Capítulo 91 - O retorno dos guerreiros
Brok deixa as dependências da tribo para trás e caminha pela floresta nos arredores. Ele anda com cautela entre os tocos de árvores cortadas e os buracos cheios de raízes secas. Poucas árvores ainda permanecem de pé nesse terreno parcialmente acidentado.
A mata está calma, com o sol da manhã iluminando as árvores e os sons dos animais ao longe, ecoando misturados ao farfalhar natural das folhas.
Apesar da calmaria, o orc segue ainda jogando olhares eventuais para trás, certificando-se de que ninguém o segue.
Ele para diante de uma árvore alta, localizada a dezenas de metros das barreiras altas que cercam o acampamento de Estoratora.
Brok encara a base do tronco, marcada com um entalhe recente, de onde ainda vaza seiva. Era essa, ele confirma, desviando o olhar para cima.
No topo dela, onde os galhos, apesar de curtos, seguem grossos como raízes, não há nada que a diferencie das outras árvores próximas, além de ser alguns metros mais alta.
Ele ainda não voltou, ele pensa. É… melhor esperar.
Brok finca seu machado no chão e senta ao lado dele com as pernas estiradas, de frente para a árvore. Seus músculos relaxam e pela boca ele espira um ar ruidoso que reflete seu cansaço.
Nesse momento de calmaria, em que não há ninguém almejando sua cabeça, ele percebe a dor dos ferimentos latejando cada vez menos.
Com um olhar rápido pelas fendas em sua armadura de couro, ele vê seus machucados consideravelmente menores, com a carne ao redor inteira e sem marcas de cicatrizes.
Estão se curando sozinhas. Magia é… impressionante, ele pensa, fascinado.
Alguns minutos se passam e nada na floresta chama a atenção de Brok, até o momento em que um ruído cintilante vindo de cima ecoa em seus ouvidos.
Quando o orc olha naquela direção, vê um círculo vermelho surgindo na copa da árvore. Nele há o desenho de um pentagrama circundado por um anel com runas escritas.
A magia atiça Brok e ele se levanta em guarda, instintivamente sacando seu machado do chão. Será que é ele?, o orc se questiona.
Uma energia rubra e densa escapa do círculo como uma nuvem. Ela começa a tomar a forma de uma criatura humanoide, de pé sobre um dos galhos. A silhueta se solidifica aos poucos, perde o brilho e assume outras cores.
Após alguns segundos, o círculo desaparece e aquela nuvem mágica se transforma em Byron.
Assim que emerge, o demônio ajusta suas roupas escuras com um gesto automático e elegante, enquanto o vento agita suavemente os tecidos. Ele faz isso olhando para as paredes de madeira do acampamento ao sul, como se não notasse a presença do orc logo abaixo.
“Hey!”, grita Brok. “Aqui embaixo.”
O orc chama a atenção do diabo, que sorri discretamente ao ver o guerreiro no solo.
Byron desce pulando de galho em galho. A cada aterrissagem, os galhos rangem e o tronco estala, prestes a ceder. A árvore inteira balança sob seu peso, mas o demônio segue impassível, firme como granito.
Ao chegar ao chão, seu pouso pesado levanta um pouco de terra e emite um som abafado. Byron corre o olhar pelo corpo do guerreiro, examinando-o. “Vejo que voltou vivo e quase inteiro”, ele comenta. “Parabéns, campeão.” A voz leve do demônio exala bom humor e tranquilidade.
Brok desvia o olhar levemente para sua arma que ainda está manchada pelo sangue de seu inimigo e na lâmina vê seu próprio reflexo, com arranhões e feridas.
“Foi difícil, mas eu… consegui”, diz Brok.
“A senhorita lhe manda os parabéns. Nosso êxito nessa empreitada não seria possível sem a sua colaboração.”
“Então vocês…”
“Sim”, diz Byron, antes mesmo do orc completar a frase. “Naganadeliumos, o dragão, morreu.”
Brok sorri, contente com aquela afirmação, mas em seguida curva as sobrancelhas, estranhando algo naquelas palavras. “Naga… na… o quê? Esse era o nome dele?”
“Ah, certo”, comenta o demônio ao perceber a confusão do guerreiro. “De fato, vejo que o nome não era conhecido entre os habitantes da floresta.”
“Não… só o conhecemos por Lorde das Terras-Livres ou por… dragão mesmo.”
“É, mas agora, creio que esse título irá pertencer a você, já que a nossa lorde não pretende usufruí-lo.”
Por um instante, o olhar do orc fica cabisbaixo, com um sentimento agridoce resvalando no fundo da garganta. Ninguém… vai saber da conquista dela, ele pensa.
“Por falar nisso…” Continua o demônio. “Deu as devidas ordens à tribo do falecido Estoratora?”
“Sim. Eles vão continuar segurando as garras-brancas por aqui.”
“Excelente. Isso nos dará alguma paz enquanto operamos, ao menos por enquanto.”
“Mas… talvez essa paz não seja tanta. Os guerreiros de Estoratora ficaram bem furiosos”, o orc pontua. “Eles não costumam ficar quietos por muito tempo. Em breve… devem pedir por mais duelos. Devo evitar isso?”
“Hum”, murmura Byron, franzindo a boca, brevemente incomodado. “Quanto a isso, não há muito o que fazer. Para manter a sua posição, uma base sólida deve ser construída. Aceite os duelos que aparecerem, não deve haver algum orc mais forte que Estoratora por enquanto.”
“Certo”, ele responde, firme.
“Mas faça de maneira brutal”, Byron acrescenta. “Mate os desafiantes de maneira que desencoraje outros a tentar. Assim, economizamos tempo e aquela tribo não vai perder muitos guerreiros. Até nos estabelecermos, será bom pouparmos qualquer recurso.”
Brok contrai os dedos com força. “Brutal… entendido”, ele comenta, assertivo.
O diabo se vira para o leste e diz, “Vamos. Temos um longo caminho pela frente.” Ele começa a andar e Brok logo o segue.
“E… qual a próxima parte?”, o orc questiona, posicionando-se ao lado de Byron.
“Nós vamos até Cahjia. Nossa lorde quer elaborar nossos próximos passos lá mesmo.”
Brok grunhe pelas narinas em sinal de aprovação.
Os dois seguem calados por alguns passos, até o orc romper o silêncio. “E… como foi a batalha?”, ele pergunta, começando um novo assunto.
Byron sorri largamente com seus olhos brilhando empolgados ao lembrar-se da luta. “Foi incrível”, ele responde. “Uma batalha de proporções épicas.”
“Ela… a lorde… como é vê-la lutando?”, Brok questiona, intrigado.
“Perante aquele nível de magia, me senti um escudeiro acompanhando um cavaleiro em batalha”, comenta o diabo, até um pouco eufórico.
“Humm”, murmura o orc, impressionado.
“Como ainda temos um longo caminho até nosso destino, vou lhe contar em detalhes.”
Byron ajusta a gola da camisa e começa a narrar com naturalidade, como se estivesse descrevendo uma pintura, enquanto Brok ouve tudo em silêncio, atento. A floresta, antes cheia de ruídos, parece parar para escutar também.
E assim, entre sombras e murmúrios, os dois desaparecem na penumbra da floresta.
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