Capítulo 73

Quão doloroso deve ter sido para ela ter apagado suas próprias memórias?

Raymond Spencer, o mesmo desgraçado insensível por dentro e por fora…

Que jeito de partir o coração dela, conseguindo quebrar uma princesa que parecia resistente a qualquer outra coisa.

Kylo sentiu uma onda de ódio em relação a Raymond e pena pela princesa.

Ela, que parecia não ter medo de nada neste mundo, era agora um ser humano partido.

Ele chegou ao palácio com uma nova consciência.

A ideia de enfrentá-la novamente o deixou nervoso.

Respirando fundo, ele entrou no prédio e subiu lentamente as escadas. Ele chegou à porta do quarto da princesa.

— …

Kylo se deparou cara a cara com Raymond, que estava na porta. Assim que o viu, não pôde evitar soltar uma risada.

— Ha… Você é um desgraçado sem consciência, não é?

O criado que estava acompanhando Kylo viu Raymond e o olhou perplexo.

Os criados que estavam na porta também estavam perplexos.

Kylo tinha uma ideia aproximada da situação.

Raymond tinha vindo ao palácio sem aviso prévio e sem ser anunciado.

Kylo se colocou em frente a Raymond, que bloqueava a entrada.

Seus olhares se encontraram. Uma pequena rachadura apareceu na expressão inexpressiva de Raymond.

— Por que você está aqui? — perguntou Raymond, com voz fria.

Kylo ficou boquiaberto.

Um canto de seus lábios se curvou maliciosamente para cima.

— Claro que estou aqui porque a princesa quer que eu esteja, chama isso de pergunta?

— …

— Então, o que você está fazendo aqui? Você realmente conseguiu o trabalho de babá da princesa, não é?

O sarcasmo não afetou Raymond de forma alguma.

Apenas os criados ao redor estavam perplexos com as faíscas entre eles.

Kylo riu internamente da falta de resposta de Raymond.

É claro que ele não tem nada a dizer.

De repente, ele se lembrou quando Raymond Spencer se aproximou dele na primeira missão da princesa e criou problemas.

E quando voltavam juntos na carruagem.

Raymond deve ter dito coisas indescritíveis para ela.

Como ele poderia feri-la tanto, alguém anos mais jovem que ele, alguém que até o amava?

Que idiota desprezível.

Em retrospectiva, ele estava feliz que a princesa Agnes tivesse perdido a memória.

Ele estava desconfortável porque tinha sido ele quem tinha provocado Raymond naquele dia.

— É verdade que a princesa te pediu para trazer esse homem aqui? — perguntou Raymond aos criados, incapaz de acreditar nas palavras de Kylo.

— Sim, sim… é isso mesmo, Lorde Spencer…

— …

Raymond franzia o cenho enquanto o criado respondia confuso.

Kylo achou a situação hilária. A princesa nem mesmo o havia chamado, e Raymond tinha viajado até ali…

Esse bastardo está se remoendo de culpa.

Kylo perguntou sarcasticamente:

— Eles não dizem que a princesa não se lembra de você?

— …

— Depois de incomodá-la tanto, como se sente sendo apagado da vida dela?

Os olhos de Raymond se agitaram ao ouvir essas palavras.

Kylo o observou, não perdendo nenhum detalhe.

“Você está vendo isso?”

Kylo conteve uma risada de surpresa.

Raymond Spencer costumava ser um bastardo despretensioso.

Ele não conseguia acreditar que ele estava tão agitado.

— De qualquer forma, você deve se sentir aliviado por ela não o incomodar mais.

— … não vale a pena responder.

— Claro que não vale a pena responder.

— Além disso, por que diabos a princesa te convocou? — perguntou Raymond, com um tom de desgosto na voz.

Por um momento, Kylo quase riu alto. Isso era algo para se viver. Ele nunca pensou que veria Raymond ofendido…

— Não sei — respondeu Kylo, divertido e descontraído. — Nunca se sabe. Talvez ela tenha me chamado para substituir você como babá, e é normal que ela se sinta mais confortável comigo do que com alguém que não lembra.

— …

— Agora, se me dá licença, preciso ver a princesa e não quero chegar com um cheiro desagradável.

A discussão estava fugindo do controle.

Um dos criados chamou urgentemente, anunciando a chegada de Kylo Gray.

Tenuemente, veio a voz da rainha de dentro, convidando-o a entrar.

Aliviados, os criados abriram a porta.

Kylo passou ao lado de Raymond, observando-o com diversão.

Para os criados, Raymond ainda estava impassível, mas Kylo notou uma sutil mudança em sua expressão.

Raymond ficou ali por um momento, com os punhos cerrados, e então virou-se.

— Por que você não se senta aqui e espera um momento?

Ao entrar nos aposentos da princesa, Kylo seguiu as indicações do criado e sentou-se no sofá da sala.

// O quarto da princesa é uma sala/salão e tem o quarto separado. Dois espaços.

Contemplando entorpecido a opulência do interior, Kylo lembrou-se da expressão no rosto de Raymond antes.

Desavergonhado.

Ele fingiu que não gostava da princesa…

Deve estar pensando em tornar-se genro do Imperador.

Talvez fosse uma elaborada tática para machucar a princesa e rejeitá-la. De qualquer forma, nunca pensou que seria capaz de chutar a bunda daquele Raymond dessa forma.

Só olhar nos olhos dele, enquanto se contorciam nervosos, foi suficiente para apagar toda a vergonha.

Mas o alívio foi breve.

Kylo começou a ficar tenso ao perceber que teria que enfrentar novamente a princesa.

Olhando ao redor, a sala estava deserta, exceto pelos dois criados.

Ao contrário de ontem, quando o Imperador, o príncipe herdeiro e os médicos estavam presentes, ele agora estava sozinho com a princesa.

Kylo apertou e soltou os punhos, que esfriaram pela tensão, para se acalmar.

“Bem, não há necessidade de ficar nervoso.”

De qualquer forma, a princesa não lembra o que aconteceu naquele dia.

Além disso, ele não a havia forçado a beijá-lo, foi ela quem se lançou e pressionou seus lábios contra os dele.

Então não havia necessidade de ficar nervoso.

Kylo estava no meio de uma lavagem cerebral.

E não teve que esperar muito antes que ela aparecesse.

— Ele chegou, Lorde Gray.

Entrando pela porta, a princesa Agnes vestia um vestido rosa pálido.

Seu cabelo estava preso num coque adornado com flores.

Por um momento, Kylo ficou paralisado pela beleza de seu cabelo.

Era como se uma ninfa da floresta tivesse surgido do nada.

Ele sempre soube que ela era diferente, mas por alguma razão não conseguia deixar de olhar para ela.

Agnes se aproximou e sentou-se em frente a Kylo.

Com voz elegante, ela indicou ao criado que trouxesse chá.

Quando o criado fez uma reverência e se retirou, Agnes se virou para Kylo e sorriu.

— Obrigada por vir tão rapidamente.

— … não.

Kylo conseguiu dizer.

Ao contrário da princesa, que o tratava com tanta despreocupação, ele ficou sem palavras, como se tivesse engasgado.

Sentia-se como um cavaleiro de armadura brilhante diante de uma dama pela primeira vez. Kylo olhou para Agnes, sentindo o rosto arder por algum motivo.

Assim que seus olhares se cruzaram, os olhos de Agnes se curvaram em meia lua e ela sorriu.

Era um sorriso vergonhosamente brilhante.

Ontem ele havia ficado desconcertado com a mudança na princesa, mas hoje era ainda pior.

A mera ideia de estar sozinho com ela deixava Kylo nervoso.

E a razão pela qual ele estava tão nervoso era por causa daquele maldito beijo.