Capítulo 345: Metal
O tempo continuou a passar na Cidade Fungo Carmesim.
Meses haviam se passado desde que o Mar Carmesim irrompeu.
Durante esses meses, a Cidade Externa passou por mudanças drásticas, enquanto a Cidade Interna mal sentiu qualquer diferença.
Claro, alguns produtos na Cidade Interna tiveram um aumento nos preços, mas todos ainda podiam comprá-los sem grandes dificuldades.
Enquanto isso, na Cidade Externa, o metal se tornou extremamente caro, algo que nunca havia acontecido antes.
A Cidade Fungo Carmesim sempre teve uma abundância enorme de metal, a ponto de que, se alguém encontrasse uma chapa de metal em bom estado na calçada, nem se daria ao trabalho de pegá-la.
Os únicos tipos de metal que tinham algum valor eram o aço e os metais tratados com Zephyx, mas esses não eram materiais com os quais as pessoas comuns tinham contato.
O metal enferrujado parecia estar em todos os lugares na cidade, mas agora, as coisas haviam mudado.
Todas as peças de metal soltas haviam sido removidas das ruas.
Antes, se alguém precisava de um pedaço de metal para consertar um buraco em sua casa, bastava ir até a rua, pegar uma chapa e fixá-la na parede.
Agora, simplesmente não havia mais metal sobrando.
Quando as primeiras lojas começaram a vender metal comum, os cidadãos ficaram confusos.
Vender metal?
Quem em sã consciência compraria metal?
E quando esses mesmos cidadãos precisaram de metal, ficaram furiosos por terem que pagar por algo que antes era gratuito.
Ainda assim, muitos acabaram pagando os preços exorbitantes.
Os que se recusaram a pagar decidiram esperar.
Em algum momento, o metal voltaria a ser gratuito.
Porém, poucas semanas depois, a situação piorou ainda mais.
Todas as lojas de metal fecharam.
Agora, o metal só podia ser vendido através da cidade.
Quem tivesse metal em excesso e quisesse vendê-lo precisava entrar em contato com a cidade. E quem precisasse de metal também tinha que contatar a cidade.
Os que tinham muito metal conseguiram vendê-lo rapidamente, já que a cidade estava comprando absolutamente tudo o que havia no mercado.
Infelizmente, os que precisavam de metal descobriram que era quase impossível consegui-lo.
Convencer a cidade a vender metal para alguém era uma tarefa absurdamente difícil.
Se alguém precisasse de metal, era melhor ter um motivo muito bom.
Um buraco no teto? Isso não era um problema.
Era só mais um ‘buraco de luz’.
Faltando uma parede inteira? Simples, bastava cortar metade de outra parede para fechar o buraco.
Os cidadãos sentiam que estavam vivendo em uma realidade completamente diferente.
Algo que havia sido abundante meses atrás agora era impossível de encontrar.
Mas então, mais uma mudança aconteceu.
Uma tendência surgiu.
Casas finas de uma única faixa.
Em vez de moradias feitas de metal grosso, frio e cheio de buracos, uma empresa surgiu oferecendo um serviço para reformar as casas.
A empresa retirava as placas de metal antigas e enferrujadas e as substituía por novas, mais finas e limpas.
Naturalmente, essas novas placas não tinham buracos, e a casa inteira passava a ter um visual uniforme e bem estruturado.
E o melhor de tudo: não era necessário pagar com créditos!
Bastava doar 20 litros de sangue ao longo de um ano.
Naturalmente, essa empresa pertencia à Kugelblitz.
É claro que muitos não gostavam da ideia de pagar com seu próprio sangue, mas, considerando os problemas que enfrentavam, essa era a melhor solução disponível.
Porém, havia um problema.
Perder 20 litros de sangue era muito para uma pessoa.
Chegava a ser perigoso para a vida.
Foi então que outra mudança aconteceu.
O preço passou a ser cobrado por residência.
Não por pessoa.
Enquanto as famílias não tinham grandes dificuldades em dividir o custo, as pessoas que viviam sozinhas não tinham tanta sorte.
Mesmo duas pessoas vivendo na mesma casa podiam achar o preço alto demais.
Mas elas ainda precisavam de moradias adequadas.
Então, essas pessoas começaram a olhar para as ruas.
Para os desabrigados dos Dregs.
Muitas pessoas da Cidade Externa ofereceram moradia aos desabrigados dos Dregs em troca de dez litros de sangue doados ao longo do ano.
O sangue passou a ser visto como uma forma de aluguel.
Além disso, os proprietários das casas até se ofereceram para pagar os impostos mínimos de cerca de 100 créditos por essas pessoas, para que não corressem risco de morte por perda excessiva de sangue.
No fim das contas, o aumento repentino no preço do metal levou à eliminação quase total dos sem-teto.
Em poucos meses, a maioria das casas foi substituída por versões novas e melhor construídas.
Naturalmente, a empresa responsável pelo serviço acumulou muito mais metal do que precisava, vendendo o excedente para a cidade por um lucro enorme.
De certa forma, podia-se dizer que a Cidade Externa foi ‘descascada’ de uma camada inteira de metal.
E o que aconteceu com todo o metal que a cidade comprou?
As primeiras peças foram transformadas em Escudos Carmesins, apelidados carinhosamente de Baratas.
As mortes no lado inferior da cidade haviam sido brutais, mas depois da introdução das Baratas, os óbitos reduziram drasticamente.
Uma Barata era uma estrutura de metal de 2,2 por 1,2 metros, semelhante a uma tigela, com várias alças e tiras acopladas.
Um trabalhador no lado inferior da cidade prendia essa estrutura às costas e se agarrava ao fundo da cidade.
A estrutura então cobria todo o seu corpo, deixando apenas uma pequena abertura de cerca de 10 centímetros, através da qual o trabalhador podia ver o mundo exterior.
A pequena abertura, posicionada a uma boa distância dos olhos, garantia que o trabalhador nunca visse o Mar Carmesim, não importava o quanto movesse a cabeça.
Além disso, a Barata podia ser usada como um grande balde para armazenar ferramentas.
As Baratas foram uma grande invenção, reduzindo as mortes em uma quantidade absurda.
Claro, receberam esse nome por conta da aparência de um trabalhador usando uma enquanto se movia pelo lado inferior da cidade.
Alguém rastejando sob a cidade com uma dessas nas costas se assemelhava a uma barata metálica saindo da cidade, deixando um rastro de pegadas.
A partir de então, trabalhar no lado inferior da cidade passou a ser chamado de ‘Baratear’.
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