Índice de Capítulo

    Na torre mais alta do castelo de Runyra, escondida atrás de portas de carvalho maciço, encontrava-se a biblioteca. Era um santuário do conhecimento do reino, um labirinto de estantes altas e prateleiras repletas de livros antigos.

    As páginas, amareladas pelo tempo, exalavam o aroma de séculos passados.

    Bill e Gerrard estavam sentados em uma pequena mesa de madeira. O livro aberto à sua frente era um tesouro: capa de couro gasto, letras douradas entalhadas. Eles passavam as páginas com dedos reverentes, sorrisos nos lábios.

    Colin, em silêncio, observava os garotos com ternura.

    Ele se aproximou, os passos silenciosos no chão de pedra. — Gostariam de ver algo tão fascinante quanto essas páginas velhas? — perguntou, sua voz grave ecoando na sala.

    Os olhos de Bill e Gerrard se arregalaram. — O senhor está livre? — perguntou Gerrard.

    — Estou, vem, não vou chamar de novo.

    — Tá! — exclamaram em uníssono. Eles se levantaram, abandonando o livro.

    Colin os conduziu pelo corredor, atravessando salões adornados e escadarias espiraladas. Finalmente, chegaram ao pátio do palácio. O sol dourado banhava o espaço amplo, e o vento sussurrava entre as árvores.

    E então, Colin ergueu as mãos. A magia fluiu de seus dedos, criando uma forma no ar. Um rugido ecoou, e diante dos garotos, materializou-se um dragão. Suas escamas eram de um azul profundo, e suas asas se estendiam como velas gigantes.

    — Uau… — Bill e Gerrard ficaram sem fôlego.

    O dragão era majestoso, seus olhos faiscando. Colin sorriu, os cabelos escuros balançando ao vento. — Subam! — disse ele, e os garotos obedeceram, agarrando-se às pernas do pai.

    A criatura bateu as asas, e eles ascenderam.

    O castelo diminuiu, tornando-se um brinquedo de pedra lá embaixo. Colin permaneceu de pé, equilibrando-se nas costas do dragão etéreo. — Nunca fui até o fim — disse ele, apontando para além das montanhas que cercavam Runyra. — Mas vocês podem, ver coisas que nunca vi. Se segurem!

    O dragão, com suas asas azuis como o próprio firmamento, cortava o céu em velocidade vertiginosa. Bill e Gerrard, agarrados às pernas de seu pai, sentiam o vento chicotear seus cabelos e os olhos se encherem de lágrimas.

    Abaixo deles, o mundo se desdobrava como um mapa mágico, os vales se estendendo como cicatrizes na terra. Alguns eram verdes e férteis, com rios serpenteando como veias. Outros eram áridos, com rochas pontiagudas como dentes de dragão. Vilas surgiam e desapareciam, pequenos pontos de luz em meio à vastidão.

    Colin apontava para cada lugar, sussurrando seus nomes como encantamentos. — Ali está a Vila dos Salgueiros, onde os tecelões criam as melhores roupas de Runyra. E além, o Desfiladeiro dos Lamentos, os ventos desse lugar uivam como almas penadas!

    Bill e Gerrard olhavam, olhos arregalados. Eles nunca haviam visto o mundo assim, de cima.

    E o dragão continuava, suas asas batendo com força.

    Quando o sol começou a mergulhar no horizonte, o mundo se tingiu de laranja e púrpura. Colin segurou ambos no colo, o coração cheio de orgulho. — Vejam! — disse ele, apontando para o oeste com o queixo. — Ali, além das montanhas, há algo que poucos viram.

    Gerrard apertou os olhos. — O quê?

    Colin sorriu. — O limite de Runyra. Nem mesmo eu fui tão a oeste. Atrás das montanhas está a desolação de Morlock.

    O dragão flutuou, pairando sobre uma crista de montanha. O vale abaixo estava mergulhado em sombras. — Aqui é onde paro — disse Colin. — Vocês ainda são jovens. Mas um dia, quando forem fortes e sábios, vocês explorarão essas terras. Voltarão e me contarão o que encontraram.

    — Tá!


    As asas do dragão cortaram o ar, e Colin segurava seus filhos nos braços enquanto a criatura descia, suas garras tocando a grama do pátio do castelo.

    Bill e Gerrard, olhos arregalados, desembarcaram com pernas trêmulas. Acima deles, o céu estava salpicado de estrelas, como diamantes incrustados em veludo negro.

    Vendo que as crianças não conseguiam caminhar, Colin os pegou no colo novamente.

    Os garotos estavam eufóricos. Nunca haviam tido um momento assim com seu pai, o homem que viam como herói. Agora, ele havia mostrado algo tão incrível que eles nunca mais esqueceriam.

    O dragão se desfez em faíscas etéreas, e Colin os conduziu de volta ao castelo.

    No quarto, a luz das velas dançava nas paredes de pedra. Colin colocou Bill e Gerrard no chão, sorrindo. — Hora de dormir — disse ele e os garotos correram para a cama, saltando como jovens cervos.

    Colin tirou as botas deles, cobrindo-os. Bill, com os olhos sonolentos, olhou para o pai. — Pode contar uma história, pai?

    Colin assentiu. — Claro. — Ele olhou para a porta, e lá estavam Melyssa, Brey e Nailah, vestindo pijamas e olhando com curiosidade.  — Vocês também querem ouvir?

    Brey, a mais curiosa, perguntou: — Aonde vocês foram, papai?

    Colin sorriu. — Fomos dar uma volta. Amanhã será a vez de vocês. — Ele abriu a porta, e todas seguiram para o quarto das crianças.

    Nailah, a mais nova, pulou na cama. — Papai, você vai contar uma história?

    Colin se sentou na beira da cama, olhando para os rostos ansiosos. — Sim, vou. — Ele apontou para as estrelas que brilhavam através da janela. — Na minha última viagem fiquei preso em uma mina, orcs, grandes com dentes enormes nos vigiavam, eu, tia Samantha e tia Morwyna.

    As crianças se aconchegaram, olhos atentos. Colin começou a contar, sua voz suave como uma canção. E aos poucos, um a um, todos adormeceram.

    Colin os cobriu, beijando suas testas e fez o mesmo ao colocar as meninas em seus quartos. Quando terminou, ele deixou o quarto, fechando a porta com cuidado.

    O castelo dormia, mas Colin permanecia acordado.

    O luar derramava-se sobre o pátio do castelo, pintando tudo em tons prateados.

    Mas ele não era o único acordado naquela noite.

    Sentada em um banco de pedra, com os cabelos escuros escovados e um vestido branco imaculado, estava Morwyna. Seus olhos estavam vermelhos, e ela enxugou rapidamente as lágrimas quando Colin se aproximou.

    Ele se sentou ao lado dela, o silêncio pairando entre eles. — O que aconteceu? — perguntou Colin, sua voz suave como uma prece.

    Morwyna entregou-lhe uma carta.

    Ele a desdobrou e leu as palavras escritas com tinta negra. Ghindrion, seu irmão, havia partido, deixando claro na carta que Colin era um perigo e que se Morwyna fosse esperta, ela também perceberia.

    — Ele nunca escuta — murmurou Morwyna. — Sempre acaba fazendo o que quer…

    Colin suspirou. — Você tem razão. Mas agora, o que acontecerá?

    Morwyna começou a chorar, e suas lágrimas refletiam a luz da lua. — Não sei. Ele é meu irmão, mas também é um perigo. E você… você é o regente… Há mais em jogo do que meus sentimentos…

    Colin assentiu. — Dependerá dele. Se Ghindrion tentar nos ferir, não terei escolha. E você, Morwyna, não é mais uma mulher comum. Deve pensar como uma princesa, como a líder de uma nação.

    Ela apoiou a cabeça em seu ombro. — Fique aqui comigo, Colin. Por favor…

    Ele acariciou seus cabelos, trazendo-a para perto. — Ghindrion tem razão — disse Colin, sua voz baixa. — Sou perigoso. Mas é assim que mantemos tudo em ordem. Um pouco de medo mantém as pessoas na linha.

    Morwyna assentiu, os olhos ainda úmidos. — Sei como as coisas funcionam, senhor Colin. Mas mesmo assim…

    Ele olhou para ela, os traços cansados. — Você terá que começar a esquecer esses sentimentos em relação a ele. Nossa família agora é você, eu, Ayla, Brighid e as crianças. Você também terá suas próprias crianças em breve. Não precisamos de traidores que nos dão as costas.

    Morwyna apoiou a cabeça em seu ombro. — Vou tentar — sussurrou. — Mas não quero me esquecer dele completamente.

    Colin acariciou seus cabelos. — Com o tempo, talvez nem se lembre que Ghindrion existiu.

    Ela olhou para as estrelas, pensativa. — Não quero esquecer. Ele é meu irmão…

    Colin suspirou. — É uma decisão sua, Morwyna.


    À noite, um manto escuro que cobria Runya, e homens encapuzados se reuniam à beira do rio. A água corria silenciosa, refletindo as estrelas acima.

    — Será que devemos mesmo fazer isso? — perguntou um deles, a voz trêmula. — O rei de Runyra é poderoso… se ele descobrir estaremos mortos…

    Aoth, o mais decidido do grupo, ergueu um frasco. O líquido viscoso dentro dele parecia pulsar com uma energia sombria.

    — Sim — disse ele, os olhos ardendo sob o capuz. — O rei sentirá a dor agora de perder tudo como nós. Nossos inimigos não podem permanecer intocados, o rei não pode permanecer intocado! Não querem suas riquezas de volta, seu lar? Milveg vai nos devolver, então façam!

    Os outros homens assentiram, as mãos trêmulas. Eles haviam se reunido em segredo, movidos por ódio e vingança. O rei de Runyra havia cruzado uma linha, e agora eles estavam prestes a desencadear uma força que não podiam controlar.

    Aoth abriu o frasco e despejou o líquido no rio. A água se contorceu, como se protestasse contra a intrusão. Os homens observaram, corações acelerados. Não havia volta.

    — Acabou — disse Aoth, a voz rouca. — O rei sentirá a agonia. E nós seremos livres.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (1 votos)

    Nota