Índice de Capítulo

    “….Ainda não conseguiu nada?”  

    O secretário perguntou do lado de fora da sala de detenção. Pelo tom de voz, ele parecia bastante agitado e apressado.  

    Javier balançou a cabeça.  

    “Nada ainda. Tentei vários métodos, mas ele não cede.”  

    “Isso é problemático.”  

    Andando de um lado para outro, o secretário resmungou para si mesmo:  

    “O Líder de Posto ficará desapontado se não tivermos nada em breve. A informação também é vital, e o cadete é nossa única fonte de informação. É óbvio que ele tem algo a ver com a situação. Precisamos descobrir algo.”  

    Ele virou a cabeça para encarar Javier.  

    Lambendo os lábios, disse:  

    “Tente novamente.”  

    “Mas—”  

    “Não me importo com os métodos que você usar, mas tente de novo! Precisamos que ele fale! Se não obtivermos resultados em breve, a situação será ruim para nós dois. Pense nos seus filhos! Faça isso!”  

    “….Tem certeza?”  

    “Sim, sim. Já disse antes, eu lidarei com as consequências. Faça o seu trabalho.”  

    “Entendido.”  

    Observando o secretário sair, Javier ficou parado por vários minutos. Sua mente estava cheia de pensamentos complexos, mas ao se lembrar de seus filhos, ele cerrou os dentes e se virou para a sala.  

    “….”  

    Encarando a porta, Javier ficou com a mão no puxador.  

    Por algum motivo, sua mão simplesmente se recusava a girar a maçaneta. Era como se sua mente se recusasse a deixá-lo abrir a porta.  

    Pensando nas palavras que o cadete havia dito e no fato de que ele tinha a mesma idade que seus filhos, Javier começou a hesitar.  

    Era estranho.  

    No entanto, suas circunstâncias coincidiam muito com as de seus filhos.  

    …..Ele continuava se lembrando deles por causa disso.  

    ‘Não, eu tenho que fazer isso.’  

    Mas cerrando os dentes, Javier forçou-se a jogar esses pensamentos para longe.  

    Respirando fundo, ele abriu a porta.  

    Clank—  

    Ao entrar na sala, havia silêncio.  

    Pinga…! Pinga.  

    Além do som do sangue escorrendo pelo rosto do cadete, não havia nenhum outro som.  

    “B… as…”

    Pelo menos, até Javier ouvir algo.  

    Era fraco, mas ele conseguia escutar.  

    O som.  

    ….Estava vindo da boca do cadete.  

    Ele parecia estar dizendo algo.  

    “B… as… tar… me..”  

    Franzindo a testa, Javier se inclinou para ouvir melhor. Antes que percebesse, seu ouvido estava próximo do cadete.  

    “B… as… tar… m… ma… ta..”  

    Mas isso ainda não era suficiente.  

    Ele não conseguia entender direito o que estava sendo dito.  

    “O que você está dizendo? Fale mais alto?”  

    O cadete não respondeu.  

    “B… a… s… m… ma…”  

    Em vez disso, continuou a resmungar sozinho.  

    Franzindo a testa, Javier recuou.  

    Agarrando o cabelo do cadete, ele puxou sua cabeça para trás para ver seu rosto. Seus olhos se encontraram por um breve momento, e foi então que os olhos do cadete se arregalaram enquanto ele gritava.  

    “B-astardo…! você deveria ter me matado como matou minha m-ãe. Eu não teria sofrido tanto se não fosse por você!”  

    Instintivamente, Javier soltou seu cabelo.  

    Clank! Clank…!  

    Se debatendo na cadeira, o cadete o encarou com olhos injetados de sangue enquanto sangue escorria de sua boca.  

    “Você…! Tudo isso é sua culpa! Ela morreu porque você não fez o único trabalho que deveria ter feito!”  

    Seu grito ecoou pela sala.  

    “Você! Por quê!? Por que você deixou isso acontecer…!?”  

    Os olhos do cadete estavam vazios.  

    Era claro que ele não estava totalmente consciente. Que ele não estava falando com ele.  

    …..E ainda assim.  

    “Você arruinou minha vida!”  

    Por algum motivo estranho.  

    “Você deveria ter morrido com ela!!”  

    Cada palavra que saía da boca do cadete parecia perfurar diretamente seu coração.  

    “Você é a razão pela qual eu não tenho uma mãe!”  

    “Haaa…. Haaa…”  

    Sem perceber, Javier sentiu sua respiração começar a ficar ofegante.  

    “P-are.”  

    Ele tentou fazer o cadete parar, mas se sentiu sem energia.  

    Isso o prendeu no lugar.  

    “Morreu! Morreu! Morreu! Morreu! Eu te odeio!!!”  

    Os gritos continuaram.  

    Eles dominaram a sala completamente.  

    “Tudo por sua causa!”  

    Junto com os gritos, a dor no peito de Javier se intensificou.  

    “N-não, isso não…”  

    Ele começou a segurar a própria cabeça.  

    “Não… foi minha culpa.”  

    Era um passado distante. Um acidente total. Sim, um acidente total. Sua esposa e seus dois filhos estavam apenas dando um passeio quando um monstro apareceu.  

    Para salvá-los, ele ficou para trás para ajudá-los.  

    …Ou pelo menos tentou.  

    No final, sua esposa acabou morrendo por sua negligência.  

    Anos se passaram desde o incidente.  

    Era um incidente que o assombrava até hoje.  

    “I-isso. Não foi minha culpa…”  

    Desculpas começaram a sair de sua boca.  

    “Eu tentei. Eu realmente tentei.”  

    “Tentou mesmo?”  

    “Ah, sim… Cl-aro.”  

    “O monstro que você enfrentou não era forte. Era um monstro que alguém com sua força deveria ter conseguido derrotar facilmente. Você queria se exibir, não foi?”  

    “N-não, não é isso.”  

    “Não é?”  

    “Eu, foi—Uh?”  

    A cabeça de Javier ergueu-se subitamente.  

    Seu coração gelou no momento em que olhou para cima. Sentado em sua cadeira com uma expressão indiferente estava o cadete.  

    Ele o encarava sem expressão.  

    …..Os pelos do corpo de Javier se arrepiaram no momento em que encontrou seu olhar.  

    “Es-pera.”  

    Ele então se lembrou da conversa que estavam tendo.  

    Ba… Baque!  

    Ele sentiu a batida do próprio coração.  

    ‘Como ele sabia…?’  

    A forma como o cadete falava fazia parecer que ele tinha estado lá. Mas isso era impossível.  

    Impossível!!  

    Apesar de saber disso, sob aquele olhar, seus músculos ficaram rígidos.  

    “Você, como você sabia…? É imp—”  

    “….Você queria que seus filhos e esposa vissem o quão forte você era, certo?”  

    “O quê…!”  

    “O monstro era mais fraco que você, e você estava de férias. Você claramente não estava cansado como disse aos outros.”  

    “Eu…”  

    Os olhos de Javier começaram a mostrar ansiedade.  

    Memórias do passado ressurgiram em sua mente. Eles estavam na floresta fora de sua propriedade. O dia estava claro, e o monstro estava bem diante dele.  

    Era um urso de duas presas.  

    Uma criatura bastante fraca, conhecida por ser ágil e feroz.  

    ‘Haha, vejam como eu o mato! Vou mostrar a vocês o quão forte eu sou.’  

    ‘Vai, pai! Vai…!’  

    ‘Mata ele!!’  

    ‘Haha!’  

    ‘Querido, por favor, tenha cuidado!’  

    ‘Não se preocupe! Eu cu—’  

    Foi apenas um momento de desatenção.  

    ‘Akh…!;  

    ‘Ahhhh!’  

    Foi o suficiente para tudo dar errado.  

    Ele ainda conseguia lembrar vividamente os gritos de terror de sua esposa e filhos.  

    “Ela morreu por sua negligência.”  

    “Haa… Haa…”  

    “…..Estou errado?”  

    Javier queria refutar, mas as palavras não saíam de sua boca.  

    Seu peito pesava, e a dor escondida que mantinha oculta começou a surgir dentro dele. Mas essa não era a pior parte.  

    Não, eram aqueles olhos.  

    Seus olhos.  

    “Deixe-me perguntar de novo, estou errado?”  

    “Não…!”  

    Javier gritou.  

    “Foi exatamente isso que aconteceu!”  

    A raiva começou a brotar de dentro dele. Era uma raiva construída sobre a culpa que mantinha escondida.  

    “Ela morreu por minha causa…! Está feliz?!”  

    Seu grito reverberou pela sala.  

    Quando terminou, a sala mergulhou em silêncio novamente. Mas o único foco da atenção de Javier eram aqueles dois olhos castanhos frios e indiferentes.  

    Javier parecia conseguir ver seu próprio reflexo neles.  

    “….Então por que você ainda está aqui?”  

    O cadete repetiu, sua voz ecoando levemente.  

    Javier sentiu a respiração presa em sua garganta.  

    “H-haa…”  

    “Como pode viver sabendo que é um homem tão fraco? Toda essa força e poder. E para quê?”  

    A voz do cadete ecoou novamente.  

    Javier sentiu seu peito apertar.  

    ‘Algo está errado.’  

    Ele sabia claramente que havia algo errado na situação. Desde como o cadete sabia todas as informações até o leve eco em sua voz.  

    Ele sabia, e ainda assim…  

    “H-ha.”  

    Não podia fazer nada a respeito.  

    ….Era tarde demais para ele.  

    Como se duas mãos tivessem agarrado sua mente, ele se viu incapaz de se mover. Estava preso no lugar, pensando continuamente no passado.  

    “Se você não consegue nem proteger sua própria esposa, o que te faz pensar que pode proteger seus próprios filhos?”  

    “H-haa… Haa…”  

    “…..Se você não consegue nem proteger seus próprios filhos, que direito tem de ainda estar aqui?”  

    “Haa. Ha. Ha.”  

    Sua respiração ficou cada vez mais rápida.  

    “Ha. Ha. Haa. Ha.”  

    Ele começou a hiperventilar.  

    ‘Pare. Pare. Pare. Pare. Pare.’  

    Javier suplicou incessantemente para tudo aquilo parar.  

    Apertando o peito, ele suplicou e suplicou e suplicou.  

    E ainda assim,  

    “Seus filhos conhecem seu pecado. Eles apenas fingem que não.”  

    A voz nunca parou.  

    Ficou cada vez mais alta em sua mente, dominando-a completamente.  

    As mãos apertaram sua mente.  

    Pare.  

    Par.  

    Pa.  

    p.  

    E então,  

    “….”  

    A sala mergulhou em silêncio.  

    No silêncio, o único som que se ouvia era a respiração ofegante de Javier, que lentamente começou a se acalmar enquanto sua cabeça caía.  

    Isso até a voz de Julien quebrar o silêncio.  

    “Olhe para mim.”  

    “….”  

    Javier ergueu o olhar.  

    Seus olhos estavam vazios, desprovidos de qualquer luz.  

    Encarando aqueles olhos, Julien estendeu as mãos algemadas para frente.  

    “Me solte.”  

    “….”  

    Javier encarou as algemas com um olhar vazio.  

    “….Você sabe que sou inocente.”  

    A voz de Julien alcançou seus ouvidos novamente.  

    “Não deixe seus pecados se acumularem. O que seus filhos pensariam de você? Você deixou sua esposa morrer, e agora tortura um cadete inocente?”  

    Sua voz, embora baixa, parecia ressoar alto na mente de Javier, que finalmente começou a se mover, tirando uma pequena chave do bolso.  

    “Abra.”  

    Javier se aproximou, levando a chave até a fechadura das algemas.  

    Clink, clank—  

    Com o girar da chave, as algemas se abriram.  

    Libertando as mãos das algemas, Julien massageou os pulsos antes de olhar para Javier. Ele parecia uma casca vazia da pessoa que o havia torturado.  

    “Você fez bem.”  

    Julien falou, afastando as algemas.  

    Tak.  

    Dando um passo à frente, ele encarou Javier nos olhos.  

    “Não foi sua culpa.”  

    “…..?”  

    As palavras de Julien pareceram trazer um pouco de clareza de volta aos olhos de Javier.  

    Mas essa clareza durou apenas alguns segundos antes que ele acrescentasse:  

    “Esta é a primeira vez que tento isso. Ainda não sou muito habilidoso. Você estava claramente ciente de que eu o manipulava, e ainda assim, sua culpa pareceu sobrepor esse fato.”  

    Estendendo a mão para frente, Julien colocou a ponta do dedo na testa de Javier.  

    “…..Ainda há muito no que trabalhar.”  

    Silêncio!  

    O mundo de Javier ficou em branco logo em seguida.  

    Baque!  

    Seu corpo caiu para trás, e sangue lentamente começou a se acumular atrás de sua cabeça, onde um pequeno buraco, quase imperceptível, apareceu.  

    Encarando seu corpo, Julien fechou os olhos.  

    Então, abrindo-os novamente, ele começou a se despir.  

    Isso era apenas o começo.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (7 votos)

    Nota