Índice de Capítulo

    Quatro dias haviam se passado desde que Hope, Elior e Aiden chegaram à montanha. A Facção havia fornecido uma pequena cabana no meio da floresta densa, equipada com suprimentos e tudo o que precisavam para se manterem por um tempo, mas a missão estava longe de ser tranquila. Eles continuavam a enviar informações diárias sobre a área, mas até então, a criatura mitológica que haviam sido enviados para investigar permanecia um mistério. Havia sinais, resquícios de sua presença – pegadas, marcas em árvores, uma aura de energia estranha no ar –, mas nenhum deles conseguira rastrear a entidade.

    Enquanto Aiden encarava a missão como uma espécie de “mini-férias,” aproveitando o ambiente e o tempo longe da sede da facção, Hope sentia um peso crescente no peito. Algo estava errado. A criatura estava ali, ela sabia disso, mas o que poderia estar ocultando sua presença era o que mais a perturbava.

    Naquela noite, depois de um dia exaustivo de busca sem sucesso, Hope acordou repentinamente no meio da madrugada. Ainda sonolenta, levantou-se da cama, sentindo sua garganta incrivelmente seca. Sua boca estava áspera, e um desconforto crescente a invadia. Confusa, ela se levantou para ir até a cozinha improvisada da cabana, pegando uma garrafa de água e bebendo avidamente.

    Contudo, a água não saciava sua sede.

    Ela sentiu um calafrio percorrer sua espinha. A sede que estava sentindo não era normal. Hope parou de beber e o choque a atingiu de repente – era a sede por sangue.

    Seu corpo ficou tenso, e seu coração acelerou. Ela correu de volta para seu quarto, quase tropeçando no escuro, enquanto sua mente disparava. Não. Eu não trouxe nenhum estoque de sangue. Como pude esquecer isso?

    Hope respirou fundo, tentando se acalmar, mas a ideia de ficar sem sangue por mais dias era alarmante. Se continuasse assim, seu autocontrole poderia falhar, e ela não poderia correr esse risco no meio de uma missão importante, cercada por colegas que confiavam nela.

    Ela fechou os olhos e tentou pensar em uma solução. Talvez pudesse voltar à base e buscar mais suprimentos? Mas isso deixaria Elior e Aiden sozinhos, e a missão já havia se arrastado por dias sem progresso. E se a criatura aparecesse enquanto eu estiver fora? Hope não podia abandonar seu posto tão facilmente.

    Com um suspiro pesado, ela decidiu sair para respirar um pouco de ar fresco, esperando que isso a ajudasse a clarear os pensamentos. Ao abrir a porta da cabana, o ar frio da montanha a envolveu, refrescando sua pele quente. As árvores altas se agitavam suavemente sob a luz das estrelas, e o ambiente parecia surpreendentemente calmo.

    Foi então que ela notou Elior. Ele estava um pouco distante da cabana, parado no meio da clareira, observando as estrelas com uma expressão distante. A lua projetava uma luz suave sobre ele, e por um momento, Hope hesitou. Ela não sabia se deveria perturbá-lo. Algo no modo como Elior estava parecia… vulnerável, quase melancólico.

    Ela deu alguns passos cautelosos em sua direção. “Elior?”

    Ele não se moveu imediatamente, mas depois de alguns segundos, ele se virou lentamente para encará-la, seus olhos se ajustando à figura dela sob a luz tênue. “Hope,” ele respondeu com uma voz tranquila, mas carregada de uma estranha serenidade. “Você também está sem sono?”

    Hope deu um meio sorriso, tentando disfarçar sua preocupação. “Algo assim… eu só precisava de um pouco de ar fresco.” Ela se aproximou mais, percebendo que, mesmo sob o exterior sempre forte e confiante, Elior parecia estar lidando com algo internamente. “E você? Parece que tem algo na sua mente.”

    Elior olhou para o céu novamente antes de responder, as estrelas refletindo em seus olhos. “Só pensando… Em tudo o que está acontecendo. Algo está errado com essa missão. A criatura está por perto, eu sei disso. Mas por que não conseguimos encontrá-la?”

    Hope suspirou, sentindo o peso da pergunta. “Eu também sinto isso. Como se estivéssemos sendo vigiados, mas… nada concreto.”

    Elior permaneceu em silêncio por um momento, antes de finalmente olhar diretamente para Hope, com uma expressão séria. “Além disso, tem algo em você que parece diferente. Você está bem?”

    Hope congelou momentaneamente, surpresa pela percepção aguçada de Elior. Ele sempre parecia notar quando algo estava errado com ela. “Eu… estou bem,” ela mentiu, tentando manter a compostura. Mas Elior apenas a observou, sem pressioná-la, embora seus olhos dissessem que ele sabia que algo estava fora do lugar.

    Ela desviou o olhar, cruzando os braços enquanto tentava ignorar a sede que se intensificava em sua garganta. “Eu só… estou cansada. Talvez devesse descansar um pouco mais.”

    Elior deu um leve sorriso, como se aceitasse a resposta, embora seus olhos demonstrassem uma leve preocupação. “Talvez seja uma boa ideia. Amanhã será outro dia de buscas.”

    Hope assentiu lentamente, mas sabia que o problema era maior do que apenas cansaço. Ela não poderia ignorar sua necessidade por muito mais tempo. Se não encontrasse uma solução, a missão e sua própria segurança estariam em risco.

    Quando a expressão de Elior mudou repentinamente, Hope ficou alerta. Seus olhos, que normalmente exibiam serenidade, agora carregavam uma intensidade diferente. Ele franziu levemente o cenho e murmurou, quase como se estivesse refletindo em voz alta:

    “Sangue?”

    Hope congelou, surpresa por notar algo que ela estava tentando desesperadamente esconder. Ele a encarou de maneira inquisitiva, e ela sabia que não adiantava tentar disfarçar. Elior era sempre perceptivo.

    “Você se alimentou?” ele perguntou diretamente, seus olhos examinando cada detalhe do rosto dela, como se pudesse ler todos os seus segredos.

    Hope suspirou, derrotada, percebendo que não havia como mentir para ele. “Eu… não consigo esconder nada de você, não é?” Ela tentou sorrir, mas a preocupação em seus pensamentos a impedia de relaxar.

    Elior, com a mesma expressão calma, se aproximou um pouco mais. “Você não deveria ignorar isso, Hope. Se alimentar é uma prioridade.” Ele então se ofereceu, estendendo o braço. “Tome um pouco do meu sangue. Vai ajudar.”

    Hope balançou a cabeça imediatamente, recuando ligeiramente. “Não. Eu vou aguentar. Posso suportar isso.” Por mais que seu corpo gritasse por sangue, ela estava hesitante em aceitar. Nunca havia passado mais de cinco horas com sede, pensou consigo mesma, mas queria manter o controle.

    Elior manteve o braço estendido, seus olhos cheios de uma seriedade inabalável. “Você sabe que, para um vampiro, especialmente um híbrido como você, a sede só piora com o tempo. Vampiros se tornam agressivos quando estão com sede, e com híbridos, é ainda pior.”

    “Eu não sou um puro vampiro,” Hope respondeu, tentando aliviar a tensão da situação. “Sou metade demônio também. Não é tão ruim quanto parece.”

    Mas Elior não se deixou convencer. “Metade demônio ou não, a sede afeta você tanto quanto qualquer outro vampiro, talvez até mais. Não adianta fingir que está bem.” Ele deu um passo à frente, insistindo. “Tome. Apenas um pouco. Vai te ajudar a se concentrar na missão.”

    Hope observou o olhar sério de Elior, sentindo o peso da situação. Ela sabia que estava chegando ao limite, e qualquer falha em sua concentração poderia comprometer tudo. Com um suspiro hesitante, ela finalmente cedeu. “Ok… mas só um pouco.”

    Elior estendeu o braço para ela, e Hope, um pouco nervosa, aproximou-se, segurando seu pulso com delicadeza. Ela mordeu suavemente, permitindo que o sangue fluísse. Assim que o líquido tocou sua língua, seus olhos se arregalaram de surpresa.

    O sabor era indescritível. Doce, intenso, quase divino. Como se o sangue carregasse uma essência pura, algo além do que ela já havia experimentado antes. Cada gota parecia vibrar com poder, e à medida que o sangue fluía por suas veias, ela sentiu sua força retornar com vigor. Seus sentidos se aguçaram, sua mente clareou e, mais importante, a sede desapareceu por completo, deixando-a revitalizada como nunca antes.

    Mas o que mais a surpreendeu foi a sensação familiar. Este gosto… Eu já provei isso antes. Ela lembrou-se imediatamente de uma vez no passado, quando recebeu uma das reservas de sua mãe. O sabor era tão intenso, tão inesquecível, que ficou gravado em sua memória para sempre. Agora, ao beber o sangue de Elior, ela percebeu que era o mesmo.

    Ela parou, sentindo-se um pouco culpada por ter tomado mais do que o necessário. “Me desculpe,” disse ela, recuando. “Eu tomei mais do que deveria.”

    Elior apenas sorriu gentilmente, seus olhos brilhando com uma doçura que ela raramente via. “Você pode tomar quanto quiser, Hope. Não precisa se preocupar.”

    Ela sentiu uma onda de gratidão, algo quente que a preencheu de uma maneira que não esperava. Elior, sempre tão calmo e gentil, era um mistério para ela, mas também um porto seguro em momentos como este.

    Sem pensar muito, ela se permitiu relaxar. Mas sua surpresa foi ainda maior quando Elior, de forma natural e carinhosa, colocou a mão sobre sua cabeça, começando a acariciar seus cabelos suavemente. Hope ficou envergonhada instantaneamente, seu rosto ficando quente.

    “Elior…” ela começou, tentando protestar, mas sua voz soou fraca. Ele apenas continuou a sorrir, despreocupado, tratando-a com um carinho que era quase infantil, como se estivesse cuidando de uma criança.

    “Você parece tão cansada,” ele comentou com um sorriso tranquilo. “Descanse um pouco.”

    Hope estava prestes a dizer algo, mas as palavras falharam, e antes que percebesse, deitou-se na grama ao lado de Elior, repousando sua cabeça no colo dele. Sentia-se estranhamente à vontade, e as carícias suaves em seus cabelos eram calmantes. Cada movimento dele era leve, tranquilo, e ela sentiu seus olhos começarem a pesar.

    Essa sensação… é tão familiar. A nostalgia encheu seu peito. Como se já tivesse vivido isso antes.

    Por algum motivo que ela não conseguia entender, seus olhos começaram a se encher de lágrimas. Mas ela as conteve, não querendo parecer frágil. E sem perceber, no meio desses pensamentos confusos, Hope foi lentamente cedendo ao cansaço, até que o sono a envolveu completamente.

    Elior, notando que Hope havia adormecido em seu colo, continuou a acariciar seu cabelo com cuidado, sem pressa. Ele observou seu rosto sereno enquanto dormia, uma expressão de paz que não via nela há dias. Ele não disse nada, mas seus olhos carregavam uma compreensão profunda e silenciosa, e, por enquanto, ele apenas a deixou descansar em paz.

    Na manhã seguinte, enquanto Hope se preparava para sair e investigar a área mais uma vez, ela ainda sentia os efeitos da noite anterior. Suas forças estavam completamente restauradas, e o poder que o sangue de Elior havia proporcionado a ela era inegável. Contudo, toda vez que tentava afastar os pensamentos sobre o que havia acontecido, a lembrança insistia em voltar, especialmente a sensação de conforto enquanto adormecia no colo de Elior.

    E agora, enquanto ajustava sua capa e prendia as luvas, ouviu o som de passos. Ao se virar, viu Elior e Aiden se aproximando para acompanhá-la. O coração de Hope disparou por um breve momento ao encontrar os olhos de Elior, mas ela rapidamente desviou o olhar, sentindo o calor tomar seu rosto.

    Ela não conseguia encará-lo diretamente, e aquilo a deixava desconfortável. Sabia que não havia nada de errado no que aconteceu, mas ainda assim, a intimidade do momento mexia com ela de uma maneira que não conseguia entender. Elior, por outro lado, parecia completamente despreocupado, seu olhar sereno como sempre.

    Foi então que Aiden, sempre atento às mudanças de humor e gestos, notou a expressão de Hope e, claro, não podia deixar passar a oportunidade de provocar.

    “Ah, então foi isso que aconteceu ontem à noite?” ele comentou com um sorriso travesso no rosto, cruzando os braços. “Eu sabia que tinha alguma coisa no ar. Vocês dois estão diferentes hoje…”

    Hope imediatamente sentiu seu rosto queimar ainda mais, e um misto de vergonha e confusão tomou conta dela. “N-Não foi nada!” tentou se justificar, sua voz um pouco mais alta do que pretendia. “Não é o que você está pensando!”

    Aiden riu, aproveitando a reação exagerada dela. “Claro, claro… Deve ter sido uma ‘investigação muito intensa’ então, não?” Ele levantou uma sobrancelha, claramente se divertindo com a situação. “Só espero que isso não tenha afetado suas habilidades de combate, porque temos uma missão, lembra?”

    Hope abriu a boca para rebater, mas as palavras simplesmente não saíam. A única coisa que conseguiu fazer foi cruzar os braços e virar de costas, tentando esconder a vergonha que crescia ainda mais. Ela não sabia como lidar com Aiden em momentos como esse — ele sempre sabia como deixá-la sem fala com seus comentários sarcásticos.

    “Não foi nada disso… E-Eu só estava—” Ela tentou continuar, mas desistiu, percebendo que qualquer coisa que dissesse seria motivo para mais provocações. Optou por simplesmente ficar em silêncio e continuar com os preparativos.

    Ele realmente não tem jeito.

    Enquanto ajeitava os equipamentos, Hope se pegou pensando em como via Elior. Eu não sinto nada romântico por ele… Ela refletia em silêncio, tentando processar os próprios sentimentos. Elior não a fazia sentir as mesmas emoções que via nas histórias de amor, aquelas sensações de desejo ou paixão. Na verdade, ele era mais como… uma figura paterna para ela? Talvez algo como um filho, ou até um irmão. Era confuso, e nem ela sabia exatamente o que pensar.

    No entanto, uma coisa era certa: ela se sentia grata por Elior. Ele sempre esteve ao lado dela, apoiando e protegendo de maneira silenciosa, mas constante. E Aiden… bem, ele era uma força completamente diferente. Mesmo com seus comentários provocadores, Hope sabia que ele se importava de verdade com o bem-estar do grupo, sempre aliviando a tensão com sua personalidade brincalhona.

    Ao olhar para os dois, ela sentiu uma onda de gratidão. Estou cercada de pessoas incríveis. Embora muitas vezes se sentisse sobrecarregada pelas responsabilidades, não podia negar que estava feliz por ter esses membros tão preciosos em sua equipe. Elior e Aiden, cada um com suas qualidades únicas, faziam com que a missão não fosse apenas mais uma obrigação, mas uma jornada que ela sentia que valia a pena enfrentar.

    Elior, observando Hope em silêncio, percebeu o leve desconforto dela, mas não disse nada. Ele sabia que ela ainda estava processando os eventos da noite anterior e que o melhor seria dar-lhe espaço. Aiden, no entanto, continuou sorrindo, claramente satisfeito por ter provocado a reação desejada.

    “Pronto para partir?” Elior perguntou, finalmente quebrando o silêncio.

    Hope, já mais recomposta, apenas acenou com a cabeça, sem conseguir olhar diretamente para ele ainda. “Sim… Vamos.”

    Com os três prontos, eles se dirigiram para mais um dia de investigação, a tensão do momento sendo suavizada pelo humor natural do grupo. Embora ainda estivesse um pouco envergonhada, Hope sabia que, com eles ao seu lado, poderia enfrentar qualquer desafio que estivesse por vir.

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