Capítulo 76
Flap…
Um enorme letreiro tremulava diante de seus olhos.
27º Leilão de Caçadores da Cidade Sejong
Ayeon tirou seu boné rosa e respirou fundo, com uma expressão satisfeita no rosto.
“Ah, o cheiro do dinheiro.”
À distância, via-se uma fila de pessoas. O que parecia ser um caixa eletrônico à primeira vista era, na verdade, um leitor automático de licenças. Estava tão lotado que a fila para obter a placa de certificação quase chegava até a entrada do local do leilão.
“Se eu esperar honestamente a minha vez, vai levar o dia inteiro.”
Dinheiro e tempo eram proporcionais. Ayeon caminhou direto até a frente da fila, sem hesitar. E então…
— Esperou bastante, né? Foi mal!
Ela se aproximou de um caçador que esperava na frente da fila e deu um leve tapinha no ombro dele.
O rosto do homem que se virou para ela se tingiu de desconfiança. Com razão, afinal uma estranha acabara de fingir conhecê-lo.
— Hã, quem…?
— Tava com uma baita dor de barriga. Já não é a nossa vez?
— Não, acho que você confundiu de pessoa…
O caçador fechou a boca. Algo pesado acabara de entrar em seu bolso. Um maço de notas de cem dólares. O homem engoliu em seco, o pomo de adão se movendo visivelmente.
— Hã, já é a nossa vez? Vamos, amigo.
— Ahn, uh…
Viva a era capitalista do século XXI. Era um mundo em que se virava melhor amigo em cinco segundos, se você tivesse dinheiro. Culpa? Nenhuma. Para os, veteranos de leilão, furar fila pagando era quase uma regra não escrita.
“Isso é ser esperta.”
As pessoas que esperavam desde o amanhecer até a manhã do dia seguinte para receber suas placas é que eram tolas.
Beep.
Ao tocar levemente o leitor com sua licença de caçadora…
— Reconhecimento em andamento. Por favor, aguarde.
— Reconhecimento completo. Obrigado.
Com a voz do sistema, uma placa rolou para fora do dispositivo. Era uma espécie de placa de autenticação com as letras H e A entrelaçadas. Era dada a caçadores oficiais que haviam pago a taxa de participação conforme seus ranks. Também permitia o uso da função de tradução automática nas áreas designadas, bastando segurá-la.
“Já troquei as fichas, então agora…”
Fichas.
Enquanto as moedas eram a moeda do sistema usada por caçadores do mundo todo, as fichas eram moeda descartável emitida pelo anfitrião do leilão, usada apenas no leilão de caçadores. Também era a moeda usada para lances prévios nos itens leiloados e podia ser ainda mais importante que as moedas.
“Se eu não conseguir fichas suficientes no primeiro e segundo dias, objetos bons não passam de sonho distante, mesmo com moedas.”
Vamos ver.
Pang!
Ayeon estourou o chiclete e ergueu a mão no ar.
【Carregando inventário.】
【- – – Carregando – – -】
Logo, o inventário preencheu sua visão. Ela ajustou a opacidade para quarenta por cento e, ao tocar o botão, ‘organizar por classe’…
Swish…
A lista de itens desceu até os dedos dos pés. Eram os queridinhos que Ayeon vinha acumulando com afinco ao longo do último ano. 112 itens Heroicos, 338 itens Raros. Isso bastava para conseguir pelo menos dez mil fichas.
“Ah, tomara que o dia 12 chegue logo!”, Ayeon organizou sua vitrine com grandes expectativas.
Porém…
— …
Swish.
Apenas três clientes visitaram sua banca na hora seguinte. Número total de itens vendidos: zero.
“Isso é sério?”
Ao olhar ao redor, definitivamente havia uma multidão de caçadores. Muito maior que a do ano passado, à primeira vista. Mas nenhum deles era cliente da Ayeon.
Ayeon ficou pensativa. Algo estava errado. Os itens estavam caros demais? Não, aquela qualidade merecia aquele preço. Estava em um lugar ruim? Negativo. Estava claro que aquele era o melhor ponto. Nesse caso…
“Tem concorrente.”
Bem perto.
Os olhos de Ayeon vasculharam os arredores com agilidade. E logo encontrou seu alvo. A vendedora sentada em um canto… estava monopolizando todos os seus clientes! Não sabia quem era, mas certamente era alguém sofisticado e malicioso. Precisava ver com os próprios olhos. Ayeon pausou as vendas e marchou até o balcão da concorrente. No entanto…
— Hã?
Pele de tigre negro. Presas afiadas. Ossos firmes de animal. Os itens exibidos na banca modesta eram muito mais simples do que ela esperava.
“Fiquei curiosa pra ver que tipo de coisa esplêndida você tava vendendo…”
Mas o quê? Não tinha nada demais. Quase se sentiu envergonhada por ter zombado de coisas tão banais. Ayeon estalou os ombros, decepcionada. Estava prestes a ir embora, quando…
— Que loucura. Ela tá vendendo quinze peles de tigre negro por uma ficha!
— Eu fui lá e paguei duas fichas por um cristal vermelho ali.
— Onde, onde?
Pelo que ouviu, vinte presas valiam uma ficha. E uma ficha por vinte e cinco ossos?! Era basicamente como dizer, ‘a gerente enlouqueceu’.
“Não é possível.”
Considerando o tempo e esforço pra conseguir um ingresso pra um portão, a mão de obra e os recursos usados pra eliminar os monstros lá dentro, mais o adicional por risco… uma ficha por quinze peles era um absurdo, mesmo sendo itens comuns.
Uma caçadora novata que não conhecia o valor das coisas? Não, caçadores novatos nem conseguiam participar desse leilão gigantesco, onde era preciso pagar mais de trezentas moedas pra entrar. Um valor inalcançável pra iniciantes.
Nesse caso… uma, ‘colher de contrato’, como uma colher de ouro1? Os olhos curiosos de Ayeon giraram ao redor. Queria ver o rosto da vendedora no meio da multidão.
— Tem algum item que você procura?
Os olhos negros a encararam com indiferença.
“Essa pessoa…”
Ayeon arregalou os olhos. Parecia familiar. Camiseta branca e jeans. Não usava nada de especial…
Ayeon estava rondando a banca quando notou uma sombrinha preta decorada de forma luxuosa. No mesmo instante, uma lembrança lhe veio à mente.
— O quê? O Mercado de Jagalchi? Você não vai entrar num Portão Desconhecido, vai? Só pra saber… qual é seu rank?
— Rank F.
Isso, ela se lembrou. A maluca… Não, a corajosa caçadora de conceito que tinha se sentado ao lado dela no KTX.
— Caramba! Não lembra de mim? No KTX, aquele dia!
— …?
Os olhos dela se estreitaram, tomados por dúvida. Parecia não reconhecer Ayeon.
— Ei, que decepção. Não me conhece? Eu até te dei um doce.
Os olhos de Eunha se moveram, e ela reagiu um segundo tarde demais.
— …Ah.
Parecia que tinha finalmente se lembrado. Bom, fazer o quê. Ayeon sorriu calorosamente e ficou ao lado de Eunha, como se fosse natural.
— Uau, dizem que basta um esbarrão pro destino acontecer, mas nunca achei que ia te encontrar de novo aqui.
— Nem eu.
— Parece que você foi mesmo pra Busan no fim! Vi na internet. É verdade que lutou com o Grande Sábio, Igual ao Céu? Não é, né?
— …
Eunha fechou a boca. As pessoas ao redor começaram a se agitar. A voz de Ayeon devia estar alta demais. Os caçadores que passavam, e os que estavam olhando os itens perto do balcão, todos olharam para Eunha.
— Opa.
Ayeon cobriu a boca.
Eram duas da tarde. Como o leilão de caçadores acontecia no Parque Central de Sejong por três dias, os restaurantes da região estavam todos lotados de caçadores, como formigas em enxame. Ayeon levou Eunha a uma cafeteria para se desculpar por ter atrapalhado suas vendas e disse que pagaria o almoço.
— Desculpa mesmo. Não fiz por mal. Minha voz já é alta naturalmente. — Ayeon sorriu sem graça, brincando com o canudo.
— Tudo bem. Vou fingir que você fez propaganda pra mim — respondeu Eunha com naturalidade, abrindo um sanduíche. Pelo tom de voz e pela expressão, não parecia estar brava.
— …
Olhos cor-de-rosa encaravam Eunha com intensidade. Ayeon achava que ela ficaria séria e exigiria que assumisse responsabilidade, mas a deixou escapar fácil demais. Era completamente diferente dos adultos que Ayeon conhecia.
“Ela parece ser uma pessoa bem legal.”
Ayeon colocou um canudo no copo de Eunha e abriu um sorriso. Eunha olhou para ela, desconfiada, mas não disse nada.
Quando Eunha quase terminava o sanduíche, Ayeon notou a sombrinha preta que ela havia deixado cuidadosamente ao lado do assento.
— …Onde você conseguiu essa sombrinha? O design parece coisa que não dá pra comprar em lugar nenhum.
— Achei — respondeu Eunha, sem emoção.2
Ela era cada vez mais estranha aos olhos de Ayeon.
“Com aqueles boatos absurdos de ter enfrentado o Grande Sábio, Igual ao Céu, ou de ter sido a verdadeira pessoa a completar o Portão Desconhecido… E participando de um leilão em que só pra entrar precisa de mais de trezentas moedas…”
“Será que ela é mesmo Rank F?” pensou Ayeon, mexendo a bebida à frente de Eunha. E isso não era o único ponto esquisito sobre ela. Os caçadores de conceito ou BJs caçadores que Ayeon tinha visto até agora geralmente se dividiam em dois tipos.
Primeiro, os que só queriam atenção.
“Ela não parece ser assim.”
Os que queriam atenção normalmente contavam histórias sobre si mesmos como se fossem lendas, mesmo sem ninguém perguntar. Mas tanto no dia do KTX quanto hoje, Eunha só respondia brevemente ao que lhe perguntavam, sem se estender nem falar de si. E, mesmo que Ayeon ainda não fosse próxima dela, dava pra ver claramente que não era do tipo que gostava de chamar atenção.
Sobrava o segundo tipo. Caçadores com habilidades únicas não combativas, que seguiam o caminho dos caçadores de conceito para ganhar a vida. Isso sim fazia mais sentido. Também explicaria o motivo de usar aquele vestido desconfortável pra caçar e acumular fichas mesmo com prejuízo.
— Você disse que é caçadora freelancer, né? A guilda com que assinou contrato não te paga direito?
Seus olhos negros se voltaram para Ayeon. Após um momento de silêncio, Eunha moveu os lábios lentamente.
— Rescindi o contrato antes do tempo.
“Não é possível.” — Por quê? — Contratos eram como comida e linha de vida pra caçadores freelancers. — Tem algum contratante?
— …
Eunha não respondeu. Ayeon apoiou o queixo na mesa e ficou olhando pra ela, balançando os dedos dos pés enquanto se perdia em pensamentos.
Então, bateu na mesa com força.
— Tá decidido. Pra me redimir como veterana de leilões, vou te dar umas dicas. Especialmente pra você.
“Dicas?” Eunha estava prestes a pegar o copo de refrigerante quando olhou pra cima.
— Primeiro: esquece o resto e sobe o preço dos seus itens a partir da tarde. Uma ficha por quinze peles é insanidade. A não ser que você tenha, sei lá, dezenas de milhares delas.
— Tenho.
O barulho de Eunha sugando o canudo foi especialmente alto. Ayeon estava prestes a continuar a explicação, quando de repente ficou petrificada no lugar.
Eunha acrescentou com calma:
— Pelo menos cinquenta mil.
— …
— …
…O quê?
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