Capítulo 109: Medo.
O que é medo? Muitos dizem que o medo são situações inesperadas que nos proporcionam o estado de perigo tanto físico quanto mentalmente, como o medo de coisas sobrenaturais.
Não está errado, mas de maneira mais complexa, o medo vem da incapacidade de lidarmos com um perigo ou algo fora de nossas capacidades. As pessoas temem os leões porque somos fisicamente incapazes de enfrentá-los, temem o sobrenatural porque são coisas incompreendidas, teme uma gravidez indesejada porque não estavam preparados para a responsabilidade, e pessoas religiosas temem o pecado com medo de receberem o julgamento divino após morte.
Mas e se as pessoas tivessem força suficiente para enfrentar não só um, mas um grupo inteiro de leões, ainda teriam medo deles? Se tivéssemos capacidades de vencer o sobrenatural, ainda teríamos medo mesmo diante deles? Se você tivesse todo o dinheiro do mundo, ainda teria medo de uma gravidez indesejada? Ou se você vivesse sua vida sem pecado, ainda temeria a morte?
A resposta certamente é um não. Quando uma pessoa tem a capacidade e a força para enfrentar os desafios na sua frente, o medo passa a tornar-se algo insignificante, apenas mais uma emoção enterrada no fundo do quociente.
E o culto demoníaco são a prova viva disso, eles são moldados a acreditar que a causa deles está acima de qualquer ser vivente na terra, por isso matam e torturam sem nenhum peso na consciência, e não temem a retribuição divina porque têm o Soberano demoníaco como deus.
{O soberano demoníaco está acima de tudo e de todos, aqueles que o seguirem terão seu lugar na terra acima dos fracos após sua ressurreição, alcançarão a imortalidade e reinarão junto a ele.}
Eles seguem esta verdade distorcida, usando-a como arma para cometer todo tipo de ato hediondo sem nenhum peso na consciência, e ainda se justificam que o errado são aqueles que os interrompem. Eles não temem a morte, após acham que serão revividos pelo soberano demoníaco quando ele voltar à terra e dominar o mundo, ou é isso que pensam acreditar. Eles não têm medo das consequências, porque se acham certos de tudo.
“Gack!?”
“Kah!!”
“So-socorr-Achk!”
Mas, bem ali, no longo corredor iluminado por tochas pendurados nas paredes, gritos de horror ecoavam enquanto sangue fresco se espalhava por todos os lados.
“O que diabos?…está acontecendo diante de meus olhos?”
Lars, o prefeito que assistia a tudo no canto, não conseguia acreditar no que estava presenciando.
Os cultistas demoníacos, considerados mais teimosos que os próprios guerreiros de Vinland, gritavam de horror enquanto seus olhos se enchiam de pânico.
E o causador de tudo isso era Ken.
Ele avançava violentamente contra eles, rasgando-os ao meio com suas garras como se fossem palito e estilhaçava seus corpos com socos.
Os cultistas, antes confiantes, olhavam com pavor diante da pessoa que parecia uma besta na frente deles. Seus braços tremiam diante de tamanha barbaridade, não acreditando no que estavam presenciando.
Eles se consideravam as pessoas mais horrorosas do mundo, e senso de justiça era algo que lhes enjoavam, por isso sempre andavam de cabeça erguida. Mas a pessoa à frente deles era diferente, ele não parecia agir com base na justiça, era como uma besta enfurecida e incontrolável, que rasgava tudo à sua volta.
Eles avançavam com suas espadas e adagas, tentando acertá-lo, mas Ken sempre conseguia prever a trajetória de cada ataque, desviava, mudava a trajetória dos ataques acertando seus pulsos ou defendia-se daqueles que não tinha como desviar, e então contra-atacava.
Eles sabiam, todos eles, que não tinham chances de parar ele, não tinham forças e nem capacidade mental para enfrentá-lo. E foi então que a realidade começou a alcançá-los. Eles estavam com medo, o medo surgindo da incapacidade de enfrentar ou de entender o alvo deles.
O número de cultistas no corredor aumentava à medida que o tempo passava, dez, vinte, quarenta, cinquenta. Mas quanto mais deles chegavam, mais corpos mortos caiam no chão, tornando a quantidade deles insignificante diante de Ken, que tinha instintos e força de uma besta.
Ele não se cansava, não vacilava, não demonstra piedade e não parava de balançar seus punhos contra eles.
“Mo-monstro…”
“É um demônio…”
O número de cadáveres no chão apenas aumentava, e o pânico se tornava cada vez mais evidente nos olhos dos cultistas.
‘Quanta mana ele tem para ter tanta força?’
Pensou o prefeito que assistia a tudo com perplexidade nos olhos.
‘Não, isto não é apenas força. Ele consegue saber exatamente onde cada ataque está sendo direcionado e agir de acordo com a situação para além de conseguir enxergar todos os truques sujos e ataques cegos. Isto não vem apenas do talento, mas sim de pura experiência prática. De verdade, Ken Wolff, quem é você de verdade.’
A sua curiosidade sobre a identidade de Ken apenas ficava cada vez mais forte, a ponto de esquecer que também estava na luta.
“Esqueçam este monstro! Peguem o prefeito!”
“Vamos usá-lo como refém!”
Em seus momentos mais desesperados, seis cultistas demoníacos conseguiram escapar dos olhos de Ken e avançaram na direção de Lars.
“Tsk! Vocês acham que sou fácil!?”
O prefeito, notando o plano deles, ergueu sua espada pronto para o confronto. Dois dos cultistas avançaram com suas adagas tortas, uma arma comum no culto, e atacaram o prefeito.
*Deng.*
As adagas colidiram com a lateral da espada de Loirs, que usou para se defender do ataque.
“Apenas se entregue!”
Gritou um deles, circulando a mana com ainda mais força para aumentar suas força física, o outro fez o mesmo.
“Ugh…”
O prefeito, embora também circulando sua mana, não conseguia superar a força de dois deles.
“Huuaaa!!”
Mas como um guerreiro de Vinland, ele não desistiu e com ainda mais força conseguiu empurrar os dois para trás.
Mas no mesmo instante outro surgiu e atacou.
“Apenas desista.”
“Ugh.”
O prefeito desviou, mas o corte atingiu sua costela, causando um pequeno corte. Mas então o prefeito segurou seu braço e abaixou sua espada em um corte, mirando em sua cabeça.
O cultista rapidamente desviou a cabeça, mas o corte caiu sobre seu braço, cortando-o fora do corpo. Mas sem soltar um grito ou demonstrar desespero em seu rosto, o cultista pulou para longe, deixando seu braço para trás enquanto puxava outra adaga da roupa.
“…”
O prefeito pareceu perplexo, mas sem demonstrar em seu rosto.
‘Mesmo que eu tenha cortado seu braço, ele não gritou nem pareceu desconfortável. Mas…’
Enquanto pensava, olhou de relance para Ken, que lutava contra os outros cultistas.
‘Os cultistas sempre parecem gritar de dor quando o enfrentam, porquê?’
O prefeito estava genuinamente curioso, mas decidiu se concentrar nos inimigos à sua frente, pegando o cabo de sua espada com mais força.
“Não adianta! Você agora é nosso refém!”
Um deles gritou e então todos os seis avançaram de uma vez, cercando-o de todos os lados. Eles estavam decididos em capturá-los para que pudessem usá-lo como refém contra o Ken.
“Haa…parece que não tenho escolha.”
O prefeito suspirou enquanto fechava os olhos, parecendo estar desistindo. Um dos cultistas, vendo isso, riu de alegria.
“Isto mesmo! Apenas desis-!”
Mas no momento seguinte uma aura laranja surgiu debaixo de seus pés e o prefeito pisou no chão, não com força, mas firme.
[Passo do monarca da terra.]
No momento seguinte, o chão tremeu ligeiramente, desequilibrado os movimentos dos cultistas que avançavam com confiança.
Passo do monarca da terra é uma técnica de 3ª classe para aqueles que possuem o núcleo de mana da terra, o que causa um tremor na terra.
(Autor: Só para deixar claro. Técnicas de aura são divididas em quatro níveis de poder, tendo a 1ª classe como mais poderosa e 4ª como mais fraca. Magias são decididas em 10 níveis de poder, tendo a 1ª classe como mais fraca e 10ª como mais poderosa.)
Depois disso, ele usou a lâmina de aura, deixando os cultistas surpresos.
“Lâmina de aura!?”
“Então ele-!”
Mas antes que eles pudessem terminar suas palavras de surpresa, Lars girou em 360ª graus com sua espada, decapitando os seis cultistas de uma única vez, fazendo suas cabeças e corpos caírem no chão em um baque.
“Haa…”
Depois disso, ele suspirou e cessou sua lâmina de aura.
“Agora, devo ajudar…”
Ele então se virou na direção de Ken, destinado a ajudá-lo.
“!…”
Mas assim que olhou para lá, percebeu que o combate já havia parado. Ken estava por cima de dezenas de corpos pertencentes aos cultistas enquanto limpava o sangue que havia sido espirrado em seu rosto com o braço.
“…”
O prefeito guardou sua espada, e, com calma, começou a se aproximar de Ken. Quando chegou até ele, perguntou.
“Tudo bem?”
De costas e sem sequer olhar para ele, Ken respondeu.
“Tudo, vamos continuar.”
Depois disso, ele voltou a andar, seguindo o caminho de onde vinham os cultistas.
O prefeito ficou confuso.
“Ei, espera! Não devemos primeiro garantir a segurança das crianças!?”
Gritou ele por trás.
Ao ouvir sua exigência, Ken parou de andar, e então olhou para ele por cima dos ombros.
“Você tomará responsabilidade?”
Perguntou.
“O quê?…”
O prefeito ficou confuso com a pergunta de Ken. Vendo isso, Ken continuou.
“Nós estamos dentro do território inimigo, você acha que eles nos deixariam levar as crianças na boa vontade? Não, eles usarão esta oportunidade para nos atacar pelas costas e ainda usariam a vida das crianças como reféns. A não ser que você tenha confiança o suficiente para proteger eles enquanto enfrenta os inimigos, sugiro primeiro nos livrarmos de todos eles e assim, finalmente, podermos salvar as crianças.”
Ken deu uma pausa deixando suas palavras se prolongarem, depois se virou e perguntou.
“Então como vai ser, prefeito? O pedido de encontrar as crianças é seu. Devemos priorizar e levar agora as crianças connosco? Ou eliminar primeiro o que resta deste lugar podre?”
“…”
Diante da pergunta de Ken, o prefeito não respondeu e ficou em silêncio por um tempo, não porque ele não tinha uma resposta para a pergunta.
Ele apertou seus punhos em frustração, não porque estava com raiva das palavras de Ken, mas porque estava envergonhado por si mesmo.
‘Droga…e pensar que me deixei levar pelas minhas emoções e quase deixei as crianças em perigo. Ele tem razão, nossa prioridade é eliminar o máximo de risco para finalmente podermos salvar as crianças.’
Ele então levantou a cabeça e olhou para Ken.
‘Embora seja jovem, seu raciocínio é lógico e sabe priorizar a prioridade ao invés de sucumbir às emoções, ainda mais quando ele parecia mais irritado que eu.’
Seus punhos então suavizaram, depois, ele se curvou.
“Desculpe, deixei minhas emoções tomarem o melhor de mim, seguirei sua sugestão.”
Ele se desculpou, seu arrependimento saindo de maneira genuína.
Ouvindo o que queria, Ken se virou para frente e voltou a andar.
“Então vamos.”
O prefeito então se levantou e começou a seguir Ken, sua determinação ficando mais forte do que antes.
§§§§
Ken e Lars continuaram a explorar o esconderijo do culto demoníaco, quanto mais eles avançavam, mas cultistas encontravam e entravam em mais conflitos. Eles passavam de portas em portas, fazendo curvas e às vezes seguindo caminho reto.
Eles passaram por um corredor com quartos, uma sala que parecia ser uma cafeteria e ao abrir mais uma porta, eles entraram em um lugar mais espaçoso, com cerca de dez metros quadrados.
O local cheirava a produtos farmacêuticos e sangue, e estava repleto de frascos de vidro em prateleiras, parecendo um laboratório. O chão do lugar também estava manchado de sangue, criando uma atmosfera sombria.
“Que tipo de experimentos faziam aqui…?”
Perguntou o prefeito enquanto olhava para o lugar, sentindo um estranho desconforto.
“Elixires.”
Respondeu Ken enquanto andava até uma mesa. Por cima dela estava um caderno, que o pegou e começou a ler.
“Elixires? Que tipo de elixires eles poderiam…espera! Não me diga…”
O prefeito estava prestes a perguntar que tipo de elixires eles estavam fazendo, até que uma ideia obscura passou por sua cabeça.
“Sim, eles estão usando as crianças para fazer os elixires.”
“!”
Ele já sabia, mas receber confirmação ainda causou um peso em sua consciência.
“Parece que eles estão fazendo experimentos implantando mana em crianças.”
Disse Ken, lendo o conteúdo que continha no livro.
“O quê?…”
Os olhos do prefeito se arregalaram de horror após ouvir o que Ken havia acabado de revelar.
“Mas porque eles implantaram mana em crianças?…Sei que os elixires destas sanguessugas são de pessoas que possuem núcleo de mana, mas porque eles fariam isso com crianças!? É impossível! Crianças não podem ter núcleo de mana.”
“…”
O que o prefeito disse estava certo, e Ken sabia disso. A única razão das pessoas apenas criarem um núcleo de mana a partir dos 15 anos é porque o corpo precisa estar fisicamente evoluído para suportar a carga da mana. Caso uma criança de menor idade tentasse, seu corpo não suportaria o poder e seu corpo seria destruído, e no pior dos casos morreria.
Existem casos de crianças que conseguiram criar um a partir dos 13, mas ou são situações extremamente raras ou não passavam de mentira.
Ken respondeu.
“O elixir criado pelo sangue de uma criança comparado com a de uma pessoa com núcleo de mana não tem muita diferença, embora que o elixir criado com o sangue de alguém com núcleo de mana seria mais eficaz. Mas, imagina se uma criança pudesse ter um núcleo de mana, isto não seria um grande tesouro?”
“…Cultistas demônios usam a energia negativa das pessoas para transformá-la em mana corrompida, por isso eles conseguem evoluir muito mais rápido que pessoas comuns que utilizam a mana natural. Com um método tão eficiente, porque precisariam de sangue de outras pessoas e de crianças?”
Diante da pergunta do prefeito, Ken fechou o livro, se virou para ele e respondeu.
“Porque embora os cultistas se consideram seres demoníacos, ainda não deixam de ser humanos. A mana corrompida pode elevar mais facilmente o poder de alguém, mas ela destrói a mente, e quanto mais você tiver mais de sua consciência você irá perder. Por isso eles criam os elixires, que os ajudam a manter a mana corrompida sob controle e ainda aumentam sua quantidade. Um dos outros efeitos colaterais ao possuir a mana corrompida é a falta de tato, assim, não conseguem sentir dor ou prazer carnal, a não ser que consumam um elixir. Eles são como parasitas que precisam se alimentar dos outros para viver.”
“…”
O prefeito, mais uma vez, ficou sem palavras.
“…Você parece saber bastante sobre eles. Além do mais, você diz que eles não parecem sentir dor, mas todos aqueles que você enfrentou sempre gritavam em horror.”
Disse ele finalmente, não aguentando a curiosidade que vinha crescendo desde cedo.
“…”
Ken não respondeu a nenhuma de suas curiosidades. Ele sabia muito sobre os cultistas demoníacos por causa das memórias dos antigos portadores do emblema amaldiçoado, e a razão dos cultistas estarem gritando de dor é por causa de sua habilidade anti-propriedade que parecia anular os efeitos colaterais da mana corrompida, causando-lhes assim dor ao serem atingidos.
Então, ao invés de responder, Ken simplesmente voltou a pousar o livro sobre a mesa e andou até a última porta. Pousando a mão sobre a porta, o empurrou, abrindo ela.
Do outro lado, um lugar ainda maior apareceu, parecendo ter cerca de cinquenta metros quadrados com um teto extremamente alto, e havia uma pequena escadaria que descia.
“…Sinceramente, como um lugar como este se encontra bem debaixo da cidade?…”
Perguntou o prefeito, ainda surpreso por existir um lugar tão extenso bem debaixo de sua cidade.
“Ora, ora, ora. Se não são uns visitantes inesperados.”
“!”
Foi então que uma voz familiar que surgiu do nada fez o prefeito dar um pulo de susto, rapidamente ficando em alerta.
“…”
Ken não demonstrou nenhuma reação, olhando especificamente para o final do local. O prefeito, vendo isso, seguiu seu olhar, e no momento seguinte seus olhos se arregalaram.
“Então você realmente estava envolvido com eles.”
Do outro lado, no final do espaço, também havia uma pequena escadaria onde uma pessoa se encontrava sentado e outro em pé de braços cruzados. Um deles era careca e com barba, usava um manto vermelho, seu rosto era coberto por uma tatuagem e em sua mão direita segurava uma garra maior que o braço.
O outro era maior e musculoso, barba cheia e não usava nada na parte superior do corpo, também usava uma capa vermelha como sangue, mas curta.
Mas, no final depois da escadaria, estava um homem que tanto Ken e o prefeito conheciam bem, seu cabelo era ruivo e segurava um martelo com o cabo maior que seu corpo.
“Você realmente me surpreendeu, nem um assassino foi o bastante para lidar com você.”
Disse ele, suas palavras sendo direcionadas para Ken enquanto falava com seus lábios se esticando em um largo sorriso.
A pessoa era o líder da guilda Martelo imortal.
Magnus.
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