O estalo da coluna foi o primeiro som que Yzael percebeu ao recobrar a consciência. A tocha oscilava num suporte de ferro à sua frente, projetando um clarão trêmulo sobre as paredes rijas do poço. Cada respiro era um punhal cravado nas costas, mas ele se recusou a fechar os olhos de novo.

    “Droga, realmente não é um sonho”, pensou.

    Lentamente, empurrou o corpo até ficar de joelhos. A pedra úmida sob as mãos lembrava-lhe da queda — o prego enferrujado que rasgava sua carne — e a angústia ameaçava dominá-lo. Ele tentou se levantar, mas sem sucesso, as dores eram fortes e agudas, Yzael estava fraco.

    — Acho que o senhor deveria descansar, não acha? — falou uma voz rouca e velha.

    A voz logo foi reconhecida, Yzael se virou e percebeu que o velho que havia o ajudado ontem, estava ali, com uma manta da cor vermelha em suas mãos. — Achei que eu tivesse enlouquecido de vez — falou Yzael para o velho.

    — São os primeiros passos até a mente cair em completas lamentações, jovem. Acabei esquecendo onde guardei essa manta, e no meio da procura acabei pegando no sono, sabe como é, sou um velho.

    Yzael soltou um riso leve, mas perceptível, — Não posso cobrar o senhor de nada, já que nem o conheço.

    — Óh, quanta falta de elegância da minha parte, o dia passou tão rápido que eu acabei esquecendo de me apresentar. Meu nome é Edran Kathuryn, e o seu? 

    O velho se aproximou, entregando sua manta ao rapaz incapacitado. — Meu nome é Yzael. Seu sobrenome não me é estranho, já conheci muitas pessoas com o mesmo sobrenome do senhor.

    — Acho que minha família se empolgou demais na hora de gerar descendentes — riu, — é comum encontrar uma a cada dez pessoas na rua.

    Yzael soltou uma risada franca, mas a única coisa que saiu foram tosses fortes e sangue. — Acho que realmente estou no fundo do poço.

    Ele limpou sua boca suja e enquanto isso, o velho Edran apagava as tochas com fortes sopros. Mas, uma pergunta chamou a atenção de Yzael.

    — Você… conhece um tal de Yorr? — perguntou com uma voz abafada, e com um tom de mágoa.

    O homem ficou sem entender, mas mesmo assim respondeu a pergunta. — Não o conheço como pessoa, mas foi este rapaz quem me ameaçou vir pra cá, caso contrário eu seria banido da guilda de Caçadores. 

    — Entendo… aquele garoto medíocre, a inveja corroeu sua cabeça — respondeu, aparentemente um pouco irritado. 

    — Mas, porquê da pergunta, Sr. Edran? — indagou inquieto, já com a manta vestida.

    — Ah… Yorr é o meu sobrinho, faz tempo que não tenho notícias dele. Mas pelo que a maioria dos novos detentores falam quando entram aqui, é que um garoto loiro, de olhos verdes o enviou após uma tremenda ameaça moral, e isso me fez questionar se ele realmente estava fazendo isso, ou não. 

    Yzael parecia meio confuso, sua cara estava encarando a luz do sol, enquanto prestava atenção nas palavras de Edran. — Infelizmente, seu sobrinho é um garoto egoísta, e pelo que parece, ele será o novo general da Guilda de Caçadores. 

    Edran se virou rapidamente, assustado, foi possível ouvir estalos de suas costas travadas. — O quê? Isso não é possível, aquele garoto idiota quer mesmo ocupar o lugar de general? Que estupidez.

    Yzael se recolocou sob as paredes, visando ficar mais confortável para suas costas, — Não sou de me meter em assuntos de outras famílias, mas acho que aquele moleque merece uns bons socos na cara, para aprender a ser homem de verdade.

    Enquanto isso…

    No Castelo do reino, um Concílio de Guerra estava acontecendo, em uma enorme sala fechada, protegida por dois guardas escoltando uma porta de ferro, enquanto lá dentro era possível notar uma mesa redonda de carvalho escuro junto a detalhes em ferro forjado.

    Acima, um lustre carregado de tochas embebidas de óleo azul-esverdeado que iluminavam as paredes brancas que continham quadros feitos de veludo antigo de velhos generais que protegiam o Reino. 

    A mesa continha quatro pessoas, no centro dos olhares, — Alfred, o atual general do Reino de Reitz.

    O líder segurava um mapa, junto a algumas escrituras antigas e citações desconhecidas para os demais membros do conselho. Ao seu lado, Loky, um exímio mago com habilidades que somente os mais próximos dele sabiam quais eram.

    A frente de Loky estava Nyck, o mago de raios habilidoso, que também segurava alguns mapas e citações do que pareciam ordens de guerrilha. E mais ao centro estava Yorr, aparentemente despreocupado, mas ainda com uma aura de que poderia acabar com qualquer problema tranquilamente.

    Alfred suspirou fundo, — Yorr, mais um guerreiro da guilda foi sentenciado ao Calabouço, você tem noção de quem seja? — indagou, com os olhos azuis fixos ao rapaz.

    Yorr foi pego por uma pergunta desprevenida, mas logo ajeitou sua postura despreocupada e ajeitou sua gola de malha e engoliu seco. — É… era apenas um caçador sem qualquer preparo de liderar uma missão de ultra urgência, Sr. Alfred, se me permite dizer.

    — Você quer se tornar general assim, tirando a concorrência de cena? — debochou Loky, tirando um tatu de seu nariz.

    — Cale-se, Loky, não quero ouvir suas baboseiras — retrucou Yorr com firmeza, batendo a mão contra a mesa.

    — Se me permite, Sr. Alfred —, Nyck interrompeu, levantando sua mão, — o homem que Yorr ordenou que fosse designado ao Calabouço, foi culpado de uma tragédia que acabou tirando vidas de muitos inocentes. Talvez não fosse a verdadeira forma de resolver, mas para o futuro general de Reitz, pode ter sido a melhor decisão. 

    — Blah, blah, blah… é sempre a mesma zebra, um faz a cagada e o outro limpa. Vocês dois parecem que vão morrer bem juntinhos, sabia? — debochou Loky, novamente, desta vez não contendo o sorriso. 

    — Silêncio, Loky! — enunciou Aldred. — Suas palhaçadas podem ser ditas fora do nosso Concílio. Enquanto estivermos aqui, quero a atenção de vocês. Entenderam?

    Nyck e Yorr assentiram com a cabeça, Loky por outro lado retrucou cochichando, — tanto faz.

    — Yorr, o assunto não será sobre sua atitude de enviar para o calabouço um dos maiores Caçadores que nosso reino tem atualmente. Quero alertá-los sobre outra coisa.

    — E o quê mais poderia ser tão importante quanto levar mais um caçador ao Calabouço? — indagou Nyck.

    — Pois bem… — Alfred cruzou os dedos e se apoiou sobre suas mãos sob a mesa. — Recebi uma notícia de alerta, veio das vilas do Sul. O Reino de Thartha foi atacado por mais um dragão Alfa.

    Os três guerreiros ao ouvirem aquilo, ficaram em choque. — Ao sul, mas os dragões do Sul não haviam sidos extintos após a queda imensa de temperatura que tem por lá? — perguntou Yorr, aparentemente assustado.

    — Ao que parece, um dragão glacial se rompeu das geleiras da costa, próximo ao reino de Thartha. Não existem informações, mas parece que ele conseguiu evoluir as mudanças bruscas de temperatura.

    Alfred suava frio, suas mãos pareciam trêmulas, — Sei que pode parecer loucura, mas… terei de enviar uma trupe para coletar informações sobre o massacre que teve por lá. 

    — O quê? — Yorr contestou, — Não acha arriscado demais?

    — Coletar informações é a base para termos uma boa estratégia e evitar uma catástrofe ainda maior. Ou, você está fugindo de seu serviço como futuro general, isso é covardia? — indagou Loky, olhando para Yorr.

    — Maldito, acha que eu não sei dos riscos de não ter informações? — retrucou.

    O clima tenso entre o deboche de Loky e a raiva de Yorr faziam Alfred ficar com dor de cabeça. Por outro lado, Nyck abriu um mapa e chamou os três a atenção. 

    — Esse mapa mostra exatamente a distância entre o reino de Thartha até o nosso, dependendo de quando esse caso aconteceu, ainda temos alguns dias de preparo, semanas… não sei. Mas, se me permite dar uma ideia, Sr. Alfred, eu recomendaria já colocar a linha de frente a postos, caso um ataque sem prévia aconteça.

    — É uma boa ideia, acredito que temos tropa o suficiente para diminuir o poder da criatura.

    Alfred complementou. — Eu irei montar uma equipe de busca. Nyck, acredito que você junto q Loky consigam fazer a busca de uma forma rápida e eficiente, chame Finch e diga a ele que foi convocado para expedição. Quanto a você, Loky, avise Baldur que ele também foi convocado.

    — E quanto a mim, Sr. Alfred? — questionou Yorr.

    — Você irá comandar a minha de frente da defesa do reino — respondeu Alfred, de forma breve.

    — Como quiser.

    — Bom, então a reunião está encerrada, mãos à obra.

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