Capítulo 223 - Reunião de negócios
Três meses haviam se passado desde que o mundo começara a mudar — lenta e perigosamente. O Japão, que antes se mantinha como um dos pilares da civilização e segurança no continente asiático, agora parecia caminhar rumo a um abismo irreversível. Gangues tomavam bairros inteiros, alianças obscuras surgiam nas sombras e rumores de uma guerra urbana iminente ganhavam corpo.
No centro de tudo isso, Charles, com sua influência internacional e recursos praticamente ilimitados, movia suas peças no tabuleiro. Ninguém sabia exatamente o que ele planejava — apenas que seria grande o bastante para mudar tudo.
Enzo, com o olhar de quem já viu mais batalhas do que qualquer um gostaria, não hesitou: “Se esse caos vai engolir o mundo, ao menos que eu esteja de pé quando acontecer.” Ele reuniu sua força. A Unidade Águia Prata voltou a ser ativada após anos, Thomas foi trazido de volta do exílio e, entre todas as estratégias possíveis, uma ganhou forma.
Wallace.
A aposta mais inesperada de Enzo.
O garoto de olhar quieto e alma instável. Aquele que por muito tempo fora apenas um rosto apagado na multidão. Agora, ele era mais que um nome — era uma chama silenciosa.
…
A estrutura era imponente, construída entre penhascos e cercada por uma floresta densa. O som constante de cachoeiras, o vento cortante que soprava entre as árvores e o cheiro forte de pinho tornavam o local quase meditativo… quase.
Dentro do centro de treinamento, explosões sutis podiam ser ouvidas, intercaladas com gritos e sons metálicos.
— DE NOVO! — Thomas rugia, como um general impiedoso.
Wallace arfava, suado, com hematomas no rosto e a camiseta rasgada em diversos pontos. Mesmo exausto, ele levantava-se sem reclamar.
— Você ainda está hesitando no segundo golpe. Se fosse contra alguém do calibre de Charles, você estaria morto. — Thomas girou sua arma e apontou para ele. — Outra vez, com tudo.
Wallace fechou os olhos por um breve segundo.
“Eu não posso morrer. Não ainda. Tenho que protegê-la… Tenho que proteger a Viviane.”
Quando abriu os olhos, havia algo diferente. Não era só determinação — era foco. Como se, pela primeira vez, Wallace tivesse se visto verdadeiramente.
Ele avançou.
Rápido.
Preciso.
Um chute frontal, seguido por uma torção do quadril, girando o corpo em um golpe lateral de cotovelo que forçou Thomas a recuar meio passo.
— Isso… — Thomas sorriu. — Isso é o que eu quero ver.
Durante as semanas seguintes, Wallace se transformou. Ele parava de hesitar. Começou a antecipar os movimentos do oponente, compreender padrões, prever aberturas. Não era apenas técnica. Era instinto.
Thomas, certo dia, o encarou sob a luz alaranjada do entardecer.
— Você sabe o que você é, Wallace?
— Um guarda-costas?
— Errado. Você é um gênio. — Thomas disse isso como se estivesse revelando uma verdade escondida do mundo. — Um verdadeiro talento bruto para o combate. Seus reflexos, seu senso de tempo, a forma como seu corpo se adapta à pressão… Você nasceu para isso.
Wallace arregalou os olhos. Nunca ninguém o tinha chamado assim. Nunca ninguém tinha acreditado nele de verdade. Pela primeira vez, ele sentiu que tinha um propósito — algo maior do que apenas sobreviver.
Quinze dias depois
Viviane caminhava apressada por um dos corredores luxuosos da sede da empresa de seu pai. Mesmo em meio ao caos externo, a alta sociedade mantinha seus rituais: trajes caros, festas veladas, segredos sussurrados atrás de portas reforçadas.
Ela entrava em um elevador espelhado quando ouviu uma voz familiar:
— Espera aí. — Wallace segurou a porta.
Viviane virou-se e sorriu, surpresa e aliviada. Seus olhos analisaram Wallace de cima a baixo. Ele estava diferente. Mais firme. O olhar mais afiado, a postura mais ereta, a energia ao seu redor… mais intensa.
— Você voltou. — disse ela, com uma expressão quase doce.
— Cumpri o treinamento. Agora posso te proteger de verdade.
Ela cruzou os braços, fingindo desdém.
— Eu sempre achei que você era só mais um valentão com sorte. Mas… você parece outro.
— Não sou mais só um guarda-costas. — Ele deu um passo à frente, encarando-a nos olhos. — Agora, sou seu escudo.
Viviane sentiu uma leve ardência no rosto. Corou. Mas disfarçou rapidamente.
— Hmph… Veremos.
À noite, Viviane voltava aos encontros secretos. Negócios com os detentores da Íris-9, reuniões com bilionários, corruptos e traficantes de influência. Era um jogo perigoso — onde até o menor erro podia ser fatal.
Wallace a acompanhava de perto, sempre em silêncio, sempre atento.
Num dos encontros, um dos empresários se aproximou demais de Viviane, tentando flertar com um sorriso forçado.
— Senhor, mantenha distância. — Wallace disse, sem alterar o tom de voz.
— Você sabe com quem está falando, moleque?
— Não me importa. — O olhar de Wallace era frio como aço. — Se der mais um passo, vou quebrar seu nariz em dois movimentos.
O empresário riu, mas recuou. E pela primeira vez, Viviane se sentiu… segura.
Mais tarde, sozinha com Wallace na cobertura do hotel, ela quebrou o silêncio.
— Você não é mais o mesmo. E isso me assusta um pouco.
— Você quer que eu volte a ser fraco?
— Não. — Ela olhou para ele com sinceridade. — Só não quero que você se perca nessa guerra.
Wallace olhou para o céu, onde nuvens encobriam a lua cheia.
— Eu me encontrei nela.
O vento soprava forte. Yoru, com os olhos fixos nas luzes da cidade, murmurava para si mesmo:
— Tudo está praticamente pronto agora…
Ele fechou os punhos, encarando o horizonte.
— Charles, está na hora da verdade. Vamos te expor para o mundo inteiro
E então sorriu. Um sorriso que misturava dor, esperança e fúria.
— O caos pode vir. Mas nós… vamos recebê-lo de pé.
Quinta-feira – Três Dias Antes
Enzo estava encostado à janela de seu escritório no 18º andar de um prédio comercial desativado no centro de Kiyokabe. Lá de cima, a cidade parecia um organismo doente — pulsações de luz e sirenes, fumaça subindo de becos longínquos, e gritos abafados que se perdiam no caos noturno. Nada mais surpreendia. Nem a decadência, nem a violência. Mas algo naquela noite o fez cerrar os punhos.
— Ele vem. — disse Enzo, virando-se para Thomas, que mantinha os braços cruzados à sombra.
— Tem certeza disso?
— Fontes confiáveis. Sábado, à noite. O pai da Viviane, vai desembarcar em solo japonês pela primeira vez em sete anos.
Thomas arqueou a sobrancelha.
— E qual o objetivo dele?
— Reatar as negociações com o Charles. Falam de um novo pacto global envolvendo a Íris-9 e uma nova linha de biotecnologia psíquica. Isso pode dar poder absoluto ao Charles. Literalmente.
O silêncio pairou denso.
Enzo respirou fundo e pegou o telefone.
— Chame o Wallace.
…
O corredor era iluminado com luzes frias. Wallace caminhava lado a lado com Thomas, ainda em traje tático, suando após uma sessão intensa de combate. Quando viu Enzo à frente da sala de reunião, seus olhos se estreitaram.
— Você me chamou?
Enzo, de pé diante da mesa de comando holográfica, o observou por um momento antes de responder:
— Wallace, uma missão de alta prioridade surgiu. Você vai proteger o pai da Viviane. Ele estará no hotel Shinkai Garden Palace, sábado, à noite. Sua presença vai ser notada, e Charles também estará no local.
Wallace engoliu seco.
— Charles vai estar lá?
— Sim. — Enzo inclinou-se para a frente. — Mas você não estará lá apenas para proteger. Você estará lá para abrir o caminho.
— Caminho?
— Uma brecha. Uma fração de segundos. É tudo que preciso. — O olhar de Enzo era cortante. — A presença de Charles em solo japonês será uma janela que talvez nunca mais se abra. Ele se sente intocável… Quero ver se ele sobrevive à realidade.
Wallace não hesitou.
— Entendido. Eu vou garantir essa abertura.
Sábado – 19h47 – Hotel Shinkai Garden Palace
O céu estava encoberto. A cidade parecia segurar a respiração. Limusines enfileiravam-se diante da entrada do luxuoso hotel de 42 andares, onde os ricos se reuniam para negócios secretos. Homens engravatados, seguranças discretamente armados, recepcionistas sorridentes demais para um evento comum.
E finalmente, o pai da Viviane chegou cercado de guarda-costas europeus, todos usando fones e ternos pretos. O ar ao redor dele era de controle absoluto.
Viviane, ao seu lado, exibia um vestido preto com detalhes prateados e olhos indecifráveis. Mas ao avistar Wallace à porta da recepção, seu semblante se suavizou.
— Você veio. — ela disse em tom quase silencioso.
— Claro. Eu disse que te protegeria. Isso inclui seu pai.
Ele lançou um olhar avaliador a Wallace.
— Você é o famoso guarda-costas de minha filha?
— Sim, senhor. Wallace.
— Espero que seja competente. Os inimigos do meu legado não têm escrúpulos.
Wallace assentiu. Mas seus olhos estavam atentos aos detalhes: os refletores externos, as câmeras ocultas nos vasos, o padrão de movimentação dos seguranças do hotel.
Algo estava errado. Ele sentia.
21h02 – Terraço do Hotel – Reunião com Charles
O pai da Viviane foi escoltado até o 42º andar. Wallace manteve-se dois passos atrás. O salão do terraço era digno de filmes: cortinas brancas balançando ao vento, lustres de cristal sobre sofás modernos, garçons discretos com taças de champanhe e um piano tocando ao fundo.
Charles já estava lá. Terno branco, gravata vermelha, um sorriso de quem sabia que o mundo girava ao seu redor.
— Olha só… — disse ele, abrindo os braços.
— Charles. — respondeu o magnata europeu, mais frio. — Vamos ao que interessa.
Eles sentaram-se, rodeados por figurões estrangeiros, espiões e conselheiros. Wallace manteve-se próximo de Viviane, que assistia tudo em silêncio, inquieta.
— E como vão as coisas na china? Creio que você esteja muito melhor que antes… — o Charles disse botando um pouco de vinho na taça e oferecendo a ele
— As coisas estão como sempre foram, boas, os números altos e as vendas, maiores ainda, desde que comecei a fazer a Íris-9, meus lucros foram muito altos, muitos líderes de gangues me procuraram para ter essa bendita droga
— Posso pedir para vocês dois saírem um instante? — o Charles disse olhando bem no fundo do olho do Wallace, o mesmo sentiu um pavor descomunal, e sem dizer um “a”, foi embora
“Como esse homem tem essa presença tão amedrontadora?”
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