Capítulo 27 - Crim|Parte 2
A manhã começou em silêncio. Nenhum pássaro cantava, e até o vento parecia respeitar a solidão de Jaro.
— Talvez por eu nunca ter estado em uma floresta tão fechada, que ela parece tão assustadora…
Jaro, antes de se tornar milionário, era alguém tão pobre que acampava em florestas próximas à cidade. Por causa disso, desenvolveu um espírito de sobrevivência e experiência em acampamentos. Se não fosse por isso, ele provavelmente estaria inseguro agora.
Carregando uma mochila de pano nas costas, ele dava os primeiros passos em direção ao vilarejo, seguindo por dentro da floresta, sem uma estrada que o guiasse. As árvores e plantas altas faziam sombra, e Jaro caminhava atento ao caminho e a qualquer barulho suspeito.
Às 11 da manhã, ele encontrou um riacho. A água era cristalina e gelada. O garoto não resistiu, bebeu direto com as mãos e também lavou o rosto.
— Sorte achar esse riacho. Acho que Já se foram umas sete horas…
O jovem, então, decidiu montar seu acampamento a alguns metros do riacho, o suficiente para ainda conseguir vê-lo. Isso porque ele sabia, por experiência própria, que existe o risco de enchente, mesmo que não esteja chovendo no local.
Além disso, água costuma atrair animais, o que pode ser incômodo ou até perigoso. Ao mesmo tempo, também seria o meio dele conseguir mais proteína pro segundo dia.
À tarde, ele aproveitou parte do tempo para se exercitar e treinar, seguindo os ensinamentos que Lila lhe passou anteriormente. E finalmente o pôr do sol deu as caras e o jovem acendeu uma fogueira pequena, só o bastante para aquecer um pouco de carne
seca e iluminar o entorno. Sentado sobre uma pedra, o garoto ficou observando as chamas e seus pensamentos voaram, até que, sem perceber, ele caiu no sono.
Crac! Crac! Crac!
Jaro acordou subitamente. Galhos se quebravam, e diversos barulhos de passos vinham do mato. Em um gole ele bebeu sua poção de visão noturna e rapidamente subiu numa árvore para identificar a ameaça. Era uma alcateia de aproximadamente vinte lobos, a aparência deles era majestosa. Eles tinham pelos negros, olhos amarelos, pelagem grossa, e eram enormes. Tendo um metro e oitenta centímetros, andando em quatro patas.
— Eles devem ter sentido o cheiro da comida… e não parecem ser lobos normais. Provavelmente vão me achar logo. — Um leve sorriso se abriu no rosto do menino. — Mas, estou preparado gatinhos.
Ele sabia que o cheiro da refeição podia atrair predadores. Por isso, depois de comer, passou quase a noite toda armando várias armadilhas: buracos camuflados com estacas de madeira pontiaguda, ao redor do acampamento e perto do riacho.
Em poucos segundos, ele começou a escutar alguns choros e o barulho nojento de carne sendo perfurada.
— Funcionou melhor do que eu esperava… mas só pegou cinco. Esses bichos são espertos.
Após a morte de seus companheiros, os lobos ficaram em alerta. Seus instintos indicavam que um inimigo estava por perto, e com seu olfato apurado, começaram a se aproximar do garoto. O jovem, esperou o momento em que alguns desviassem das armadilhas, pulando ou contornando os buracos.
Um deles pulou uma armadilha, e prontamente Jaro lançou uma adaga em alta velocidade na direção da cabeça do lobo, que morreu instantaneamente. Outros quatro fizeram o mesmo e foram mortos pelo jovem.
Com metade da matilha no chão, os lobos entenderam o risco. Pararam de caçar sozinhos e decidiram esperar o inimigo aparecer.
Percebendo que os lobos não iriam mais se arriscar, o garoto saiu das sombras e parou a uma boa distância da alcateia.
Ao perceberem que o inimigo era uma criança humana, os lobos se animaram. Achavam que seria uma presa fácil.
Três deles uivaram e partiram pra cima. O primeiro lobo, o do meio, chegou mais rápido e pulou pra cima do garoto ferozmente, com sua grande boca tentando esmagar seu crânio.
Nesse momento, as palavras de Lila passaram pela a mente do jovem: Respire… inspire e mate!
Fwish!
O garoto sacou a espada e em um golpe certeiro, cortou o lobo ao meio. Sangue jorrou para todos os lados, inclusive sobre ele e sobre seu olho esquerdo o tampando. Mesmo assim, não se desesperou. Ainda havia dois lobos.
O da esquerda já estava a centímetros dele e tentou mordê-lo. Jaro, com um corte horizontal, cortou a boca do lobo, cauterizando o ataque do animal e o levando ao chão ferido.
Depressa ele se preparou para o terceiro, que também estava prestes a mordê-lo no ombro. O menino, deu um ataque reto, entrando goela abaixo no bicho, e em sequência girou a lâmina, matando-o definitivamente. Depois, deu alguns passos até o da esquerda que estava caído e perfurou o crânio do lobo, levando-o à morte.
As mãos de Jaro novamente experimentavam a morte. Ele ainda se sentia mal, mas não havia outro jeito. Era matar ou ser morto.
Os lobos uivavam loucamente e se moviam nervosamente. Perceberam que a criança humana era um perigo maior do que imaginavam. Mas não iam desistir.
Ao invés de atacarem em pequenos grupos, decidiram ir todos juntos. E todos correram em direção a Jaro para o eliminá-lo.
O jovem então fez o mesmo que os lobos, avançou contra eles, matando três que estavam vindo pelo meio e criando uma abertura para fugir.
Ele corria pelas árvores, tentando buscar os lugares mais estreitos para enfrentar um ou dois lobos por vez.
Dessa maneira, foi matando lobo por lobo e posteriormente:
— Esse foi o último — falou, com a espada cravada no coração do último lobo, o alfa da matilha.
O corpo do grande lobo caiu na terra, e Jaro ofegava, coberto de sangue.
Suspiro.
— Preciso tomar um banho e…
Auuuuu!
Um choro agudo ecoou pela floresta. Jaro se virou, surpreso. Achava que todos já estavam mortos, mas pelo visto estava enganado.
O som veio de trás de uma moita baixa, e ele avançou devagar, portando sua espada ainda em mãos. Quando afastou os galhos, viu algo que fez seu peito apertar.
Era um filhote. Um pequeno lobo negro, seus olhos ainda eram levemente azulados e ele tremia muito1O garoto, ficou parado por um momento, impactado. Ele se aproximou lentamente, e o filhote rosnou, tentando parecer bravo.
Jaro se ajoelhou diante dele e suas mãos, ainda sujas de sangue, hesitaram antes de tocá-lo.
— Me desculpa, por ter matado seus companheiros… — sussurrou.
O lobo, mesmo assustado, não fugiu. Jaro estendeu os braços e o pegou no colo. Ele era quente e pequeno. Uma lágrima escorreu pelo rosto do menino e caiu no pelo do filhote.
— Vai ficar tudo bem, vou cuidar de você, pequenino.
O menino observava ao redor, os corpos espalhados, e sentia o cheiro enjooso de sangue. Por mais que tivesse vencido, não parecia uma vitória.
Logo depois, ele recolheu suas adagas e também juntou todos os corpos dos lobos e os queimou.
Fez isso porque poderiam atrair mais animais, e era exatamente o que ele não queria. Daí ele higienizou suas lâminas e se banhou junto do filhote no riacho. A seguir, Jaro jogou alguns pedaços de carne para o filhote.
— Vai com calma, hein.
O pequeno lobo cheirou, desconfiado, depois deu uma mordida tímida. Em segundos, devorava o resto com fome, fazendo barulhinhos engraçados com a boca.
— Caramba, você tava mesmo faminto.
Mais tarde, Jaro se acomodou no saco de dormir, com o filhote junto ao peito. No alto da árvore, cercados pelo silêncio da floresta, os dois adormeceram sob a proteção das estrelas.
- Lobos filhotes nascem com os olhos azulados, porém não permanentes.[↩]
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