Capítulo 143: Indivíduo Misterioso

Adam lançou um olhar sutil para Crocodilo enquanto falava.

— Você quer que eu saia de novo, né? Tudo bem! Ele já pagou, então temos que fazer o que ele manda. Vamos nessa!

Assim que Crocodilo deixou o cômodo, Adam se voltou para Liu Shouyi, que também o encarava ao perguntar:

— O que você quer saber?

— Quero fazer umas perguntas sobre a Corporação Gaia.

A expressão de Liu Shouyi endureceu na hora ao ouvir o nome ‘Corporação Gaia’, como se lembranças aterrorizantes, marcadas a ferro em sua mente, tivessem emergido à tona.

— Quem é você?

— Ninguém.

Adam refletiu por um momento e percebeu que, se não revelasse nada sobre si, não teria como conquistar a confiança de Liu Shouyi. Ele apenas pensaria que Adam era um funcionário da Corporação Gaia tentando induzi-lo a falar algo que não devia.

— Pra falar a verdade… eu sou um quadro em branco. Tenho certeza de que já ouviu esse termo, certo?

— Já. Meu irmão me disse que quem tem dinheiro suficiente pode arranjar quadros em branco pra alcançar a imortalidade.

— E quem é que está arranjando esses quadros em branco? A Corporação Gaia?

Liu Shouyi ficou em silêncio de novo.

— Vem comigo. Vou te mostrar algumas das minhas experiências pra provar que estou falando a verdade.

Enquanto falava, Adam arrastou Liu Shouyi para seu mundo psíquico e, lá, mostrou algumas de suas memórias: seu despertar naquela câmara subterrânea, a provação que enfrentou após ser enganado e jogado num túnel habitado por um morador de rua, seu primeiro encontro com a Aranha Vermelha…

A confiança era o fator mais importante para viabilizar qualquer comunicação entre pessoas, e a simetria de informações era a base da confiança.

Depois de compartilhar um pouco de suas vivências com Liu Shouyi, Adam naturalmente conseguiu conquistar parte de sua confiança.

— Então você realmente não é da Organização Gaia… — Liu Shouyi parecia muito mais tranquilo ao sair do mundo psíquico. — Você é um quadro em branco… Parece que sua vida foi ainda mais dura que a minha.

— É por isso que quero descobrir todos os segredos por trás de mim. A Organização Gaia tem alguma ligação com quadros em branco?

— Eu não sei. — Mesmo sendo a mesma resposta de antes, Liu Shouyi falava com muito mais sinceridade. — Sou só um funcionário. Não tenho acesso ao que os superiores fazem. Mas tenho quase certeza de que alguns dos altos executivos da empresa trocaram de corpo em algum momento.

— De vez em quando, um cargo de liderança acaba nas mãos de um rosto completamente novo. Mas essa pessoa já chega sabendo de tudo desde o primeiro dia — até segredos da empresa e sistemas complexos. A única diferença em relação ao antecessor é que são mais jovens e ainda melhores no que fazem. No passado, isso sempre me deixava confuso… mas, se eu estiver certo, todos eles já usaram quadros em branco.

Adam assentiu e perguntou:

— Você se lembra de uma mulher chamada Madame Árvore?

— Madame Árvore? Quem é essa?

Adam percebeu que a expressão confusa de Liu Shouyi era completamente genuína, e teve certeza de que a memória com a Madame Árvore havia realmente sumido como uma bolha estourada. Por isso, reformulou a pergunta:

— Depois que saiu da Corporação Gaia, encontrou mais algum adaptador? Ou procurou algum psicoterapeuta adaptador pra tratar sua condição?

— Não. Vim direto pra cá depois que fui demitido.

— Tem certeza?

— Absoluta — respondeu Liu Shouyi com firmeza.

— Por que escolheu vir pra Cidade das Sombras?

— Porque aqui a ideia de imortalidade não existe. Ouvi dizer que é um lugar caótico, mas que funciona com uma rede interna, e os moradores são proibidos de acessar o Metaverso. Aos meus olhos, isso aqui é um lugar limpo e puro.

— Isso aqui é limpo e puro? Você tá pedindo pra ter os rins arrancados!

— Pelo menos aqui não existe fraude sistêmica. Mesmo que eu acabasse morrendo nessa cidade, estava disposto a aceitar meu destino.

Considerando que o estado mental de Liu Shouyi era tão grave a ponto de gerar uma anomalia de nível três, não era surpresa que ele desse tão pouco valor à própria vida.

A essa altura, o fardo mental era simplesmente insuportável para uma pessoa comum, algo capaz de levá-la ao suicídio ou à insanidade.

— Você mencionou que foi demitido, certo?

Ao refletir sobre as estratégias e os processos da Corporação Gaia, Adam percebeu que se tratava de um sistema verdadeiramente impecável.

Eles usavam adaptadores para realizar análises psíquicas periódicas nos funcionários, depois alteravam as memórias daqueles que consideravam problemáticos.

Mesmo após essas alterações, ainda se preocupavam com a possibilidade de os valores pessoais do funcionário não estarem alinhados com os da corporação, e por isso, esses indivíduos acabavam demitidos.

Esse já era um sistema de segurança com três camadas. E, além disso, o poder, a influência e o controle que a Corporação Gaia exercia sobre as informações na internet funcionavam como uma quarta barreira.

Ninguém encontrava nada de negativo sobre eles online.

Assim, não havia controvérsia externa contra a corporação, e todos os problemas internos eram eliminados por esse processo à prova de falhas. Era, de fato, um sistema quase perfeito.

— Você realmente sentiu que ninguém dentro da corporação tentou te ajudar?

— Quem poderia estar me ajudando?

— E seu irmão?

— Ele ainda trabalha lá, e tá completamente em paz com isso. Não acha que esteja fazendo nada errado. Chegou a me alertar pra não atrapalhar a forma como ele ganha dinheiro — Liu Shouyi suspirou.

Pelo visto, no fim das contas, os dois irmãos tomaram caminhos distintos devido aos valores conflitantes.

Adam já tinha feito todas as perguntas que queria, mas ainda sentia que não estava mais perto de resolver o mistério.

Ainda assim, não tinha sido um esforço em vão.

Ao menos, havia sido alertado de que existia um adaptador misterioso, ou talvez um grupo, infiltrado na Corporação Gaia e agindo contra ela.

Adam já havia cruzado com um ‘ajudante’ misterioso no Metaverso, e, se não estivesse enganado, as duas presenças eram a mesma.

Quanto à identidade dessa pessoa ou grupo, Adam não fazia ideia, e Liu Shouyi claramente também não sabia de nada. Pretendia perguntar diretamente na próxima vez que os encontrasse.

— Certo. Fiz todas as perguntas que queria. Pode ficar aqui daqui pra frente. Já pedi pro Crocodilo garantir sua segurança.

Adam deu um leve tapinha no ombro de Liu Shouyi antes de se levantar para ir embora. Liu Shouyi ainda era útil, mas não no momento. No momento, sua prioridade era limpar seu nome para deixar de ser um foragido.

Seja lá o que fosse essa entidade misteriosa, ela havia informado que a gravação estava na Cidade das Sombras. Agora que Adam sabia das ações dessa figura dentro da Corporação Gaia, ficou ainda mais convencido de que a informação recebida era confiável.

— Tô indo.

Adam saiu sem demora, despedindo-se rapidamente de Crocodilo.

Nos dias seguintes, Adam continuou participando das lutas na arena, ao mesmo tempo em que pedia à Gangue Verde, a Crocodilo e à Tartaruga Vermelha que continuassem procurando por sujeitos potencialmente adequados para ele.

No entanto, a busca não estava indo muito bem, e as lutas também começaram a se tornar mais difíceis.

Hailey já havia dito a Adam que, com o nível de poder que demonstrava, ele provavelmente só chegaria até o Rank B. Claro, naquela época, Adam havia escondido a maior parte de seu poder.

Mas, agora, começava a enfrentar dificuldades reais.

Ao chegar no Rank B, o nível geral de seus oponentes aumentou consideravelmente, e era comum ele se ver envolvido em batalhas exaustivas.

Apesar de continuar com um histórico impecável de vitórias, Hailey e todos os espectadores podiam ver que ele já estava perto de seu limite.

Especialmente naquele dia, em que ele disputava uma luta de promoção para o Rank A, e seu oponente também era um combatente do Rank B com uma ficha limpa.

Era uma luta muito aguardada. O público adorava ver combatentes poderosos em sequências de vitórias, mas gostava ainda mais de ver essas sequências serem quebradas.

A decepção trágica de ver o caminho de alguém ser interrompido brutalmente era uma narrativa cativante, garantia de público.

Os organizadores do evento sabiam disso muito bem e não pouparam esforços na divulgação da luta. Como resultado, no dia do confronto, o estádio já estava completamente lotado quando Adam chegou.