A criatura caminhava na direção de Íris, lenta, como quem saboreava o momento. Um sorriso torto — e absurdamente fora de lugar — se formou quando seus olhos cruzaram os dela, olhos carmesim que ardiam como fogo.

    — Olhos vermelhos, é? Hehehe… interessante… — comentou com uma voz gutural, monstruosa, demoníaca. Seus olhos começaram a brilhar como lâmpadas de LED, irradiando uma luz branca intensa, tão absurda quanto a própria aparência dele.

    Os ossos, que pareciam espinhos gigantes saindo do corpo, começaram a encolher, regredindo lentamente para dentro da pele pálida como cal, marcada por veias negras que pareciam se mover sob a carne.

    Íris, mesmo tremendo por dentro, se abaixou e pegou uma pedra grande ao lado do corpo de Bruno. Pensava consigo mesma, sentindo o coração martelar no peito:
    — O que é essa coisa…? É gigantesca, puro músculo… e o pior: pensa. É inteligente. Como se tivesse sido feita pra matar. Isso só pode ser um tipo de tanque infectado mutante…
    Droga… e agora? Corro e deixo o corpo do Bruno aqui? Mas lutar contra aquilo? Não tem como… aquilo foi feito pra matar.

    A criatura inclinou a cabeça, como se estivesse analisando.
    — Hm… seu corpo não sofreu grandes mudanças, mesmo com os olhos vermelhos… Você é algum tipo de alfa recém-nascido?

    Ele parou por um instante, os olhos brilhando, e então abriu um sorriso largo, cheio de emoção, ferocidade e loucura.
    — Isso não importa! Eu sou o alfa dos alfas… e o seu poder vai ser meu! Nem que eu precise arrancá-lo de dentro de você, pedaço por pedaço!

    Íris, vendo aquele tanque de guerra vindo correndo em sua direção, agarra Bruno — todo ensanguentado — pelo braço e o joga nas costas, sem perceber o quão estranhamente leve ele estava. Quando olha de volta para aquela coisa, ela já está tão perto que tudo que consegue fazer é se jogar para o lado, com Bruno nas costas, tentando desesperadamente desviar das mãos daquele terrível monstro.

    Ela consegue escapar por pouco, mas aquele demônio agarra Bruno pelos pés e o arranca das costas dela, arremessando-o para o outro lado da rua como se fosse apenas uma pedrinha no caminho. Antes que percebesse, a pedra que Íris tinha na mão acerta em cheio a cabeça do monstro, abrindo uma ferida profunda no local atingido. Ele, no entanto, sequer parece se importar. A ferida começa a se fechar quase instantaneamente, coberta por uma gosma negra que escorria onde deveria haver sangue.

    — Patético — comentou o mutante, como se zombasse dela.

    Em seguida, ele aponta o dedo indicador para Íris, como se estivesse mirando uma arma em sua direção. O som de algo explodindo ecoa, e a ponta do dedo da criatura se estoura — regenerando-se quase que imediatamente.

    Íris olha para baixo… e sua roupa começa a se manchar de sangue. Um pedaço de osso havia atravessado sua barriga, rasgando-a de um lado ao outro e deixando um buraco grotesco. Ela não conseguia reagir. O monstro, vendo o choque estampado no rosto dela, a agarra pelos cabelos e a ergue do chão com facilidade.

    — Agora que estou perto o suficiente… consigo ver através do seu cheiro que você não é quem eu procuro. Mas não importa… ainda assim, provarei da sua carne e do teu sangue, pequena ruiva — disse a criatura, usando a outra mão para prender os braços dela.

    Ele puxou seu cabelo para um lado e os braços para o outro, forçando-a a manter o pescoço exposto, pronto para a mordida.

    Íris, vendo aquela boca monstruosa se aproximar do seu pescoço, queria gritar. Mas sua voz não saía. A dor era absurda, e a falta de ar causada pelo buraco em seu estômago a deixava fraca, paralisada.

    Então ela é mordida.

    A dor é imediata, dilacerante, mas o que vem depois é ainda pior: algo pulsa dentro de Íris, como se uma energia estranha e violenta tivesse invadido suas veias, queimando tudo por onde passa. Seus músculos se contraem sozinhos, a visão embaça e um zumbido sinistro começa a tomar conta de sua mente — como uma sirene abafada gritando dentro do crânio.

    Era como se estivesse sendo possuída.

    A criatura crava os dentes monstruosos com voracidade, rasgando a carne de seu pescoço e puxando pedaços como um animal faminto. Ele mastiga diante dela, como se saboreasse cada centímetro, enquanto o sangue jorra em jatos, respingando no rosto dele e no chão como uma chuva quente e vermelha.

    Íris tenta gritar, tenta reagir, mas seu corpo não responde. Só consegue sentir… o calor. O calor e a escuridão. Algo dentro dela grita, mas não é sua voz. É outra coisa. Uma presença. Algo que se retorce por dentro, querendo sair.

    A criatura lambe os próprios lábios, saboreando o gosto.
    — Sinto o cheiro dele… se intensificando no ar… quase como se fosse a própria morte…

    E então, com um gesto de desprezo, ele joga o corpo de Íris para o lado como se fosse lixo.

    Começa a farejar o ar, olhos se estreitando, a respiração ficando mais pesada.

    — CADÊ VOCÊ, MALDITO?! — rugiu, com aquele gutural demoníaco que parecia fazer o chão vibrar.

    Naquele mesmo instante, um forte choque bateu em sua cabeça — como se fosse a descarga de um trovão descendo do topo do crânio até a espinha. A dor foi lancinante. O monstro, que até então acreditava ser imune à dor, começou a se debater de um lado para o outro, gritando e se contorcendo como se algo dentro dele tivesse sido rasgado à força.

    A carne no pescoço de Íris começou a se regenerar rapidamente, enquanto uma imagem turva surgia em sua mente — uma visão embaçada, distorcida… e então, uma voz trovejante gritou dentro de sua cabeça:

    — LEVANTE-SE E ACABE COM A RAÇA DELE!

    Ela abriu os olhos. A ferida já estava quase completamente curada, e veias negras, finas como raízes, se tornavam visíveis sob sua pele, partindo dos olhos e se espalhando discretamente pelo rosto.

    Íris se ergueu, cambaleante no início, mas com o olhar firme. À sua frente, a criatura parecia estar encolhendo, retornando lentamente à estatura de uma pessoa comum, ainda se contorcendo de dor. Um vento forte soprou contra ela, jogando seus cabelos ruivos para trás. Ela começou a caminhar, sem hesitar, como se nada mais importasse além de destruí-lo.

    A fera, agora em forma humana, ainda se recuperava, com a pele suada e o olhar confuso.

    — Meu corpo voltou ao normal! Como isso é possível? — questionou-se em voz alta, incrédulo, pois não sentira em momento algum sua força diminuindo.

    De repente, foi chutado com violência para o outro lado da rua. Levantou-se rápido — ileso — e, ao olhar para quem o atacou, arregalou os olhos ao ver Íris em pé, totalmente curada. Nem sinal do buraco na barriga, nem da mordida no pescoço.

    Ela correu para cima dele, tomada por uma fúria quase incontrolável. Começou a socá-lo com tudo que tinha, sem parar, golpe atrás de golpe, mas ele continuava sorrindo… como se estivesse se divertindo. Aquilo a enfurecia ainda mais. Ela socava e ele ria.

    Íris então se levantou, ofegante, saindo de cima dele, incrédula. Seus socos não estavam causando absolutamente nada.

    — Demorou pra perceber, né, piranha? — disse ele, agora com uma voz de pessoa comum, como se todo aquele horror anterior fosse apenas uma máscara.

    Ela o encarou, confusa, furiosa e frustrada.

    — Por que eu não consigo feri-lo?! Não é possível que eu seja tão fraca assim! — murmurou, revoltada consigo mesma, olhando fixamente para os olhos brancos dele.

    — Hm… você pode não ser uma alfa, mas tem a selvageria de um. Vou ser gentil com você, já que o seu sangue me ajudou a voltar à forma humana. O lance é que, pelo visto, só um alfa pode enfrentar outro alfa. Todos nós somos infectados de segunda geração… e, obviamente, você é da terceira. Por isso não tem força suficiente pra me matar. Conseguiu entender? — disse, se aproximando e passando a mão no rosto dela com desprezo.

    — O que você sabe sobre esse vírus? — perguntou Íris, o desafiando com um olhar cheio de ódio e vontade de matá-lo ali mesmo.

    — Não é da sua conta. Descubra você mesma. Afinal, até descobrir quem é seu alfa, eu não pretendo matá-la… porque agora eu quero ainda mais o poder dele — respondeu, dando as costas a ela como se nada tivesse acontecido, como se a luta não tivesse passado de um jogo.

    Íris o observou ir embora como se não fosse nada demais. Agachou-se, pegou uma pedra com raiva, pronta pra lançá-la contra ele, mas hesitou. Olhou para o lado e viu Bruno ainda caído no chão, todo machucado.

    “Que merda… vai se foder… é melhor eu deixar quieto, já que não posso com ele.” — pensou, largando a pedra que acabara de pegar.

    Abandonando a ideia de atacá-lo, Íris caminhou na direção de Bruno, ainda processando tudo que acabara de acontecer — e tudo que havia descoberto por meio daquele monstro. Quando se aproximou, olhou para o corpo do amigo. Ele não estava se regenerando. Estava… parado. Silencioso. E definitivamente não parecia nada bem.

    Ela olhou ao redor, procurando por abrigo — alguma casa, algum lugar onde pudessem se esconder e tentar sobreviver àquela noite que viria.

    Íris se ajoelhou ao lado de Bruno, ofegante, os olhos ainda ardendo com aquelas veias negras que pareciam se espalhar como raízes sob a pele.
    — Bruno… — sussurrou, tocando de leve o rosto dele, coberto de sangue seco e poeira.

    Ele não respondeu. O peito subia e descia de forma lenta, fraca. Quase imperceptível. O corpo dele continuava estranhamente leve, como se os ossos tivessem sido esvaziados por dentro.

    “Por que você não tá se regenerando como antes…? Não é possível que seja só isso.”

    Ela olhou ao redor, desesperada, e avistou uma casa mais adiante — janelas estouradas, porta escancarada, mas parecia deserta.

    Sem pensar muito, o ergueu nos braços com esforço. A cada passo, sentia o sangue quente dele escorrendo por seus braços, e a dor do próprio corpo tentando se adaptar ao que estava se tornando.

    No meio do caminho, uma fisgada no peito a fez parar. Caiu de joelhos por um segundo.
    “Droga… não agora…”

    O ar ficou denso. Por um instante, ela ouviu — de novo — aquela voz dentro da cabeça.
    “Sangue… Sangue…”

    Ela arregalou os olhos, engoliu seco, e se levantou com Bruno nos braços. Um filete de sangue escorria de seu nariz agora. A mutação estava acelerando. Não sabia o que estava virando, mas sabia que se ficasse ali parada, Bruno morreria.

    Entrou na casa, chutando a porta com o pé. O interior fedia a mofo, sangue velho e abandono. Mas servia.

    Deitou Bruno no chão, apoiando sua cabeça numa almofada suja qualquer.
    — Aguenta, por favor… eu não sei o que tá acontecendo contigo, mas você não vai morrer aqui. Eu não vou deixar…

    Os olhos dele tremularam, e um leve ruído escapou de sua boca. Íris se abaixou ainda mais.

    — Fala comigo, caralho! Você é o porra do Bruno Mohammad, não vai morrer por causa de um desgraçado daqueles! Mas o que ela não percebeu, enquanto gritava com ele, era o que estava crescendo por dentro. As veias negras subiam agora por seu pescoço. E seus olhos… não estavam mais só carmesim. Começavam a brilhar de dentro pra fora.

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