Capitulo 26: Falsa Lua

O Ceifador não moveu um músculo sequer desde a chegada dos tripulantes da Dama da Ruína ao seu templo, com um semblante impossível de decifrar com exatidão… não era raiva, tampouco alívio, era algo no meio-termo entre paciência calculada e o peso de alguém que já havia previsto aquela cena muito antes dela acontecer.

Zath tomou a frente, ficando a um passo do primeiro degrau, sabendo que ir além disso seria como anunciar o início do confronto.

— Olha, podemos resolver toda essa confusão sem derramar sangue. Assim como você não queria ninguém invadindo sua casa, nós também não queríamos abandonar a nossa. Mas essa é a nossa missão, então teremos que ir até o fim para capturá-lo. Apenas quero que saiba que, se entregar o Vulto Negro, o ecossistema desse subsolo será preservado.

Os olhos cor de âmbar de Osíris varreram as figuras de Zath e Mirage, decodificando os códigos que transitavam por seus corpos. Além dos padrões comuns para o fluxo de Miasma, havia uma marca de “propriedade”: três números seis, vermelhos, alinhados lado a lado. Um sinal claro de que aqueles Undeads não tinham escolha.

Aquela descoberta fez uma rara irritação subir à cabeça do Ceifador. Aquilo era uma condenação eterna de servidão forçada; mesmo que reencarnassem sem qualquer lembrança, estariam presos à Igreja Amaldiçoada.

Infelizmente, ele ainda não podia permitir que levassem Jasper — o último resquício de Condor que restava neste mundo. Perdê-lo seria condenar todos os que ainda insistiam em lutar.

Erguendo a mão, as veias escuras do Desperto passaram a uma tonalidade verde vibrante e ameaçadora. Logo acima dele, a pequena lua do subsolo permanecia suspensa no ar, mas, com um olhar mais atento, era possível notar algumas “falhas”, como quando você move algo muito rápido e a imagem fica distorcida.

De repente, junto à luz serena e esbranquiçada que o astro emitia, uma névoa espectral familiar girava ao seu redor, até que a própria lua começou a rotacionar em seu próprio eixo em alta velocidade, chegando a sofrer rachaduras profundas. No ápice, a estrutura não resistiu e explodiu, liberando uma intensa onda de energia esverdeada.

Os destroços estavam prestes a dizimar toda a sociedade do subsolo, mas a névoa espectral agiu antes, puxando todos os pedaços da antiga lua para um único ponto e os comprimindo pouco a pouco, até que, finalmente, a forma verdadeira daquele astro foi revelada: a grande foice do Ceifador, que voou girando no ar até parar exatamente em sua mão.

Osíris não perdeu tempo. Disparou na direção de Zath; se não podia fazer nada sobre a situação em que se encontravam, ao menos teria a piedade de lhes conceder uma morte rápida.

O comandante da Dama da Ruína nem teve tempo de reagir; em um instante, Osíris desapareceu do ponto onde estava e surgiu diante dele, pronto para parti-lo ao meio com sua foice, inteiramente negra, com detalhes esverdeados e um fio que lembrava a crosta lunar.

Por um instante, Zath sentiu que sua hora havia chegado, seus múltiplos olhos se fechando ao mesmo tempo. Porém, em vez de carne, a lâmina lunar de Osíris encontrou o corpo gelatinoso de Mirage, a única que conseguiu acompanhar a velocidade assombrosa do inimigo.

Assim como planejado, o ataque dividiu perfeitamente o corpo do invasor. Mesmo que não fosse o alvo original, as duas metades caíram para lados opostos. Ainda assim, isso não significava que Mirage estava morta, seu Núcleo Mutante permanecia intacto em uma das partes de seu corpo.

O olho central de Zath, o único que não havia se fechado, presenciou toda a cena e não podia deixar aquilo impune. Canalizando a energia multielemental de seu Núcleo, disparou um feixe roxo de pura energia à queima-roupa contra o Ceifador, que reagiu na mesma velocidade, colocando o cabo da foice diante do corpo.

As duas metades da Undead gelatinosa se arrastaram para longe da energia às pressas, unindo-se novamente apenas quando estavam a uma boa distância do calor, uma de suas fraquezas mais perigosas.

A disputa entre o poder de fogo de Zath e a resistência de Osíris, que usava sua névoa como barreira junto da foice, permanecia acirrada, mas a vantagem era clara quando o Ceifador começou, lentamente, a ser empurrado para trás.

Com sua força física drasticamente reduzida pela falta de um Núcleo Mutante saudável, o Undead silencioso foi arremessado pelo impacto da explosão da barreira de névoa, incapaz de conter o raio destrutivo. A colisão do Ceifador contra as escadarias do templo foi desastrosa: todos os degraus desabaram, erguendo uma espessa nuvem de poeira.

Zath cambaleou alguns passos para trás, seu olho central esfumaçando pela alta temperatura.

Mas que diabos… esse cara está ainda mais forte do que da outra vez, sua energia parece aumentar exponencialmente quando usa essa foice.

Mirage puxou Zath com sua mão gelatinosa, esticando-a para afastá-lo da linha de frente.

— Fica um pouquinho no suporte, chefe. Você não é dos melhores combatentes, só fica spamando raios que eu faço o resto. Estou louca para mostrar um pouco de mágica para ele — explicou, enquanto sua armadura vermelha se regenerava, revelando ser feita do próprio líquido que constituía o corpo de Mirage.

Osíris apertou a foice negra com mais força, seus detalhes esverdeados reluzindo sob a fraca luz do subsolo. Com um movimento rápido e preciso, ele a girou em um arco amplo, espalhando a poeira que ainda flutuava no ar, formando um redemoinho silencioso ao seu redor.

Seus olhos âmbar fixaram-se intensamente em Zath e Mirage, sem emitir uma única palavra, mantendo o silêncio imponente que marcava sua presença desde o início do confronto.

Próximo ao combate dos três, Kaern mantinha-se alerta, vigiando Jasper, ainda imerso na própria mente. As linhas de sua couraça alternavam entre vermelho e amarelo, pulsando com tensão. O olhar do Bestial desviava ocasionalmente para as escadas, como se ponderasse entre ir ajudar o Ceifador ou permanecer ao lado do Vulto Negro, protegendo-o a todo custo.

— Fique aí, seu vira-lata. Ele disse que consegue lidar com esses caras, então não vamos nos intrometer. E, se por acaso ele morrer, não terei mais nenhuma dívida por ter sido salvo. — ordenou o Caçador de Ossos, guiado apenas por suas motivações egoístas.

É impressionante o quanto esse cara não tem amor à vida… Quanto mais Miasma você libera desse seu núcleo ferrado, mais perto da morte fica. Bem, nossas situações não são tão diferentes, então vire pó logo, Maverick.

Outro estrondo ecoou por todo o subsolo, indicando que o confronto só tendia a aumentar cada vez mais.