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    Esse foi o verão do décimo nono ano de Eugene.

    Embora o clima lá fora estivesse quente e úmido, o interior de Akron era confortável.

    O cabelo desgrenhado de Eugene estava amarrado de forma descuidada. Apesar de Akron estar repleto de feitiços que garantiam várias conveniências, como purificação do ar e controle de temperatura, Eugene era o único visível usando um manto forrado de pele naquele calor sufocante.

    Ele não tinha nenhum motivo em especial para isso. Era simplesmente confortável. Ao contrário da aparência pesada, o Manto das Sombras mal pesava alguma coisa.

    Embora isso já fosse evidente, a magia era realmente conveniente.

    Mesmo o pequeno peso que Eugene sentia não era suficiente para incomodá-lo. Desde os dez anos de idade, ele vinha treinando diariamente com sacos de areia pesados presos ao corpo, então não havia como o peso daquele manto lhe causar qualquer desconforto.

    Também não era quente. O manto ressoava com os sistemas sensoriais de seu portador e monitorava constantemente as temperaturas internas e externas, garantindo conforto em qualquer situação. Só isso já era conveniente o bastante, mas o que Eugene mais valorizava eram os encantamentos espaciais embutidos no manto.

    E entre esses, o que ele mais usava era o subespaço.

    Enquanto girava uma caneta no dedo, Eugene olhava para sua escrivaninha. Observava uma tese que tinha começado a escrever algumas horas atrás. Quando voltou a si, já havia preenchido várias páginas. Eugene as juntou grosseiramente e as jogou dentro do manto, depois tirou mais algumas folhas em branco.

    — Já não está quase na hora de comer alguma coisa?

    A pergunta veio de Mer, que estava sentada à sua frente. As pernas balançavam preguiçosamente, pois a cadeira era alta demais para ela, e ambas as mãos apoiavam seu queixo.

    Eugene deu uma desculpa:

    — Comi bastante antes de vir pra cá.

    Mas Mer viu através da mentira:

    — O que você tá dizendo de repente? Você sempre come muito. Então não tá com fome agora?

    — Tô com um pouco de fome — Eugene admitiu. — Mas se eu for agora, vou perder o foco, então não posso comer ainda.

    “Mentiroso”, pensou Mer, bufando e estufando as bochechas. Dizer que perderia o foco era ridículo. Ela vinha observando Eugene fazia dois anos, e nunca o vira perder o foco.

    — Você não tá sendo apressado demais? — Mer perguntou.

    — Acho que não — Eugene respondeu.

    — Agora que chegou a hora de escrever sua tese, é ainda mais motivo pra não se apressar. Você devia escrever com calma, devagar, pra não cometer erros pequenos… — Mer tentou pensar em mais argumentos. — Hm… Então por isso, é melhor escrever com cuidado, entendeu?

    — Não tô apressado, e tô escrevendo com calma. Só não sei quanto a devagar. Venho revisando minha tese o tempo todo, e pelo menos nos meus olhos, ainda não vi erro nenhum. Isso deve significar que tô escrevendo com cuidado — Eugene respondeu, continuando a girar a caneta.

    Mer não ficou muito satisfeita com essa resposta e, após uma breve pausa, voltou a falar:

    — …Tô falando de magos normais, mas geralmente eles levam décadas pra terminar uma tese que resume a própria magia, não é?

    — O tempo que passei estudando magia é bem menor que algumas décadas.

    — Isso é ainda mais motivo pra pensar que você tá sendo arrogante demais em escrever sua tese tão cedo! Em vez de fazer uma coisa tão precipitada, devia se aprofundar na magia por mais dez anos… — Mer foi protestando até perder o fôlego.

    — Parece que nossa pequena Mer tá ficando bem tímida — Eugene sorriu ao olhar pra ela.

    Com isso, Mer franziu as sobrancelhas, como se estivesse enojada, e ergueu os dois punhos fechados na direção de Eugene.

    — Já não falei um monte de vezes pra você parar de passar dos limites? — Mer protestou.

    Eugene negou a acusação:

    — Mas não acho que eu tenha passado dos limites.

    — Tô falando do que você disse: ‘nossa pequena Mer’! Já falei pra não me chamar assim. Tenho duzentos anos a mais que você, Sir Eugene.

    — Então parece que nossa vovozinha Mer tá bem tímida.

    — Quer morrer?

    Os ombros de Mer pareciam tremer de raiva. Mas mesmo assim, Eugene não sentia nenhuma intenção assassina vindo dela. Depois de dois anos sendo provocada daquele jeito, Mer parecia já ter se acostumado. Além disso, ambos sabiam que Mer não estava falando sério e que, no fundo, não odiava o modo como Eugene a tratava.

    Era estranho, novo e nostálgico. Entre todos os magos que tinham conseguido acesso a Akron ao longo dos séculos, nenhum deles tratava Mer como uma criança. Embora alguns tolos ocasionalmente quisessem dissecá-la junto com a Feitiçaria sob o pretexto de pesquisa, a maioria dos magos mantinha uma certa distância de Mer, o que tornava difícil para ela conversar com eles.

    Eles não tinham escolha a não ser tratá-la assim. Mer era uma familiar criada pessoalmente pela Sábia Sienna, baseada em uma versão infantil dela mesma. Também servia como inteligência artificial da Feitiçaria, o maior grimório da história da magia. Mesmo depois de já terem dissecado seu conteúdo uma vez, todos os magos que haviam acessado a Feitiçaria sentiam admiração por Mer.

    Mas Eugene não era assim.

    Não havia motivo algum para ele seguir essa tendência. Respeito pela Sábia Sienna? Embora admitisse que ela era uma grande maga, para Eugene, Sienna era apenas Sienna.

    — Você não quer que eu vá embora, né? — Eugene foi direto ao ponto.

    — Hm… — Mer hesitou em responder.

    — Viu só? Você não quer. Pensar que já se passaram dois anos desde que vim aqui pela primeira vez. Mas parece que só eu venho e vai regularmente deste andar — Eugene comentou com empatia.

    — Isso… é inevitável — Mer murmurou, afrouxando os punhos cerrados. — Os outros magos já terminaram de examinar a Feitiçaria faz tempo.

    Um pequeno gesto, um grande impacto!

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