Capítulo 10: Os Diferentes Tipos de Pessoas (1/3)

Assim que Seol deu um passo à frente, apontando a extremidade afiada e quebrada da perna da cadeira para o monstro…

Kiiiiik!

A criatura estremeceu e se encolheu. O monstro rapidamente retraiu a cabeça e pressionou seu corpo rastejante contra o chão. E quando o primeiro passo suspenso de Seol finalmente tocou o chão, ele recuou num piscar de olhos, sua velocidade de reação tão rápida quanto a de um javali que levou uma espetada ardente.

O monstro, que se afastava sorrateiramente, parecia muito confuso, como se não conseguisse entender por que estava fugindo daquela maneira.

Grrrr…

Quando o monstro aceitou o fato de que estava sendo suprimido pela aura de Seol, seu catarro gorgolejou alto em sua garganta. Seus instintos gritavam avisos de perigo.

O humano diante de seus olhos era incomparável a todos os outros. Se atacasse esse homem, morreria.

O monstro já havia saciado parte de sua fome. Além disso, havia muitas outras presas correndo do lado de fora. Não havia razão para enfrentar esse perigo aqui dentro.

Assim que tomou essa decisão, fugiu rapidamente pela porta aberta. Realmente, possuía uma astúcia e reflexos impressionantes.

Tk.

A perna quebrada da cadeira escorregou da mão de Seol e caiu. Ele olhou ao redor do salão de assembleia agora vazio, com uma expressão meio atordoada. Parecia completamente desinflado.

Não muito tempo havia se passado, e ainda assim ele podia ver mais de dez cadáveres espalhados em poças de sangue. Eventualmente, sua atenção foi capturada pelo buraco de onde o monstro havia surgido.

“É o buraco do diário.”

Então, era isso. O buraco mencionado no diário era aquele.

Seol lançou outro olhar para a saída do salão. Houve alguma hesitação, mas ainda assim escolheu atravessar o chão e espiar cautelosamente pela borda, agora encharcada de sangue. Em seguida, abaixou-se com cuidado e entrou.

Seol chegou ao andar do porão. Decidiu seguir em frente, pelo menos por enquanto. Ele devia ter exagerado no uso de seus poderes, pois sua mente e corpo estavam extremamente fatigados.

O corredor dobrava em um ângulo de 90 graus à frente, e ele logo chegou a uma parte onde portas estavam alinhadas em intervalos regulares de ambos os lados. Parecia que a escola utilizava esse andar subterrâneo como espaço para reuniões e atividades de clubes. Seol empurrou a porta com um banner colorido proclamando — Vá a qualquer lugar!

O cômodo além era pequeno e íntimo, com apenas dez ou quinze metros quadrados. Ao verificar os cartazes pendurados nas paredes, parecia que aquele era o clube de viagens.

Seol baixou a bolsa dourada de seu ombro e sentou-se contra a parede.

Sentado ali, como um homem em transe, sua consciência antes nebulosa parecia voltar a ele pouco a pouco. Era como se estivesse despertando de um longo sonho.

E, logo…

“No que eu estava pensando…?”

O terror e o nojo antes esquecidos voltaram a inundá-lo um após o outro. O cheiro de sangue, que havia bloqueado de sua mente graças ao surto de adrenalina, fez com que engasgasse reflexivamente. Ao se lembrar da aparência do chamado monstro fraco, seu corpo inteiro começou a tremer de medo.

No entanto, isso durou apenas por um breve momento. Quando começou a controlar sua respiração lentamente, os tremores cessaram. Sentindo seu coração se acalmar, Seol não pôde deixar de exibir um sorriso irônico.

O Seol destruidor demoníaco do sonho era seu verdadeiro eu? Ou o homem tremendo de medo agora era o verdadeiro?

Tudo parecia como se estivesse experimentando o ‘Sonho da Borboleta’ de Chuang-Tzu.¹

Seol rangeu os dentes e focou sua mente, tentando organizar tudo o que havia acontecido até aquele momento.

A primeira coisa a se resolver era a questão sobre seus olhos.

A habilidade evoluída chamada ‘Nove Olhos’… Isso causou um grande choque mental em Seol. Afinal, ele vinha vivendo sob a suposição de que enxergar a cor verde era tudo o que seus olhos eram capazes de fazer.

“Não, não era que não havia outras cores, eu apenas não podia vê-las.”

As novas cores desbloqueadas eram amarelo, laranja e vermelho. E, tão importante quanto isso, havia outras cores ainda a serem desbloqueadas.

Kang Seok fora mostrado em amarelo, o chamado ‘Atenção Necessária’; no entanto, Yi Seol-Ah não possuía nenhuma cor. Isso significava que ele ainda não podia vê-la.

Ao pensar na garota, seus pensamentos se tornaram complicados. Seus gritos suplicantes de ajuda ainda ecoavam em sua mente. Se ele não tivesse demorado tanto para se decidir, será que aquela garota de bom coração ainda estaria viva agora?

“Eles já chegaram lá?”

O anúncio repentino ajudou a clarear um pouco a mente de Seol.

Seol leu o diário com atenção antes de perceber que havia um arquivo anexado a ele. Devia ter deixado passar antes, já que as coisas estavam caóticas. Quando clicou no arquivo e o abriu, seus olhos se arregalaram de surpresa.

“Um mapa?”

O arquivo anexado era, na verdade, um mapa semelhante a uma planta baixa de todo o terreno da escola. Quando clicou no ‘prédio principal’, essa parte do mapa se expandiu, permitindo que Seol verificasse facilmente o layout interno do edifício.

Seu olhar pousou em um ponto no segundo andar. Essa sala específica tinha um formato retangular, e havia seis ícones azuis piscando sobre ou perto das bordas e linhas que demarcavam as paredes. No entanto, ele viu um deles mudar para a cor vermelha antes de parar de piscar completamente.

Knock. Knock.

Seol estava tentando descobrir o que aqueles ícones azuis piscantes significavam quando ouviu batidas na porta. Surpreso, virou-se para olhar e viu a porta ser brevemente banhada por um brilho verde antes de a cor desaparecer completamente.

— …Ele também não está aqui?

— Quem está aí?

A voz afiada de Seol fez com que o som do lado de fora parasse de se afastar.

— Ufa, finalmente te encontrei. Ei, cara, posso entrar? Ah, certo. Não estou tentando te ameaçar nem nada, então relaxa.

— …

— Se não se sentir confortável comigo entrando, apenas diga. Eu te deixo em paz.

— …Entre.

A porta se abriu lentamente, rangendo.

— Valeu! Na verdade, eu estava preocupado que você fosse me mandar sumir ou algo assim.

O homem que entrou na sala do clube falando num tom jovial era um dos oito Convidados… aquele que usava um boné verde de beisebol sobre os cabelos um pouco longos; sua pele levemente bronzeada estava parcialmente coberta por um par de óculos escuros.

— Cara, deu um trabalho danado te encontrar. Digo, as pegadas ensanguentadas estavam ficando fracas, ei também havia tantas salas por aqu… Ah, certo. Quer um cigarro?

O homem jogou sua bolsa no chão e fez um pequeno alvoroço antes de, de repente, estender um maço de cigarros para Seol. Sem dizer nada, Seol pegou seu próprio maço. Ainda tinha um cigarro sobrando.

— Você fuma híbrido? Eu não curto. Odeio esses sabores esquisitos, cara.

Ele então acendeu o cigarro de Seol. Pouco depois, os dois ficaram se encarando enquanto a fumaça azul pairava preguiçosamente entre eles.

O homem lentamente abriu a boca.

— Deveríamos nos apresentar? Sou Hyun Sangmin.

— …Seol.

— Seol? É um nome meio feminino, não acha? É um nome de uma só sílaba?

— Como me encontrou?

Seol mudou de assunto. Hyun Sangmin não pareceu se importar. Apenas estalou os dedos segurando o cigarro.

— Te vi no salão de assembleia, entrando no buraco no chão.

— Você também ficou no salão?

— Não, não. Eu também corri para a saída, viu. Mas voltei… Huh, você ficou lá o tempo todo?

Seol assentiu silenciosamente. Ao ver essa resposta, Hyun Sangmin apenas coçou a cabeça. Então, rapidamente continuou com sua explicação.

No momento crítico entre a vida e a morte, a multidão conseguiu remover o púlpito e as cadeiras empilhadas para escancarar a porta de saída. As pessoas em fuga então se dispersaram por toda parte. Alguns correram em direção ao portão principal da escola, mas a maioria seguiu Kang Seok até a entrada principal do prédio escolar.

No entanto, encontraram um novo problema: a entrada estava trancada.

— Não era como se não tivéssemos tempo, sabe. Aquele monstro parecia que ia correr atrás da gente imediatamente, mas, por algum motivo, não fez isso.

Hyun Sangmin olhou para Seol por um instante antes de continuar.

— Mas, não importa o que fizéssemos, chutar, empurrar, bater… Não importava a porra do que fizéssemos, a porta não se mexia. Ficamos todos ansiosos pra caramba. E pra piorar, o monstro também apareceu. Cara, foi tenso demais.

— Então, o que aconteceu?

— Sei lá. Eu estava tentando pegar uma pedra ou algo assim no jardim de flores ali perto pra quebrar as janelas, mas quando vi o monstro, dei no pé, cara. Dei uma volta maior e voltei para o salão de assembleia.

Hyun Sangmin abaixou os óculos escuros e esboçou um leve sorriso.

— Como já tinha atacado lá uma vez, achei que não voltaria de novo.

— E você me viu e decidiu me seguir?

— Isso mesmo. Nunca na minha vida imaginei que você fosse entrar no buraco. Fiquei obviamente hesitante sobre o que fazer. Mas, quando desci lá, você já tinha sumido faz tempo. Então, fiquei te procurando até agora.

— Por quê?

— O quê? Você realmente não sabe?

Hyun Sangmin tagarelava. Claro, Seol também já tinha uma ideia do motivo.

— É simples, cara. Quero me juntar a você. Foi por isso que te procurei… Então? O que acha? Quer seguir sozinho ou me levar junto?

— …

— Se estiver disposto a aceitar alguém junto, que tal eu? Mas, vou te avisando agora, não estou planejando me escorar em você nem nada do tipo.

Como Seol permaneceu em silêncio, Hyun Sangmin ficou mais ansioso.

— Certo, vou dizer isso abertamente. Eu aguento injustiça, mas não suporto sair no prejuízo.

Seol olhou de volta, um pouco confuso com essa afirmação. Hyun Sangmin apagou o cigarro e sentou-se mais ereto.

— Escuta, cara. O que estou propondo aqui não é uma parceria igualitária. Não, é mais como uma relação vertical.

— Uma relação vertical?

— Isso mesmo. Se me deixar te acompanhar, eu vou seguir suas ordens. E sim, estou disposto a assumir um certo nível de perigo por você, se pedir.

A proposta de Hyun Sangmin era simples e fácil de entender.

“Pode me usar.”

“Sou um cara bem útil, então confie em mim e me aproveite.”

Seol conseguia entender mais ou menos por que esse homem estava disposto a ir tão longe desse jeito.

Era tudo por causa do Selo Dourado de Seol. Também havia a possibilidade de que Hyun Sangmin tivesse percebido algo lá no salão de assembleia.

No entanto, Hyun Sangmin não era um bom samaritano altruísta. Obviamente, ele queria algo em troca.

— O que você quer em troca?

— Bom, muitas coisas, mas… Por ora, sobreviver e chegar ao Paraíso. Isso já basta.

Seol observou Hyun Sangmin por um tempo.

— Se você for um lobo solitário, vou respeitar isso. Também não quero forçar nada. Já te disse antes, não disse? Se não me quiser, vou embora na boa.

Ele falou até ali e lentamente estendeu a mão.

Para ser completamente honesto, Seol não estava sentindo nada. Se fosse alguém como Yi Seol-Ah, ele não hesitaria nem por um segundo e aceitaria sem pensar duas vezes, mas Hyun Sangmin… bem, nada nele realmente chamava a atenção de Seol.

No entanto, havia um detalhe em Hyun Sangmin que o tornava um tanto semelhante àquela garota que já havia falecido.

“Não consigo ver a cor dele.”

Se sua cor fosse amarela… Atenção Necessária… Seol recusaria na hora. Mas o fato de não conseguir ver nenhuma cor em Hyun Sangmin realmente lhe deixava intrigado.

Pensando que não faria mal esperar para ver como as coisas se desenrolariam, Seol apertou a mão estendida de Hyun Sangmin e a sacudiu.

— Ótimo!

Hyun Sangmin abriu um sorriso brilhante, como se estivesse genuinamente feliz.

— Ótimo, muito bom! Agora, eu também faço parte do melhor time do mundo!

Seol teve a impressão de que, se ele fosse deixado sozinho por mais tempo, Hyun Sangmin poderia até começar a cantar e dançar. No entanto, ele eventualmente parou de fazer escândalo e se aproximou de Seol.

— Então, o que você vai fazer agora? Pode me contar quais são seus planos?

Seol caiu em um profundo estado de contemplação. Como possuía um mapa, chegar à área de espera do segundo andar seria algo simples, caso decidisse ir para lá imediatamente. Embora aquele monstro ainda estivesse vagando por aí, desde que utilizasse sua habilidade, eles conseguiriam evitar qualquer perigo.

Do nada, Seol se lembrou das palavras de Kim Hannah e quase soltou uma gargalhada. Ela estava certa. Ela realmente tinha facilitado muito as coisas para ele, então era melhor que sobrevivesse a esse evento, custasse o que custasse.

Seol pegou sua mochila e se levantou. Hyun Sangmin o observava sem dizer nada.

— Por agora, vamos sair daqui.

1. Trata-se de um capítulo de um antigo texto chinês chamado Chuang-Tzu, ou Zhuangzi. Nele, o mestre taoista cai em sono profundo e sonha ser uma borboleta e viver tal vida. Ao acordar, se questiona se é a borboleta ou o homem.[↩]