortis entrou na Samsara — explicou Orthar. — A realidade precisa permanecer estável, e a Samsara afeta a causalidade. Então, quando algo é alterado no passado, a realidade física se ajusta junto com isso.
— Algumas lendas e histórias falam de laços temporais, e em quase todas elas, não se sabe o que aconteceu na primeira iteração do tempo e da realidade. Estamos atualmente na primeira iteração. A Samsara de Mortis ainda não havia acontecido, mas assim que aconteceu, a realidade física se adaptou.
— Eu fui o único que pôde sentir a percepção de Mortis na Samsara, o que significa que fui o único cujas memórias foram alteradas. Neste momento, me lembro de que nunca estive preocupado com Mortis, pois sabia que ele sobreviveria.
— No entanto, também sei que essas são memórias de eventos que nunca aconteceram. Em certo sentido, essas coisas aconteceram, mas não na realidade física. Apenas pensamos que aconteceram na realidade física — explicou Orthar.
Gravis tentou entender o que Orthar estava lhe dizendo.
— Então, laços temporais não podem existir? — perguntou Gravis.
— Na realidade física, não. Na realidade percebida, sim — respondeu Orthar. — O tempo não reverte na realidade física. Se você usar a Lei Verdadeira do Tempo para vislumbrar o passado, verá apenas uma realidade percebida, não a realidade física. O máximo que pode fazer é congelar o tempo por um instante.
— Então — disse Gravis após alguns segundos. — Você se lembra de ter sentido a percepção de Mortis entrar na sua percepção, mas sabe que isso nunca aconteceu de fato.
— Exatamente — Orthar confirmou.
Orthar olhou para Mortis por um momento com um olhar avaliador.
— O primeiro teste foi concluído — disse ele. — Recupere-se pelos próximos 10.000 anos. Depois disso, poderá entrar no segundo teste.
— E o que… oh — Gravis começou, mas então percebeu que Orthar já não estava mais ali.
Agora, restavam apenas Gravis e Mortis.
Gravis olhou para os dois portões fechados.
“Imagino que não vão se abrir por um tempo. Então, é como antes. Depois de cada teste, temos uma pausa.”
Gravis lançou um olhar para Mortis, que ainda estava confuso com o fato de estar de volta ao seu corpo.
— A primeira Samsara é sempre difícil — disse Gravis.
Mortis olhou para Gravis.
— Você se lembra da minha primeira Samsara? Foi contra um cara de uma das Seitas mais poderosas no mundo de Arc. Demorou apenas cerca de 10.000 anos, mas eu também desmoronei depois — disse Gravis com um sorriso.
— Lembra-se de quando lutamos contra Nira? — perguntou Gravis. — Naquela época, também usei Samsara, e depois que me recuperei, fiquei completamente fora de mim. Eu nem conseguia usar minha Lei de Forma, e usar minhas Leis normais também não era fácil. Afinal, eu não as havia usado por um tempo muito longo.
— Quanto tempo durou seu Samsara? — perguntou Gravis, olhando para Mortis.
— Não sei — respondeu Mortis, distraído.
— Quantos anos ele tinha antes de morrer? — Gravis perguntou.
Mortis lançou um olhar complexo para o cadáver à sua frente.
— Cerca de dois milhões de anos.
Gravis assentiu.
— Isso é bastante tempo. Imagino que você tenha passado por algo em torno de dez milhões de anos de Samsara. Isso é muito para a primeira vez. Como foi?
Mortis não tinha certeza do que pensar naquele momento.
— Não sei — respondeu.
— Ah, entendi — disse Gravis. — É como uma experiência ruim, mas que conseguiu resolver um problema seu. Ainda foi horrível passar por isso, mas, no fim, você sente que está feliz por ter passado por aquilo. Afinal, se não tivesse, não seria tão forte quanto é agora.
— Mas se pudesse repetir a experiência pelos mesmos ganhos, provavelmente recusaria, certo? — perguntou Gravis com um sorriso.
Mortis olhou para Gravis por um instante.
— Sim, isso parece certo.
Gravis apenas sorriu e caminhou até Mortis. Então, sentou-se diante dele e pegou um pouco de café, que havia conseguido de seu pai algum tempo atrás. Ele queria guardar esse café para uma ocasião especial.
Quando Mortis viu o café, velhas memórias ressurgiram em sua mente.
A conexão de Mortis com aquele café era tão forte quanto a de Gravis.
Mortis pegou um pouco para si e bebeu.
Nos minutos seguintes, Gravis e Mortis beberam em silêncio. Gravis parecia relaxado, enquanto Mortis tinha um olhar distante.
— Conte-me sobre a vida do Deus Ancestral — disse Gravis de repente.
— A vida dele? — perguntou Mortis.
— Mhm — Gravis assentiu. — Quem ele era? O que fez? Que conexões ele tinha? Que Leis conhecia? O que aconteceu com ele? Apenas me conte tudo desde o começo.
Depois de alguns segundos de hesitação, Mortis começou a narrar a vida do Deus Ancestral.
No início, Gravis não disse muito, mas assim que o Deus Ancestral do passado se tornou senciente, Gravis começou a lançar algumas perguntas.
— Essa foi a decisão certa?
— Por que ele fez isso?
— Você acha que foi a decisão correta?
— O que você teria feito?
— Se tivesse feito isso, como o mundo teria mudado?
— Isso é realmente o que você quer?
— Você realmente acha que isso seria o melhor?
— Por que faria isso?
Gravis fazia uma pergunta atrás da outra enquanto Mortis recontava a história do Deus Ancestral.
No início, Mortis achou difícil responder a essas perguntas. O Deus Ancestral havia feito o que fez, e as coisas já tinham acontecido. Além disso, Mortis sentia que as ações do Deus Ancestral eram naturais e lógicas.
No entanto, as perguntas de Gravis questionavam os motivos fundamentais por trás das ações.
Em determinado momento, Mortis sequer conseguia dar uma resposta clara sobre por que o Deus Ancestral havia feito algo.
Então, Gravis começou a perguntar o que Mortis teria feito.
No começo, as respostas de Mortis eram quase idênticas às ações do Deus Ancestral, mas com o tempo, a insistência de Gravis fez Mortis reavaliar suas respostas.
Sem perceber, Mortis foi se distanciando do passado do Deus Ancestral.
À medida que mais tempo passava, Mortis passou a narrar as ações do Deus Ancestral com uma voz mais distante e sem emoção. Era como se ele já não estivesse mais envolvido naquilo.
Por quê?
Porque o Deus Ancestral havia feito várias coisas que não estavam de acordo com as crenças de Mortis.
No início, Mortis instintivamente agia de maneira semelhante ao Deus Ancestral, mas essa conexão foi cortada.
Eventualmente, Mortis terminou a narração. Devido às perguntas constantes de Gravis, levara literalmente anos.
— Boa história — disse Gravis.
— Não sei — respondeu Mortis, franzindo a testa. — Ele me parece mais um idiota.
— Talvez — disse Gravis. — Então, como você se sente?
Mortis olhou para Gravis.
— Não diferente do usual.
Gravis apenas abriu um sorriso brilhante.
— Isso é bom de ouvir.
Mortis assentiu. Ele já havia percebido o que Gravis havia feito. Gravis questionou continuamente as ações do Deus Ancestral, forçando Mortis a reavaliá-las. Por causa disso, apenas as ações com as quais Mortis realmente concordava permaneceram em sua mente.
Gravis havia reavivado a personalidade de Mortis.
Ele não era exatamente o mesmo Mortis de antes da Samsara, mas aqueles que o conheciam definitivamente sentiriam que ele ainda era Mortis.
Ele havia mudado apenas um pouco.
E isso era normal.

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