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    Juno girava a cabeça de um lado para o outro. A quantidade de gente ao seu redor, a expedição para tirar o hospital de um Lagmorato, já era esperado. Mas, ela procurava por outra pessoa. Heian e Marcus conversavam mais afastados, Leonardo e alguns dos novos combatentes, até mesmo Arsena e Magrot tinham se juntado.

    Mas, ela não via Dante. Esperava que ele estivesse ali para lhe dar boa sorte ou algo do gênero. Onde ele tinha se metido?

    — Não crie expectativas — disse Meliah ao se aproximar ajustando a capa sobre o ombro. — Degol colocou Dante para fazer ronda ao sul já que nós vamos ficar fora.

    — Por que? — Sua voz saiu meio falhada. Esperava ele ali para… ela parou por um segundo. Por que estou esperando ele?

    A voz de Veronica soou em sua mente, calejada e fria.

    — Deveria parar de querer a aprovação daquele velhote toda vez que vai fazer alguma coisa audaciosa. Nós estávamos sem ele antes, e faziamos o trabalho sujo. Agora, você é mais forte do que ele, mais forte do que qualquer um aqui. Confie no que treinou, nas batalhas e na experiência.

    Ela respirou fundo. Não queria deixar seu mestre para trás por motivos mesquinhos como soberba. Queria aprender mais e mais com ele, mas desde seu retorno, desde que o Rastro tinha sido destroçado por ela, as mudanças foram significativas.

    Dante não era mais poderoso ou forte como antes. Até mesmo a vitalidade que ele parecia ter tinha sido tomada por um ritmo mais baixo, apenas fazendo pequenas rondas e instruindo os demais em treinamentos técnicos.

    O alerta de Veronica não era somente palavras para libertá-la. Correntes e gaiolas, retiradas de si, abrem o caminho.

    — Juno — Meliah esticou a mão, tentando confortá-la. — Dante não tem mais o mesmo ritmo que antes. Então, vai ficar a critério de Leonardo sobre como vamos fazer. Você precisa saber que nós treinamos muito para hoje, então confie em nós.

    — Eu confio.

    Leonardo deixou sua esposa de lado, e deu um beijo em sua filha. Seguiu para o meio do grupo, deixando as vozes diminuírem até que somente o respirar deles fosse a única coisa que unia o grupo.

    — Todo dia quando nós acordamos, temos o sonho de não termos mais medo. — Leonardo girou o rosto, encarando-os com simplicidade. — Hoje, nosso sonho fica mais próximo porque estamos preparados. Estamos fazendo isso por tanto tempo que sabemos o que pode ou não acontecer. Quem estará ou não lá. Por isso não podemos cometer erros. O Hospital é um dos maiores edifícios da cidade, e cheio de suprimentos, planos, máquinas. Lá, está o que Simone esperava de nós. Está um pouco do sonho de não ter medo, um pouco do sonho de poder sorrir sem lembrar que somos caçados. Trabalhamos nessa cidade por tempo demais para deixar que as pessoas que nos esperam fiquem ansiosas. Usem o fruto desse mesmo trabalho, hoje, para darmos um pouco de luz na escuridão de Kappz. Não quero gritos de batalha, nem sorrisos ou berros quando derrotarem um inimigo, quero a seriedade. A mesma seriedade que temos quando enfrentamos o monstro que vive bem debaixo do nosso teto.

    O silêncio deixado por ele fez com que as bocas e olhos se estreitassem. Leonardo tinha a certeza de que eles sabiam da verdade, do motivo de serem confiantes.

    — Sete meses atrás — continuou —, enfrentamos uma criatura que beirava o rídiculo. Vencemos por termos a sorte e também o preparo ao nosso lado. Mas quase perdemos pessoas queridas. Faremos diferente dessa vez, para honrar o que e quem nos trouxe até aqui.

    Não houve resposta. Juno compreendia mais do que qualquer um o que significava a honra de estar lutando mais uma vez contra os demônios que os caçavam até pouco tempo atrás. Mesmo a Zona Cega, exemplo claro de combatentes poderosas, tinha perdas maiores do que as deles, independente se fossem menos preparados.

    A diferença era clara.

    Juno virou o rosto na direção sul, onde os ventos batiam contras os prédios tombados entre si, criando encruzilhadas e decaimentos. Onde o solo afundava, dando caminho para os trilhos, onde boa parte dos Felroz ainda habitavam por conta do limiar e fronteira.

    Lá, mesmo que não pudesse vê-lo, estava um homem que não precisava desse apoio para vencer. Por isso, Juno virou o rosto.

    Preciso alcançar ele.

    I

    — O senhor passou metade da manhã encarando a direção norte — disse Holanda, sentado em uma rocha de concreto, com vigas nas laterais. Os olhos azuis piscando de vez em quando. — Algo te incomoda?

    — Muitas coisas me incomodam. — Dante soltou um suspiro, de braços cruzados. — Eu te ensinei o que um Lagmorato é, mas eles precisam de bem mais do que vontade, precisam de confiança. Acredito que eles vão se sair bem, mas não posso deixar de temer o pior.

    — O senhor é um humano humilde em reconhecer seu medo. Muitos não fariam o mesmo. Pelo menos, Vick me disse isso.

    O rosto fagulhado e cheio de torções apareceu nas costas de Dante, a própria Vick se materializou para confrontá-lo.

    — Não diga besteiras, Holanda. Humanos são tentados por natureza, e sem a soberba intercalado com a humildade, existe uma ganância que não pode ser medida. Nosso propósito aqui é mais do que claro, não deixar que os Felroz do lado sul se unam quando ouvirem o chamado.

    Dante virou, concordando com a cabeça.

    — Exatamente. Nós estivemos treinando esse tempo todo para não deixar isso acontecer. E pelas rondas que fizemos com a ajuda de Nick e Lilo — os dois Felroz pularam de dentro de seu casaco preto, ficando cada um em um ombro —, temos certeza de que temos uma formação de Felroz para lá.

    Holanda ficou de pé, ajustando os braços para baixo e erguendo o queixo metálico.

    — Estou pronto para ajudar no que for necessário, mestre. O que solicitou ao senhor Duna e senhorita Manu também já estão praticamente pronto e aguardando. Nós vamos partir agora?

    Com uma última olhada para o norte, Dante fitou o sol ao lado. A cidade ficava bem iluminada quando o dia começava, e era sempre nesse mesmo horário que alguns rugidos surgiam de onde costumava fazer a ronda.

    Novamente, um rugido baixo, parecendo uma dormente música que atraía pequenos animais para sua toca. Pronto para abocanhar qualquer que fosse o petisco.

    — Vamos. — Dante tomou a dianteira. Holanda o seguiu pelas costas, pegando a bolsa larga deixada por senhorita Manu. — Temos uma ronda para começar.

    — Adoro rondas — respondeu Holanda, animado. — Bater em monstros sem consciência é divertido, mestre. Não acha?

    Dante riu.

    — Claro que sim. Fomos criados para isso.

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