Índice de Capítulo

    “Alguma vez em vossa vida, mesmo que somente uma única vez, já experienciaram serem tão bons em algo, tão monstruosamente talentosos, que seus mestres sentiram medo e repulsa de vós?

    Se nunca sentiram isso, provavelmente nunca entenderão o coração de Ereken Zwaarkind.”

    Izandi, a Oniromante

    Fezes, das mais fétidas e acres que já sentira.

    O fedor foi tamanho que quase quis vomitar, empalidecido e de cenho franzido. “Como alguém vive nesse odor?!”

    Sua barriga estremeceu e sua garganta começou a fechar. Ereken balançou a cabeça.

    E nesse balançar, viu um gorro atirado ao chão, próximo do turíbulo fétido. Um gorro roxo, cujos bons olhos de caçador viam uma pequena placa de ferro. Ele se aproximou com a leveza de um gato, segurando o cabo de uma adaga longa na mão, não dando suas costas para as tendas por mais que um segundo — com os pelos saltando e lábios trincados…Agarrou o gorro de lã, e logo um cheiro floral chegou ao seu nariz.

    “Tinta?”

    Cerrou os lábios com mais força.

    No segundo seguinte, Ereken deu um sinal para trás e seguiu sua marcha para detrás da árvore perene e de tronco oleoso. …E ali, encostada à árvore que parecia ter crescido torta apenas para observar o sofrimento alheio, estava Thirtu.

    Amarrada como uma presa qualquer, com as mãos e tornozelos presos com tiras de couro basto e a pele cada vez mais próxima da cor dos seus cabelos. Os cabelos desgrenhados, o rosto sem cor, as pálpebras trêmulas… Respirava com um tremelique dos dentes quase imperceptível, como uma fogueira prestes a apagar.

    Ereken parou — por um instante apenas. Algo dentro dele rangeu. Não como espada contra armadura. Mas como os ossos de um pai que vê a filha sendo puxada para um abismo.

    O que poderia lhe garantir que sua família não estivesse assim também?

    LIRTUISE! CHYESSET-DET! — Mas Ereken não se importou de imediato com o grito. Ele se aproximou com um silêncio tão profundo que os flocos de neve pareceram hesitar antes de cair sobre seu ombro. Sem dizer palavra, ajoelhou-se e soltou-lhe os braços. Por um instante, os olhos castanhos da garota se abriram e caíram sobre o homem.

    Ereken cobriu-a com seu manto, então virou seu corpo bem a tempo do ferro frio da espada cortar somente o ar. Num movimento felino, jogou-se para esquerda e puxou sua espada, mantendo-a inclinada para o oponente. Era um homem alto, de queixo angular, coberto por uma túnica cinzenta com fedor de fezes impregnado, e sua espada era um rústico pedaço de metal.

    Os dois se moveram.

    Ereken deu um longo passo à frente, batendo a ponta da sua espada diagonalmente contra o sulco da espada do oponente. O arranhão ruiu alto quando os dois se separaram, mas o castanho foi mais rápido: com um passo forte, avançou com um corte diagonal no quadril. Houve resistência por um instante antes de que o osso fosse cortado.

    E então um longo corte abriu-o até o coração, e sua metade despencou num baque abafado cheio de granidos de dor. Ereken não o finalizou — havia outros grasnados metros à frente. Cei Mauric Hoone tinha sua espada coberta por calor enquanto se digladiava com um homem com peso para três, vestido na mesma túnica. Ceire Joran Cyrekc acertara uma flecha no peito de outro, mas Ereken logo fez as contas.

    Deveria bem ter uns quatro homens para cada um do grupo de soldados, e nenhum deles pareceu querer conversar.

    Bombeando ahvit para fora do seu corpo, tocou o peito quase frio de Thirtu, fazendo a fricção da névoa alaranjada arder no seu peito. No segundo seguinte, agarrou-a entre o braço e o antebraço, cerrou os dentes e avançou.

    O primeiro que correu em sua direção recebeu uma lâmina atravessada na garganta. A garganta era grossa, musculosa, mas a espada de Ereken entrou nela como se entrasse na água. Um fôlego de sangue quente respingou contra a barba do guerreiro, e ele o ignorou.

    Um segundo inimigo gritou e avançou com uma clava de pedra. Ereken não desviou. Fez um giro, ergueu a lâmina e fê-la incandescer como se dentro do metal houvesse uma chama alaranjada. A clava passou raspando pelo joelho da garota, e caiu no chão quando o braço fora descepado do corpo. O grito de dor do homem foi tão alto que poderia acordar qualquer coisa nas montanhas, e Ereken logo o decapitou rapidamente.

    Testemunhou Cei Mauric esmagar o queixo do homem com o pomo da espada. O som foi seco, seguido de um urro trêmulo. Ereken forçou mais calor no corpo da garota, então, com um golpe lateral, disparou para a direção de um desavisado. Cortou-lhe a barriga até os rins, e o homem caiu sem compreender o que havia acontecido, agarrado nas entranhas.

    No mesmo momento, uma flecha atravessou ambos os calcanhares de um fujão, e um soldado foi atravessado por uma espada. Mais e mais dos de túnica saíam das tendas, como se estivessem nascendo do chão. Um homem, talvez o líder do grupo, gritou palavras de reunião. Os homens mais próximos montaram numa composição em quase quadrada.

    Não! — gritou, e um deles disparou com uma besta requintada a flecha que furou o crânio de um soldado.

    Você poderia tê-la parado, ressoou dentro de Ereken. Ele estremeceu, pôs ainda mais ahvit no corpo de Thirtu e disparou contra a formação. Doze homens se circundavam, preparados para ele. Thirtu gemeu quase muda, mas fora o suficiente para que apertasse o punho da espada com mais força. Outro dos seus morreu mesmo assim, vingado pelo Ceire… mas morto.

    Não aprende nunca?

    Ereken empurrou a garota para seu peito. ajustou a postura. Dobrou os joelhos, firmou os pés na neve, e levou a espada à diagonal para trás, e sentiu sua mão esquerda ser domada pela letargia — e suas costas, pelo frio. O cansaço, a ferrugem, tocou nos seus músculos quando disparou contra a formação.

    Três homens o receberam: um lanceiro, um com um machado e um com uma espada longa. Ereken não se deixou abalar enquanto seu sangue fervia pela cadência da batalha. Com um movimento diagonal, interceptou a lança; girou seu seu corpo pela direita, deixando suas costas para o lanceiro, para desviar da espada.

    Num movimento felino, resvalou o cabo metálico da lança — jogando-a para longe. Moveu a lâmina em um semicírculo descendente, com tanto ímpeto que esfaqueou a neve e empurrou-a nos olhos do com o machado.

    — Gh! — ele fez. Ereken chutou o joelho do espadachim e atirou-se para o lado esquerdo, usando do impeto do movimento para esfaquear a garganta do lanceiro. Ficou seus pés no chão e girou para a direção oposta, bloqueando a espada que descia!

    O clangor do metal fez ressoar por seu braço, e no instante que Ereken fortaleceu a espada com mais ahvit, recebeu um chute na barriga e uma bordoada na cabeça. O pomo do machado atingiu seu escalpo com força para que seu mundo estremecesse, e a lâmina não parou de descer por sua carne, vertendo sangue dolorosamente.

    O espadachim fez o aço silvar contra o pescoço protegido pela gorjeira.

    Thirtu gemeu, seus olhos bem abertos e quase sem brilho…

    Uma onda laranja permeou a espada de Ereken. Sangue fugiu de sua bochecha, e mesmo assim ele realizou um ataque amplo pela horizontal. O do machado saltou a tempo, todavia a finta parou — e num átimo de segundo, Ereken mudou a pegada de sua espada, esfaqueando o cotovelo do espadachim.

    Um grito de dor ecoou pela floresta, e o momento de dor fora suficiente para o Mestre de Armas se erguesse, soltasse sua espada e cortasse a garganta do espadachim com a adaga.

    No outro segundo, a disparou contra o do machado, que bloqueou por pouco.

    Mas fora o suficiente para Ereken atingi-lo com um chute no joelho, o destroçando sonoramente. Crack!, ecoou, junto do grito de um grito animalesco. Aproveitando do clarão de dor, agarrou o machado do homem e bateu a lâmina contra o crânio do dono, atravessando-o de ponta a ponta.

    A energia alaranjada subiu pelo seu braço como lava viva. Ereken ergueu-se de novo, e quando correu, a neve sob seus pés derreteu com o calor do próprio corpo.

    Ele atravessou o resto da formação como um raio.

    Um, dois, três — golpes em linha, cada qual um corte fatal mais rápido do que poderiam se dar conta. Um dos homens tentou girar uma corrente contra ele, mas Ereken passou por dentro do arco, cortando-lhe a axila e a virilha com um só movimento. Outro o atacou pelas costas — Ereken recuou meio passo e girou a espada por trás do ombro, decapitando o desavisado. Sangue quente jorrou em suas costas.

    Um dos últimos tentou correr. Ereken não o perseguiu — Ceire Joran já preparava sua flecha, e antes que o homem pudesse dar o segundo passo, foi pregado ao tronco de uma árvore pelo quadril, gritando em agonia.

    Ahh… Está… vindo… — gemeu Thirtu, e no instante seguinte, fora como se o solo tivesse dado à luz a uma nova montanha, feita da mais pura neve negra.

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