Índice de Capítulo

    Slaaap!

    A cama tremeu com um estalo tão brutal que era difícil acreditar que aquilo havia vindo de um simples tapa. O golpe pesado, carregado com todas as emoções de Eugene, arrancou Eward da névoa de álcool e drogas que turvava sua mente.

    Aaargh! — Eward gritou.

    Apesar de ter acordado, ele ainda não compreendia a situação. Primeiro levou as mãos à bochecha dolorida, mas logo Eugene empurrou suas mãos para o lado.

    — Já voltou à consciência? — Eugene perguntou, antes de dar outro tapa em Eward.

    Embora fosse chamado de tapa, seria mais justo dizer que foi uma agressão em cheio. O golpe foi tão forte que as pernas da cama cederam, e Eward caiu para trás, com as pernas para o alto.

    Aaargh! — gritou de novo.

    Tsc, irmãozão… — Eugene suspirou.

    Ele ergueu as mãos para dar outro golpe, mas Eward, dessa vez, conseguiu reagir a tempo e cobriu a cabeça com os braços.

    Eward só tinha levado dois tapas, mas lágrimas grossas já escorriam de seu rosto. Considerando que o interior de suas bochechas havia sido rasgado, enchendo a boca de sangue, e que seus dentes certamente estavam soltos, não era surpresa que estivesse com muita dor.

    Mas chorar por causa disso? Ele não era apenas um rapaz de dezenove anos qualquer. Era o primogênito da linha direta da família Lionheart, descendente de Vermouth! E estava chorando só por levar dois tapas no rosto? As lágrimas de Eward não serviram para acalmar a raiva de Eugene, pelo contrário, só a fizeram crescer ainda mais.

    — Você acha mesmo que merece alguma compaixão? — Eugene zombou.

    Desorientado, Eward balbuciou:

    — Q-Qu-Quem é você? Por que eu tô…? O q-que é esse lugar?

    — Está fingindo ou realmente não sabe o que está acontecendo? A segunda opção é bem possível, considerando que você tomou drogas depois de já estar bêbado. Indo tão longe assim, não seria surpresa se nem reconhecesse os próprios pais — disse Eugene, com voz calma, enquanto estendia a mão.

    Eward estremeceu e se encolheu. Agarrando os lençóis manchados de sangue, puxou-os sobre a cabeça, uma cena absurda e patética.

    Eugene respirou fundo para se acalmar e continuou:

    — …É por isso que você precisa voltar à realidade primeiro. Agora, vira o outro lado do rosto pra mim.

    — Que-quem  diabos é você? — Eward repetiu, apavorado.

    Tsc… Você tá mesmo fora de si. Ainda não me reconheceu? Fazer o quê. Parece que vou ter que continuar batendo. Se você ainda não voltou à consciência, é sinal de que ainda não sentiu dor o bastante. Se eu te bater mais umas vezes, vai ter que acordar mesmo que não queira.

    — P-p-por favor, para! Não me bate…

    — Primeiro, tira esse cobertor da cara. Não tenta bloquear. Se tentar bloquear à toa, posso acabar acertando outro lugar por engano — e aí vai ser bem pior pra você.

    Apesar do aviso, Eugene não esperou que Eward se movesse por conta própria. Puxou o cobertor e afastou as mãos que cobriam a cabeça do rapaz.

    O lado do rosto que já tinha levado dois tapas estava inchado, com sangue escorrendo dos lábios rachados. Eugene agarrou o nariz de Eward e virou sua cabeça para o outro lado.

    Aaaaaargh!

    Ignorando os gritos, Eugene deu mais dois tapas no lado restante, igualando os dois lados do rosto. Em seguida, segurou a cabeça de Eward com ambas as mãos e o manteve firme.

    — E agora, voltou à consciência?

    Uuu… Uwaahh… — Eward só conseguia soluçar.

    — Ah, desculpa — Eugene disse, como se só então percebesse algo. — Talvez você não esteja me reconhecendo por causa da aparência alterada.

    Na mesma hora, Eugene desfez o feitiço de transformação e voltou ao seu rosto original. Os olhos de Eward enfim se arregalaram em reconhecimento. Cheios de lágrimas, vacilaram desesperadamente em busca de ajuda enquanto ele gaguejava:

    — Eu-Eu-Eugene…

    — E aí, irmãozão — Eugene cumprimentou com casualidade.

    — Você… o-o que você tá fazendo aqui?

    — Eu te segui até aqui, irmãozão.

    No fundo, Eugene queria muito mais era xingar Eward, mas por ora decidiu manter o tom fraternal.

    — Em que diabos você estava pensando? — ele perguntou.

    — …Hã… o quê…? — Eward murmurou, confuso.

    — Eu tô perguntando: o que você tinha na cabeça, irmãozão? Olha, eu até tentei entender sua situação, sei que você tá sob muita pressão, sabe? Já que a sua realidade fede como merda, até entendo querer brincar nos sonhos doces de uma súcubo.

    — Eu… eu só…

    — Achei patético e idiota da sua parte, mas não é como se eu não entendesse os motivos. E a força vital que você ofereceu à súcubo era sua, né, irmãozão? Então era sua escolha fugir da realidade e se satisfazer com sonhos. Mas isso aqui… isso aqui já passou dos limites.

    Grind.

    Eugene apertou as têmporas de Eward com as duas mãos. A pressão, como um torno, deixou os olhos de Eward vermelhos e cheios de veias. Ele tentou se contorcer para escapar, mas Eugene não o soltou.

    — Você não tem permissão pra se envolver com magia negra — Eugene declarou solenemente, mantendo a pressão.

    Aaah… Ughhh… — gemeu Eward.

    — Como o filho mais velho da linha direta dos Lionheart, o homem destinado a se tornar o próximo Patriarca… como você pôde tentar firmar um contrato com um demonídeo? E justo com um íncubo?

    — E-eu… eu só… não consegui evitar…

    — O que você quer dizer com ‘não conseguiu evitar’, seu maluco?! — Eugene rugiu de repente. — Você sabe o que acontece quando alguém entra na magia negra por meio de contrato, em vez de aprender a usá-la do jeito certo? Sua alma vira propriedade do demonídeo. Você se torna um escravo que mata quando mandam matar e morre quando mandam morrer.

    Existiam dois métodos para começar a estudar magia negra.

    Um deles era aprender aos poucos a controlar o poder demoníaco. No entanto, esse não era um caminho acessível para qualquer um. A menos que fosse um mago verdadeiramente excepcional, não conseguiria controlar esse tipo de energia por conta própria.

    Por isso, a maioria dos magos negros recorria ao outro método: firmar um contrato com um demonídeo. Mesmo sem muita habilidade, ainda assim era possível estabelecer um contrato, e mesmo sem conseguir controlar o poder demoníaco por si só, poderia receber esse poder diretamente do demonídeo contratado.

    A maioria dos magos negros aumentava sua força com o poder demoníaco que recebia de seu contratante. Assim, mesmo com talentos miseráveis, conseguiam evoluir rapidamente, mas por mais fortes que se tornassem, jamais escapariam de seus vínculos com os demonídeos.

    Eugene disparou uma enxurrada de perguntas:

    — Você acha mesmo que isso é um problema que afeta só você? Você entende de verdade o que acontece quando se torna um mago negro?

    — Vamos ver… a primeira coisa a ir pro lixo por sua causa seria a honra da família. Mas isso seria só o começo. E se o demonídeo com quem você contratou mandasse você matar sua mãe? Depois seu pai. E, por fim, seus irmãos. O que você faria se ele exigisse que entregasse a Fórmula da Chama Branca da família principal e todos os tesouros do cofre?

    — E-Ele disse que eu não teria que obedecer incondicionalmente — Eward protestou, fazendo uma careta. — Ele disse que me trataria com consideração…! Que não me daria ordens impossíveis ou irracionais… F-Foi o que ele prometeu.

    — Quem prometeu isso? — Eugene zombou. — Foi aquele maldito íncubo? Seu idiota, acha mesmo que demonídeos são como dragões ou elfos? Que cumprem palavra? Pra eles, quebrar uma promessa é mais fácil que estalar os dedos.

    — M-mas… nosso ancestral e os Reis Demônios…

    — Aquele juramento foi feito com um Rei Demônio, porra! Você acha que uma promessa feita com um íncubo de quinta vai ter o mesmo peso?! — Eugene gritou, apertando ainda mais a cabeça de Eward em vez de soltá-la. — ‘Você não vai precisar obedecer incondicionalmente’? Isso mesmo, não vai. Você pode se recusar a obedecer — desde que esteja preparado pra morrer. Mas e você? Tem coragem pra isso? Conseguiria desobedecer mesmo sabendo que morreria por causa disso?

    — … — Eward ficou sem palavras.

    — Como se você fosse capaz de algo assim — Eugene zombou. — Você é só um covarde que não consegue nem se proteger e foge da realidade se afundando em álcool e sonhos.

    — V-Você… — As lágrimas escorriam quando Eward encontrou um pouco de força na voz. — Você… quem diabos te deu o direito de me julgar?

    — Hah, tudo bem então — Eugene bufou e assentiu como em desafio. — Acha que tem algo errado no que eu disse? Então por que não tenta se justificar, irmãozão?

    — Você… você não sabe de nada. Você…! Desde quatro anos atrás, todo mundo só presta atenção em você. Desde que foi adotado pela família principal, o pa… o pa… o Patriarca não para de te encher de apoio, então como você pode…?!

    — Se alguém mais te ouvisse agora, poderia até achar que você sofre discriminação. Mas você também recebeu muito apoio, não foi, irmãozão? Não te deixaram acessar a linha ley? Você também herdou a Fórmula da Chama Branca, não herdou? E porque queria aprender magia, te mandaram pra Aroth, e ainda te deram a chance de se tornar discípulo de um Mestre da Torre. Estou errado?

    — Isso…

    — Eu recebi o mesmo apoio que você, irmãozão. Não sou assim porque o Patriarca me favoreceu mais do que a você. É só que eu nasci incrível.

    Essas palavras fizeram os ombros de Eward tremerem de raiva.

    Eugene continuou:

    — E além de ter nascido com talento, também me esforcei muito pra ficar assim. Aposto que trabalhei bem mais duro que você, né, irmãozão?

    — Só porque… você nasceu talentoso… não tem como eu me comparar com você…! — Eward espremeu as palavras, amargas.

    — Então por isso resolveu recorrer à magia negra? — Eugene retrucou. — Por isso quis assinar contrato com um íncubo, manchar o nome da sua família e jogar tudo fora? E até onde você acha que conseguiria chegar com isso?

    Eugene soltou a cabeça de Eward. Levantou o dedo para chamar sua atenção e apontou para o mago negro ajoelhado ao lado deles.

    — Mesmo de olhos fechados, eu ainda mataria um desgraçado desses em menos de dez segundos — Eugene declarou com confiança.

    — … — Eward mordeu o lábio em silêncio.

    — Com a ajuda da magia negra, é esse o nível que você alcançaria. Você achou mesmo que o poder que conseguiria ao assinar um contrato com um íncubo seria algo incrível? Ah, certo. Talvez estivesse esperando usá-lo como intermediário pra conseguir um contrato com a Rainha dos Demônios da Noite. Era isso, irmãozão?

    As bochechas de Eward tremeram quando ele rangeu os dentes. Acertou em cheio. Eugene bufou e balançou a cabeça.

    Um pequeno gesto, um grande impacto!

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