Capítulo 26 - Ascensão do Clã Baek.
A alvorada nasceu com um céu turvo, nuvens densas se acumulando sobre a Fortaleza do Dragão Oculto como um manto de presságio. A brisa matinal, fria e cortante como lâmina, agitava as capas brancas dos soldados alinhados no campo leste.
O som das trombetas cortou o silêncio como uma espada afiada.
— “TODOS EM POSIÇÃO!” — bradou o Capitão Carter, sua voz ecoando entre os vales.
Diante do campo de treino, três jaulas gigantescas foram puxadas por carruagens rúnicas, seladas com insígnias de contenção. Dentro delas, três feras rugiam e se debatiam com fúria:
Um Urso das Neves de Nível Guerreiro, sua pele espessa coberta por gelo espiritual que jamais derretia.
Uma Serpente Rubra com escamas de fogo, silhueta sinuosa, olhos cheios de malícia e veneno.
E por fim, um Tigre de Presas Negras, conhecido por devorar cultivadores e absorver seus núcleos.
Todas eram bestas perigosas, capturadas em regiões distantes por ordem de Baek Jin, com um único propósito: testar a primeira formação real da Liga da Lâmina Celestial.
Baek Jin, de pé em um mirante acima do campo, observava com os braços cruzados. Sua expressão era serena, mas seus olhos… aqueles olhos carregavam uma chama antiga.
— “Está pronto, Capitão?” — perguntou ele, sem desviar o olhar.
— “Sim, senhor.” — respondeu Carter. — “Dividimos a unidade em três batalhões de mil. As bestas serão libertadas uma por uma, em combate simulado, sem reforços mágicos externos. Apenas formação de escudos, lanças e estratégia.”
Baek Jin assentiu levemente.
— “O mundo só respeita quem é forte. Está na hora de o mundo ouvir o rugido da nossa muralha.”
As jaulas começaram a se abrir.
— “PRIMEIRA BESTA: URSO DAS NEVES! PREPAREM A MURALHA!”
Qian Xue avançou com o terceiro batalhão, sua posição: comandante da terceira fileira de escudos.
A besta surgiu rugindo, sua massa colossal rompendo a terra com cada passo. Seus olhos estavam tomados por Qi demoníaco, pulsando em vermelhidão.
— “Muralha de Escudos! Primeira linha: formação sólida!” — gritou o comandante da frente.
Os escudos subiram, a muralha se formou.
O urso colidiu contra os escudos com a força de uma avalanche.
O impacto foi brutal — o chão tremeu, o som de metal rangendo ecoou, mas a muralha… resistiu.
— “SEGUNDA LINHA, GOLPE HORIZONTAL!” — gritou Qian Xue.
Os guerreiros atrás avançaram um passo, deslizaram as lanças pelas aberturas nos escudos, e perfuraram as patas da criatura. O urso urrou, recuando por um instante.
Mas veio novamente.
Qian Xue apertou os punhos. Seus olhos estavam fixos.
Sua mente, repleta de lembranças de sua família, sua seita em chamas.
— “Não cederemos…” — sussurrou. — “Não outra vez.”
Ela saltou da formação, ignorando os olhares ao redor.
— “Capitã Qian!” — gritou Carter — “O que pensa que está fazendo?!”
Ela não respondeu.
Correu em linha reta, sua túnica negra balançando, a capa branca girando como asas celestiais.
Em um movimento veloz, ativou sua técnica de espada:
“Corte Frio das Cinzas Eternas”.
A lâmina brilhou em prata pálido.
O corte passou pela pata traseira do urso com precisão e velocidade assustadoras, fazendo a criatura cair desequilibrada.
Ela saltou para trás, retomando sua posição na muralha.
— “AVANÇAR EM BLOCO! DESESTABILIZADA! TERMINEM!” — gritou ela.
Com um brado uníssono, o batalhão avançou, as lanças cravando-se no flanco da besta caída até que ela parou de se mover.
Silêncio.
Então o campo inteiro explodiu em aplausos.
A segunda besta, a Serpente Rubra, foi liberada contra o segundo batalhão.
A luta foi mais difícil — sua velocidade e veneno testaram os limites da formação.
Mas inspirados pela vitória do terceiro batalhão, resistiram.
E venceram.
O terceiro monstro, o Tigre de Presas Negras, foi lançado contra o primeiro batalhão.
Comandados por Huo Liang, sob olhar atento de Qian Xue, eles resistiram bem — mas sofreram perdas. A muralha teve três lacunas abertas.
Qian Xue, sem ordens, reorganizou os flancos e reforçou a linha com soldados de reserva em tempo recorde.
A muralha fechou.
O tigre caiu.
Ao entardecer, a luz do sol sangrava no horizonte como um pano rubro estendido nos céus.
Todos os soldados estavam em formação, enquanto Baek Jin descia os degraus do mirante.
— “Todos vocês provaram seu valor. Mas entre todos…” — sua voz pausou enquanto olhava diretamente para Qian Xue — “…houve uma guerreira que superou as expectativas. Inteligência, coragem e comando.”
Ela manteve-se firme. O coração acelerado. Mas não baixou os olhos.
— “Qian Xue. A partir de hoje, você é oficialmente nomeada Capitã de Mil Homens da Liga da Lâmina Celestial. Sua unidade será a Terceira Companhia de Elite, sob meu comando direto.”
Os soldados bateram os punhos nos escudos três vezes, em respeito.
Qian Xue respirou fundo, os olhos marejando por um instante.
— “A Liga da Lâmina Celestial é minha nova seita. Não recuarei.” — disse, com voz firme.
Baek Jin assentiu.
— “A partir de hoje, sua espada carrega o peso de mil almas. Não pela glória, mas pela justiça. Prepare-se. Em breve… o sangue real será derramado.”
…
Em outro lugar.
A noite ali não era apenas ausência de luz. Era uma prisão viva, sufocante, densa como óleo e silenciosa como uma cova esquecida. O céu, coberto por nuvens negras que jamais se dissipavam, escondia a lua e as estrelas, como se até os céus se recusassem a testemunhar aquele local amaldiçoado.
No centro de um vale morto, onde as árvores haviam sido reduzidas a torres carbonizadas e o solo não passava de cinzas misturadas a sangue seco, duas figuras surgiam, envoltas em mantos vivos que pareciam feitos de sombras líquidas. Cada passo deles deixava rachaduras por onde névoas negras escapavam, espalhando uma presença que sufocaria qualquer ser comum com um único suspiro.
A primeira figura era alta, magra como uma lâmina e com o rosto completamente coberto por uma máscara de osso, cujos traços lembravam o crânio de um antigo demônio. Seus olhos brilhavam em vermelho opaco, como brasas enterradas sob montanhas. Era chamado de Rei da Noite Eterna, e apenas seu nome já bastava para fazer os mortos se revirarem em suas covas.
A segunda figura era mais robusta, trajando uma armadura negra com entalhes demoníacos em vermelho pulsante. Seus ombros largos sustentavam uma capa feita de asas de bestas espirituais arrancadas à força, e sua voz tinha o peso de cem mil mortes. Chamavam-no de Senhor do Abismo, não por acaso — ele era o comandante de legiões da noite, e seu nome era temido até nos pesadelos dos cultivadores demoníacos.
Eles se encontravam diante de um altar quebrado, antigo como os primeiros mitos, encharcado com o sangue de incontáveis sacrifícios. Ali, as palavras que trocavam não pertenciam ao presente, mas ao futuro que pretendiam moldar com ferro, escuridão e terror.
—
Rei da Noite Eterna:
“O ciclo está prestes a se romper. O tempo dos homens chegou ao fim. A luz… está fraca demais para resistir.”
Sua voz era calma, fria como a tumba mais antiga. Cada sílaba parecia arranhar as paredes da alma.
Senhor do Abismo:
“A Liga da Lâmina Celestial… Eles ainda acreditam em esperança. Ainda constroem paredes e muralhas. Ainda forjam espadas pensando que podem resistir ao inevitável. Patéticos.”
Ele cuspiu no chão, e a terra dissolveu-se sob o impacto de sua saliva corrompida.
Rei da Noite Eterna:
“Eles não sabem. Ninguém sabe. Nem os Santos Marciais, nem os Semi-Deuses… Todos dormem sob o falso conforto da paz. Quando abrirmos os portões da Cidade Sombra, quando os Filhos das Trevas despertarem… haverá apenas um trono, e nós sentaremos sobre ele.”
Senhor do Abismo:
“Eles estão distraídos com guerras internas, alianças frágeis, disputas ridículas por território. Enquanto isso, nosso exército cresce. Nossos Generais Sombras alimentam as legiões. Já passamos dos trinta mil cultivadores corrompidos, todos acima do Quinto Nível do Reino Marcial.”
Rei da Noite Eterna:
“Ainda falta algo…”
Ele ergueu uma mão de dedos longos e retorcidos, apontando para o horizonte que não tinha fim.
“Precisamos da última chave. A Espada do Céu Caído. Ela está em algum lugar entre as fronteiras do Império Solaris e os Reinos das Montanhas Gêmeas. Quando ela for nossa…”
Senhor do Abismo:
“Nem mesmo Baek Jin, o Santo Marcial da Lâmina Silenciosa, poderá impedir. Ele pensa que constrói um exército. Ele pensa que prepara sua defesa. Mas está apenas reunindo oferendas para nosso banquete.”
Ele gargalhou, uma risada grave e cheia de ódio. Cada eco era como um trovão vindo do submundo.
Rei da Noite Eterna:
“Prepare os Seis Generais da Escuridão. Enviem sombras para se infiltrarem entre os exércitos mortais. Que observem, que espalhem o medo. Em breve, até as estrelas do céu esquecerão de brilhar.”
Senhor do Abismo:
“Sim… Rei da Noite Eterna.”
Ele se ajoelhou, batendo o punho cerrado no peito, reverente.
“O mundo será mergulhado em trevas. E sob a bandeira da Escuridão, nós reinaremos.”
—
Então, como se os céus ouvissem aquela profecia, uma tempestade negra começou a rugir acima deles. Raios púrpuras cortaram o céu, mas nenhum som de trovão veio — apenas o uivo abafado das almas condenadas.
Naquele momento, um novo ciclo estava prestes a começar. Um ciclo de destruição.
E nenhum cultivador no mundo sabia disso.
Ainda.
—
…
A aurora daquele dia não trouxe apenas a luz do sol.
Ela trouxe esperança.
Ao sul do território do Clã Baek, onde os ventos sopravam sobre os jardins de bambu e o aroma das flores de magnólia se misturava ao orvalho, o céu repentinamente se agitou com uma leve distorção espiritual. Uma explosão suave de energia se espalhou pelo salão principal do clã, e todos os anciãos, discípulos e guardas congelaram como se os próprios céus tivessem parado por um momento.
Na câmara de cultivo sagrada do clã, uma cúpula de energia prateada expandiu-se com força invisível, empurrando o ar como uma maré viva. Raios dourados dançavam ao redor do telhado de jade do templo principal, enquanto as nuvens formavam espirais densas sobre o local, como se os céus estivessem testemunhando algo digno de lembrança eterna.
— I-Isso é… — um dos anciãos murmurou, os olhos arregalados.
— Não pode ser… — outro exclamou, cambaleando ao sentir o peso da pressão espiritual que repentinamente tomava conta do ar.
As sinetas do templo tocaram sozinhas.
As formações defensivas brilharam com luz azulada.
E então, a câmara se abriu.
Com passos calmos, o Patriarca Baek Mu-Hwan emergiu de seu retiro espiritual. Vestia um manto cerimonial branco como a neve, bordado com dragões de jade e nuvens prateadas. Sua expressão era serena, como a superfície de um lago em silêncio. Seus olhos, entretanto, ardiam com um novo brilho. As marcas da idade ainda estavam ali, mas agora, o vigor de um cultivador que havia cruzado a barreira do impossível pulsava de seu corpo.
— O Patriarca… ele… ele rompeu… — um discípulo sussurrou com a voz trêmula.
— Quase-Santo… ele atingiu o nível de Quase-Santo Marcial! — gritou um dos anciãos, caindo de joelhos.
Com o rompimento do Patriarca Baek Mu-Hwan, um evento há muito considerado improvável havia se tornado realidade. O clã Baek, antes visto como o mais frágil entre os grandes cinco clãs, tinha ascendido.
A notícia correu como um incêndio em floresta seca. No mesmo dia, mensageiros espirituais atravessaram as nuvens com selos oficiais das demais seitas e clãs, parabenizando e, ao mesmo tempo, reconhecendo o novo posto do Clã Baek.
— Com a ascensão de Baek Mu-Hwan… o Clã Baek é agora o quarto clã mais poderoso! — proclamava o boletim das Seis Seitas.
— Não! Corrijam-se! — outro relatório retificava, vindo de um dos Anciãos do Vale do Norte. — Desde a chegada de Baek Jin, o Santo Marcial conhecido como Lâmina Silenciosa, eles já haviam superado o Terceiro e o Segundo Clã. Agora, após o avanço do Patriarca, eles são o Segundo Clã mais poderoso de todo o Continente Central!
O impacto foi estrondoso.
Em poucas horas, caravanas de mercadores, cultivadores errantes, emissários e representantes começaram a rumar para a sede do Clã Baek. Esperavam alianças, oportunidades, ou simplesmente queriam presenciar com seus próprios olhos o que o mundo começava a chamar de “Renascimento do Clã Baek”.
No salão interno do Clã, em um ambiente decorado com tapeçarias cerimoniais e incensos que exalavam perfumes de flores raras, Baek Mu-Hwan se encontrava com Baek Jin.
— Jin’er… — a voz do Patriarca era suave, quase paternal. — Hoje, sinto que o peso do mundo sobre meus ombros ficou um pouco mais leve. Este avanço… não é apenas meu mérito.
Baek Jin, com os braços cruzados, observava o Patriarca com um leve aceno de cabeça. Vestia seu habitual manto escuro, os longos cabelos cinzentos quase negros caindo pelas costas, e seus olhos carregavam a serenidade de quem já havia visto muitas vidas e mortes.
— Não há necessidade de agradecimentos, Patriarca. O clã se fortalece porque precisa sobreviver. Nada mais.
O Patriarca sorriu, mas seu olhar logo se tornou sério.
— Mesmo assim, Jin’er, muitos dos anciãos estão inquietos. Seu novo exército… A Liga da Lâmina Celestial… eles dizem que isso poderá, um dia, substituir o próprio clã.
— E se for preciso? — Baek Jin respondeu com frieza, seus olhos penetrantes encarando o do Patriarca. — Eu jurei proteger o clã. Mas se os céus abandonarem os fracos, alguém precisa ter força para lutar contra a escuridão. Os tempos de paz estão ruindo, Patriarca.
Baek Mu-Hwan suspirou, mas assentiu. Havia um entendimento entre eles que transcendia palavras. Em silêncio, ele se levantou e colocou uma das mãos sobre o ombro de Baek Jin.
— Então, caminhemos juntos até onde for possível. Mas que os céus tenham olhos… e que julguem nossas ações.
Naquele mesmo dia, grandes bandeiras foram erguidas no alto da muralha principal do clã. Bordadas com fios de prata, exibiam o símbolo da espada da Lâmina Celestial — uma lâmina solitária, apontada para o céu, envolta em chamas suaves.
A partir daquele momento, todos sabiam: o Clã Baek não era mais uma sombra de seu passado.
E enquanto os fogos de artifício explodiam no céu e as multidões celebravam, em terras distantes… olhos frios e cheios de trevas observavam em silêncio.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.