Capítulo 26 - Encuralados por Gigantes
A clareira estava envolta em fumaça densa, as árvores em chamas, enquanto centenas de corpos cobriam o solo como um tapete. Cada passo era um desafio para se manter em pé, era muito difícil lutar sem tropeçar nos cadáveres dos goblins caídos.
Apenas sete heróis conseguiram sobreviver a explosão do dirigível, e o subsequente ataque da horda: Argus e seu aprendiz, dois oficiais e três membros da guilda dos Cavaleiros de Inverno. Cercados pela maré incessante de goblins, lutavam com tudo o que tinham, e o cansaço começava a pesar em seus braços.
— Temos que sair daqui… — afirmou Yonzu entre tosses sufocantes, a fumaça presa sua garganta.
— Eles não param de vir! — bradou Isabel, enquanto lutava com um capataz atrás do outro.
Atrás dela, Argus disparava sua espingarda, muito efetiva contra os inimigos agrupados, porém cada recarga custava segundos preciosos, tempo que eles simplesmente não tinham.
Então, o chão tremeu.
Um silêncio pesado caiu sobre o campo de batalha quando uma sombra colossal se projetou. Os heróis ergueram os olhos, horrorizados.
Um goblin descomunal emergiu da floresta, sua cabeça ultrapassava copa das árvores. Seu corpo monstruoso vestia apenas uma tanga rudimentar, e suas mãos empunhavam um porrete grotesco, troncos de árvores entrelaçados e reforçados com correntes enferrujadas.
— Yonzu! O que é isso? — gritou Isabel, o pavor evidente em sua voz. Como eles iriam derrubar algo assim?
Yonzu colocou a mão no olho, e formou um monóculo com os dedos. E então, ativou sua habilidade de caçador para identificar a criatura. Um brilho azul percorreu sua visão enquanto o sistema identificava a ameaça.
Rei Goblin | Inimigo Cinco Estrelas
— C-cinco estrelas… — Yonzu balbuciou, o desespero em sua voz. Sem pensar duas vezes, virou-se para correr.
— CINCO? — Argus repetiu, ao arregalar os olhos. Deu um passo para trás e tropeçou em um cadáver, e caiu de costas no chão, a espingarda caiu para longe dele.
— Adrian! — Hal se virou para o espadachim, o tom exigente por uma resposta. — Não era um inimigo de quatro estrelas?
— Ele… não está sozinho… — murmurou Adrian. Suas mãos tremiam incontrolavelmente, mal conseguia segurar a espada.
A clareira, já consumida pelo caos, ficou ainda pior.
De todos os lados, gigantes começaram a emergir das sombras da floresta. Cada um era único, com tons de pele vibrantes, vermelho, laranja, azul, roxo. Alguns tinham dois braços, outros quatro, alguns até seis. Chifres irregulares adornavam suas testas, enquanto uns tinham um único olho, e outros, uma dezena de globos oculares espalhados pelo rosto disforme.
Yonzu disparou para fora da clareira, em uma tentativa de escapar da morte certa. Começou a correr, e quando estava prestes a conseguir fugir, ele olhou para cima.
Diante dele, um dos monstros bloqueava seu caminho. Era colossal, e media pelo menos quatro metros de altura, seu corpo musculoso marcado por cicatrizes profundas. Sua pele acinzentada não possuía pelos, e no centro da testa, quatro olhos escuros o encaravam. Estava nu e não possuía nenhum traço de órgão reprodutivo. Em suas mãos imensas, empunhava uma maça titânica, um tronco inteiro reforçado com estacas de madeira afiadas.
Yonzu engoliu em seco.
A arma desceu como um raio, e cortou o ar com um silvo mortal. Ele congelou. Seu corpo se recusava a obedecer, o medo o paralisara. Fechou os olhos, seu destino já decidido.
O estrondo do impacto veio… contudo não houve dor.
Atônito, Yonzu abriu os olhos e viu um herói diante dele.
Um jovem de armadura segurava o golpe inimigo com um escudo do tamanho dele, seus músculos tensionados enquanto a maça do gigante pressionava contra sua defesa. O choque metálico ecoava pela clareira.
— Sub-tenente! Não vou aguentar por muito tempo! — gritou o jovem, enquanto o gigante descia sua enorme arma mais uma vez.
Yonzu reagiu no último instante. Com um movimento ágil, puxou uma flecha e a disparou direto nos olhos do monstro.
O brutamontes urrou em agonia. Cambaleou para trás, soltando sua arma com um estrondo avassalador antes de desabar, e sacudir o solo com seu peso descomunal.
— Ótimo, Diovanni! — Yonzu agradeceu, ofegante.
O sétimo sobrevivente do grupo se destacou na penumbra. Alto e musculoso, Diovanni exalava uma presença imponente. Seus cabelos loiros curtos brilhavam, e seus olhos castanhos claros eram firmes e determinados. Sua armadura refinada, embora leve, oferecia proteção excepcional sem comprometer sua mobilidade.
Os heróis tentavam se defender com tudo o que tinham. No entanto, as grossas peles dos gigantes pareciam impenetráveis. Adrian sabia, por experiência anterior, que precisaria desferir um único golpe fatal. Porém, nas condições atuais, ativar sua habilidade seria o mesmo que condenar todos ali à morte.
Até mesmo Argus, com suas armas de fogo, enfrentava dificuldades contra os gigantes. Sua espingarda parecia ineficaz contra eles; era como atirar contra uma blindagem espessa. O impacto deixava marcas, ainda assim, insuficiente para causar danos sérios. Em um lampejo de memória, ele se lembrou de uma munição especial guardada no bolso do uniforme.
Municiou sua espingarda, e disparou contra um dos gigantes que tentava o atacar. O gigante caiu no chão imediatamente, com um enorme buraco no meio de seu peito.
— Balas abençoadas! — exclamou Argus. — São criaturas amaldiçoadas, essa é a fraqueza delas!
Todos voltaram o olhar para Hal, o único clérigo do grupo, o único capaz de fortalecê-los para enfrentar aquelas criaturas.
— Quanto tempo você pode manter uma bênção de nível quatro? — questionou Adrian, espada em punho, agora muito mais confiante.
— Dois minutos… talvez três… — balbuciou Hal, ao entender o que Adrian pretendia.
— Só preciso de um. — Adrian sorriu.
Hal bateu o cajado no chão, retirou um livro do bolso e começou a recitar palavras indecifráveis em voz alta. A esfera na ponta do cajado brilhou intensamente, emitindo uma forte luz branca. Adrian sentiu o cansaço se dissipar e seu vigor ser restaurado.
Rápido como uma rajada de vento, ele desferiu um único golpe contra um dos gigantes à sua frente. A lâmina cortou a pele da criatura sem resistência, agora envolta por uma fina camada de aura. O aço bramia no ar enquanto Adrian se movia com destreza acrobática pelo campo de batalha, e eliminava seus inimigos um por um.
— Simples assim? — murmurou Yonzu ao puxar outra flecha da aljava e disparar contra o gigante caído à sua frente. Diferente do primeiro tiro, que atingira apenas os olhos da criatura, este segundo projétil atravessou sua cabeça por completo.
Das árvores ao lado do Rei Goblin, emergiu um gigante colossal, ainda maior que os outros, contudo não maior que o próprio rei. Empunhava um tronco de árvore envolto em chamas e, com um movimento brutal, lançou-o contra Adrian, que se movia agilmente entre os menores.
Cercado de todos os lados, Adrian não tinha para onde escapar. Se tentasse desviar do tronco flamejante, seria atingido por outro gigante. Foi então que ouviu o som de água corrente atrás de si, e uma mensagem iluminou o céu.
[Barreira de Água – IV]
(Habilidade Exclusiva de Nível 20 – Classe: Escudeiro)
De repente, uma parede de água ergueu-se sobre os gigantes e desabou sobre eles, derrubando-os. A brecha perfeita para Adrian escapar. O tronco, agora encharcado, caiu apagado e rolou pela clareira.
O espadachim olhou para trás em busca de seu salvador. Lá estava Diovanni, exausto e ferido, com o escudo apoiado no chão para evitar cair de cansaço. Ele havia usado todas as suas forças para protegê-lo.
— Você é o único que consegue… — murmurou antes de desmaiar.
Adrian soltou um leve sorriso e voltou sua atenção para o restante dos inimigos.
— Bola de fogo! — gritava uma voz vinda da floresta. Era uma garota.
Ela surgiu das árvores, com uma horda de goblins menores tentando atacá-la. Adrian tentou reconhecê-la, com seus longos cabelos ruivos até os ombros. Era Alice, sozinha.
— Raio! — Alice conjurou sua habilidade, e os goblins atrás dela caíram em sequência.
— Onde está Vítor? — perguntou Adrian, a voz meio tensa.
Não estava preocupado com Vítor, e sim com o que poderia ter forçado um herói de nível tão alto a se separar de sua aprendiz. O inimigo dele deveria ser muito forte para conseguir tal feito.
— Um… um… homem cruzou com a gente… — Alice estava ofegante pela corrida. — Vítor disse que ia cuidar dele e mandou eu seguir na frente…
— Um homem? — Adrian continuou a questionar, enquanto continuava a acabar com os gigantes.
— Foca nele! — interrompeu Hal, ao apontar para o gigante que ainda pegava troncos em chamas e os lançava contra o grupo. — Não vou aguentar por muito mais tempo!
Ao perceber o terreno livre à sua frente, sem obstáculos ou inimigos, Adrian não hesitou. Conjurou sua lâmina de vento, que agora estava muito mais poderosa do que antes. O reforço dado por Hal, juntamente com toda a experiência adquirida durante a batalha, havia aumentado consideravelmente suas estatísticas base.
Levantou a espada e executou um corte horizontal. E tudo se partiu: árvores, corpos, e até mesmo o ar. Tudo o que estava na direção do corte foi destruído, esse era o poder de sua “lâmina de vento” amplificada. Os gigantes caíram, seus corpos partidos pelo impacto do tronco, e apenas um deles permaneceu em pé.
O gigante encarou Adrian, e avançou sobre ele, pronto para esmagá-lo com a árvore em chamas que segurava. Para os olhos rápidos de Adrian, o movimento de ataque inimigo era lento, muito lento.
Ele saltou sobre a árvore em chamas, aterrissando na mão do gigante. Com agilidade, subiu pelo braço da criatura, fincando a lâmina na carne e cortando a pele exposta. Até estar no ângulo perfeito no ombro do inimigo. Com um golpe preciso, decapitou-o com sua “lâmina de vento”.
— Conseguiu… — Hal desabou no chão, exausto após tanto tempo reforçando Adrian com uma bênção tão poderosa.
Adrian estava satisfeito e encarou o restante do grupo, todos impressionados com a força que ele demonstrara. No entanto, seus rostos logo se preencheram de temor, e o espadachim virou o pescoço para ver o que estava atrás dele.
A sombra à sua frente se expandia. Era o Rei Goblin. No entanto, em vez de atacar Adrian, o monstro estava caindo. O impacto foi tão forte que fez o chão tremer. A cabeça rolou, tão grande que poderia engolir Adrian inteiro.
Algo havia decapitado aquela gigantesca criatura com um único golpe, tão silencioso que ninguém o percebeu. Todos olharam em volta, tentando identificar o responsável, e logo avistaram uma silhueta em pé sobre a cabeça decapitada do Rei Goblin.
— Qual o motivo de tanta algazarra? Cheguei muito atrasado? — disse Vítor, com um sorriso no rosto.
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