Capítulo 64:O Despertar da Gélida Fúria.
Quando Ruby o repreendeu, preocupada com sua distração, Yuki olhou para ela por um breve momento, mas logo voltou sua atenção para os soldados das trevas que se aproximavam. Algo mudou dentro dele. Sua mente clareou, e seu coração, que antes estava acelerado devido à confusão da situação, agora batia em um ritmo calmo e constante.
“Frio. Impiedoso. Preciso.” Era assim que o Yuki dessa era parecia lutar. Sua magia de luz, que tantas vezes o definira, agora parecia desnecessária diante daqueles inimigos comuns. O poder que ele realmente precisava usar estava bem ali, nas profundezas de sua alma: o gelo.
Conforme os soldados das trevas avançavam contra ele e Ruby, suas garras e armas se chocando contra a barreira de vento que ela conjurara, Yuki permaneceu imóvel. Seus olhos, agora completamente focados, brilharam com uma determinação gélida. Quando os soldados se aproximaram o suficiente da barreira, ele simplesmente ergueu a mão, e o ar ao redor deles começou a congelar. A umidade no ambiente solidificou-se em uma geada mortal.
“Crack!”
O som do gelo se formando foi quase inaudível no meio da batalha, mas o efeito foi devastador. Em questão de segundos, os soldados das trevas foram envolvidos por uma camada espessa de gelo, congelados em suas posições enquanto tentavam avançar. Seus movimentos, antes violentos e rápidos, agora pararam completamente.
Yuki, ainda com a mão erguida, abaixou lentamente seus dedos, quase como um maestro regendo uma sinfonia de destruição. Ao fazer isso, pilares de gelo surgiram do chão, perfurando e imobilizando ainda mais os inimigos. Ele então pegou sua espada com uma mão firme, sem hesitar, e deu um golpe no ar. A lâmina cortou o vazio, mas a força daquele movimento reverberou pela magia que o cercava.
“BOOM!”
Os pilares de gelo se estilhaçaram de uma vez só, como vidro quebrado. Cada soldado das trevas foi dilacerado instantaneamente, suas formas congeladas sendo reduzidas a pedaços que se desintegravam no ar. O campo de batalha, que momentos antes estava cheio de gritos e caos, agora estava silencioso. Tudo o que restava era uma brisa fria, que carregava pequenos fragmentos de gelo no ar, brilhando à luz distante.
Por um momento, Yuki se sentiu diferente, como se estivesse fora de si, em um estado de transe profundo. Não era o mesmo Yuki que ele conhecia. Esse Yuki era mais frio, calculista, quase como uma máquina de combate. Ele olhou para o cenário à sua frente, os pedaços de gelo e os corpos destruídos, e uma única pergunta atravessou sua mente.
“Então essa é a extensão do meu poder”, ele murmurou para si mesmo. “Não… sinto que isso não é nem um centésimo da minha verdadeira força. Tenho que aprender a controlar esse poder.”
Nesse momento, o som de uma voz familiar ecoou atrás dele. Ruby, que estivera lutando ao seu lado, o observava com uma mistura de preocupação e admiração.
“Yuki, você está bem?” Gritou ela, tentando avaliar o estado mental e físico dele.
Ainda em um estado de contemplação, Yuki não respondeu imediatamente. Ele sabia que algo profundo havia sido despertado dentro dele, algo que ele ainda não compreendia totalmente. O gelo que ele controlava com tanta maestria parecia apenas a ponta de um iceberg muito maior. Suas memórias das vidas passadas, que ainda estavam voltando lentamente, sugeriam que seu verdadeiro poder era muito maior do que ele jamais havia imaginado.
Antes que ele pudesse responder a Ruby, Diego se aproximou rindo alto, quebrando o momento de introspecção de Yuki.
“Vejo que você não mudou nada, hein!” Disse Diego, dando um tapa forte nas costas de Yuki. “Achei que você estava com problemas depois de te ver todo confuso até agora, mas parece que me preocupei à toa.”
Yuki riu, embora seu riso estivesse um pouco mais contido do que o habitual. Diego era claramente alguém de confiança, alguém que fazia parte do grupo há muito tempo. Mesmo assim, Yuki sabia que ainda tinha muito a descobrir sobre essa versão de si mesmo, sobre o guerreiro frio e implacável que parecia emergir nas batalhas mais intensas.
“Estou bem, Diego, só me ajustando… a algumas coisas novas, sabe?” respondeu Yuki, tentando esconder o quanto ainda estava confuso.
“Você sempre com essa cara séria, mas pelo menos ainda é o mesmo Yuki durão de sempre”, disse Diego com um sorriso, sem perceber a profundidade do que Yuki realmente estava experimentando.
Ruby, por outro lado, não parecia tão convencida. Seus olhos vermelhos brilharam com preocupação enquanto ela observava Yuki mais de perto. Ela sempre fora sensível às mudanças ao seu redor, e algo no comportamento de Yuki a estava incomodando.
“Se precisar de ajuda, você pode contar comigo, sabe disso, né?” Disse ela suavemente, sua expressão séria, mas cheia de compaixão.
Yuki apenas assentiu, ainda tentando processar tudo o que havia acontecido. Ele sabia que precisava de respostas, e a única maneira de encontrá-las seria continuando a lutar, continuar explorando seus próprios poderes. Mas, no fundo, uma coisa era certa: ele estava mudando. O Yuki que eles conheciam talvez nunca mais fosse o mesmo.
A noite caiu suavemente sobre a floresta, o céu pontilhado de estrelas começando a brilhar acima das copas das árvores. O grupo de guerreiros e magos que lutara bravamente contra as trevas começava a relaxar, seus rostos marcados pelo cansaço, mas aliviados pela breve sensação de segurança. A fogueira no acampamento estalava, iluminando os rostos deles, enquanto as risadas enchiam o ar e o calor do fogo afastava o frio da noite.
Yuki, no entanto, estava afastado de todos. Ele sentara-se em um tronco de árvore caído, as sombras da noite escondendo parcialmente seu rosto. Seus olhos estavam voltados para o céu, observando as estrelas distantes, mas sua mente vagava para longe, muito além daquele acampamento. Ele pensava na linha do tempo que deixara para trás, no outro mundo onde seus amigos e amores ainda lutavam. “Sofhia”, especialmente, nunca saía de seus pensamentos. “Será que ela estava bem? Será que as trevas haviam atacado novamente?” Ele se preocupava que seu tempo no passado pudesse ter consequências sérias no presente. A dúvida corroía sua alma.
“E se eu estiver perdendo tempo aqui enquanto eles precisam de mim lá?”, ele murmurava para si mesmo, sua expressão tensa e preocupada. O vento suave balançava as folhas ao redor, como se a própria natureza compartilhasse de sua inquietude.
De repente, uma voz familiar quebrou o silêncio.
“Yuki! Você está aí?” Ruby o chamava, aproximando-se devagar. Sua voz soava cheia de preocupação. “Estou preocupada com você. Geralmente, você fica quieto, mas sempre está perto de todos nas comemorações. Hoje, você parece distante, mais do que o normal.”
Yuki virou o rosto lentamente, seus olhos encontrando os dela. Por um breve instante, ao ver o brilho nos olhos de Ruby, ele se lembrou de Sofhia. As semelhanças entre as duas eram impressionantes, não apenas na aparência, mas na maneira como Ruby o olhava com aquele misto de carinho e preocupação, do mesmo jeito que Sofhia fazia. Um sentimento de nostalgia o envolveu, e ele murmurou baixinho, quase para si mesmo:
“Talvez… se for você, você entenderia meu fardo.”
Essas palavras saíram quase sem ele perceber, ecoando sua angústia e o peso que ele carregava em silêncio. Ele estava perdido em pensamentos, refletindo sobre seu destino e a difícil jornada que enfrentava. Ele se sentia preso entre o presente e o passado, lutando para encontrar um equilíbrio. A saudade de casa, de Sofhia, de seu mundo, apertava seu coração.
Ruby deu um passo à frente, seus olhos estreitos de preocupação.
“O que você disse, Yuki?”
Antes que ele pudesse responder, Ruby agiu por impulso. Ela correu na direção dele e, num movimento repentino e cheio de emoção, o abraçou com força. O choque inicial de Yuki se dissipou rapidamente quando ele sentiu o calor do abraço dela. Ruby o segurava apertado, como se quisesse afastar toda a dor que ele guardava.
“Não sei o que aconteceu com você para estar assim, mas saiba que já passamos por muitas coisas para que eu te deixe sozinho agora.” Ela falou com uma firmeza terna. “Lembre-se de que sempre estarei aqui para você. Hoje, amanhã e no futuro. Eu te amo, Yuki. E te amarei nesta vida e nas próximas também.”
As palavras dela tocaram profundamente o coração de Yuki, e antes que ele percebesse, lágrimas silenciosas começaram a rolar por seu rosto. O peso de tudo o que ele carregava finalmente encontrou uma saída. Ele não chorava há muito tempo, mas ali, nos braços de Ruby, ele sentiu que podia se permitir desmoronar um pouco.
“Sabe… está sendo muito difícil.” Yuki disse entre lágrimas. “Meu coração está confuso, cheio de sentimentos conflitantes. Minha cabeça… parece que vai explodir de tantas memórias e responsabilidades. Não sei se, se eu te contar tudo, você vai estar lá para mim como está agora.”
Ruby o apertou ainda mais forte, como se quisesse provar que estava ali de verdade, presente para ele, não importa o que acontecesse.
“Yuki… eu não sei o que você está passando. Mas o que eu sei é que sempre estarei aqui. Quando você se sentir pronto para compartilhar o que está te consumindo, eu estarei aqui, do seu lado. Sempre.”
As palavras dela soaram como uma promessa sagrada. Pela primeira vez em muito tempo, Yuki se sentiu realmente acolhido, como se alguém pudesse dividir o peso que ele carregava. Ele respirou fundo, sentindo a calma se espalhar em seu peito.
“Sabe, eu…” — Yuki começou a falar, mas foi interrompido por uma voz alta e animada.
“Aí estão vocês, seus pombinhos apaixonados!” Diego aparece, cambaleando e com um sorriso bêbado no rosto. Ele claramente havia bebido mais do que o necessário ao redor da fogueira. “Deixem o romance para depois e venham comemorar comigo!”
Antes que Yuki pudesse protestar, Diego o agarrou e o arrastou de volta para o grupo ao redor da fogueira. Ruby riu da situação, mas no fundo, não podia deixar de se perguntar o que Yuki estava prestes a dizer antes de serem interrompidos. Havia algo importante que ele queria compartilhar, e ela sabia que precisava ser paciente.
Naquela noite, o grupo ao redor da fogueira celebrou suas pequenas vitórias com risadas e histórias. Yuki, mesmo ainda com os pensamentos distantes, permitiu-se relaxar por um breve momento. Ele sabia que ainda tinha uma longa jornada pela frente, tanto no passado quanto no presente.
Na manhã seguinte, antes que o sol surgisse no horizonte, uma explosão violenta ecoou pela floresta, sacudindo o chão e arrancando todos de seu sono. O campo de batalha pacífico da noite anterior se transformou rapidamente em um caos, com todos se levantando de suas tendas, alarmados e prontos para o que estava por vir.
“O que foi isso?” Ruby gritou, correndo em direção a Yuki, que já estava de pé, seus olhos alertas e preparados para a batalha.
A paz havia sido quebrada, e algo perigoso estava se aproximando.
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