Capítulo 18 – As Lembranças de Um Herói – Parte 2
O sol nascia lentamente sobre Pyronia, tingindo o céu de tons laranja e dourado. No campo de treinamento do quartel militar, o som de gritos, espadas se chocando e passos apressados marcavam o início de mais um dia exaustivo para os novos recrutas. Hiroshi Ignivor, Harland Ferres e Rylen Thorne estavam entre os recém-chegados, mergulhados em uma rotina implacável que os testava física e mentalmente.
O sargento Gared, um veterano de guerra de cabelos grisalhos e voz áspera, comandava o treinamento. Ele não fazia distinção entre nobres e plebeus. Para ele, todos os homens que cruzavam os portões do quartel eram apenas soldados em potencial – ou corpos esperando para serem enterrados.
– Ouçam bem, seus inúteis! – gritou Gared, caminhando pelo campo com as mãos cruzadas atrás das costas. – A guerra não se importa com quem vocês são ou de onde vieram. Ela só se importa com o quão rápido vocês podem matar… ou morrer.
Os recrutas estavam divididos em fileiras, equipados com espadas de madeira, lanças embotadas e escudos mal ajustados. Hiroshi, mesmo acostumado ao treinamento básico que recebera em casa, sentia o peso em seus ombros.
– Você aí! – Gared apontou para Rylen, que estava com a postura errada ao segurar sua lança. – Se você segurar a arma assim no campo de batalha, vai perder a cabeça antes mesmo de atacar!
Rylen tentou corrigir sua postura, mas Gared já havia se movido para outro recruta, corrigindo falhas com críticas severas.
Durante um intervalo, Hiroshi, Harland e Rylen sentaram-se sob a sombra de uma árvore, compartilhando um pedaço de pão duro que lhes fora dado como refeição.
– Esse sargento vai me matar antes mesmo que eu veja um campo de batalha – comentou Rylen, esfregando os braços doloridos.
Harland riu, embora também estivesse exausto.
– Ele é um idiota, mas tem razão. Se não aprendermos rápido, não vamos durar muito tempo.
Hiroshi concordou, mastigando em silêncio.
– Vamos sobreviver – disse Hiroshi, quebrando o silêncio. – Não importa o quão duro seja, precisamos voltar para casa. Para nossas famílias.
Os amigos concordaram.
Naquela tarde, Gared reuniu os recrutas para um exercício que chamava de “a Prova de Resistência”. Eles seriam enviados para um bosque nos arredores de Pyronia, onde teriam que completar um percurso carregando escudos pesados e enfrentando obstáculos.
– Estejam preparados para falhar – disse o sargento, sorrindo com crueldade. – A maioria de vocês vai.
O percurso começou com uma corrida pelas trilhas irregulares do bosque. Hiroshi liderava o grupo, os músculos queimando a cada passo. Atrás dele, Harland mantinha o ritmo, mas Rylen estava ficando para trás.
– Vamos, Rylen! – gritou Hiroshi, virando-se para ajudá-lo.
Harland também diminuiu o ritmo, empurrando Rylen para frente.
– Não vamos deixar ninguém para trás – disse ele, com firmeza.
Juntos, os três continuaram, enfrentando valas, cordas e até espantalhos armados para simular ataques inimigos. Quando chegaram ao final do percurso, exaustos, Gared estava lá, com os braços cruzados e um sorriso irônico.
– Vocês não são os piores que já treinei – admitiu ele. – Mas ainda têm muito o que aprender.
Naquela noite, enquanto o campo de treinamento se silenciava, Hiroshi sentou-se sozinho, olhando para o céu estrelado. Ele segurava o pingente de chama que Eiko lhe dera, sentindo uma pontada de saudade.
Harland aproximou-se, carregando duas canecas de cerveja fraca que havia conseguido com outro recruta.
– Um brinde ao primeiro dia – disse ele, entregando uma das canecas a Hiroshi.
– Ao primeiro dia – repetiu Hiroshi, brindando.
Rylen juntou-se a eles pouco depois, trazendo pedaços de pão que sobraram do jantar.
– Não importa o que aconteça amanhã – disse Rylen, com um sorriso cansado. – Estamos nisso juntos.
Os três beberam e riram, encontrando conforto na companhia um do outro. Era apenas o começo de sua jornada, mas sabiam que cada dia seria uma batalha, dentro e fora do campo de treinamento.
O treinamento avançava com o passar dos dias, e as exigências de Gared apenas aumentavam.
Hiroshi se destacava pela disciplina e determinação, características herdadas da criação em sua família. Sua postura como líder natural começou a surgir, algo que não passou despercebido por Gared.
– Ignivor! – bradou o sargento durante uma simulação de combate. – Quero ver se você sabe liderar tanto quanto aparenta. Organize sua equipe e conquiste aquele forte improvisado!
O “forte” era uma pequena colina protegida por recrutas mais experientes, escolhidos para atuar como defensores. Hiroshi reuniu Harland e Rylen, junto com outros recrutas designados ao seu comando.
– Vamos cercá-los pela retaguarda – disse ele, estudando o terreno. – Eles esperam que ataquemos de frente. Se formos rápidos, podemos pegá-los desprevenidos.
Com os comandos distribuídos, Hiroshi liderou o grupo pela densa vegetação que cercava a colina. Harland, armado com uma lança, assumiu a linha de frente, enquanto Rylen cobria o flanco com um arco improvisado.
Quando o ataque começou, o impacto foi imediato. Os defensores, pegos de surpresa, não conseguiram reagir a tempo. Hiroshi liderou o avanço final, derrubando o recruta que defendia o “estandarte” com um golpe preciso de sua espada de madeira.
Gared observava do alto, com um raro sorriso de aprovação.
– Parece que temos um estrategista aqui – comentou ele, enquanto Hiroshi e sua equipe comemoravam a vitória. – Mas no campo de batalha real, a única comemoração é estar vivo.
À noite, os recrutas se reuniam ao redor de uma fogueira improvisada. O cansaço era visível em seus rostos, mas também havia um senso de camaradagem que crescia a cada dia.
– Você foi incrível hoje, Hiroshi – disse Harland, entregando ao amigo um pedaço de carne seca. – Eu não teria pensado naquela estratégia.
– Foi um esforço de equipe – respondeu Hiroshi, humilde. – Sem vocês, não teria funcionado.
Rylen, que estava afiando sua faca, olhou para os dois. – Ainda assim, você está se destacando. Gared está de olho em você.
Hiroshi deu de ombros. – Prefiro que ele me veja como um soldado qualquer. Não quero atrair atenções desnecessárias.
– Às vezes, não temos escolha – disse Harland, pensativo. – Talvez seja o destino.
No último dia do treinamento inicial, os recrutas foram convocados para um teste coletivo: uma simulação de batalha que envolveria todo o pelotão. Divididos em duas equipes, eles deveriam enfrentar-se em um campo aberto, usando as táticas aprendidas durante as semanas anteriores.
Hiroshi foi nomeado líder de uma das equipes, enquanto um recruta veterano liderava a outra. Gared observava de uma torre improvisada, avaliando cada movimento.
– Mostrem do que são feitos, seus miseráveis! – gritou o sargento.
A batalha simulada começou com uma intensidade surpreendente. Hiroshi, ao lado de Harland e Rylen, liderou sua equipe com confiança. Ele utilizou manobras rápidas para flanquear o inimigo, aproveitando a superioridade numérica em pontos estratégicos.
Quando a poeira assentou, a equipe de Hiroshi foi declarada vencedora. Ele ergueu os braços, exausto, mas satisfeito.
– Não foi nada mal – comentou Harland, dando um tapa nas costas de Hiroshi.
– Ainda estamos vivos – respondeu Rylen, com um sorriso cansado.
Naquela noite, enquanto todos descansavam, Hiroshi sentou-se sozinho, olhando para o pingente que Eiko lhe dera. Ele sentiu um misto de orgulho e apreensão. A guerra estava cada vez mais próxima, e ele sabia que os desafios no campo de treinamento eram apenas o começo.
Harland e Rylen se aproximaram, sentando-se ao lado dele.
– O que está pensando? – perguntou Harland.
– Sobre o que vem a seguir – respondeu Hiroshi, sem tirar os olhos do pingente.
– Seja o que for, enfrentaremos juntos – disse Rylen, com firmeza.
Hiroshi sorriu, sentindo o peso da responsabilidade, mas também o conforto da amizade.
– Vamos sobreviver – prometeu ele. – Pelo bem de nossas famílias, pelo bem de Imperion.
E com essa promessa, os três amigos encerraram o dia, prontos para o que o destino lhes reservava
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