Capítulo 168 — Primeira Semana: Moris Ziziel (5)

O apito de Moris gritou para anunciar que a bola saiu de campo.

Por uma pequena diferença, Theo chutou a nexus para fora sem perceber.

O general travou quando percebeu o erro.

“Eu… Perdi a noção de espaço?” Estava literalmente paralisado com o erro.

Pela primeira vez, o vento alterou sua percepção.

Theo ajudou Bastien e se levantar e saiu da área inferior, dando espaço para o time B reiniciar a partida.

— Ei, Theo! — exclamou Artur. — Foi um bom lance, relaxa.

— Foi mal — respondeu cabisbaixo, mas, focado na partida.

Zemynder jogou a bola nos pés de Bastien, que analisou cautelosamente a área e passou para Jack, no centro.

Glaciel arrastou a bola para a lateral direita de seu time, dando espaço para Zypher dominar o centro e avançar para o ataque. Vendo seu companheiro avançar, Jack se livrou de Artur com um drible ágil e passou para Bastien: rapidamente, ele lançou a nexus para a zona inimiga.

Zypher tentou confiar que a bola passaria de Kyle, porém, este saltou para cima com uma impulsão estupida e recuou a bola com uma cabeçada.

A nexus sobrou no meio de campo, livre de todos os atletas. Portanto, Bastien arrancou e, com um brilho intenso nos olhos, esticou os braços para lados opostos e apoiou-se com a perna esquerda, preparando um chute poderoso com a direita.

Uma névoa cinza escapou dos dedos e seguiu os olhos. O orbe no centro da nexus brilhou intensamente em branco.

— Se joga! — exclamou Artur, encorajando Theo.

O general engoliu em seco. Mas, como era o único perto de Bastien, ele tomou consciência e interveio no ataque: deslizando pelo chão, Theo bloqueou o caminho da bola com o corpo.

A nexus novamente voou por cima de suas cabeças.

Desta vez, ela caiu nos pés de Artur, que conseguiu dominar e carregá-la pela lateral enquanto duelava fisicamente com Jack.

“Droga… Eles não vão conseguir se livrar da defesa.” pensou Artur, tocando levemente na bola. “E esse cara… Ele me dá um frio na barriga! Não estou conseguindo duelar com ele!”

Medo.

Aquele sentimento causava desconforto em Artur, pois ele odiava se sentir imponente e inseguro. Por isso estava sempre lidando de frente com seus medos…

Para lidar com esse medo, ele lançou a bola pela linha lateral e correu para pegar. Por ser de estatura padrão e muito magro, Artur conseguiu vencer Jack na corrida, mas foi logo alcançado.

O limite do campo já estava acabando, logo, a única alternativa foi driblar Glaciel e arriscar um chute.

Tocando com o calcanhar fazendo a bola voltar para trás, ele novamente usou sua ignição e conseguiu se livrar do puxão de Jack.

Livre de qualquer marcador, estava apenas Artur e Zemynder na jogada.

Dando dois toques leves para conseguir chutar a bola onde desejava, Artur arriscou com um chute técnico e preciso no canto superior das traves.

Mas, para a sua infelicidade, o carrasco de Alsu conseguiu defender e jogar a bola para os pés de Bastien.

— Está um jogo de contra-ataque… — comentou Carl.

— Espero que marquem logo. Seguir nesse ritmo vai ser enjoativo — disse Nora.

Jeanne começou a tremer a perna. Ela costumava assistir a jogos profissionais, mas não conseguia se aquietar com uma simples partida de amigos.

Correndo com a bola pelo meio de campo, Bastien conseguiu se livrar parcialmente de Theo e abrir espaço contra Kyle. Era praticamente ele contra o Titã Javier.

“Não posso morrer…” pensou.

Perder é morrer, em todos os sentidos na vida de Bastien.

Seja em um esporte ou lutas de verdade… 

Aquele seu espirito é a única coisa que o difere. Um espirito que não aceita derrotas, não aceita a morte, pois está sempre com ela.

Um homem que viveu com a perca, mas que entendeu sua coroa e nunca mais soltou…

Um campeão.

A névoa turva que cobria Bastien por vezes, se tornou uma sombra imensurável. Como uma caveira da morte tomando o chão; um túnel do submundo abriu o caminho para seu objetivo.

Seus olhos dançaram em vibração, era o ápice da adrenalina.

O orbe brilhou intensamente em branco e lançado, junto da nexus, em direção as traves.

Javier ficou, por um instante, admirado com a sensação da aura de Bastien.

Ele nunca havia sentido uma sensação tão fervorosa e monstruosa de alguém tão inferior a si. Aquilo fez com que o Titã não se movesse e deixasse a nexus tocar a rede.

Moris apitou.

— Ponto para o time B!

[Placar 03:27]

Time A 0 × 1 Time B

                     Bastien {C}

O placar próximo à arquibancada foi alterado pela primeira vez.

Sem comemorar, todo o time B retornou para a zona.

Javier saiu do estado de transe assim que escutou o apito de Moris, então recuperou a bola e tocou para Artur.

Theo, posicionado na lateral direita, tentou abrir espaço recuando para sua zona.

“Após marcar pontos, não precisamos reiniciar a partida. Podemos continuar normalmente.” Theo pensou dominando a bola após um passe de Kyle. “Eles querem nos treinar a contra-atacar rapidamente, sem deixar ser dominado.”

Theo associou a levar um ponto com perder um colega no campo de guerra; em tese, seria o mesmo que estar perdendo. Não iria ter tempo para chorar na guerra, então, não deveria sentir o peso daquele ponto.

Eles teriam que correr para igualar e sobressair.

Mantendo a posse, o general controlou a bola pela lateral enquanto carregava a linha de defesa do time. Kyle manteve-se afastado, embora centrado.

“Tenho que limpar o caminho…” Os olhos de Theo brilharam na mais pura cor de âmbar.

Fingindo avançar pelo meio do campo, ele desequilibrou Bastien e retornou para correr pela lateral.

Apoiando-se perfeitamente com o pé esquerdo, Theo deu um leve chute diagonal e com efeito na curva da bola, com uma precisão imensa.

Correndo para a linha esquerda do campo, Artur e Jack mantiveram a cabeça para cima, acompanhando o efeito e movimento da nexus.

“A arte de copiar, mas fazer certo…” pensou Artur, parando meio metro antes da linha branca e colocando força nas costas para Jack não alcançar.

A bola estava caindo exatamente em seu pé direito.

Impedindo seu marcador de roubar a bola, Artur deu um toque suave com a lateral do pé e jogou a nexus para trás novamente.

Ele tentou correr por debaixo do braço de Jack novamente, mas, dessa vez, sua técnica não foi eficaz com o iceberg humano.

Deslocando praticamente centímetros, Artur não notou sua perna travada na canela de Jack. Portanto, aproveitando o desequilíbrio do oponente, Glaciel deu um leve empurrão no ombro de Artur e puxou a perna travada para trás.

Artur caiu no chão e girou pela grama.

Moris parou o jogo e se dirigiu até o lugar da penalidade.

“Qual foi…” pensou Artur, tentando se levantar.

Porém, Jack o pegou pela cintura e levantou o jovem.

— Foi mal. Não queria ser desvalorizado assim — disse Jack, sorrindo.

Artur sorriu e bagunçou o cabelo de Glaciel.

— Relaxe. — Ele retrucou.

Moris parou a nexus no local da queda e, posteriormente, contou três passos largos.

— Atletas da barreira, por favor — chamou Moris.

— Jack, Zypher, na barreira — ordenou Zemynder. — Bastien, continue o que está fazendo.

Kyle e Artur ficaram no local da penalidade, ofegantes e esperando a barreira ser adequadamente ajustada. Theo foi o único distante, preparado para avançar caso a bola sobre para ele, mas, voltando suas forças para um contra-ataque.

Artur arrumou a meia longa em sua perna.

— Eu cobro? — Kyle perguntou passando a mão no rosto.

— Pode ser.

— Aham.

O seguidor de Surya engoliu em seco e suspirou olhando para o posicionamento de Zemynder.

“Ele está posicionado perfeitamente para defender em qualquer um dos ângulos superiores…” pensou Kyle. “Eu teria que aplicar muito efeito para cobrir o corpo dele. Se eu conseguisse fazer a bola dar uma curva na barreira, indo por dentro e voltar para o lado esquerdo… Não, calma. Nem sou um profissional.”

Artur olhou para a bola e analisou a barreira.

“Ele também tentou algo novo contra o Carl, sendo um tenente da Primeira Legião. Na época, ele era só um membro da trupe.”

Artur se lembrou do treinamento que teve com Theo, e as habilidades que o Jovem Mestre Lawrence se dispôs a testar no calor do momento.

Mas, “a época” que Artur se referiu, foi há, somente, alguns dias.

“Minha percepção de tempo é completamente distorta quando penso naquele dia…” Ele suspirou. “Tô nem aí. Se ele pode tentar algo, por que eu não posso também? Eu quero saber o que difere um talentoso de um gênio.”

Moris soprou o apito, dando permissão para a cobrança de falta.

Artur notou Zemynder um pouco direcionado para o canto direito do gol, então mudou de ideia.

Ele não deixou Kyle cobrar: Artur roubou a cobrança para si.

Pegando até o próprio Kyle de surpresa, Artur chutou a bola… Porém, testando um novo alcance de sua técnica.

Expandindo o domínio de sua habilidade pelo corpo da nexus, Artur foi capaz de, sem necessariamente aplicar energia, encantar a bola com seu próprio poder.

O efeito de ilusão, que se aplica aos sentidos, fora aplicado diretamente na bola. Ela voou, aos olhos de terceiros, baixo de mais para um lançamento aéreo no esporte.

Jack e Zypher interceptaram facilmente com um pulo, onde a nexus se chocou com a cabeça de Glaciel.

Contudo…

No instante em que entrou em contato com Jack, a bola se desmanchou numa aura de areia.

“Quê?!” pensou Jack.

A nexus, portanto, passou por debaixo da barreira e foi rumo ao canto da trave.

“Não preciso de mana para ser incrível!” pensou Artur, com os olhos fervendo ao marcar aquele ponto.

Zemynder ficou apenas paralisado.

“Mas, que porra…” pensou o carrasco.

[Placar 04:53]

Time A 1 × 1 Time B

Artur             Bastien {C}

Porém, antes de tentar entender, ele recuperou a bola e viu a zona do time A vulnerável. Kyle e Artur estavam um pouco longe, ao mesmo tempo que Jack e Zypher já corriam para o meio do campo.

Todavia, Bastien era a verdadeira chave.

O capitão do time B já havia se livrado de Theo e ficado livre pela lateral, correndo rumo à área adversária. Zemynder lançou a nexus e confiou no capitão.

O lançamento foi perfeito, sendo necessário apenas um toque de Bastien para posicionar a bola na direção que ele queria.

Novamente motivado, Bastien desferiu um chute preciso e poderoso. Entretanto, Theo surgiu junto ao vento, silenciosamente, e jogou o pé direito na trajetória da bola.

A alma da morte e do destroyer se colidiram; como uma névoa cinza e pálida lutando com o mais forte dos ventos, o mais frio, banhado pelo brilho refletido na lua.

Ainda assim, havia uma montanha de gelo preparada para usufruir dos restos.

Com a bola sobrando na lateral de Jack, o agente desferiu um chute tão poderoso que sentiu a camada externa da nexus afundar, e seu pé tocar o orbe no centro.

A bola se moveu como um projétil tão rápido quanto um piscar de olhos.

Mas, Javier já havia falhado ao tomar um gol de Bastien. Por isso ele manteve a calma, mesmo diante ao frio emanado pelos espinhos de gelo em sua frente.

O Titã, portanto, fechou o punho e defendeu aquele chute estrondoso com um pulso.

A nexus rebateu e caiu nos pés de Artur, que facilmente driblou Zypher e correu pela lateral. Vendo Kyle sozinho no centro do campo, ele lançou para seu companheiro.

Um halo de chamas tomou os pés de Kyle enquanto este esperava a bola chegar. Ele sabia que Artur não erraria o passe, então, se preparou.

“É assim que se faz, mulas!” pensou no ápice da adrenalina.

Com um chute estrondoso, sem deixar que a bola tocasse o chão, Kyle a fez flutuar pelo gramado e logo subir em direção à trave superior.

Zemynder saltou para defender, mas a nexus foi ainda mais alto; brilhando no branco mais intenso, a bola bateu na trave superior e rebateu nas costas do carrasco.

[Placar: 05:13]

[Time A] 2 × 1 [Time B]

Artur             Bastien {C}

Kyle