Capítulo 1 - Fantasmas são simplórios.
—Ambição—
―欲望―
—Desejo—
TLM-001-NNGY: Fantasma – Relatório:
Um dia de matar.
Eu estava voltando para casa depois de um dia complicado no trabalho.
Foi realmente difícil de matar.
Caçador uh? Que piada, eu deveria dar conta de um monstro como aquele sem sujar as roupas.
Mas sujei, muito.
Apaguei o maço no pulso antes de lançá-lo com um peteleco para a lata de lixo ao lado da porta, surpreendentemente, acertei. Coisas simples deixam a vida mais bonita.
A escada de três degraus de madeira era bem firme, risquei as digitais no corrimão antes de levá-las ao bolso, atrás do molho de chaves.
Simples, sem chaveiro, eu poderia reconhecer as sete chaves quase iguais pela disposição delas, da direita para a esquerda.
Destranquei com a própria chave sem por a mão na maçaneta, temendo sujar. Infelizmente meu medo se concretizou assim que pisei em casa.
Sem anúncios, desde que moro sozinho, eu entrei. Uma gota escarlate caiu sobre o tapete da entrada. Minha roupa repleta de vermelho ainda estava molhada em partes.
Eu preciso de roupas limpas antes que suje mais ainda a casa.
—Desejo—
Tirei as roupas ali mesmo, só de íntima e meias. Bati a porta com as costas e fiz uma bola com as roupas sujas, embora ainda estivesse sujo eu mesmo.
Banho, roupas limpas e um banho, para agora. Corri ao armário.
Imagine minha surpresa ao encontrar um fantasma no armário.
Fantasmas…
Não, estava mais para um monstro.
Era um Oni, eu senti como se fosse um radar, meus instintos e seus tímidos chifres pálidos de ponta rosada entraram em concordância.
Ah, claro, e os seus olhos. Seus olhos vermelho carmesim, absoluto. Mais vermelho que meus cabelos — mesmo que eles estivessem emaranhados em sangue e muito mais ruivos que o habitual — ainda perderiam, não havia competição perante o vermelho absoluto.

Com kanjis1 no lugar das pupilas, um para cada.
‘欲 望’2
“Yokub—”
—Corte—
―切―3
—Corte—
Não, eu quase me esqueci.
Boa noite, para você que é humano.
Também para você, que é Yōkai.4
Vampiros, Ghouls, Yuki-onna, Górgonas, Jiangshi, Diabos.
Uma noite maravilhosa para qualquer criatura quer ela seja.
Exceto para…
“Mazou-gahara… Chou Omeniu-xalia…?”
“Sem essas pausas.”
Ah, sim, como se esse fosse um nome fácil de repetir sem pegar fôlego. Mazougaharachou Omeniuxalia, um nome desnecessariamente grande, confuso e sem significado real. Eu me arrependi copiosamente, negativando a ideia com a cabeça.
Era um péssimo nome, parecia melhor quando escrito.
Mazo, Mazo… Mazou.
“Bom… Mazou-san?”
“Sim?” Respondeu prontamente, mesmo que sua expressão demonstrasse tédio… Demon-strasse. A melhor das palavras para a pior das situações.
“Desde quando você mora no fundo do meu armário?”
Ah sim, é verdade. Minha boca elucidou uma questão que eu mesmo já estava negligenciando.
Eu estava caído no chão pelo susto.
Desde o momento que abri o armário para escolher uma muda de roupas, e vi no canto, uma mulher pálida como uma assombração, descabelada como uma assombração e com uma voz doce como uma criança travessa.
Minha primeira impressão de Mazou foi certeira, ela é aquela criança que bate à porta pedindo a bola, inocente.
Mesmo depois de quebrar a sua janela com ela.
Ouça, mesmo que sua vida dure cento e cinquenta anos, valor mais que acima da expectativa de vida humana, não é esperado que você encontre um fantasma, muito menos no seu armário.
É possível que você acredite ter visto, ouça histórias ou qualquer coisa parecida, mas confie em mim quando digo que um zombie, vampiro, ou qualquer outra entidade estúpida — mas física —, está numa porcentagem maior de encontros.
Não crê? Eu tenho dados. Cem a cada um milhão de pessoas já encontraram uma entidade sobrenatural de frente, destas, só dez encontraram com uma criatura etérea e mais ou menos meia pessoa dessa pilha foi com um fantasma. É algo que exige muito poder do fantasma e muita sensibilidade do humano.
Uma a cada dois milhões.
E mesmo assim, eu deveria estar esperando isso.
Mas não é legal ser a pessoa especial, nem um pouco.
Me foi informado que eu encontraria logo, contudo, no meio da bagunça executiva esqueci completamente desse fato.
Que eu ia me encontrar com a fantasma em breve.
“Então…? você não me respondeu.”
“Eu moro em todo objeto de desejo.”
“…”
Todo… O que isso deveria significar?
Cínica, ela disse isso como se fosse somente uma lei de Newton, algo que eu deveria estar ciente, como se fosse um mais um é dois.
‘Olhe aqui sua pirralha, invasão domiciliar é crime!’
Era o que eu queria dizer, mas não podia, nada mudaria se dissesse. Ela não poderia ter esperado na porta?
Uh… Massageei as pálpebras, num sonho profundo, imaginei um universo onde eu abria os olhos e ela não estava mais lá.
Não funcionou.
Ainda estava lá, levemente translúcida.
“Nesse caso, você mora no meu armário por que eu desejei pegar… Roupas?”
“Basicamente.”
“Fantasmas são simplórios…”
Me levantei cuidadoso, ficando um pouco mais alto que a mulher, mas não muito por causa dos seus chifres.
Toda sua roupa era um manto haori azul florido fechado, com um obi branco enrolado na cintura e com um laço nas costas, não parecia usar sutiã mesmo que precisasse.5
Eu tenho certeza que já vi esse haori… Não que isso importe.
Também não parecia usar xampu, nem banho.
Fantasmas são assim.
Geralmente criaturas fáceis de lidar, mas difíceis de conviver.
Simplórios, medíocres.
“De fato, eu me sentiria ofendida se fosse um fantasma?”
“Oh… E o que você é?”
“Uma alma.”
“Isso é um fantasma!”
“Não, existe um abismo entre fantasmas e almas.”
“Eles se parecem idênticos para mim.”
“Um fantasma é uma consciência perdida, uma insatisfação flutuante, almas são essência sem corpo físico.”
Essência.
É, acho que tive alguma aula sobre isso.
Meu mentor disse alguma baboseira sobre, mas nunca como usar isso para lidar, somente para derrotar.
Um fanático por execuções perfeitas, ele nunca me explicou o que eu deveria fazer se, por algum acaso, uma fantasma peituda a qual eu não posso mandar ao além vida surgisse pela noite na minha casa.
Não, mais importante que isso…
“Assim sendo, você não pode ser tocada?”
“Basicamente.”
Inspirei insatisfeito.
Isso dificulta o trabalho em quatrocentos por cento.
“Em todo caso, eu ainda preciso da minha roupa, Mazou-san, me dê licença.”
Encarei silenciosamente a ‘Alma’ sair do armário, ela passou por mim.
Literalmente, por mim; Senti um calafrio familiar, ela atravessou meu corpo como se — novamente — fosse mais uma segunda-feira, como se pizza fosse melhor que lasanha e estrogonofe melhor que pizza, só mais um fato universal.
Tinha pés, mas não caminhava, flutuou sobre o chão de madeira, depois sobre o tapete e então se deitou na minha cama.
Notei novamente, ela fedia um pouco.
Não exatamente como um ser físico, eu acho. É difícil explicar, mas entre as classificações de youkais, os que estão mais do lado de lá que cá, tem algo diferente no aroma, algo meio… Sentimental.
Digo, havia sim um mal cheiro por falta de banho, ela deve ter morrido suja. Mas algo indescritível entre ‘abandono e ansiedade’, uma aura desgostosa que me deixava incomodado de respirar o mesmo ar que ela.
Talvez passe com um banho normal?
“Mazou-san, fantas—” Corrigi. “Almas se banham?”
Trouxe a questão enquanto escolhia uma roupa de ficar em casa, uma camisa leve e uma calça folgada.
“…”
Ela pareceu pensativa.
Como alguém buscando uma resposta que não tem para uma pergunta que precisa ser respondida.
“Quando podem… Ou quando querem?”
E deu uma resposta vaga.
“Você já quis alguma vez na vida? Ou morte… Existência, sei lá.”
“Estou fedendo?” Ela não parecia ofendida, mas sim surpresa.
“O suficiente para precisar de um banho.”
“Entendo, nesse caso, deseje banhar-me.”
Eu parei.
“Como?”
“Eu estou em todo desejo. Deseje, e eu estarei.”
Heh, isso é bem abrangente. Eu pensei em tomar banho, tentei imaginar, forcei os olhos neste pensamento, mas nada aconteceu.
“Não funcionou.”
“Tem de ser um desejo verdadeiro.”
“Então o que quer que eu realmente almejar, você terá?”
“Basicamente.”
“Hum.”
Forcei as pálpebras com o indicador e polegar.
Naveguei por lugares ruins da minha mente até finalmente me concentrar numa maneira de tornar esse desejo palpável.
Ah, estava na minha frente esse tempo todo.
Palpável.
—Desejo—
Quando abri os olhos, senti tamanho mal cheiro qual o de um cadáver.
“…?”
Mazou me encarou, buscando respostas.
De repente, o que parecia uma projeção holográfica, agora interferia nas dobras do forro de cama — que ficava cada vez mais sujo —, ela se sentou na cama.
“Seu desejo sincero era um corpo físico para mim?”
“É, era.”
Ela me encarou por mais alguns segundos, piscou os olhos algumas vezes.
“Você é um tarado?”
Ela perguntou sinceramente, me encarava séria.
Começamos com o pé direito, em minutos ela me odeia.
Não, não, eu não ligo, de verdade.
A animosidade não me importa desde que o cheiro de cadáver começou a correr pelo quarto, e logo deve impregnar minha casa toda.
“Talvez, mas tenho um problema maior que qualquer libido.” Tampei o nariz. “Vamos, vamos, levanta daí, para o banho! Agora que você está fisicamente aqui, você vai se lavar, né?”
“Talvez.”
“Talvez?!”
“É, basicamente.”
“Até o seu vício de linguagem é enorme.”
“Me perdoe, eu vou corrigir.” E se levantou com um pulinho.
Isso vai ser um serviço problemático…
Com a roupa de cama sob o braço eu a acompanhei até o banheiro.
“Eu não poderia reparar, por não ter um corpo físico anteriormente, mas as manchas de sangue no seu corpo também estão com cheiro forte, você não vai tomar banho para lavar isso?”
Oh, ela tem bons olhos. Ou um bom nariz, nesse caso.
Mas era um eufemismo de sua parte.
Eu não estava com manchas de sangue, estava vermelho vivo, mesmo que vista preto para absorver as manchas, o uniforme estava carmesim puro, e até sem ele eu tinha várias partes do corpo tomadas por sangue seco. Com o uniforme, era como se eu tivesse acabado de sair de um moedor de carne.
Não era muito diferente de um moedor de carne, a propósito.
“Banhe primeiro, eu espero.”
Seu olhar afiou.
“Um pervertido de alto nível. Então você quer usar a banheira depois que eu me lave nela?”
Ela pareceu diferente de antes.
“Ei ei, o que há com você? Se tudo é perversão, então nada é perversão.” Ela não se comoveu com minhas palavras, só me encarou como se eu fosse a água suja que pinga do saco de lixo.
“Isso é algo que qualquer pervertido com boa lábia diria… Para a polícia, onde você adquiriu essa habilidade especial em dar desculpas?”
Deu um passo — seu primeiro sem flutuar —, em minha direção e colocou seus olhos esculpidos em rubi em frente aos meus. Cruzou os braços.
“Não são desculpas, são argumentos, lógicos e bem embasados, com zero fundamento em palpites, coisa que você aparentemente desconhece.”
“Kek—, o último pervertido que conheci tinha uma eloquência tão boa quanto a sua.” Ela disse algo que chamou minha atenção. “Sabe como ele a adquiriu? Tendo que se explicar toda vez que assediava uma mulher em público.”
“Você está me comparando com um assediador de metrô?”
“Você está num nível de pervertido que vai além deste?”
“Isso é…”
Pensei em mais uma resposta boa, mas me encolhi.
Essa troca está se estendendo demais, nós vamos permanecer discutindo por toda a noite sem chegar numa conclusão.
E eu como uma pessoa madura, deveria apenas desistir.
Isso, eu deveria apenas entrar e tomar banho sem retrucar, tomar partido da atitude responsável e encerrar a discussão.
É só não responder…
“Isso é um paradoxo, eu poderia dizer o mesmo de você se eu fosse primeiro.”
Eu respondi.
Droga, me surpreendo em como eu mesmo sou infantil.
Mas não estava errado, era de verdade, um impasse.
Uma sinuca de bico.
“Nesse caso, entre também.”
Huh?
“Bom, se não se importa.”
Essa foi uma resolução rápida, como disse, fantasmas são simplórios.
Não, espere, o problema original não era esse?
“Tarados tendem a atacar mulheres durante o banho?”
Começou de novo com essa idiotice de pervertido. Por favor, pare por um minuto mulher.
“Eu não conheço muitos tarados, mas acredito que nenhum deles tem essa oportunidade em vida.”
Pervertidos são em grande maioria, frustrados, essa é uma situação impossível, de fato, são apenas virgens solitários buscando oportunidades sexuais de maneira criminosa, oportunidades que nunca tiveram licitamente.
Pessoas que nunca tiveram contato com mulheres.
Estou me descrevendo?
Oh droga, me perdi novamente.
Espere…
O que há com esse desenvolvimento. Esse é o famigerado “Banho com a fantasma-oni que surgiu no meu armário?”
Eu esperava ter de acender velas pretas, lidar com poltergeist ou vozes, qualquer uma dessas merdas quando me foi proposto esse trabalho.
Olhando em retrospecto, achei que iria morrer em qualquer explosão emocional do fantasma de um monstro.
Na verdade, ela sequer sabe tomar um banho?
Entrei na banheira de água quente que havia, ela também entrou, sentou de costas para mim.
Oh, eu tive uma visão arrebatadora.
Fechei os olhos com firmeza, meu cérebro disse a mim para se controlar, mas meu coração com certeza tirou print dessa imagem para me relembrar em algum momento horrível como um funeral.
Heh, lembrar de um fantasma num funeral.
Pare, pense apropriadamente.
É serviço. Sim, é trabalho, não cometa nenhuma gafe.
No meio do banho peguei alguns dos meus produtos para cabelo, os melhores, para cabelos bem rebeldes e despejei sob o dela.
Tentei usar um pente, mas os dentes dele começaram a torcer e quebrar, então procurei uma escova.
“Longo…” Soltei.
“É, bem grande.”
“Sim, se fosse bem cuidado, seria muito bonito.” Tentei com a escova, um tufo junto com som de rasgar. Ela nem reagiu.
“Isso é auto depreciação?”
“Mazou-san, eu estou falando do seu cabelo.”
“Ah… Bom, também se aplica.”
Essa garota…
Comecei a desembaraçar o cabelo sujo dela.
Ela não reclamou, nem com os puxões, nem com os fios que eventualmente eu arrancava por descuido.
Minha mão passou por um pequeno embate contra seus chifres.
Eles não parecem tão rígidos visualmente, mas no toque são ásperos como quaisquer outros chifres, eles tentaram por alguns minutos me impedir de pentear a franja.
Cômico, para alguém como eu, com um serviço como o meu, meu maior desafio foram seus chifres.
Mais que qualquer demônio moedor de carne.
Depois disso, comecei a me esfregar.
Ela só encarou, com leves dúvidas no olhar.
“É assim ó, me imita.”
“Certo…”
Ela ergueu os braços à frente e tentou me esfregar.
“Não, espere. Esfregue o seu próprio corpo, como eu estou fazendo.”
Ela continuou me encarando com olhos duvidosos.
Haa…
Passei a bucha – Oh, que linha horrível, no pescoço dela e esfreguei até o meio das suas costas.
“Vê? Faça o mesmo, você mesma.”
Ela parecia ter entendido, confirmou com a cabeça.
Contra todas as minhas expectativas para esse serviço, eu ruborizei.
É TRABALHO.
***

(Mazo-Pincel-Chi.png)
(O pincel que usei foi o “[c) Pencil-6 Quick Shade]” do Krita, tamanho 60,00 e opacidade 85%. E só.)
- Kanji são caracteres utilizados na escrita japonesa, representando ideias e palavras.[↩]
- Yokubo (欲望): Desejo[↩]
- Kiri (切): Corte[↩]
- Yokai são criaturas sobrenaturais do folclore japonês, podendo ser deuses, monstros, demônios, fantasmas ou outras entidades estranhas.[↩]
- Haori e Obi respectivamente são uma jaqueta tradicional japonesa usada sobre o quimono e uma faixa larga usada com o quimono.[↩]
Notas do autor:
E ele fez de novo.
Vou tentar ser breve, ao menos.
Eu passei por um mês ruim, e essa história – mesmo seguindo o rumo do roteiro a risca -, sofreu consequências sérias.
Sinto que eu descarrilhei no arco 3 e isso matou minha vontade de continuar, eu não conseguia escrever o próximo capítulo por que odiava o último lançado.
Não sei dizer, ficou corrido, e os capítulos eram enormes também.
Conclusão, eu decidi voltar ao início e ir mexendo com calma na história.
Essa nova edição é o resultado.
Tirado isso, temos outra questão, as artes.
Eu comecei esse projeto com o meu colega de classe, o tal “Nyar~ Kevin-sama!”.
Um artista de mão cheia e grande amigo, mas como dito, eu passei por um mês ruim.
Me afastei de uma maneira destrutiva e seca da maioria dos meus amigos e acabei passando um bom tempo sem falar com ele, mesmo que não houvesse nenhuma desavença.
E bom, ele seguiu a vida né. O cara trabalha e eu também, tem a própria família e projetos, eu nem mesmo quis pedir que ele voltasse com as artes, seria insensível depois de meter o louco e depois desaparecer.
Conclusão. Eu acho que vou fazer as artes.
Isso é bom e ruim, bom porque eu não dependo de ninguém para tê-las além de mim, ruim por que meu estilo de arte é bem mais pintura e menos anime quando faço no digital, vou tentar mesclar com desenhos tradicionais e pinturas digitais.
Mais importante, eu prometo me esforçar daqui pra frente =]
E não sumir de novo né, kkkkkk.
Por último, gostaria de declarar que a Mazo é lindinha demais slk

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