Capítulo 33 - As circunstâncias do conde (3)
“Você já esteve aqui antes?”
“Às vezes, quando eu era mais jovem. Era sufocante ficar preso na mansão. Então, sempre que tinha uma oportunidade, usava esse caminho para sair escondido e brincar lá fora.”
“Secretamente?”
“Sim, secretamente.”
Paula deu uma risadinha, achando engraçada a imagem do Vincent jovem abrindo aquela porta. Ela o imaginava, com uma expressão entre irritada e incomodada, destrancando o portão de ferro e correndo para o mundo lá fora.
Ele tocou gentilmente sua testa enquanto ela ria, pedindo para não rir.
“Esse caminho é conhecido apenas pelos membros da família.”
“Agora eu sei também.”
“Certo. Agora, só nós dois sabemos sobre ele. Mais ninguém. É, como você disse, uma porta secreta.”
A ideia a agradou. Uma porta secreta. Ela segurou o portão de ferro com a boca e, brincando, explorou com as mãos.
“Vamos até a cidade agora?”
“O quê? Por quê?”
“Você disse para irmos para longe.”
“Mas a cidade não é tão longe. Além disso, até recentemente, você tinha medo até de sair do seu quarto. Como é que agora está com coragem para isso?”
“Você disse que não posso ficar sempre assim.”
“Bem, é verdade, mas não seria melhor evitar chamar atenção? Você se destaca, sabia?”
“Certo.”
“E fica ainda pior. Eu só vou dar uma volta pela floresta.”
Paula balançou a cabeça com firmeza, mostrando resistência. Ela não queria se preocupar com isso. E se algo acontecesse enquanto estavam lá fora? Depois de expressar sua recusa, ela segurou a mão de Vincent e voltou pelo caminho por onde haviam vindo.
“Mas como você soube desse lugar? Quero dizer, você não consegue ver, mas veio aqui com tanta confiança.”
“Há marcas nas árvores.”
Vincent parou de andar e guiou a mão dela. Ele apalpou a árvore próxima e pressionou a mão dela contra ela. Havia uma marca muito pequena, parecendo um selo. Era mais fácil notar com o toque do que com a visão.
“Se você seguir as árvores com essas marcas, elas levam até aquela porta.”
“Uau, parece uma verdadeira aventura!”
“Eu adoro coisas assim. É emocionante.”
“Mas é melhor não usar esse caminho.”
“Por quê?”
“É perigoso usar essa estrada.”
Isso podia ser verdade. Paula assentiu e tocou novamente a marca na árvore.
“Você não está curiosa sobre a cidade? Ela é bem grande e famosa.”
“Estou curiosa, mas é arriscado, então não devemos ir.”
“Ninguém pensaria que o homem cego que vê é o Conde Bellunita. Além disso, você está comigo.”
Foi só então que Paula olhou para Vincent. Ela não entendia.
“Por que você insiste tanto em sair? Não é como se realmente quisesse.”
“É, eu não quero. Mas… eu quero tentar ser corajoso. Como você disse, não posso viver assim para sempre.”
“Coragem, agora?”
“Porque tem que ter um gatilho, em primeiro lugar.”
Por que o gatilho agora? Era apenas teimosia incompreensível. Ultimamente, Vincent estava fazendo coisas que nunca tinha feito antes, de um jeito tão diferente que preocupava Paula.
Mas, ao olhar para o rosto firme de Vincent, ela viu que ele não estava apenas dizendo isso. Ele não demonstrava um olhar de aversão, mas sim o oposto. Não era fácil para Paula dissuadi-lo. Na verdade, ela também queria ver a cidade, passear por lá.
“Tá bom, eu entendo. Então, vou pegar um chapéu.”
“Por que um chapéu?”
“Porque… normalmente uso um chapéu quando saio. Especialmente em lugares com muita gente, preciso cobrir meu rosto mais. Mesmo que me esconda atrás da franja, ainda fico insegura. Além disso, acho que seria melhor se você também usasse um chapéu.”
“Eu achei que seria menos perceptível se eu usasse um chapéu.”
“Podemos ir comprar um.”
“Mas vai ser tarde. Espera um momento, por favor.”
“Não vá.”
Ele apertou mais a mão dela. Seu rosto, que antes estava sereno, começou a se contorcer, como se ficar sozinho o assustasse. Paula deu umas leves batidinhas na mão dele e tentou acalmá-lo.
“É seguro aqui, então tudo bem você ficar sozinho. Este lugar é desconhecido para o resto das pessoas. Só espera um pouquinho e eu já volto com o chapéu.”
“…”
“Vai ser realmente só um momento, tá? Eu vou correr até não conseguir mais ver meus pés. Tá bom?”
“…”
“Certo, então conta até cem. Eu volto antes de terminar.”
Vincent deu uma olhada confusa para Paula. Na verdade, era bem difícil ir e voltar dentro do tempo de contar até cem. No entanto, Paula continuou garantindo que ele não se preocupasse, e no final ele deu permissão para que ela fosse rápido.
“Volta antes de eu terminar de contar até cem.”
“Sim!”
Embora com relutância, Paula respondeu alegremente e soltou a mão dele com cuidado. Felizmente, ele conseguiu se recompor e a expressão de ansiedade que tinha antes desapareceu. Ela deu uma olhada rápida em Vincent e virou-se rapidamente. Atrás dela, ouvia-se ele contando: um, dois, três.
“Espera, não consigo realmente ir e voltar dentro do tempo de contar até cem, consigo?”
Enquanto ele contava, Paula correu pelos arbustos, como se estivesse possuída, indo em direção à saída da floresta. Depois, seguiu direto para a porta dos fundos do anexo. No entanto, ao abrir a porta e entrar, um silêncio incomum a acolheu.
“Por que está tão quieto?”
Claro que o anexo normalmente era bem calmo, mas naquele dia, havia uma tensão inexplicável no ar.
Era só imaginação dela ou ela estava se sentindo mais nervosa do que o normal?
Paula respirou fundo, tentando acalmar seu coração acelerado.
Levantando os calcanhares, ela foi na ponta dos pés pelas escadas. Fez o possível para não fazer barulho. Primeiro foi até o quarto dele para pegar o chapéu, e depois foi para o seu próprio quarto para colocá-lo. Depois disso, ouviu um som baixo vindo de algum lugar. Sua atenção foi atraída, porque parecia alguém falando.
Como poderia haver alguém ali? Além disso, a voz parecia relativamente próxima.
Curiosa, Paula seguiu em direção ao som. Ele vinha do andar de baixo. Ela desceu as escadas com cuidado, indo na direção do barulho. Um grupo de pessoas estava reunido entre o hall de entrada, onde ficava a porta da mansão, e a escada central.
A primeira coisa que chamou sua atenção foi a parte de trás de um homem grande. Ao lado dele, estava o mordomo. E do outro lado, Isabella estava de pé.
O cabelo preto, bem penteado para trás, fazia-o parecer outra pessoa. Seria um visitante que veio ver Vincent? Enquanto observava o homem, seus olhos encontraram os de Isabella, que estava do outro lado. Os olhos dela se arregalaram por um momento e depois ela se recompôs rapidamente.
“Onde está o Conde Bellunita?”
“O mestre saiu.”
“Chame ele.”
Com um tom firme e uma voz pesada, como quem está acostumado a dar ordens, o homem falou. Enquanto a atitude dele confundia Paula, ela não pôde deixar de se perguntar quem ele seria. Nesse momento, ela rapidamente se escondeu atrás de um canto, instintivamente sentindo a necessidade de se esconder.
Depois de uma pausa, Paula olhou para ele com cautela. O homem estava olhando para a escada central, franzindo a testa e observando os arredores. Ele bateu no chão com a bengala, demonstrando desconforto. Exalava uma aura imponente e um tanto perigosa, típica de um convidado desconhecido.
Ele era como uma cobra, venenosa, escondendo suas presas e observando o ambiente em busca de uma vítima. Seus olhos castanhos profundos estavam cheios de uma intenção clara. Ele nem se dava ao trabalho de esconder sua presença na casa dos outros.
“Isso vai dar problema.”
“Eu só preciso encontrar o Conde. Não sei onde ele está, mas não fique aí parada. Vá e o chame.”
“…”
“Quanto tempo vai me fazer esperar?”
Então, finalmente, Paula entendeu. A razão de Isabella ter mandado Vincent sair era por causa desse homem. Ele era alguém que Vincent não deveria encontrar? Seria por causa de sua condição? Não, parecia haver um problema ainda mais grave.
Impossível.
Seria…?
O olhar de Isabella voltou a se fixar em Paula. Paula rapidamente se virou e caminhou apressadamente em direção à porta dos fundos, abafando os passos. Um suor frio escorreu pela sua coluna, e seu coração batia tão forte que parecia que ia explodir.
Assim que saiu pela porta dos fundos, Paula correu em direção à floresta, sem se atrever a olhar para trás. Entrou na mata e foi empurrando os arbustos. Se perdeu no caminho, mas, sentindo as marcas nas árvores, como ele tinha dito, ela conseguiu encontrar o caminho para o local do caminho secreto.
Vincent pareceu surpreso com a aproximação de Paula, mas logo se concentrou nos sons ao redor. Paula se aproximou dele, ofegante.
“Senhor.”
“Você está atrasada.”
Percebendo que era Paula quem se aproximava, Vincent imediatamente fez uma expressão carrancuda. Mesmo assim, como se estivesse esperando, ele rapidamente caminhou em direção a ela.
“Q-quem é a pessoa que veio para a mansão?”
“…”
Num instante, seus passos pararam. A dureza desapareceu do rosto dele, dando lugar à tensão. Paula olhou para ele e confirmou sua suspeita inicial.
“Quem… quem chegou?”
“James… James Christopher.”
O irmão mais velho de Ethan e Lucas.
‘O homem que cegou Vincent.’
‘O homem veio para a mansão. Por isso, Vincent fugiu.’
‘Sim, é isso. Por isso você está aqui.’
Ele vacilou. Paula se aproximou rapidamente e deu apoio a Vincent. Sua pele estava pálida. Encontraram um lugar para descansar brevemente, mas não havia onde sentar. Então, Paula tirou o casaco e o colocou no chão, ajudando Vincent a se sentar nele. Isabella tinha dado o casaco a ela, então hesitou, mas não podia deixar Vincent sentar diretamente no chão frio.
Ela estava preocupada que ele pudesse ter uma crise, vendo-o respirar com dificuldade, mas felizmente ele conseguiu controlar a respiração logo em seguida. Ele pressionou a testa entre as sobrancelhas, como se estivesse cansado.
“Qual pode ser o motivo da visita dele?”
“Ele deve ter vindo verificar minha condição.”
“Ele nunca veio antes?”
“Esta é a primeira vez que ele vem pessoalmente nesse estado. Já mandou pessoas aqui algumas vezes. Provavelmente ouviu sobre o que aconteceu recentemente com Ethan, Violet e Lucas. Você o viu pessoalmente?”
“Não, só o vi de longe. Tive a sensação de que não devia me aproximar.”
“Entendo… você fez bem.”
Vincent parecia um pouco constrangido enquanto falava. Seus olhos desbotados estavam fixos no chão, seu rosto carregado de emoções complexas. Observando sua expressão, Paula sentou-se quieta ao seu lado.
“Já que peguei o chapéu, vamos para a cidade?”
“Não quero ir. Estou sem energia.”
Vincent encostou a cabeça no ombro de Paula, e ela percebeu seu estado de espírito.
“Então, vamos a outro lugar?”
“Está desconfortável aqui?”
“O que quer dizer com isso?”
“Este lugar.”
Paula olhou ao redor do pequeno espaço. Atrás deles estava o portão secreto, e os arredores eram cercados por arbustos. Era um lugar isolado, sem o barulho da cidade ou olhos curiosos. Só havia ele e ela. Isso a fazia sentir-se confortável. O canto ocasional dos pássaros acrescentava à tranquilidade.
“Não.”
“Então, vamos ficar aqui, assim mesmo.”
Vincent fechou os olhos, e Paula colocou o chapéu que estava segurando em sua cabeça.
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