Capítulo 165: O Grito [3]
“…Não sei. É tudo que posso dizer.”
Após o grito, fui levado a uma sala separada dentro do bunker. Disseram que eu não estava “detido”, mas vendo que estava em uma pequena sala com três pares de olhos fixos em mim, era basicamente a mesma coisa.
Eu estava detido.
“Se me perguntam por que ele estava me encarando, eu não sei.”
O fato de que quem gritou estava me olhando parecia suspeito para todos presentes.
Não que eu não entendesse.
Mas também era verdade que eu estava tão perdido quanto eles sobre o motivo e que era inocente.
Provavelmente, ele só olhou para mim por acaso.
Ou pelo menos, era o que eu dizia a mim mesmo. No entanto, ao relembrar a cena, tinha um palpite de que ele realmente estava me encarando.
“Eu estava no lugar errado na hora errada—”
“Entendi, pode parar.”
Uma voz grave interrompeu minhas palavras.
Ela pertencia a um homem forte, de cabelos castanhos longos e olhos cor de mel. Apenas sua presença já era sufocante.
E ainda havia outras duas pessoas assim na sala.
Uma mulher aparentando vinte e poucos anos, com longos cabelos negros e olhos azuis, estava sentada de braços cruzados, enquanto ao lado dela havia um homem magro com nariz comprido, cabelo curto preto e olhos cor de mel.
Eu não sabia exatamente quem era quem, mas pela pressão que emanavam, era claro que eram Líderes Postais.
Estranhamente, não me senti nervoso.
Talvez porque já estava acostumado a lidar com figuras importantes, mas a presença deles não me intimidou tanto.
Atlas e Delilah eram muito mais assustadores.
“É possível que você seja apenas um desafortunado que estava no campo de visão da vítima. Sem dúvidas.”
“E?”
“Mas também é fato que ela estava olhando para você. Dada a gravidade da situação, não podemos simplesmente deixá-lo livre. Também é uma questão de segurança para você.”
Que mentira.
Claramente, só queriam me manter trancado aqui.
“De qualquer forma, teremos que mantê-lo aqui. Pelo menos até algo acontecer e termos certeza de sua inocência.”
“…”
Não respondi.
O que mais eu poderia dizer? Pelas expressões deles, já haviam decidido.
Quando estava prestes a suspirar, tive uma ideia.
“Hmm.”
Franzindo a testa, os três Líderes Postais me olharam.
“Está insatisfeito com o arranjo?”
O homem forte perguntou, irritado. Olhando para ele, observei os outros dois antes de balançar a cabeça.
“Não, estou bem com isso. Só estava pensando na pessoa que gritou comigo.”
“Oh? Sabe de algo?”
A mulher perguntou.
Sua voz era clara e agradável.
“…Se souber de algo, pode nos contar. Podemos protegê-lo, caso esteja realmente envolvido.”
“Não, não é isso.”
Balancei a cabeça.
“Só lembrei que os sintomas parecem com algo que li no passado.”
“…”
A sala ficou em silêncio.
Seus olhares ficaram mais pesados.
Fingindo estar em profunda reflexão, apertei a testa.
“O que era mesmo…?”
Fiz meu melhor para parecer confuso.
Atuar não era difícil para mim.
Na verdade, eu era um premiado.
“Ah.”
E então, quando estavam prestes a perder a paciência, bati o punho na palma da mão.
Toc!
“Lembrei! Árvore de Ebonthorn! É isso!”
“Árvore de Ebonthorn?”
Repetindo minhas palavras, os três franziram a testa. Engoli em seco e os olhei com expectativa.
‘Eles sabem de algo?’
Certamente, saberiam, considerando suas posições.
Mas,
“Não me soa familiar. Penelope, você conhece?”
“Não, também não.”
“Eu nunca ouvi falar.”
Para minha decepção e surpresa, nenhum dos três sabia.
…Como isso era possível?
Estava quase certo que conheceriam a árvore. Era algo raro?
“Quão certo está de que os sintomas estão relacionados a essa árvore?”
A mulher, que soube se chamar Penelope, perguntou.
Olhando para ela, concordei seriamente.
“Estou quase certo.”
Ela apertou os olhos, e meu corpo subitamente ficou rígido. Não conseguia me mover, e a respiração ficou difícil.
Felizmente, a sensação passou rápido.
Penelope se levantou.
“Certo, vou investigar isso.”
Ela olhou para os outros dois.
“E vocês?”
“Também vou verificar.”
“Idem.”
Os dois também se levantaram.
O homem forte colocou a mão na mesa.
“…Por enquanto, fique aqui. Refeições e água serão fornecidas. Entenda nossa posição.”
“Sim.”
Eu sabia que pareceria mais suspeito após mencionar a árvore.
Mas valia a pena, já que não me soltariam de qualquer forma.
Pelo menos, as coisas avançariam mais rápido agora.
Só havia um problema.
‘Se algum deles plantou a árvore, me coloquei em perigo.’
Era provável que a árvore tivesse sido colocada ali artificialmente. O mesmo valia para os incidentes.
Se fosse o caso, eu estava em risco.
Mas estava preparado para isso. Na verdade, até esperava.
“Atualizaremos você se descobrirmos algo.”
Os três saíram da sala. Olhando para suas costas, o silêncio tomou conta.
“…”
Por alguns minutos, fiquei sentado antes de soltar um longo suspiro.
“Haa…”
Olhando para trás, observei a janela.
Apesar de ser uma sala de confinamento, havia uma janela com vista para fora.
O mundo estava vermelho, e ao longe, via os muros da cidade.
Eles eram altos e se estendiam por toda a cidade.
“…Espero que tenha funcionado.”
Se alguém pudesse descobrir algo sobre a árvore, eram eles. Se não conseguissem, não havia esperança.
Não importava se parecia suspeito. Estava pronto para as consequências.
A única coisa em minha mente era a árvore.
A maldita árvore.
Olhando para baixo, vi minhas pernas. Estavam completamente envoltas por raízes negras, subindo até minha pélvis.
“Haaa… Haa…”
Não tinha muito tempo.
***
Ao mesmo tempo, no bunker.
“O que está acontecendo? Para onde levaram Julien?”
“Levaram para interrogatório.”
“O quê?”
Apesar de Kiera e Aoife não se darem bem, agora conversavam normalmente. Pelo menos não pareciam querer se matar.
“…Por que fariam isso?”
“Óbvio, não?”
“Johanna não estava olhando para ele. Por que o culpariam?”
“Não sei. Só estão sendo cautelosos.”
“Cautelosos, nada.”
Leon ouvia a conversa com expressão vazia.
Evelyn estava sentada ao lado dele.
“Ei.”
Ele virou para olhá-la.
“…Acha que ele está envolvido?”
Pela voz, Leon percebeu que ela mesma não acreditava nisso. Então, balançou a cabeça.
“Não.”
Ele sabia que Julien não tinha nada a ver com isso.
‘Árvore de Ebonthorn.’
Seria obra da árvore que Julien mencionou?
Leon pensou um pouco antes de negar. Improvável. Ainda não havia árvore. O mais provável era que alguém estivesse tentando plantá-la, criando caos de propósito.
Por quê?
Leon não sabia. Mas se tivesse que chutar, era para criar uma distração.
Eles não tinham muito tempo.
Clank—
De repente, as portas da área interna do bunker se abriram, e três figuras saíram. Leon se endireitou, assim como os outros.
“Eles voltaram.”
Mas ao ver que Julien não estava com eles, todos entenderam.
“Ele está detido.”
“Sim.”
Os olhos de Leon se estreitaram.
‘Não é bom.’
Com Julien fora, a situação ficava mais difícil. Virando-se, ele olhou para Aoife. Como se lesse seus pensamentos, ela concordou.
“Sim, vou perguntar sobre a árvore.”
Ela deu um passo, mas parou. Sua cabeça virou para a esquerda, assim como a de todos.
“Hiiiiiiiiak—”
Um grito ecoou.
O corpo de Leon congelou.
Seu olhar caiu sobre outra pessoa. De olhos brancos, ela gritava sem parar.
E se isso não fosse ruim o suficiente.
“Hiiiiiiiiak—”
Outro grito veio de outra área.
Seguido por outro.
“Hiiiiiiiiak—”
E mais um.
“Hiiiiiiiiak—”
Em pouco tempo, vários gritos enchiam o bunker. Leon sentiu seu coração gelar.
E, para piorar, todos com olhos brancos pareciam olhar na mesma direção.
Leon engoliu seco.
‘Oh, não.’
A área interna do bunker.
Onde Julien estava.
Baque!
Os gritos não duraram muito. Aprendendo com o ocorrido, os delegados1 das Guildas os nocauteavam rapidamente.
Mas o estrago estava feito.
Agora, todos olhavam para a área interna.
Leon também.
Ploc…! Ploc.
Seus pensamentos foram interrompidos por um som estranho.
Baixando o olhar, viu o chão e então limpou o nariz.
Seu dedo estava manchado de sangue.
‘Sangue…?’
De repente, o mundo ficou embaçado. Virando a cabeça lentamente, sentiu todos olhando para ele. Evelyn parecia preocupada. Ela dizia algo, mas ele não ouvia.
‘O que você está dizendo? Não consigo ouvir.’
Leon estava confuso.
Por que estava assim?
Piscando, sua mente começou a ficar vazia.
Estava perdendo a consciência.
E então,
“Hiiiiiiiiiiak—”
Ele também gritou.
- A partir de agora, irei tratar aqueles antes chamados de líderes como delegados, para não haver confusões futuras[↩]
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.