Capítulo 2 – Nova vida
Capítulo 2 – Nova vida
A minha memória não estava muito boa, mas lembrei que senti uma dor no peito e liguei para a emergência e também que havia saído do banho quando isso aconteceu. Eu estava só de toalha, fiquei toda envergonhada só de imaginar.
Olhei para o seu crachá, estava escrito Doutor Miguel.
Ele sorriu e me perguntou se eu estava me sentindo bem, respondi que sim ao tentar me levantar. Ele se aproximou e me auxiliou a acomodar. Ao ajeitar na cama, não pude ficar sem me impressionar ao ver aqueles olhos azuis por perto. Um azul profundo igual à cor do céu e eu quase não conseguia esconder a admiração. Ele deu um passo para trás, de repente o sorriso se escondeu e o rosto ficou sério.
— Posso saber seu nome? — disse olhando para os papéis que tinha na mão.
Me senti incomodada, falei o meu nome e em seguida veio outra pergunta.
— Vi que já és maior, vives com alguém? — dessa vez olhando diretamente para meus olhos.
— Não, vivo sozinha. Por quê?
Não sabia ao certo o que estava acontecendo, mas a minha intuição dizia que não era boa coisa. Por que queria saber se vivo sozinha, será que era algo grave ou aparentava viver com pais?
Perdi os meus pais há mais ou menos cinco anos, desde então tenho cuidado da minha irmã. O meu pai sofreu um acidente de carro quando tentou desviar de um garoto que estava atravessando a estrada. Perdeu o controle e bateu num poste de iluminação e morreu. Depois de alguns meses a minha mãe.
O problema de coração dela se agravou e o médico havia dito que a doença piorou devido à perda do marido, ela havia parado de tomar os medicamentos e chegou ao um ponto em que não havia mais nada que pudesse fazer e ela acabou por falecer.
— Com os exames feitos, diagnosticamos que tens insuficiência cardíaca. De agora em diante tens que mudar o seu estilo de vida e…
Após ter escutado o diagnóstico, mil pensamentos invadiu a minha mente de um momento para outro que me fez parar de ouvir o médico.
“Como assim, eu estou doente? Como isso aconteceu? O que vou fazer? Se eu morrer, quem vai cuidar da minha irmã? Comecei a trabalhar muito cedo, nunca tive quaisquer sintomas. Quem vai pagar os estudos da minha irmã? Como isso pode ter acontecido?” Senti o meu chão desaparecer naquele momento, a minha vida já não estava lá uma boa coisa e depois daquilo não fazia a menor ideia do que iria acontecer.
— Mas como assim estou doente, doutor? — perguntei apavorada. — Eu sempre fui boa de saúde, até a manhã de ontem, eu estava super bem.
O médico respirou fundo e respondeu:
— Normalmente isso não avisa, simplesmente aparece. Pode ser hereditário ou diagnosticado, devido à má qualidade de vida da pessoa.
— Entendo… a minha mãe morreu pelo mesmo motivo. E também não ando cuidando muito da minha saúde. Talvez seja a junção deles que condicionou isso — murmurei que quase nem dava para ouvir, se não tivesse a prestar bem a atenção, é que depois de ouvir aquilo ninguém fica bem.
— Entendo. Só com mais exames posso te dizer se é ou não verdade — disse o médico olhando para mim.
— Quanto tempo tenho de vida, doutor? — perguntei de cabeça baixa.
O médico reparou que eu estava abatida, talvez porque meus olhos tinham se enchidos de lágrimas, sem ao menos eu notar, estava chorando. Senti os meus olhos molhados, uma angústia no meu peito e minha boca trêmula.
— Podes ter uma vida normal seguindo as orientações dos médicos, e tomar os medicamentos sempre às horas.
Aquela notícia simplesmente me desestabilizou, terminei de fazer todos os exames e recebi alta. Tinha faltado ao trabalho três dias, por isso tinha que levar um comprovativo do hospital. Depois daquela notícia, não havia muito o que fazer. Programei a minha rotina de acordo com as indicações do médico.
O médico havia dito para ter alguém a viver comigo, eu só tinha a minha irmã e eu não podia em hipótese nenhuma falar para ela sobre isso, senão ela iria largar os estudos para cuidar de mim, e aí que eu iria morrer de verdade.
Voltei a minha rotina, mas eu já não trocava as minhas folgas. Eu as aproveitava. Comecei a ter uma paixão pela natureza, aliás sempre me fascinava, só que estava sempre ocupada com o trabalho. Ir ao parque e fazer caminhada pela estrada de terra virou a minha rotina em todas as manhãs, os meus colegas de trabalho começaram a perguntar o porquê que já não aceitava trocar.
Eu respondia que precisava sair mais vezes, que estava ficando velha. E sempre com um sorriso no rosto, mesmo sem refletir o que ia no coração.
Passei a ter mais gosto pela minha vida, e tentar viver mais anos possíveis ao menos até me sentir satisfeita e em paz.
A primavera havia chegado, decidi ir ao parque fazer uma caminhada e respirar um pouco de ar fresco era o meu dia de folga. Conheci um menino, ele usava um tênis todo sujo de lama, poeiro, camisola vermelha e calções curtos. Os cabelos lisos de cor dourado e eram aparentemente morenos.
No começo ele estava bravo porque a mãe não queria brincar com ele. Mas, depois de criarmos laços um com o outro, nos divertimos muito. Acabei fazendo um amigo, coisa que nem sabia como se fazia.
Recebi uma chamada da minha irmã no caminho de casa, me perguntando se estava tudo bem, como sempre disse estar mesmo não estando. Cheguei em casa, no caminho havia comprado um pote de gelado, sentei no sofá comendo e vendo um filme.
Acabei pegando no sono, estava relaxada porque o meu chefe me deu quinze dias de folga que foi uma surpresa e o rapaz com que eu dividia o quarto saiu em viagem. Então não tinha muito do que me preocupar.
Despertei na madrugada com falta de ar, havia esquecido de tomar os medicamentos. Até parece um déjà vu, lembrando da minha mãe. Comecei por deixar os medicamentos na cabeceira mais perto possível, foi uma das ideias que o médico lindo me deu. Saber que estás mais perto da morte te faz ver o mundo com outros olhos.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.