Capítulo XIII - Caverna
Jiahao e eu caminhávamos pela mata. Ele permanecia com o rosto fechado e sério, não havia comentado mais nada, somente me dava orientações de como me mover pela trilha na floresta. Eu estava bem satisfeito, o meu café da manhã havia sido ótimo, então em estava bem-disposto para caminhar pela floresta.
Paramos em frente a uma caverna, a entrada repleta de musgo, e alguns ossos de animais espalhados pela entrada. Havia uma placa escondida entre a vegetação, com os ideogramas ilegíveis para mim.
— Onde estamos? — questionei, o local me trazia uma estranha sensação. Não era agradável, eram como se mil olhos me encarassem, e suas mãos tentassem me agarrar e me sufocar para o interior da caverna.
Jiahao colocou a mão no queixo, e encarou a placa com um sorriso malicioso.
— Bem, antigamente, cultivadores independentes vinham até essa caverna, para descobrir se estavam realmente prontos para ascender para o segundo reino.
— E o que eu tenho que fazer?
— Não se preocupe, apenas entre pela caverna, e atravesse a montanha. Existe uma saída do outro lado.
— Parece fácil demais. Então qual é a pegadinha?
— Você é esperto. — O sorriso dele se ampliou. — Mas eu não tenho essas respostas, Thomas. Isso é algo que terá que descobrir sozinho.
Suspirei, dando um leve estalo no pescoço. Não era como se eu tivesse outra escolha, de qualquer forma. Ajustei a alça da mochila e caminhei até a entrada.
— Não vai levar uma tocha? — Jiahao me interrompeu. — A caverna é escura. Muito escura. Você pode se perder.
— Não preciso. Tenho os meus próprios truques.
Entrei na caverna, a escuridão aos poucos tomou conta da minha visão. E o cheiro do musgo e de grama molhada começou a mudar para o característico cheiro de fezes de morcego.
Cobri o nariz com a mão, e peguei uma carta do baralho.
— O mágico! — proclamei, e uma mascará de gás surgia em minha mão.
Coloquei a máscara, e girei a carta novamente, e uma lanterna a bateria apareceu na minha outra mão.
Agora, sim, eu estava pronto.
Apontei a luz para o teto da câmara e encontrei uma colônia de morcegos pendurada acima de mim, agitada pela intrusão. Os ignorei, e segui em frente, atento para não escorregar ou me sujar. A máscara foi minha salvação, o chão estava coberto por uma espessa camada de guano, e bastaria uma respiração descuidada para inalar esporos perigosos. Uma infecção fúngica era o mínimo que poderia acontecer ali dentro.
Caminhei por longos minutos em silêncio, até que algo inesperado me chamou a atenção: uma luz à distância, tênue, mas constante, no final do túnel. Parecia a saída da caverna.
Hesitei por um momento.
Não podia ter sido tão fácil.
Desliguei a lanterna, agora inútil diante do brilho crescente à frente. A claridade aumentava, passo a passo. Ao sair do túnel, me deparei com algo inesperado: uma passagem oculta dentro da montanha, que reveleva uma paisagem esquecida pelo tempo.
Diante de mim, estendia-se uma vila abandonada. As casas de pedra, cobertas por musgo e raízes, estavam, na sua maior parte, desmoronadas. Em um dos cantos, destacava-se um templo antigo, a única construção que parecia intacta. No topo, uma gigantesca cabeça de dragão esculpida na rocha da montanha jorrava uma água esverdeada pela boca, e formava uma pequena cascata que caía sobre um lago circular à frente do santuário.
— O mágico! — proclamei, e tanto a lanterna como a máscara desapareceram no ar.
Caminhei, atento para qualquer perigo.
O lugar parecia abandonado há décadas. Lanças partidas e espadas enferrujadas jaziam espalhadas pelo chão, enfiadas entre rachaduras e pedras. Algumas casas estavam destruídas por completo, seus telhados desabados e paredes parcialmente consumidas por raízes.
— O que acha? — questionei para Lefkó.
Ela saiu da mochila, e subiu pela minha perna, até se aconchegar em volta do meu pescoço.
— Consegue sentir algo? — perguntei, ao dar um pequeno afago na sua cabeça.
— O Qi presente aqui é muito forte, mas, ao mesmo tempo, muito fraco.
— Não entendi, explique.
— Naturalmente, era para o Qi fluir por esse vale, mas tem alguma coisa se alimentando dele.
— Defina alguma coisa. — As palavras dela não me convenciam por completo, havia algo a mais naquelas palavras.
— Uma besta espiritual…
— Legal… — murmurei.
Adentrei a vila com cautela, atento a qualquer movimento suspeito. A cada passo, um arrepio subia pela minha espinha. Sentia olhares nas sombras, como se algo me observasse de cada esquina, silencioso. Tentei me convencer de que era apenas imaginação, mas a sensação persistia.
Cheguei à base da escadaria que levava ao templo. Hesitei. O ar ali parecia mais pesado, quase sólido. Lefkó, percebendo minha inquietação, murmurou junto ao meu ouvido:
— A saída está no templo.
— Como assim?
— A passagem para o outro lado da montanha. Está lá dentro. Teremos que atravessar o templo. Para completar o teste de Jiahao é necessário entrar no templo.
Aquilo não me trouxe nenhum alívio. Pelo contrário. Todavia, eu não tinha escolha. Reuni a coragem e comecei a subir. À medida que avançava, os sinais de uma antiga batalha tornavam-se mais evidentes: armaduras partidas, lanças cravadas no solo, mantos rotos presos às pedras.
No topo, uma enorme porta de pedra me aguardava. Seu centro era marcado por uma fechadura circular, pulsante, feita de uma luz branca. Na pedra, vários ideogramas rudimentares, feitos provavelmente com lâminas.
Aproximei-me e toquei a superfície brilhante com a ponta dos dedos.
Imediatamente, um calor intenso percorreu minha mão, e me forçou a recuar.
— É um selo de Qi — explicou Lefkó, séria. — Você não será capaz de abrir.
— Explique. — Cruzei os braços, e a encarei nos meus ombros.
— Foi feito para impedir o acesso por dentro. Me parece um selo de ato único. Quando for ativado, a porta se abrirá por alguns instantes, tempo suficiente para alguém entrar. Depois disso, se fechará novamente e só poderá ser aberta do lado de fora.
— Em outras palavras — conclui, a mão na cabeça, preocupado. — Uma vez lá dentro, estarei trancado.
Ela assentiu com a cabeça.
— Mas como vou entrar? Como se quebra um selo de Qi? — questionei, afinal, eu ainda teria que concluir o teste.
— A maioria delas envolve um cultivador com grande controle de Qi.
Cocei o queixo. Controle de Qi era algo que eu não tinha.
— E quanto a você? Você não consegue usar o Qi?
— Consigo senti-lo, não o usar — respondeu um tanto irritada pela minha pergunta. — São duas coisas diferentes.
— Nem a sua forma humana? — questionei com um sorriso sarcástico.
— Sabe que estou proibida pelo conselho de usá-la! — Ela apertou meu pescoço. — Não zombe de mim!
Fiquei em silêncio por um momento. Pensava em como iria quebrar aquela barreira, parecia não haver muitas opções.
— Que tal pólvora? — Foi o meu primeiro pensamento.
— Vai explodir essa porta? Ela está selada por algum motivo! Não é nada prudente! — reclamou ela com um novo aperto.
— Chata, uma explosão contida não faz mal a ninguém. — Suspirei, e tentei pensar em uma outra alternativa. — Será que a Torre vai funcionar nessa porta?
Retirei a carta do baralho.
A ilustração mostrava uma imponente torre medieval, erguida em meio a uma tempestade violenta. No topo, duas baterias antiaéreas rugiam contra o céu, disparando contra bombardeiros que cruzavam as nuvens iluminadas por explosões. Relâmpagos cortavam o horizonte.
— A Torre! — proclamei enquanto colocava minha mão sobre o selo.
Desta vez, não houve calor. A porta começou a brilhar intensamente até se dissolver em pura luz. Atravessei para o interior do salão e, ao olhar para trás, conseguia ver a vila abandonada atrás de mim, a porta havia sumido por completo.
Invoquei novamente a lanterna a bateria e me preparei para explorar o templo.
Ao trocar a carta da Torre pela carta do Mágico, a porta reapareceu. Agora eu estava trancado naquela construção.
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