Capítulo 30 – O medo de Qian Xue.
A luz da tarde refletia suavemente nas muralhas brancas da Cidade Celestial Tianlong. Era uma arquitetura de esplendor divino — colunas entalhadas com runas antigas, caminhos de jade e torres flutuantes que tocavam as nuvens. As aves espirituais voavam tranquilas pelos céus, mas dentro da torre do comando da Liga da Lâmina Celestial, havia apenas tensão e silêncio.
Qian Xue estava parada diante de uma janela aberta, com os olhos distantes no horizonte. O vento brincava com seus longos cabelos prateados, ondulando como fios de luar em uma noite calma. Sua armadura de capitã reluzia sob a luz, ajustada perfeitamente ao seu corpo esguio e gracioso. Mas por trás da postura ereta e digna, seu coração palpitava com fúria e medo.
— “O que… você disse?” — sua voz, embora suave, cortava o ar como uma lâmina.
O mensageiro curvou-se com a testa quase tocando o chão.
— “A proposta foi enviada com o selo oficial da Seita do Céu Aberto… o Mestre Ji-Yeon declarou que, caso haja recusa, poderá ser considerada uma afronta direta à sua seita.”
Qian Xue cerrou os punhos. As luvas rangeram sob a pressão.
— “Ji-hoon…” — ela sussurrou o nome com desprezo. — “Aquele nojento…!”
Ela deu um passo para longe da janela e caminhou até a mesa central, onde repousavam mapas, documentos e planos de treinamento. O som de suas botas metálicas ecoava firmemente pela sala.
— “Esse homem…” — sua voz começou a tremer. — “Dizem que visita bordéis espirituais em cada cidade por onde passa. Que compra servas como se fossem frutas no mercado. Que trata mulheres como brinquedos para satisfazer seus impulsos…!”
Suas mãos tremiam.
— “E agora… ele acha que pode simplesmente… me comprar com uma carta?!”
Ela bateu o punho sobre a mesa com força, rachando a madeira encantada.
O mensageiro não ousou levantar a cabeça.
Qian Xue respirou fundo, tentando se acalmar. Seus olhos, antes cheios de ira, agora mostravam uma sutil sombra de pavor. Ela se lembrou dos rumores — de que Ji-hoon era protegido por seu avô, um Ancião Supremo, um cultivador de nível Semi-Deus que havia devastado três seitas rebeldes com um só movimento de palma.
Mesmo dentro da Cidade Celestial, a ameaça da Seita do Céu Aberto não era algo que podia ser subestimado.
— “Se… se eu recusar…” — ela murmurou, seus olhos voltando-se para o céu além da janela — “será que vão me caçar? Destruir minha honra? Acusar a Liga de desrespeito? Será que vão mover guerra contra o Líder Baek Jin…?”
As dúvidas lhe mordiam a mente como serpentes venenosas. Pela primeira vez em anos, Qian Xue sentiu-se frágil. Vulnerável.
Sua mente, sem querer, voou para outro nome.
Tae-Min.
Jovem, de olhos sinceros e coração firme. Um discípulo de sua divisão que sempre se dedicava ao cultivo com alma limpa. Ele a respeitava, ouvia cada palavra com atenção e nunca a olhou com desejo. Apenas com admiração sincera.
— “…se fosse para me casar com alguém…” — ela disse num sussurro quase imperceptível — “teria que ser com alguém como Tae-Min. Alguém com dignidade. Alguém… puro.”
Ela estava prestes a afundar mais em suas incertezas quando a porta da sala se abriu.
Silenciosamente.
Como o som de uma folha caindo sobre neve.
Baek Jin entrou.
Seu olhar sombrio pousou sobre ela. O manto negro dançava suavemente com a aura ao seu redor. Era como se a noite tivesse caminhado para dentro da sala. Seus olhos, dois abismos imóveis, refletiam algo que nem mesmo os cultivadores santos podiam decifrar.
Qian Xue endireitou-se, respirando fundo.
— “Líder Baek…” — sua voz agora estava controlada, mas seu coração ainda batia rápido. — “Recebeu a carta, não foi?”
Baek Jin não respondeu de imediato. Caminhou lentamente até ela. Cada passo parecia ecoar no ar como um sino distante. Quando parou diante da Capitã, ele a observou em silêncio.
Então, ergueu uma mão e pousou-a levemente sobre o ombro dela.
— “Você não vai se casar com Ji-hoon.” — sua voz era firme, como gelo quebrando sobre pedra. — “Não enquanto eu estiver respirando.”
Qian Xue arregalou os olhos, surpresa com a frieza protetora em seu tom.
— “Mas… eles têm um Semi-Deus, Líder Baek…” — sua voz vacilou — “Eles podem… destruir tudo o que construímos aqui.”
Baek Jin a encarou com seriedade.
— “Eles têm um Semi-Deus, sim.” — seus olhos brilharam por um instante com uma luz estranha — “Mas eu estou prestes a romper o sexto portão interno. Você sabe o que isso significa.”
Qian Xue arregalou os olhos novamente.
— “O sexto portão… mas…”
— “Depois disso, estarei no mesmo nível que eles.” — completou Baek Jin. — “Ou além. Tenho um poder oculto me guiando. A Torre dos Deuses é apenas o começo.”
Ele deu um passo à frente, agora com os olhos suavizados.
— “Você não pertence a ninguém, Capitã Xue’er. Você escolhe o seu destino. E se escolher lutar, então lutaremos juntos. A Liga da Lâmina Celestial não se curva a canalhas vestidos de ouro.”
As palavras entraram em seu coração como bálsamo.
Qian Xue, mesmo sendo uma guerreira, sentiu seus olhos se umedecerem. Um calor diferente, feito de confiança, percorreu sua espinha.
Ela assentiu, firme.
— “Sim… então que venham.”
Baek Jin sorriu levemente.
— “E se vierem… conhecerão o verdadeiro som… da minha lâmina silenciosa.”
…
O céu sobre a Cidade Celestial Tianlong estava límpido, como se os próprios deuses estivessem observando os acontecimentos daquele dia. Porém, a tranquilidade da paisagem celestial contrastava com o estrondo causado pela chegada de uma luxuosa carruagem dourada, puxada por quatro bestas espirituais do tipo relâmpago, cada uma com a crina feita de chamas azuis que crepitavam ao tocar o solo.
A comitiva da Seita do Céu Aberto invadia os portões como se fossem donos do mundo. Os discípulos da Liga da Lâmina Celestial, postados como guardas, curvaram-se por educação, mas seus olhos denunciavam a indignação. Nunca antes alguém ousara entrar com tamanha ostentação no coração da cidade sagrada.
Da carruagem, desceu Ji-hoon.
Alto, vestindo um manto bordado com fios de jade e ouro, ele caminhava com passos relaxados, como se todo o mundo estivesse aos seus pés. Seus cabelos estavam presos por um adorno de cristal celestial, e seu olhar carregava a arrogância de alguém que jamais ouvira um ‘não’ em sua vida. Atrás dele, marchavam quatro guardas pessoais, cada um com a força de um Mestre Marcial no Auge — cultivadores temidos em qualquer região.
Ji-hoon levantou os olhos e sorriu.
— “Então esta é a lendária Tianlong… bela, mas ainda pequena diante do minha Seita do Céu Aberto.”
Suas palavras, mesmo ditas com suavidade, soaram como marteladas no coração dos presentes.
Do alto do salão de recepção principal, Baek Jin já o observava.
Sentado de forma casual no trono provisório da liderança da Liga, sua presença era como uma sombra que pairava sobre o salão, silenciosa mas sufocante. Seus olhos semicerrados não perdiam um movimento sequer do novo visitante. Ao lado, Qian Xue mantinha a compostura, embora seus punhos estivessem cerrados.
Ji-hoon avançou pelos degraus com um sorriso confiante, ignorando todos à volta. Quando viu Qian Xue, seus olhos brilharam com um desejo doentio.
— “Qian Xue…” — ele sorriu. — “Finalmente posso vê-la pessoalmente. É ainda mais encantadora do que imaginei. Os rumores não fazem justiça à sua beleza.”
Ela desviou o olhar, enojada.
— “Ji-hoon… vá embora.”
Ele soltou uma risada exagerada.
— “Oh? Vai mesmo recusar o pedido oficial de casamento da Seita do Céu Aberto? Minha carta foi clara, não? Estou disposto a aceitá-la como minha esposa principal. Mesmo com sua fria rejeição, ainda vim pessoalmente mostrar minha boa vontade.”
Qian Xue ficou em silêncio. Ela não queria provocar um conflito naquele momento. Mas antes que pudesse dizer algo, Ji-hoon deu um passo à frente — e com total desrespeito, tentou segurar sua mão. Mas Qian Xue se afastou um passo.
— “Vamos, Xue’er… pare com essa encenação. Você é linda demais para ficar aqui nesse lugar provinciano. Venha comigo, e terá um palácio de jade só para você, com servos, riquezas e status além da imaginação. Até meu avô já aprovou.”
Ji-hoon foi mais ousado, tentando descaradamente tocar os seios fartos de Qian Xue. Ela bateu nas mãos dele o afastando novamente.
— “NÃO ME CHAME DESSA FORMA ÍNTIMA! É NOJENTO!” — Gritou Qian Xue, ela estava ardendo em fúria, seus cabelos prateados tremiam de raiva.
Foi nesse instante que o ar mudou.
Uma pressão silenciosa, como um trovão contido, tomou conta do salão. Os pilares estremeceram. O chão pareceu vibrar sob os pés dos presentes. Ji-hoon congelou, sua mão parada a centímetros de Qian Xue.
Baek Jin se levantou.
A sua presença espiritual desceu como um céu caindo sobre a terra.
Todos sentiram a pressão de um verdadeiro Santo Marcial.
A atmosfera tornou-se sufocante. Até mesmo os guardas de Ji-hoon, mestres marciais no auge, deram um passo atrás instintivamente, suando frio. Era como se estivessem diante de um dragão adormecido que, naquele momento, havia entreaberto os olhos.
Baek Jin desceu um degrau. Seus olhos, negros como a noite eterna, estavam fixos em Ji-hoon.
— “Tire as mãos dela.”
Ji-hoon tentou rir.
— “Você acha que pode me impedir? Sou herdeiro da Seita do Céu Aberto! Meu avô é um Semi-Deus! Você… não é nada além de um cultivador no nível dos Santos!”
— “E você é apenas um verme coberto de ouro.” — respondeu Baek Jin, sem levantar o tom.
Ji-hoon rangeu os dentes, envergonhado diante de tantos olhares.
— “Guar—”
Mas ele não teve tempo de terminar o chamado.
Num único piscar de olhos, Baek Jin moveu-se. Seu corpo tornou-se uma sombra, um borrão veloz que nenhum dos presentes conseguiu acompanhar. E então, ouviu-se um único estalo.
CRACK.
Ji-hoon gritou em agonia.
Seu braço direito pendia, quebrado em múltiplos pontos, dobrado de forma antinatural. Os gritos ecoaram como trovões pelos corredores.
— “AAAAARRGH! M-MEU BRAÇO! VOCÊ… VOCÊ OUSOU…?!”
Baek Jin segurava ainda o ombro dele com uma mão, mantendo-o ajoelhado com facilidade. Seu olhar era gélido.
— “Você veio aqui com arrogância… tentando desonrar a venerável Capitã Xue da minha Liga da Lâmina Celestial… e me ameaçar com o nome de seu avô. Mas aqui… você está sob minhas leis.”
Os guardas da Seita do Céu Aberto avançaram, mas pararam no instante seguinte.
A pressão espiritual de Baek Jin aumentou. Não era apenas uma aura… era como estar diante de um mar revolto prestes a engolir tudo. Suor escorria pela testa dos mestres marciais. Seus joelhos começaram a tremer.
— “Não… é possível…” — murmurou um dos guardas, arfando. — “Esse nível de pressão… ele já… ele já tocou o sexto portão interno?!”
Baek Jin soltou Ji-hoon, que caiu ao chão, gemendo.
Ele virou-se e caminhou de volta lentamente. Cada passo era um fardo para aqueles que ousavam levantar a cabeça.
— “Levem-no de volta.” — ele disse. — “E avisem ao velho Semi-Deus de sua seita…”
Ele parou por um momento, olhando por cima do ombro, os olhos brilhando com uma luz incomum.
— “…se quiser guerra, que venha. Mas traga mais do que palavras e ameaças. Porque da próxima vez… eu não vou apenas aleijar.”
Qian Xue observava tudo com os olhos marejados.
Não de medo.
Mas de alívio.
E admiração.
Ji-hoon foi levado, desacordado pela dor e pela humilhação. Seu nome, antes símbolo de privilégio e poder, agora ecoava como um lembrete… de que havia forças no mundo que o ouro e o sangue não podiam dobrar.
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