Capítulo 86: Pode Ser Feito, Não Pode Ser Feito (2/3)
Seol Jihu viu a lâmina do machado. Aquilo foi o fim.
No momento em que colidiram, uma terrível mistura de ruídos desorientadores ressoou em seus canais auditivos, e sua visão escureceu rapidamente. A parte de trás de seu nariz ficou ardendo e quente por algum motivo. As outras sensações que ele percebia simplesmente desapareceram.
O rangido metálico já não podia mais ser ouvido. Ele também não sentia ter sido cortado. Era como se o tempo tivesse sido cortado.
Mas isso durou apenas um breve instante.
— …
A dor horrenda…
— …Ah.
…Veio bater à porta com atraso.
“Huuaaaaakkk!!”
Se pudesse, ele teria gritado tão alto que rasgaria suas cordas vocais. No entanto, a dor intensa e paralisante não lhe permitia sequer abrir a boca.
Poderia ser descrita como a dor do sangue fluindo em sentido contrário? Parecia que todos os seus ossos tinham se despedaçado e sua carne explodido em pedaços. A sensação dos músculos do ombro sendo dilacerados e rasgados em pedaços era uma dor de outra dimensão, uma tortura que não podia ser descrita em meras palavras.
O que lhe trazia ainda mais desespero era o fato de não sentir nada em ambos os braços.
Não era como se não pudesse mover os braços, não, era mais como se eles nem existissem em primeiro lugar. Ele até chegou a pensar que seus braços deviam ter sido arrancados pela força da colisão.
“Eu não deveria ter me metido…”
O arrependimento veio à tona com atraso. Se havia sido contratado como carregador, deveria ter ficado quieto. Por que precisou se intrometer aqui?
“Será que eu morri?”
Só agora percebeu que o ambiente também havia se tornado silencioso. Tudo parecia abafado, como se estivesse ouvindo debaixo d’água.
Será que estava ficando surdo, ou havia morrido? Seol Jihu pensava nisso, mas então percebeu que havia algo estranho.
Se realmente estivesse morto, não deveria estar sentindo dor. Como ainda sentia, então…?
— !!
Sua mente despertou num instante. Seus olhos se abriram escancarados.
A primeira coisa que viu foi um enorme machado, tão próximo que quase tocava seus globos oculares. Na verdade, ele conseguia até perceber a sutil vibração da lâmina.
Seus dois braços, que ele achava que, no mínimo, estariam quebrados, ainda estavam presos aos ombros. O cabo da lança que segurava com ambas as mãos estava pressionado contra o machado e o impedia de descer ainda mais.
A expressão de Seol Jihu ficou atônita. Mesmo sendo ele quem fazia aquilo, sua expressão indicava descrença.
…Mesmo que seus ombros parecessem prestes a se despedaçar a qualquer momento, e seus braços tremessem como se fosse largar a lança ao menor estímulo.
Mas se havia algo que ninguém poderia tirar dele naquele dia, era o fato de que ainda permanecia de pé, resistindo com determinação.
Era um momento crítico, onde um único erro poderia levar à aniquilação da expedição. No entanto, Seol Jihu havia conseguido defender contra um ataque relativamente complacente que, ainda assim, o pegou de surpresa.
Hrrrr?
Ainda não havia terminado. A distância entre ele e o monstro era curta. Surpresa com a súbita intervenção, a Lioner fêmea sabia que o humano à sua frente não era páreo para ela. De fato, ele era tão fraco que, se aumentasse sua força só um pouco mais, seria esmagado sob seus pés.
E assim, as mãos que agarravam o machado emitiram um ruído de pressão enquanto o monstro aumentava sua força. Só mais um pouco, só um pouco mais, esmagar o humano, e então…!
— Uuuu…!
Seol Jihu soltou um gemido à medida que a pressão aumentava mais um nível.
A alegria de sobreviver durou apenas um instante. A sensação da lâmina fria pressionando sua testa podia ser sentida agora. O sangue escorria e se acumulava ao redor de seus olhos. À medida que sua visão se tingia de vermelho, pensamentos de rendição surgiram em sua mente.
Esses pensamentos sussurravam que era um milagre ele ter resistido até agora, que resistir mais era impossível, que morreria de verdade dessa vez.
No momento em que esses pensamentos surgiram, as ‘emoções’ que estavam silenciosamente submersas abaixo de tudo se agitaram violentamente. Ele sentiu como se tivesse sido arrancado e colocado de volta em terra firme depois de afundar cada vez mais no fundo de um mar sem fim.
“Mas, por quê?”
Ele já havia chegado a uma conclusão e desistido? Não era como se tivesse esgotado tudo o que podia ainda.
— Keuk!!
Ele agarrou o cabo da lança com ainda mais força. Suas palmas deviam estar rasgadas, pois doíam terrivelmente, mas ele não ligou para isso. Seu olhar fixo no inimigo se tornou ainda mais afiado.
A aceitação do fim que sentia transformou-se na determinação de não querer terminar as coisas ainda.
Os pensamentos de desistir, dizendo que era impossível continuar, mudaram para um desejo ardente de não desistir.
E finalmente, o desespero que dizia que ele não conseguiria mudou para a esperança de que ele poderia conseguir.
Os olhos de Seol Jihu, antes presos em confusão e incerteza, recuperaram seu brilho no momento em que começou a ‘negar’ todos os pensamentos negativos em sua cabeça.
— Keuh…!
Ele respirou fundo, bem fundo, e…
— Keuhkk!!
Ele reuniu cada gota de força e circulou cada gota de mana por todo o seu corpo.
O poder oculto que ele nunca havia sentido antes irrompeu das profundezas de seu ser. A energia avassaladora e escaldante, surgindo como uma maré, concentrou-se em seus braços. A lança começou a vibrar com um estranho zumbido.
Seu rosto ficou avermelhado. Todos os seus músculos incharam, e suas veias ficaram tão esticadas que pareciam prestes a estourar.
Grit!
Seol Jihu cerrou os dentes e lentamente ergueu os braços mais alto.
Foi nesse momento que os outros ao redor puderam ver ‘aquilo’, a cena que desafiava completamente o senso comum.
Para ser mais específico…
— Keeeuuuuaahhhh!!
…era a cena da lança de Seol Jihu lentamente forçando para cima o machado da Leoa.
O machado que tocava seu rosto foi empurrado acima de sua cabeça e, então, lentamente, subia cada vez mais alto no ar. A Leoa também estava dando tudo de si, a prova sendo seus braços que seguravam o machado tremendo violentamente. No entanto, mesmo assim, a arma subia agonizantemente devagar, como se ele estivesse levantando pesos pesadíssimos.
Diante da força nunca antes vista que continuava a crescer, os olhos da Leoa começaram a demonstrar sinais de pânico pela primeira vez.
Foi então que o corpo de Seol Jihu se desequilibrou por um momento.
O motivo era simples. Foi porque a Leoa não conseguiu mais resistir e deu vários passos para trás.
Era isso mesmo, ela havia recuado. E o resultado disso foram os olhares de incredulidade gravados nos rostos dos membros da expedição, assim como no rosto da Leoa líder, que caiu com uma flecha cravada nela.
Esse era um evento que não deveria ter acontecido, e a visão que presenciaram quebrou completamente o senso comum. Embora tenha sido apenas por um breve momento, um Guerreiro de Nível 1 não apenas conseguiu pressionar um monstro que era reputado como mais forte que um Guerreiro de Nível 4, como também o forçou a recuar!
“Preciso perfurá-la…”
Assim que perdeu seu objetivo, seu alvo, toda a sua força o abandonou. Suas pernas cederam e seus joelhos tocaram o chão. Um profundo cansaço tomou conta de todo o seu corpo. Tudo o que conseguia fazer era aguentar assim, sem desabar.
Instintivamente, a Leoa ergueu o machado bem alto no momento em que viu Seol Jihu caído no chão, sua respiração desordenada. Ela sabia que precisava matar o Mago, mas o medo que sentira agora pouco soou como um alarme em sua mente, dizendo que aquele humano precisava morrer primeiro.
Pzzzt!!
No instante seguinte, uma única linha de eletricidade avançou como uma lâmina de luz e decepou a mão direita da Leoa. O machado caiu desamparado no chão, e a Leoa soltou um lamento de dor e tristeza.
Seol Jihu observou com uma expressão atônita, mas de repente sentiu uma enorme mão batendo em suas costas.
— Kuk?!
— Bom garoto!! Muito bom, muito bom!
Quando ele tinha chegado? O sempre calmo Dylan estava sorrindo feliz e exibindo todos os dentes.
— Ahahaha!!
Em seguida, Seol Jihu sentiu alguém esfregar levemente o topo de sua cabeça. Chohong passou por ele e o olhou por alguns momentos antes de rir alegremente também.
— Euhah, ahahaha!!
Samuel gargalhou como um louco e deu um tapa no ombro de Seol Jihu enquanto passava.
“Esses caras?!”
Ele já estava meio morto de tanta dor no corpo!
— Por que vocês…!!
— Uwaahk?!
Seol Jihu estava prestes a gritar ‘Por que vocês continuam me batendo?’ mas Hugo gritou primeiro.
— Uwaaaahk!!
Hugo gritou novamente, como se as emoções que não conseguia controlar transbordassem, e seu rosto misturava excitação, pura alegria e extrema felicidade.
Seol Jihu ficou olhando feito um idiota para Hugo, enquanto o grandalhão agarrava com energia seu machado, que até então se mantinha pendurado com dificuldade. De repente, o jovem sentiu alguém apertando firmemente seu pescoço em um abraço. Era Alex.
— Muito bem!! Muito bem mesmo!!
Alex gritou com uma voz extremamente eufórica, e, no ritmo em que estava, poderia até começar a beijar o jovem.
— Seol arriscou a vida para criar essa oportunidade para nós.
Dylan falou, incapaz de disfarçar sua própria empolgação.
— Restam poucos deles. Matem todos!!
Wuoooooooohhh!!
A boa luta de Seol Jihu encorajou os membros da expedição, e todos avançaram com espírito renovado.
Logo, a Floresta da Negação se encheu com os sons de armas se chocando e dos gritos dos Lioners.
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