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    Entre as poucas aulas teóricas que Adam havia assistido na Academia Layton, havia justamente uma sobre implantação de memórias.

    Não era porque ele queria aprender esse conteúdo, a aula era obrigatória, pois dizia respeito a uma das leis mais fundamentais. Para adaptadores, era considerado um crime grave alterar as memórias de outra pessoa sem justa causa.

    Por outro lado, a aula também não era levada muito a sério, já que a maioria dos adaptadores nem sequer possuía essa capacidade. A maioria dos alunos mal prestava atenção.

    Seja Adam, Shae, Nie Yiyi, Gancho ou qualquer oponente que Adam já havia enfrentado, nenhum deles era capaz de alterar memórias alheias.

    Era uma habilidade tão rara quanto proibida.

    A lógica por trás disso era que a identidade de uma pessoa estava intimamente ligada às suas memórias. Essencialmente, o passado de alguém era preservado por meio delas e, ao alterar essas memórias, não era muito diferente de cometer assassinato.

    Se uma pessoa já não era mais ela mesma, aquela pessoa original ainda podia ser considerada viva?

    Era uma questão filosófica, e também relacionada aos quadros em branco.

    Quadros em branco eram humanos que haviam tido todas as memórias removidas para dar lugar à consciência de outra pessoa. Era uma forma extrema de alteração de memória.

    Por isso, aquela cena teve um grande impacto em Adam.

    “Ele claramente já aceitou seu destino, e ainda assim teve as memórias alteradas só por demonstrar insatisfação e representar um risco de exposição desses segredos sombrios?”

    Adam ficou longe de satisfeito com o que viu e decidiu agir de imediato, sem esperar mais.

    Na prática, ele já estava naquela sala o tempo todo, mas por algum motivo, ninguém parecia notar sua presença. Adam nunca havia enfrentado uma situação assim antes. Tentou intervir, tentou alterar alguma coisa, mas continuava sendo ignorado.

    — Ei! — Adam se virou para a adaptadora psicoterapeuta, já pronto para lutar. — Tô falando com você!

    Mas ela continuou fazendo seu trabalho, sem dar a menor atenção. O mesmo valia para Liu Shouyi.

    No mundo real, Adam jamais teria atacado em uma situação como aquela.

    Ele não fazia ideia do quão poderosa aquela adaptadora era e, pelo que a Madame Árvore acabara de dizer, parecia estar em pé de igualdade com o senhor da Cidade das Sombras. Ou seja: era um nível acima do que ele podia enfrentar.

    A vantagem, no entanto, era que aquele era o mundo psíquico de Liu Shouyi. Ele não sabia o verdadeiro poder daquelas pessoas, e o que determinava a força delas ali era a avaliação subconsciente que Liu Shouyi fazia.

    Como não obteve reação da adaptadora, Adam decidiu atacar primeiro.

    Ele já estava fundido com a Múmia, e lançou um soco com o punho envolto em bandagens. Mas assim que o golpe tocou o corpo da adaptadora, ele atravessou como se estivesse socando uma ilusão.

    Imediatamente, toda a cena desmoronou, como uma bolha de sabão que havia acabado de estourar.

    A cama, os equipamentos, Liu Shouyi, a sala, o prédio, até o módulo inteiro, tudo se desfez em um instante, como bolhas estourando uma a uma.

    “O que está acontecendo?”

    Com o desaparecimento completo do mundo psíquico, Adam ficou sozinho em meio a uma vasta escuridão. Ao longe, ainda conseguia ver outros módulos psíquicos, mas não havia mais nada naquele ponto.

    Tudo sumiu.

    “Como o mundo psíquico de alguém pode ser assim?”

    Quanto mais refletia sobre o que havia acabado de acontecer, mais suspeitas surgiam.

    A primeira desconfiança era óbvia: o desaparecimento inexplicável daquele módulo. Módulos psíquicos eram construídos a partir de memórias e, salvo em casos de dano físico ao hipocampo, esse tipo de apagamento era algo inédito.

    A segunda era o conteúdo das memórias de Liu Shouyi, havia várias incoerências.

    Ele estava claramente inconsciente quando foi invadido pela adaptadora psicoterapeuta. Como poderia lembrar da visita da Madame Árvore? Em um estado inconsciente, ele não deveria ter essa memória.

    Além disso, a Madame Árvore havia alterado suas memórias e sua postura em relação ao trabalho, mas, ao longo do caminho, Adam viu diversos traços de insatisfação nas memórias dele. Se a visita tivesse ocorrido de verdade, ele não deveria se lembrar da discussão com o irmão na mansão.

    Nada fazia sentido.

    Era como se aqueles módulos psíquicos, frágeis como bolhas, tivessem sido implantados artificialmente na mente de Liu Shouyi.

    E, se esse fosse o caso, isso tornava a situação ainda mais perturbadora.

    No momento, Adam só conseguia pensar em duas possíveis explicações para tudo aquilo.

    A primeira era que Liu Shouyi estava completamente delirante, e aquela memória não passava de uma criação da sua imaginação. Isso até fazia algum sentido, já que delírios são instáveis e podem ser facilmente desfeitos.

    A segunda teoria era que outro adaptador já havia entrado na consciência de Liu Shouyi antes dele, e não apenas removido todas as sementes plantadas pela Madame Árvore, como também deixado para trás aquela ‘filmagem’ para que futuros visitantes pudessem vê-la.

    Adam se inclinava mais para essa segunda possibilidade. O motivo era simples: o que ele tinha acabado de presenciar se apresentava como um módulo psíquico. Se fosse apenas um delírio frágil, teria se dissipado ao menor contato e não teria permanecido como memória sólida. Portanto, era contraditório que fosse, ao mesmo tempo, profundo o suficiente para formar um módulo psíquico e frágil o suficiente para se romper com um toque.

    Contudo, essa segunda hipótese também era estranha. Que tipo de adaptador faria algo assim?

    Além disso, esse adaptador teria que ser extremamente poderoso.

    Com essas perguntas na cabeça, Adam continuou explorando os outros módulos psíquicos de Liu Shouyi, mas não encontrou mais nada de útil. Quanto ao módulo em forma de bolha, parecia ter sido uma experiência única, que não podia mais ser acessada depois de destruída.

    “O que está acontecendo aqui, afinal?”

    Após uma longa jornada pelo mundo psíquico de Liu Shouyi, Adam se encontrava agora em um shopping center, ainda tentando entender o que acabara de testemunhar. De repente, sentiu algo voando em direção à parte de trás da cabeça, e desviou por reflexo.

    No instante seguinte, um balcão à sua frente foi pulverizado com um estrondo.

    Adam se virou e viu uma anomalia cuja forma parecia ser completamente feita de lodo.

    “Essa é uma anomalia gerada por culpa.”

    Ele recuou rapidamente para abrir distância. Aquele módulo psíquico era um shopping de luxo gigantesco, repleto de acessórios e itens caros, o paraíso perfeito para a maioria das mulheres.

    O módulo continha a memória de um encontro que Liu Shouyi teve com sua primeira namorada. Não muito longe dali, ele estava saindo com ela, mas a aparição da anomalia fez todos entrarem em pânico e saírem correndo, inclusive o próprio Liu Shouyi e a garota.

    Adam já havia visto uma entidade de lodo parecida no mundo psíquico de Peter. Peter era um homem que tinha feito muitas coisas ruins, mas como recebia tratamento psíquico com frequência, sua culpa não chegou a evoluir para uma anomalia. Já essa criatura diante dele havia passado desse ponto.

    A anomalia de lodo possuía um corpo gigantesco, com quase quatro metros de altura. A metade inferior ainda era pura lama, enquanto da parte superior brotavam dois braços e uma cabeça. Em suas mãos, segurava dois tridentes de aço, e de sua cabeça saíam dois chifres. Seu corpo inteiro emanava uma energia negra ameaçadora.

    Segundo o próprio Liu Shouyi, ele havia ‘comprimido’ muitas pessoas no passado — o que fez sua culpa crescer como uma bola de neve, apesar dos esforços do irmão para convencê-lo de que não era culpado.

    “Quanto mais emoções negativas sentia, mais poderosa sua anomalia se tornava.”

    E quanto ao quão poderosa ela era, Adam só descobriria lutando.

    Na forma atual, com sua resistência física excepcional, ele não tinha motivo para recuar. Avançou imediatamente, lançou-se no ar e desceu com a faca de entalhar em um golpe feroz, carregado por sua força bruta e pelo impulso da queda livre.

    A anomalia ergueu seus tridentes para revidar. Um estrondo metálico ecoou quando Adam foi arremessado para trás por mais de dez metros. A anomalia também recuou, sendo arrastada por sete ou oito metros conforme seu corpo escorregava no chão lamacento.

    Um pequeno gesto, um grande impacto!

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