Índice de Capítulo

    O céu se tingia de azul profundo quando Baek Jin cruzou os grandes portões do Clã Baek. A Lua ainda não surgira, mas as sombras já começavam a se alongar, como se o mundo se curvasse em reverência ao retorno de uma presença antiga. 

    Seu manto escuro balançava suavemente ao vento, e sua figura caminhava em silêncio, despercebida pelos discípulos mais jovens — poucos sabiam, ou sequer desconfiavam, que sob aquela aparência de homem de trinta e poucos anos, escondia-se uma força que fazia até um Santo Marcial franzir a testa em alerta. 

    Baek Jin. 
    A Lâmina Silenciosa. 
    Aquele que retornou da morte, e agora caminhava em direção ao topo mais uma vez. 

    Ao chegar no pátio lateral de sua residência, sob a sombra de uma ameixeira antiga, sentou-se com as pernas cruzadas. O vento balançava seus longos cabelos cinzas-quase-negros, e a luz dourada do entardecer refletia na barba cerrada de cavanhaque. Seus olhos, profundos como um lago intocado, encaravam o vazio. 

    Mas dentro de sua mente… 
    Mil ideias colidiam como trovões. 

    “Já alcancei o auge do Mestre Marcial. Quatro portões abertos. Cada respiração minha é como engolir o céu.” 

    Ele ergueu a mão direita. 

    O Qi em seu corpo respondeu de imediato, como uma serpente de fogo e raio contorcendo-se em torno de seus dedos. Era um poder vasto. Denso. Explosivo. 

    “Meus portões ainda não estão completos. Mas mesmo assim…” 

    Fechou os olhos, permitindo que as sensações fluíssem. 

    As técnicas do Clã Baek eram eficientes, sim, mas… limitadas. Engessadas. Criadas por Anciãos que há muito haviam parado de ousar sonhar. Para Baek Jin, aquilo já não bastava. 

    Ele queria mais. 

    “Na minha vida passada… quantas obras li? Quantas técnicas lendárias vi em palavras?” 

    Abriu os olhos. 
    E os nomes ressurgiram como relâmpagos: 

    “Deus Herege… a arte de queimar o próprio Qi para atravessar limites temporários.” 

    “Lótus que Aquece a Alma… cultivação baseada em ciclos internos que acalmam a mente e fortalecem o espírito.” 

    “Transformação do Dragão… o domínio de mudar carne e osso com Qi, criando uma força monstruosa por curtos períodos.” 

    Baek Jin riu, baixo. 

    “Quantas vezes invejei protagonistas por terem suas próprias técnicas inatas? E agora… talvez seja minha vez.” 

    Levantou-se lentamente. 

    Seus passos o levaram até um antigo salão de meditação abandonado nos fundos do terreno. Paredes rachadas, janelas entulhadas de poeira… mas o isolamento o tornava perfeito para o que ele queria. 

    Sentou-se novamente, limpando o espaço com um simples aceno da mão. 
    Formou um selo com os dedos, e o Qi circulou ao redor, formando espirais suaves que dançavam sobre o chão de madeira envelhecida. 

    “Preciso de uma técnica que una explosividade e controle. Que não só destrua, mas me permita adaptar… ser uma lâmina viva, que nunca se desgasta.” 

    Em sua mente, rascunhos começaram a tomar forma. 

    Um núcleo selado em camadas, semelhante à “Alquimia do Deus”, para refinar o Qi em estágios. 

    Uma formação de respiração que aumentava o fluxo interno durante batalhas curtas, baseada em “Transformação do Dragão”. 

    Uma defesa espiritual passiva, inspirada na “Lótus que Aquece a Alma”, mantendo sua mente imune a ilusões e manipulações mentais. 

    “Se eu criar uma técnica de três fases… respiração, combate e regeneração…” 

    Baek Jin suspirou. 

    Isso era mais do que apenas uma técnica. Era uma filosofia. 

    “A Lâmina Silenciosa deve ser como a chuva fina… invisível, mas constante. Quando o inimigo perceber… já estará cortado.” 

    Passaram-se horas. 

    Páginas mentais foram escritas, reescritas e queimadas. 
    Ele desenhava com a mente, esculpia ideias com o coração. 

    A noite caiu. 
    E, de repente, uma chama brilhou ao seu redor. 

    Algo começou a se formar. 

    Uma essência estranha. Nova. Como se o próprio mundo reconhecesse o nascimento de algo único. 

    Baek Jin abriu os olhos. 

    Na frente de seus joelhos, traços de Qi haviam gravado na madeira um padrão hexagonal, pulsante, com símbolos fluindo lentamente — um protótipo de formação interna. Rudimentar ainda, mas… viva. 

    “Isso… não é apenas uma técnica.” 

    Ele sorriu, pela primeira vez em muito tempo. 

    “É minha assinatura neste mundo.” 

    Levantou-se, ofegante. 

    “Ainda preciso testar sua eficácia. Ainda não sei se funcionará em batalha. Mas agora, sei o que quero.” 

    Voltou os olhos para o céu estrelado. 

    “Criarei uma técnica secreta que pertencerá apenas a mim.” 

    “Uma arte que será temida… reverenciada… e jamais esquecida.” 

    A aura ao seu redor oscilou levemente. 
    Como uma lâmina coberta por seda. 
    Suave à vista, mas afiada o suficiente para dividir montanhas. 

    “Os céus têm olhos.” 
    “E finalmente… eles me veem.” 

    … 

    A escuridão envolvia o antigo salão como um manto ancestral. Pilares rachados lançavam sombras que se projetavam nas paredes como espectros de um passado esquecido. Mas ali, no centro daquele santuário silencioso, pulsava vida. 

    Baek Jin sentava-se imóvel, como uma montanha viva. 

    O brilho do Qi ao seu redor oscilava, vibrava, serpenteava pelo ar denso. A energia espiritual havia se tornado mais espessa que a névoa da manhã, e sua presença era tão opressora que até insetos evitavam o espaço ao seu redor. Seus olhos, meio fechados, revelavam traços de exaustão — mas também de triunfo. 

    Porque, naquele instante… ele havia criado algo. 

    Não uma simples técnica. 
    Não uma cópia imperfeita de artes do passado. 
    Mas uma lenda em gestação. 

    “A Lâmina da Aniquilação Silenciosa…” — murmurou em voz baixa, o nome ressoando como um sussurro nas tábuas do chão. 

    Seu peito subia e descia lentamente, respirando Qi denso, que parecia ter peso. O suor descia de suas têmporas, escorria pelo queixo e desaparecia na barba cerrada, negra como obsidiana. Seus cabelos cinza-escuros, soltos, estavam encharcados, grudados ao rosto. As mãos, em forma de selo, tremiam levemente, resquícios de um consumo brutal de energia. 

    A técnica tinha três fases. Três rostos da mesma lâmina. 

    Fase Um — Corte Vazio. 

    “Um golpe. Um inimigo.” 

    O corpo concentra o Qi ao extremo, formando uma lâmina invisível que ignora a resistência física. O golpe é silencioso, sem rastros de energia. Apenas o som de um suspiro… e o inimigo já está morto. 

    Com esse ataque, Baek Jin poderia eliminar alvos rapidamente, como uma serpente que morde e desaparece. 

    “Ideal para emboscadas… ou duelos de vida ou morte.” 

    Era discreto. Preciso. Letal. 

    Fase Dois — Julgamento Sombrio. 

    O Qi circula por três meridianos ao mesmo tempo, alimentando a base dos pulmões, do coração e da mente. Ao expirar, Baek Jin libera uma onda negra que se espalha em forma de meia-lua diante dele, capaz de devastar um grupo inteiro de inimigos num único sopro. 

    “Essa fase é para a guerra.” 

    Quando cercado, quando acuado, quando o sangue ferve em batalha… 
    Essa técnica emergia como um dragão que abria as asas no campo de combate. 

    “Cortarei legiões.” 

    Fase Três — Barreira do Deus Imortal. 

    Aqui, o Qi se condensa em seu núcleo espiritual, formando uma barreira defensiva em três camadas: 

    • A primeira, uma muralha invisível que protege contra ilusões e ataques mentais. 
    • A segunda, um escudo de Qi denso que repele projéteis e ataques físicos. 
    • E a terceira, uma cúpula negra absoluta, que cerca o corpo de Baek Jin como uma esfera de morte, girando lentamente ao seu redor, protegendo-o de todas as direções. 

    “Mas ainda está incompleta.” — pensou, cerrando os punhos. 
    “Com quatro portões, meu núcleo ainda não produz Qi o suficiente para manter essa última fase ativa por mais de cinco respirações.” 

    Ele engoliu em seco. 

    Havia provado o gosto do potencial absoluto… mas ainda não podia sustentá-lo. 

    A técnica suprema estava viva. Mas com sede. 
    Sede de poder. De crescimento. De evolução. 

    Baek Jin então percebeu: 
    Cada portão que abrisse… alimentaria essa arte. 

    A Lâmina da Aniquilação Silenciosa não era uma técnica estática. Ela reagia ao seu cultivo. Cresceria com ele. E, com tempo… se tornaria a arte mais temida de todo o Continente Murim. 

    Levantou-se, mesmo com as pernas trêmulas. Respirou fundo, tentando estabilizar o Qi. 

    Um sorriso leve surgiu nos cantos de seus lábios. 

    “É isso…” 

    “Essa é a arte que reescreverá meu nome na história.” 

    Saiu do salão antigo com passos lentos, mas firmes. As tábuas rangiam sob seus pés, como se o mundo reconhecesse que algo grandioso acabava de nascer. 

    No céu, a primeira estrela surgiu. 

    E Baek Jin, a Lâmina Silenciosa, caminhava para o amanhã como um cultivador renascido… armado com uma técnica que carregava a destruição nas sombras. 

    Apenas uma coisa era certa: 

    Os dias de viver como servo haviam terminado. 
    Agora, era o mundo que teria de se curvar… diante da lâmina que cortava sem ser vista. 

    … 

    O som seco de uma porta dupla se abrindo ecoou por todo o salão ancestral do Clã Baek, como se o próprio tempo tivesse suspirado. A alvorada ainda não havia surgido, mas todas as tochas do Salão dos Cem Pilares estavam acesas, lançando chamas trêmulas nas paredes esculpidas com histórias antigas de glória e tragédia. 

    No centro, sob o brasão do clã — a espada de três lâminas sobre uma lua minguante —, o Patriarca Baek Mu-Hwan permanecia de pé. 

    Alto, envolto em um manto azul-escuro bordado com fios prateados, sua presença era como um lago profundo: silenciosa, mas ameaçadora. Seus olhos não demonstravam raiva, apenas um olhar impassível que escondia as tempestades dentro de seu espírito. 

    À sua volta, o conselho se reunia em formação circular. 

    Anciãos se sentavam em poltronas de madeira escura, suas roupas austeras marcadas com insígnias de seus status. O ar carregava tensão. Não apenas por causa das palavras que ecoariam a seguir, mas pela sensação crescente de que o mundo estava se partindo lentamente — e eles estavam prestes a testemunhar o colapso. 

    “Chamem todos.” — ordenou o Patriarca, sua voz como trovão abafado. 

    E eles vieram. 

    O Ancião mais velho e respeitado do Clã Baek foi o primeiro a chegar. 
    Baek Woon. 

    Sua barba prateada se estendia até o peito. Os olhos cansados observavam tudo com a frieza de quem já viu gerações perecerem pela espada. Usava uma bengala de ébano, mas todos sabiam que era apenas adorno: Baek Woon ainda podia devastar uma montanha com o punho se desejasse. 

    “Os ventos antigos voltaram a soprar, Patriarca.” — murmurou ao se sentar. — “E eles carregam o cheiro do sangue.” 

    Logo atrás, os dois Jovens Mestres do Clã Baek fizeram sua entrada. 

    Baek Ryu, o primogênito. 

    Vestia uma túnica branca com detalhes dourados. Os cabelos longos estavam amarrados em um coque alto, e seus olhos semicerrados carregavam desdém. A arrogância se manifestava no andar firme, no queixo erguido, na forma como nem mesmo olhava diretamente para os Anciãos ao passar. 

    “Se vieram declarar guerra, por que não nos atacaram logo? Esta carta é apenas covardia disfarçada de ousadia.” 

    Baek Haneul, o mais jovem, seguiu logo após. 

    Apesar da pouca idade, sua presença era afiada como uma lâmina recém-temperada. Vestia uma túnica azul escura com o símbolo do clã bordado nas costas. Os olhos pretos carregavam uma arrogância diferente de Ryu — não de superioridade, mas de uma confiança cruel. 

    “Caminho Demoníaco?” — disse com um sorriso torto. — “Então eles decidiram abandonar seus ancestrais para abraçar as sombras.” 

    Silêncio caiu sobre o salão por alguns instantes, quebrado apenas pelo som de passos suaves vindo do fundo. 

    Baek Jin. 

    Seus cabelos cinza-escuros caíam sobre os ombros. A barba cerrada lhe dava uma aparência austera e refinada, como um general saído de uma pintura antiga. Seus olhos eram calmos… mas por trás daquele olhar, havia brasas. 

    Ele se aproximou em silêncio, como a chegada de uma tempestade oculta por névoas. 

    Alguns Anciãos o encararam com estranheza. Aquela aparência jovem, vigorosa, era um paradoxo. Baek Jin, o servo silencioso? O velho inútil dos jardins sombrios? 

    Mas ali estava ele. Transbordando presença. 

    “Você veio.” — murmurou Baek Mu-Hwan. 

    Baek Jin apenas assentiu. 

    Foi então que o Patriarca ergueu a mão. Um servo se aproximou com uma caixa de jade selada. Ela foi aberta com cuidado. Lá dentro, repousava uma carta antiga, o selo vermelho como sangue ainda intacto. 

    “Recebemos isto.” 

    O selo era do Clã Yan. As runas do envelope pulsavam com energia densa. 

    “O Clã Yan retornou da escuridão. Declararam guerra aberta.” 

    As palavras caíram como rochas no centro do salão. 

    Alguns anciãos prenderam a respiração. Outros franziram a testa. Mas foi a voz de Baek Woon que falou por todos: 

    “E o nome do remetente?” 

    O Patriarca respondeu: 

    “Yan Xian.” 

    Um murmúrio cresceu. Alguns se levantaram. Outros apertaram os punhos. 

    Yan Xian, o mais velho Ancião do Clã Yan. Um cultivador que havia desaparecido por décadas… e agora retornava não apenas como líder da guerra, mas como novo Patriarca, após rumores de que havia assassinado seu predecessor. 

    Ao lado dele, seu braço direito — Yan Wu Heng, conhecido como o “Punho Negro das Cem Ruínas”. 

    “Os informantes dizem que todos os outros anciãos do Clã Yan o apoiam… e que caíram no Caminho Demoníaco.” — continuou o Patriarca. — “Suas auras mudaram. Seus olhos brilham como os de bestas… e seus corações, dizem, não sentem mais temor dos céus.” 

    O salão ficou em silêncio. 

    Até que Baek Jin falou. 

    “Yan Xian… voltou mais forte do que nunca.” — seus olhos se estreitaram. — “E se realmente abraçou o Caminho Demoníaco… então essa guerra não será como as anteriores.” 

    O Patriarca assentiu. 

    “Por isso convoco este conselho de guerra. Precisamos decidir: resistiremos?” 

    Baek Ryu se levantou, irritado. 

    “Que pergunta é essa? Resistiremos? Isso não é uma escolha. É o destino do nosso clã!” 

    Baek Haneul sorriu. 

    “Sim. E está na hora de mancharmos as espadas novamente. Já faz tempo que o clã vive em paz… talvez tempo demais.” 

    Baek Woon, no entanto, falou com peso: 

    “A guerra que se aproxima não será simples. Se eles realmente abandonaram a justiça… então nós enfrentaremos monstros.” 

    O Patriarca voltou-se para Baek Jin. 

    “E você? O que tem a dizer?” 

    O homem de olhos serenos ergueu a cabeça. 

    “Deixem-me ir para a linha de frente.” 

    Todos os olhos se voltaram para ele. Mas antes que qualquer resposta fosse dada, o som de passos apressados ecoou pelo corredor. 

    Um servo adentrou ofegante, se ajoelhando ao chão, a testa suada e o olhar trêmulo. 

    “Senhores… a Lâmina Silenciosa chegou.” 

    Um silêncio mortal caiu sobre o salão. 

    O Patriarca ergueu uma sobrancelha. 

    “Baek Jin já está aqui.” 

    O servo engoliu seco. 

    “Não, senhor. A outra Lâmina Silenciosa…” 

    “Quem…?” 

    O servo respondeu com a voz fraca, quase inaudível: 

    “Uma mulher… envolta em negro… montada numa fera espiritual… Ela traz a mensagem dos Yan.” 

    O salão explodiu em murmúrios. 

    Baek Jin apertou o punho. 
    O sangue em suas veias começou a ferver. 

    O jogo havia começado. 
    A guerra havia sido selada. 
    E as sombras… marchavam outra vez. 

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (2 votos)

    Nota