Capítulo 6 – Genialidade duvidosa
Kino guardou o isqueiro no bolso e pegou o sapato em chamas do chão.
Ele respirou fundo, ignorando o medo crescente no peito e esperou o momento certo.
A criatura abriu a boca, soltando um rugido que parecia um trovão. Um calafrio percorreu sua espinha.
“Só tenho uma chance…”
O garoto de cabelos pretos lançou o sapato com toda a força que conseguiu reunir.
Bum!
A explosão foi ensurdecedora. Kino foi arremessado para trás como uma boneca de pano. O calor bateu em seu rosto com tanta força por um momento ele achou que sua pele fosse derreter como sorvete.
Quando o corpo dele se chocou na parede de concreto, tudo girava. Piscou algumas vezes, tentando focar sua visão. Por um instante, conseguiu ver os destroços do monstro espalhados pelo chão, misturados com aquele líquido verde nojento que piorava ainda mais o cheiro horrível do lugar.
” Não posso…”
O jovem tentou se mexer, porém seu campo de visão começou a escurecer, e antes de apagar, ele viu apenas um par de sapatos velhos se aproximando.
” Morrer aqui…”
Quando Kino acordou, o céu estava escuro. Uma fogueira queimava perto de si, iluminando o local com uma luz trêmula. O cheiro de carne assada invadiu seu nariz, e o estômago de Kino roncou tão alto que ele mesmo ouviu.
Kino tentou se mexer, mas seu corpo ainda estava travado. Foi então que percebeu algo estranho: estava completamente pelado. Sem roupas.
Kino ouviu passos pesados se aproximando. Fechou os olhos, tentando parecer inconsciente. Logo, uma voz grave e resmungona começou a ecoar, acompanhada de um som metálico.
Kino abriu os olhos devagar e viu uma figura enorme, com quase dois metros de altura. De costas, parecia um ogro, mas quando virou, ele percebeu que era algo ainda pior. O ser tinha um olho só. Um olho gigantesco e leitoso bem no meio do rosto.
” Eita fedor da miséria… É como se essa criatura tivesse mergulhado em um tanque de urina e fezes.” Seu estômago embrulhou.
Ele não precisava ser um gênio para juntar as peças: a fogueira crepitando, o cheiro de carne, o olhar faminto que o monstro lançava na direção dele.
— Humano… comida! — gritou a criatura, e sua voz parecia capaz de partir pedras.
O som reverberou no peito de Kino e ele teve que lutar para não entrar em pânico. Tentou mais uma vez mover seu corpo.
” Merda…”
Seu cérebro gritava comandos, mas o corpo simplesmente não respondia.
Foi então que ele sentiu algo. Um movimento mínimo.
“Um mísero dedo.”
Era quase nada, mas naquele momento parecia um milagre.
“Preciso agir rápido…” Não tinha como ele enfrentar aquele monstro diretamente — ele era forte, grande e, pior, faminto. Se fosse para sair vivo, teria que usar o pouco que tinha de inteligência e torcer para que isso fosse suficiente.
Deitado ali, paralisado, Kino começou a planejar. Cálculos loucos passavam pela sua cabeça enquanto concentrava toda a força do seu corpo naquele único objetivo: mexer mais do que aquele maldito dedinho antes de virar churrasco. Ele precisava ganhar tempo.
— Ei, grandão — chamou o monstro. O ciclope se virou, parecendo surpreso.
— Humano… morto… pensei.
— Você tá com fome, certo?
O monstro balançou a cabeça, concordando.
— Assar… você… Quero.
Ele se aproximou e pegou o pescoço de Kino apenas com uma mão. Ele não conseguia respirar, e já começava a se arrepender do plano.
— Mais… humanos!
O monstro soltou o pescoço de kino. O jovem mal conseguia respirar parecia que ele tinha comido um pote se pimenta.
— Humano… mentiroso — gritou o monstro.
Conseguiu sentir o bafo quente e podre do monstro. Seu estômago embrulhou.
— Verdade… juro! — Kino conseguiu mexer os dedos de uma mão.
“Só tinha de continuar assim..”
O ciclope começou a coçar o queixo, como se estivesse tentando pensar em algo.
— Humanos… mostrar.
— Daqui a cinco minutos, pode ser?
— Humanos… agora! — rugiu o monstro, batendo o punho no chão com tanta força que tudo ao redor tremeu. Sentiu o impacto subir pelos ossos e, naquele momento, soube: não ia ser fácil enrolar aquele cara.
” Caralho! Pensa!”
O ciclope pegou o Kino com uma mão e arreganhou a boca.
Kino viu os dentes podres afiados e uma saliva verda saindo da boca dessa criatura.
— Calma aí, irmão! — uma outra voz surgiu, vinda da escuridão. Grave, firme e com uma autoridade que fez até o ciclope congelar por um segundo.
— Fome… irmão… comer — respondeu o ciclope enquanto apertava Kino com uma mão.
— Já disse que agora não! — a voz trovejou, tão cheia de poder que o ciclope imediatamente se encolheu, quase como uma criança que leva bronca.
” Hã? “
O garoto nem precisava ver o corpo para imaginar: devia ser o dobro do tamanho, três vezes mais forte e infinitamente mais assustador. Kino engoliu em seco, percebendo que qualquer plano que tivesse acabava de ir para o ralo.
— A gente precisa de uma espada pra cortar a pele dele. Vá buscar uma. — ordenou o outro monstro, com a frieza de quem estava acostumado a dar ordens.
— Mas… irmão… é longe. — O ciclope hesitou, olhando para o chão como um cachorro que acabou de ser pego fazendo besteira.
— Não me interessa. Quer que eu vá aí buscar?
— Não… irmão. — Ele balançou a cabeça rapidamente e, ainda resmungando, começou a se afastar, deixando para trás o cheiro horrível de suor e urina.
Por um segundo, Kino sentiu um alívio. Pelo menos aquele ciclope tinha ido embora. O bom era que agora ele conseguia se movimentar. O ruim? Bem, ainda tinha outro problema gigantesco para lidar: o “irmão”.
— Não se assuste com a minha aparência.
“Como se falando isso fosse ajudar…”
Ele tentou procurar por algo que pudesse lhe ajudar. As únicas coisas que conseguiu achar foram pedrinhas e suas roupas largadas no chão.
“Não podia ser melhor…”
A criatura saiu da escuridão revelando seu…
“Isso só pode ser brincadeira…”
Kino tinha se enganado. Ele esperava um ciclope com talvez cinco metros de altura que desse medo até no capeta.
Porém o que encontrou não respondeu com suas expectativas.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.