Capítulo 75
Não importa que ela ponha essa carinha tão inocente e desamparada perto da dele…
De repente, ele teve a ideia de que a princesa Agnes poderia não estar fazendo isso só com ele, mas com os outros também.
Certamente era perigoso.
Especialmente se algo assim estivesse acontecendo com Raymond…
O miserável bastardo deveria estar ficando nervoso porque a princesa havia perdido a memória.
Um bastardo como ele faria qualquer coisa.
Olhando para trás, Raymond poderia pensar que era algo bom. Ter todas as suas memórias apagadas significaria que ele teria a chance de começar de novo com ela.
Enquanto pensava nisso, ele sentiu uma pontada repentina de desconforto.
Se, naquele momento, fosse Raymond Spencer sentado diante dela em vez dele…
Esse covarde bastardo poderia ter ousado roubar os lábios da princesa Agnes.
Talvez fosse melhor dar-lhe um aviso.
Kylo olhou inquieto para Agnes.
— …
Foi feio.
Seus olhares se encontraram e a princesa sorriu satisfeita. Ela não percebera que tinha creme nos lábios novamente…
Kylo franziu o cenho e a princesa Agnes piscou.
— Voltei a ter creme nos lábios?
— … sim.
— Então, peço desculpas, mas se importaria de limpá-lo novamente?
Não soava nada arrependida.
Kylo não pôde evitar, então pegou o lenço novamente.
A princesa Agnes piscou desta vez como uma boneca e colocou o rosto nele.
— Ah… droga…
Kylo praguejou baixinho e limpou o creme tão indiferentemente quanto pôde.
Sentiu como se tivesse acabado de ser contratado como babá da princesa, exatamente como tinha dito a Raymond Spencer.
O karma do qual tinha falado tinha voltado para assombrá-lo.
Mas…
Não foi tão ruim.
Foi um momento relaxante.
O sol aquecia e a brisa refrescava sob a sombra.
Nunca tinha ido a um piquenique, mas entendia por que a nobreza tirava um tempo para isso.
Então aconteceu.
De repente, Agnes chamou os criados e ordenou que retirassem as xícaras de chá e os bolos.
Ela vai embora agora?
Mas Agnes não parecia querer se levantar. Quando o lugar foi arrumado, ela disse.
— Peço desculpas, lord Gray, mas posso me deitar um pouco? Gostaria de tirar uma soneca à sombra.
— … ficarei feliz em lhe ceder o lugar.
— Não, não precisa, preciso pegar emprestada uma perna sua.
— O quê?
Agnes sorriu levemente e se aproximou dele.
Então ela se inclinou e apoiou a cabeça em sua coxa sem pensar duas vezes.
Kylo teve que ficar parado, com suas longas pernas esticadas. Aconteceu tão rápido que ele nem teve tempo de dizer que não.
Isso é loucura.
Em sua mente, ele viu o rosto adormecido da princesa Agnes, com os olhos fechados.
Ele não entendia por que estava passando por isso.
As pernas não doíam nem formigavam. A cabeça da princesa Agnes era tão leve que ele mal sentia seu peso.
Era o rosto dela que o deixava perplexo.
Era um rosto tão fino quanto uma folha de papel.
Era tão bonito, como o trabalho de toda uma vida de um escultor, que era difícil desviar o olhar.
Apesar de sua natureza feroz, era fácil ver por que a nobreza elogiava sua aparência.
Cílios fartos e fluidos, nariz afilado e lábios vermelhos abaixo deles…
O olhar de Kylo parou por um longo tempo em seus lábios carnudos.
Os lábios da princesa Agnes tinham sido tão suaves contra os seus naquele dia.
Ao contrário da aspereza de seus próprios lábios, quase secos demais para serem deste mundo.
E eles cheiravam tão bem.
Kylo ainda se perguntava se os lábios da princesa Agnes eram tão suaves como ele se lembrava. Mas perguntar não significava que ele quisesse tocá-los.
Ele tinha talento para a paciência.
Não havia nada na vida que ele não pudesse suportar.
Intimidação, ser ignorado e desprezado, solidão, privações, tortura, batalhas intermináveis.
Seja o que for, não era difícil de suportar. Era o que ele estava acostumado e em que tinha mais confiança.
Mas isso era diferente.
Era mais fácil para ele suportar a tortura em corpo e mente.
A atitude da princesa era desconcertante. Um sorriso tão doce quanto algodão-doce, um tom caloroso e afetuoso, um olhar caloroso.
Essas coisas eram mais difíceis de suportar do que a tortura.
Uma brisa suave e quente soprou sobre eles. Kylo ficou olhando sem rumo enquanto os cabelos da princesa Agnes se agitavam ao vento.
Ele não conseguia desviar o olhar.
Seus lábios deliciosos, cujo toque ele já conhecia, o decote esbelto, a pele branca por baixo. Ele sabia que deveria desviar o olhar, mas não desviou.
Se ela acordasse e fizesse contato visual, certamente se sentiria desconfortável.
Mas…
Kylo a olhou como se não quisesse desperdiçar o momento de fechar os olhos.
Ele podia sentir os fortes batimentos do coração. Era preocupante que seu coração respondesse à princesa Agnes, sem falar de qualquer outra pessoa.
Se havia alguém por quem ele nunca deveria sentir um afeto irracional, seria a princesa Agnes.
Mesmo sabendo disso, seu coração batia.
Ele tinha estado tentando manter distância com medo de desenvolver um coração irreal…
Neste momento, tudo era em vão.
Isso era puramente culpa da princesa Agnes.
Obviamente, ele tinha tentado evitar, fugir… De qualquer forma, seu coração não valia nada para a princesa.
Seria jogado fora como lixo, para nunca ser correspondido.
Ele tinha que parar.
Se não quisesse ser jogado fora como lixo como seus pais o haviam feito…
Se ele não parasse, certamente desmoronaria.
Ele não queria desmoronar.
Ele tinha que sobreviver até o amargo fim e se vingar daqueles que riam dele. Ele não podia deixar que um pequeno afeto arruinasse tudo.
Ele tinha que…
Justo então, um raio de sol se abriu entre o sombrio folhagem.
Os pálidos raios caíram sobre o rosto da princesa Agnes.
Kylo ergueu sua grande palma para protegê-la do sol.
Nunca tinha sentido isso, nunca tinha sentido isso.
Então ele não sabia
Como se acalmar.
Como controlar essa sensação de ir e vir entre o céu e o inferno.
Kylo nunca quis admitir.
Que estava apaixonado.
Tão envergonhados quanto Kylo estavam seus servos e criadas.
Era uma blasfêmia dizer isso, mas eles teriam apostado suas fortunas que ele estava louco. O comportamento da princesa era estranho.
Claro, mesmo antes do acidente, ela tinha se mostrado relativamente calma e gentil naqueles dias.
Mas nunca tinha sido tão gentil. E…
— Por que diabos ela faria isso na frente de Kylo Gray?
Especialmente Emma e Chloe, as criadas da princesa, estavam à beira de um colapso mental.
Elas tinham voltado correndo de uma festa na mansão local ao saber da notícia do acidente da rainha.
Elas podiam aceitar que ela tivesse perdido as memórias de Raymond Spencer, e que já não era tão agressiva como antes.
Mas Kylo Gray…!
Era um homem notoriamente rude nos círculos sociais.
Nunca tinha interagido com ninguém, então era óbvio que não sabia como tratar uma dama.
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