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    A neve ficou mais densa à medida que adentravam o bosque. As estacas com tochas de plasma haviam ficado para trás, e agora o único brilho vinha do reflexo azulado que dançava entre as árvores congeladas. Troncos grossos, partidos ao meio por alguma força anterior, revelavam que ali também havia sido um campo de batalha recente. E, no entanto, era… silencioso demais.

    Dante mantinha o passo. A cada metro, a sensação de que os olhos de Dinastio não o deixavam aumentava. A caminhada se tornava um duelo de paciência — ele queria acreditar que Dinastio era apenas mais um aliado estranho, mas o frio não vinha só do ambiente. Vinha da presença do outro homem também.

    Foi então que Dinastio parou subitamente. Dante o imitou. O vento cessou por um instante, como se o bosque prendesse a respiração.

    — Você percebeu também, não é? — perguntou Dinastio, ainda olhando para a frente.

    — Percebi o quê?

    — Que eles não estão mais atacando. Os Felroz.

    Dante estreitou os olhos. Estava certo. Desde que passaram pela última árvore marcada, o som dos gritos havia cessado. Nenhum uivo. Nenhum estalo de osso. Nenhuma ameaça visível.

    — Nunca recebemos relatos de Felroz se agrupando — continuou Dinastio. — Sempre atacam sozinhos, feito animais selvagens. Mas agora… agora é como se estivessem nos vigiando.

    Dante olhou em volta. As árvores formavam corredores escuros, e entre os galhos havia vultos. Coisas rápidas. Invisíveis demais para o olho, mas presentes o suficiente para o instinto. Algo passou acima deles. Depois, à esquerda.

    — Eles nos cercaram — murmurou Dante, com a mão no cabo da espada.

    — Não sei se é isso… — Dinastio balançou a cabeça. — Não parece uma emboscada. Que merda, eles não disseram nada disso. É como se estivessem esperando…

    — Esperando o quê?

    — Se eu soubesse…

    A honestidade no tom de Dinastio era incomum. Ele parecia incomodado, não pela presença dos Felroz. Justamente porque não sabia o que esperar deles.

    — Os Saser me enviaram com mapas, com instruções — ele continuou. — Mas tudo que tínhamos era suposição. Disseram que havia uma energia que estava sendo emitida do norte, mas não aqui embaixo. Não tão perto das expedições.

    — E mesmo assim você veio — disse Dante.

    Dinastio riu sem humor.

    — Vieram outros antes. Muitos outros da minha família. E nenhum deles voltava inteiro. Sempre dessa maneira, sempre dessa forma.

    O silêncio se quebrou por um instante. O som de um graveto sendo pisado. Depois, nada. Um vazio tão absoluto que parecia que o mundo havia prendido a respiração.

    — Você sentiu isso? — murmurou Dante.

    — Como se tivesse algo… por baixo da terra? — respondeu Dinastio, os olhos arregalando-se levemente. — Sim.

    O chão tremia de forma quase imperceptível. Emanava um calor estranho, um calor azulado que se misturava à neve sem derretê-la. Como se aquele bosque estivesse em guerra com as próprias leis da natureza.

    — Estou tentando filtrar o que vem da terra — disse Dante. — Mas não consigo.

    — Merda, parece que é outra coisa.

    Não era só por estar vivo, mas sim porque a mesma sensação de antes, Dante sentia agora. Os olhos enxergando, esperando, simplesmente querendo avançar, mas se segurando. Existia um motivo, algo que os travava, os Felroz poderiam ser idiotas, mas ele tinha visto alguns mutantes.

    Em Kappz, quando ficaram cara a cara contra ele, quando perderam sua vontade de lutar ou viram que não tinha mais como vencer, queriam recuar. Talvez…

    Sim, os Felroz sentem o cheiro dos humanos com mais intensidade quando sentem coragem ou medo. Eu tenho armazenado no banco de dados vindo de Render.” — Vick soou com cautela. — “Também tenho cadastrado que nenhum Felroz evoluiu rápido para se comunicar dessa forma e não avançar. Os únicos registros vem de Kappz, do Farol”.

    Moonlich. Dante não tinha como simplesmente esquecer daquele que o tirou de onde desejava estar. A cidade onde poderia passar uma vida inteira procurando as respostas, mas agora jogado contra uma infinidade de problemas.

    Era ele quem tinha… lhe tirado o desejo de permanecer com… Clara.

    — Precisamos voltar — afirmou para Dinastio na mesma hora com força. — Temos que voltar agora.

    O homem virou para ele. Assim que o fez, ao abrir a boca, um vulto surgiu praticamente atrás de sua cabeça. Dante reagiu na mesma hora. Esticou o braço velozmente, quase duas vezes mais rápido do que da última vez que lutou, e seu punho passou ao lado do rosto de Dinastio.

    Seu punho chocou-se contra uma muralha de carne e ossos. O impacto fez com que Dinastio saltasse para atrás de Dante. E ele pôde observar a criatura coberta de neve, cheia de ossos expostos, e um olhar fumegante. As cinzas saíam de sua boca em procura de comida, mas sua atenção não se perdeu.

    Os olhos da criatura foram para seu punho imenso que foi parado por um Humano. Dante fez o mesmo. Os dois impressionados, mas não pelos mesmos motivos. Dante encarou a criatura, sorrindo agora.

    Impacto e dano aumentaram em 50%, como instruído. No entanto, a força dos golpes referente a Conversão Cinética também aumentaram. O limite corporal em grau menor possui mais intensidade e potência.”

    O impacto do soco fez a criatura recuar dois passos, mas não caiu. Seu corpo era feito de músculos deformados e ossos externos reforçados como placas de armadura. A pele pálida se rompia em rachaduras por onde cinzas escapavam, serpenteando no ar frio.

    Em cima das árvores, sombras se agitaram. Vultos. Felroz escondidos, centenas talvez, observando. Vibrando sem som. Pacientemente, esperavam pelo desfecho, vibrando e querendo que a luta continuasse a acontecer.

    Dante deslizou um pé para trás e assumiu postura de guarda. A criatura emitiu um rugido surdo, vibrando mais como uma reverberação de dor do que raiva.

    — Vick, marque todos os movimentos dela. Não quero desperdiçar energia — sussurrou ele.

    Entendido. Modo de combate assistido iniciado. Padrões irregulares. Probabilidade de investida lateral: 78%.”

    A criatura avançou.

    Dante se abaixou no último instante, girando o corpo. Sentiu o vento cortando quando uma garra passou onde seu rosto estivera segundos antes. Aproveitou o desequilíbrio do monstro e impulsionou-se com os calcanhares. Saltou como uma flecha e desferiu um gancho direto na costela exposta.

    O estalo foi seco. Fragmentos de osso voaram, misturando-se à neve que rodopiava ao redor.

    O Felroz tropeçou para o lado, mas girou com a cauda, uma massa óssea, nodosa, como uma corrente de espinhos, tentando atingir Dante pelas costas.

    Cuidado!” — alertou Vick.

    Ele saltou no ar, torcendo o corpo, e caiu de cócoras sobre um tronco tombado. O impacto da cauda acertou uma árvore próxima, que explodiu em estilhaços congelados.

    Os dois ficaram fitando um ao outro por alguns segundos. Dante sorrindo. A passada, a velocidade, o movimento do corpo e também sua força, seu olho direito agora era da Vick. Ele calibrava para que enxergasse além do que estava acostumado.

    O destino lhe tirou a habilidade e sua capacidade de ir além, então, faria de tudo para continuar caminhando. Nem que isso fosse aceitar a ajuda de Vick.

    Dinastio observava da margem da clareira. Respirava rápido. Nunca tinha visto um humano reagir tão rápido, muito menos bater de frente com um Felroz e fazê-lo hesitar. Ao seu redor, o bosque vibrava de modo estranho.

    Os galhos se curvavam, querendo observar mais a luta que ocorria diante deles. O breve urro vindo do alto simplesmente deixada Dinastio sem entender o que acontecia para que eles não atacassem juntos, como fizeram antes.

    — Eles estão… torcendo — murmurou ele. — Estão esperando o resultado.

    Dante partiu novamente.

    Avançou com passadas longas, o peso do corpo projetado para o ataque. Disparou uma sequência de jabs rápidos para o rosto da criatura, forçando-a a recuar. Um direto entrou no queixo. Outro na têmpora. E quando a criatura tentou responder, Dante já estava em outro ângulo.

    O ritmo desenfreado explodiu por alto. O ar contorceu depois de cada golpe. O Felroz era enviado para trás, arrastando sua imensa pata contra a neve, torcendo para a direita. E Dante não parou em nenhum momento.

    Quanto mais se movia, mais rápido se tornava, mais forte ficava. O acúmulo de Energia já estava criando uma estranha aura ao redor de seu braço. Ele saltou por cima do ataque desornado da criatura, um movimento desesperado.

    E ele usou a explosão do ar em sua perna para descer girando e acertar uma joelhada bem no meio do rosto dele.

    — Você não está conseguindo mais me acompanhar, desgraçado?

    O ritmo do inimigo está desestabilizado. Sugiro aproveitamento para execução de técnica cinética de nível médio,” sugeriu Vick. Dante achou que ela estava um pouco… empolgada demais.

    Assim como ele, animado demais!

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