Índice de Capítulo

    O ponto de encontro era onde as estradas se uniam em uma só e levavam até o cânion. Ficava a cerca de dois dias de viagem da Floresta da Negação, mas a expedição decidiu acelerar o passo após receber o pedido para chegar lá o mais rápido possível.

    A expedição marchou durante todo o dia e, quando o sol se pôs além do horizonte, montaram acampamento para passar a noite. Dylan ficou bastante satisfeito com o progresso, dizendo que deveriam chegar ao ponto de encontro na manhã seguinte, já que haviam percorrido bastante distância naquele dia.

    Após o jantar, Ian perguntou se Seol Jihu deixaria que ele avaliasse o brinco. O jovem também estava curioso sobre seus efeitos, então o entregou sem dizer nada. Quando Ian lhe contou que o processo de avaliação poderia levar um tempo, Seol Jihu decidiu fazer uma pausa para fumar e caminhou até a borda do acampamento. Ainda se sentia um pouco inquieto.

    Enquanto estava sentado no chão fumando, de repente sentiu um ar quente roçar em sua bochecha. Dylan lhe estendia uma xícara de chá.

    — Obrigado.

    — Mais do que palavras, são as ações físicas que transmitem melhor o que queremos dizer.

    Seol Jihu riu e puxou outro cigarro para oferecer. Dylan o acendeu e inalou profundamente, assumindo uma expressão de renovação. Sentou-se ao lado do jovem.

    — Em que você estava pensando?

    — Estava pensando no Samuel e no Alex.

    Seol Jihu respondeu com franqueza. Dylan parou de levar a xícara à boca.

    — Puxa vida. Me enganei de novo.

    — ?

    — Achei que você estava pensando na guerra.

    — Ah, isso. Bem, é algo que eu vou acabar enfrentando mais cedo ou mais tarde de qualquer maneira.

    Seol Jihu sorriu fracamente e falou com uma voz desanimada.

    — É só que… ainda não consigo aceitar direito o que aconteceu.

    — Primeira vez vendo alguém morrer?

    Não era o caso. Mas, da perspectiva de Seol Jihu, tanto Samuel quanto Alex não eram simples desconhecidos.

    — A vida no Paraíso é assim. O cara com quem você conversou de manhã pode voltar como um cadáver à noite.

    — Você parece bem, Dylan. O Mestre Ian também. A mesma coisa para a Chohong, o Hugo…

    — …Hmm.

    Por alguma razão, Dylan pareceu desconfortável, como se tivesse dificuldade para abrir a boca. Seol Jihu se perguntou se havia dito algo impróprio e decidiu mudar de assunto.

    — A propósito, o que vocês vão fazer quando chegarmos lá?

    — Hm? Ah, isso. Estamos pensando em nos juntar à guerra, desde que a realeza não peça algo absurdo. E, embora ele não tenha dito nada, parece que o Mestre Ian também deseja isso.

    — A Chohong não vai surtar?

    — Não. Ela pode até parecer assim, mas ainda sabe separar seus deveres dos sentimentos. Claro, vou ter que convencê-la primeiro, mas uma chance de ficar com um Mago em dívida não é fácil de conseguir. Vale a pena.

    Seol Jihu não tinha certeza, mas pelo jeito, Dylan havia feito sua escolha levando Ian em consideração. Estaria tentando conquistar o favor de um Mago? Embora Dylan soasse como se estivesse calculando friamente ganhos e perdas, Seol Jihu não se sentiu incomodado com isso.

    Depois que a conversa terminou, um momento de silêncio se instalou entre os dois. Os únicos sons eram o chá sendo bebido e o cigarro sendo tragado.

    Pouco depois, Dylan abriu a boca.

    — Seol.

    — Sim?

    — Não sei se é cedo demais para você, mas…

    Foi nesse momento que uma voz chamou pelo jovem vindo de trás. Parecia que Ian havia terminado a avaliação.

    — Oh. Vamos lá ver?

    Embora tenha sido interrompido, Dylan não se importou e se levantou do chão.

    “O que ele estava tentando me dizer…”

    Não parecia que queria recrutá-lo; era como se Dylan tivesse outra coisa em mente. Seol Jihu levou consigo essa curiosidade sem resposta enquanto caminhava de volta para as barracas.

    Dentro da barraca, Ian sorria esperando a chegada do jovem. Enquanto isso, tanto Chohong quanto Hugo olhavam para o brinco com os olhos brilhando.

    — Parabéns.

    Assim que viu Seol Jihu, Ian o parabenizou.

    — Como era de se esperar do Império. Ainda não entendo como uma nação capaz de produzir bens assim foi destruída tão facilmente.

    Ian deu uma risada jovial e devolveu o brinco.

    — O nome desse item é ‘Brinco Festina’. Aquela santa realmente lhe deu algo maravilhoso.

    — É um bom item?

    — Claro! Agora, vamos ver. Primeiro de tudo, este Brinco Festina ficará vinculado à primeira pessoa que o colocar.

    — Então é bom pensar bem. No momento em que você colocar e ativar, o brinco vai se tornar completamente inútil.

    Quando Chohong rapidamente complementou, Hugo soltou um alto resmungo.

    — O que é que tem pra pensar? Claro que o Seol deve usar. Esse acessório foi feito para Arqueiros e Guerreiros, de qualquer forma.

    — Calma, calma. Vamos deixar as transmissões desnecessárias de lado por enquanto.

    Ian pigarreou e prosseguiu.

    — Quando você infundir sua mana no ‘Brinco Festina’, a função de ‘Impulso’ embutida nele será ativada. Ou seja, aumentará a velocidade da pessoa que estiver usando. De acordo com o resultado da minha magia de avaliação, sua velocidade geral deve ser aumentada em cerca de 1,5 vezes o normal, e o efeito durará por cerca de um minuto.

    — Keuh!!

    — Além disso, você pode usar o Impulso até três vezes. Sempre que ativar o efeito, ele recarrega automaticamente para o máximo de novo. O tempo para uma recarga completa é de cerca de seis horas.

    — Kyah!

    Seol Jihu permaneceu quieto, mas era Hugo quem fazia todos os efeitos sonoros. Ian então falou com uma expressão que dizia, — Você com certeza vai reagir ao que direi agora.

    — Mas, o mais importante: tanto o número de usos quanto o tempo de ativação podem ser acumulados.

    — Oh.

    Seol Jihu soltou um leve suspiro de admiração.

    — Então, se eu usar o Impulso três vezes seguidas…

    — Sua velocidade será aumentada em até 3,375 vezes, durando três minutos. Ou seja, você conseguirá manter uma velocidade rápida o suficiente para percorrer 100 metros em três, quatro segundos durante três minutos seguidos!

    Ian falou triunfante, mesmo que o brinco nem pertencesse a ele.

    — Desde que o usuário saiba utilizá-lo adequadamente, será capaz de demonstrar uma capacidade de combate assustadora.

    Seol Jihu olhou para o brinco em sua mão. Feito de um material prateado e moldado na forma da Estrela de Davi, havia uma joia de cor marfim presa no centro, que espalhava uma luz suave.

    — Quanto isso valeria?

    — Ei, você!

    Hugo gritou alarmado. Ian sorriu brilhantemente.

    — Quanto você quiser. Porém, você realmente pretende vendê-lo?

    — De jeito nenhum. Quero dizer, eu consegui isso durante a expedição, então…

    — Que bobagem.

    Ian acenou a mão, rejeitando a ideia.

    — Tanto o Prova de Castitas quanto o Brinco Festina são recompensas que você conquistou através de suas ações independentes. Não encontrará nenhum filho da mãe entre nós que sequer pense em tomar parte das suas conquistas.

    Hugo latiu alto como um cachorro. Quando Ian o encarou como se ele fosse um idiota irremediável, Hugo choramingou e rapidamente recuou.

    — Na minha opinião pessoal, seria melhor se você usasse. Esse brinco é valioso demais para ser vendido.

    Seol Jihu equipou o brinco com cautela. Inicialmente, pensou que precisaria furar a orelha, mas, ao aproximar o brinco de seu lóbulo esquerdo, ele simplesmente se fixou ali como se fosse cola.

    — Muito bem. Agora, infunda um pouco da sua mana nele.

    O brinco se tornaria seu no momento em que o ativasse. Embora tenha hesitado por um momento, Seol Jihu logo tomou sua decisão.

    “…Não é como se eu estivesse precisando de dinheiro, de qualquer forma.”

    E assim… Aconteceu quando fechou os olhos e despertou sua mana adormecida.

    Pow!

    Seu cabelo dançou no ar de repente e, ao mesmo tempo…

    — !!

    Uma rajada de vento poderosa passou por ele antes de desaparecer num piscar de olhos.

    Seol Jihu rapidamente examinou seu corpo, completamente confuso. Sentiu como se uma aura sem forma o envolvesse.

    — Quer correr para ver por si mesmo?

    Correr era a especialidade de Seol Jihu. Então, ele começou a correr com tudo o que tinha.

    Logo, Seol Jihu havia saído do acampamento e estava correndo pelos campos de grama, sem conseguir esconder seu choque.

    “Santo Deus.”

    Ele definitivamente sentiu a diferença assim que começou a correr com toda sua força. Quando olhou para trás, viu o acampamento se afastando rapidamente. Até pensou que aquele corpo não poderia ser o dele.

    “Eu posso acumular o efeito, certo?”

    Enquanto circulava pelos campos, despertou sua mana mais uma vez.

    POW!

    Seol Jihu se assustou com a sensação repentina de todo seu ser entrando em um estado estranho. Os objetos ao redor passavam borrados diante de seus olhos. O vento contra seu rosto parecia afiado o bastante para cortar sua pele. Sua mente caótica se acalmou instantaneamente e, de fato, parecia que havia entrado em um novo mundo.

    Ian estava certo. Dependendo de como fosse utilizado, esse brinco exibiria efeitos verdadeiramente inimagináveis, seja no meio de batalhas, em avanços ou até mesmo em fugas. Se conseguisse controlá-lo adequadamente, seria o mesmo que empunhar uma arma absurdamente poderosa.

    Aos poucos, foi se aproximando do acampamento. Seol Jihu achou que seria uma boa hora para desacelerar, então tentou fazer isso. Tentou.

    — Uh…? Uh, uh, uhhhh?!

    Suas pernas não queriam obedecer. Como se fosse um artista de circo, suas pernas se embolaram e, eventualmente, ele não conseguiu vencer a própria inércia e seus membros começaram a realizar uma dança bizarra.

    — Euh?! U-uwaaah?!

    Tombo!! Estrondo! Pancada!!

    No final, ao entrar no acampamento, Seol Jihu caiu feio e rolou no chão. Continuou rolando por um bom tempo antes de finalmente parar.

    — Argh, ai, ai, aiaiai…

    Chohong e Hugo estavam apenas observando até então, mas explodiram em uma gargalhada e quase caíram de tanto rir. Até Dylan e Ian riam alto também.

    À medida que a noite avançava, o acampamento se enchia com os sons das risadas.


    Manhã seguinte.

    A expedição chegou ao ponto de encontro antes mesmo do sol alcançar o meio do céu. Ian entrou em contato com a família real e, em seguida, transmitiu a mensagem para o resto da equipe de que o exército deveria chegar em breve. Seol Jihu conteve o coração acelerado e examinou os arredores.

    A topografia em volta não era nada muito interessante de se olhar. A estrada até o cânion, no entanto, era bastante acidentada. Havia algumas rochas grandes espalhadas aqui e ali, mas o número delas aumentava gradativamente quanto mais a visão se deslocava para o nordeste. Ainda mais adiante, podia-se ver uma imponente cadeia de montanhas, bem além das pedras do tamanho de casas.

    “Então, vamos entrar naquela cadeia de montanhas, hein…”

    Não, ainda não estava decidido que eles iriam até lá. Embora ele estivesse meio tentado a voltar para casa imediatamente… Certamente, seus Nove Olhos o ajudariam a escolher a melhor opção.

    — Esta deve ser sua primeira vez encontrando um membro da realeza.

    Talvez achando toda aquela espera entediante, Ian puxou conversa. Seol Jihu assentiu enquanto brincava com o Brinco Festina.

    — Hmm. Não sei o que você está pensando, mas é melhor abaixar suas expectativas.

    — ?

    — Mesmo sendo da realeza, ainda é um ser humano, não é? Não há necessidade de ficar tenso.

    — Está insinuando que a realeza perdeu seu poder?

    Ian sorriu brilhantemente. Se ele fizesse a mesma pergunta para Chohong ou Hugo, eles provavelmente fariam uma expressão dizendo, ‘Do que você está falando?’. Mas o jovem à sua frente parecia sempre pensar um pouco antes de responder.

    — O que vem à sua mente quando pensa em Haramark?

    — Uhm… Um castelo? Uma cidade?

    — De fato. A maioria dos Terrestres responderia da mesma maneira.

    Ian soltou um suspiro.

    — Em vez de ser vista como um verdadeiro reino, Haramark agora é vista apenas como mais uma cidade. A influência atual da Família Real de Haramark se estende apenas ao endereço onde vivem. E só.

    — Os efeitos colaterais da rebelião devem ter sido grandes.

    — Com certeza, seria tolice negar isso. Contudo, depois da própria rebelião, o rei de Haramark voluntariamente abriu mão da autoridade de governante.

    — O rei… fez isso?

    — Não teve muita escolha. Aprendeu que nem a autoridade real nem uma abordagem forçada funcionavam com nós, Terrestres. Ele teve que mudar de postura. Para sobreviver, é claro.

    A menção de alguém tentando sobreviver soava um pouco desesperadora.

    Seol Jihu ficou refletindo em silêncio sobre o que Ian dissera, antes de abrir a boca.

    — Que tipo de pessoa é a princesa, aquela que vem para cá?

    — Teresa Hussey. Ela é uma mulher e tanto.

    Ian sorriu profundamente. Seus olhos se iluminaram com um calor carinhoso, como o de um avô se gabando da neta.

    — Ela cresceu vendo a invasão de raças estrangeiras. Bem, ela é um caso especial entre os Paraisianos.

    — Especial? Como?

    — O Sistema do Paraíso que nós conhecemos e usamos é, na verdade, uma dádiva concedida apenas aos Terrestres. No entanto, ela é uma das poucas residentes originais que também recebeu essa dádiva.

    Era a primeira vez que ele ouvia algo assim.

    — Então é isso. Paraisianos também podem…

    — Pelo que ouvi, invocaram algo chamado Juramento Real e receberam a dádiva em troca. Eu entendo o lado dela. Como mulher neste mundo, seria necessário ter grande poder para proteger a família restante, ainda mais quando só sobraram dois membros.

    — Qual é o nível da Princesa Teresa Hussey?

    — Oh? Agora que estou olhando melhor, vejo que você está bem interessado nessa dama!

    Ian de repente fez uma expressão maliciosa e cutucou Seol Jihu de leve na lateral.

    — Muito bem! Claro que eu vou contar! Primeiro, ela tem cerca de 32D no busto, e a cintura é tipo…

    — …Mestre Ian.

    — Haha, estou brincando. Só brincando! Ela também é uma Alta Ranker. Nível 5, Cavaleira Princesa.

    Cavaleira Princesa? Seol Jihu inclinou a cabeça ao ouvir um termo que nunca tinha ouvido antes.

    — Sim, o nome da classe dela é meio engraçado. Mas, não se engane. Você precisa deixar de lado aquela ideia pré-concebida de princesas sendo feitas de refém pelos orcs.

    — Parece que eles chegaram.

    Antes que Seol Jihu pudesse pedir uma explicação a Ian, Dylan falou primeiro.

    Instintivamente, o jovem virou o olhar, e sua visão captou algo correndo em direção ao grupo, levantando uma enorme nuvem de poeira à distância.

    Um pequeno gesto, um grande impacto.

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